A primeira coisa que se pensa quando se fala em segurado especial (agricultores), geralmente, é aquele segurado que exerce suas atividades em regime de economia familiar, isto é, com seu companheiro(a) e filhos(as). Todavia, existem hipóteses de trabalhadores rurais em que esse não é o enquadramento correto, devendo ser reconhecido, na verdade, o regime de economia individual.
No ponto, o art. 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, assim preconiza:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993)
(…) VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
Com efeito, é necessário especial atenção ao caso concreto, pois um enquadramento incorreto pode prejudicar sobremaneira o cidadão, que poderá deixar de ter a sua qualidade de segurado reconhecida.
Imagine-se, por exemplo, um casal de segurados. Ambos moram na zona rural da cidade, mas um deles vai para a cidade todos os dias trabalhar como mecânico. O outro permanece no campo, trabalhando na lavoura, no cultivo de milho, feijão, mandioca e batatas, com uma pequena criação de porcos e galinhas, cujo excedente é comercializado ali pela região mesmo.
Um pedido de reconhecimento da qualidade de segurado especial em regime de economia familiar, nesse caso, poderia ser sumariamente indeferido, uma vez que um dos membros do grupo familiar dedica-se à atividade urbana. O mais correto, portanto, seria sustentar, ainda, a qualidade de segurado especial daquele sujeito, mas em regime de economia individual, isto é, daquele que exerce atividade rural sozinho, sem o auxílio de familiares ou terceiros.
De fato, no caso em tela, o segurado que trabalha nas lides campestres o faz sem sequer o auxílio de seu companheiro, sendo o único do grupo familiar a se dedicar a essa atividade. Em razão disso, deve ser enquadrado no regime de economia individual, sem prejuízo do labor urbano exercido por outros membros do mesmo grupo.
Deve-se observar, contudo, que a opção pelo reconhecimento da qualidade de segurado especial em regime de economia individual não exime da necessidade de que a renda advinda da atividade rural seja preponderante para o sustento do segurado em questão. No exemplo acima, a renda do segurado especial deve ser capaz de prover o seu sustento, sem que a renda do companheiro mecânico seja a principal do casal.
Nesse sentido, veja-se o entendimento da Turma Nacional de Uniformização:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL INDIVIDUAL. MEMBRO DA FAMÍLIA EXERCE ATIVIDADE URBANA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL SEM CONSIDERAR O RENDIMENTO URBANO. 1. A legislação de regência admite tanto a figura do segurado especial em regime de economia familiar, quanto a do segurado especial em regime de economia individual. Os institutos foram criados de forma complementar, não sendo admissível a conclusão de que um anule ou absorva o outro. São institutos que devem sobreviver juntos, aplicando-se a situações fáticas diferenciadas. Não se trata de regime individual dentro do familiar, e sim de regime individual contraposto ao familiar. Dois conceitos estabelecidos de forma conjunta na legislação de regência não podem se destruir. Seria incoerente que o legislador criasse a figura do segurado especial em regime de economia familiar, se a família fosse irrelevante para fins de consideração de uma categoria diversa, de segurado em regime individual. Bastaria a criação do regime individual, que atenderia a todos os postulantes. O conceito principal e originário é o de segurado especial em regime de economia familiar, previsto em sede constitucional, sendo que o regime individual deve manter sua característica de complementaridade, já que fixado pela legislação infraconstitucional regulamentadora. 2. O trabalho individual que possibilita o reconhecimento da qualidade de segurado especial é, primeiramente, aquele realizado por produtor que trabalha na propriedade em que mora e não possui família. Isso porque a legislação não poderia prejudicar ou punir, de forma desarrazoada, aquele que não pertence a grupo familiar algum, excluindo-o da possibilidade de ser abrigado pelo Regime Geral de Previdência na qualidade de segurado especial. Também se caracteriza como segurado especial individual o trabalhador avulso, conhecido como “boia-fria” ou “volante”, que independentemente de não possuir produção própria, é absolutamente vulnerável, encontrando proteção na legislação de regência. 3. Já o produtor rural que possui família e pleiteia o reconhecimento da qualidade de segurado especial deve necessariamente demonstrar a relevância do trabalho na lavoura no orçamento familiar. Essa conclusão se ancora no § 1º do art. 11 da Lei nº 8.213/91, que exige que o trabalho dos membros da família seja indispensável à própria subsistência do grupo. Entendimento consagrado na Súmula nº 41 da TNU. Dessa forma, se algum membro integrante do grupo familiar auferir renda proveniente de atividade urbana, esse dado não pode deixar de ser considerado em comparação com a renda proveniente da atividade rural da família para efeito de definir se os familiares que exercem atividade rural podem se qualificar como segurados especiais. Descaracterizado o regime de economia familiar, não se pode postular o reconhecimento de qualidade de segurado especial individual com desprezo do rendimento urbano auferido pelos demais membros da família. Esse entendimento, divergente do acórdão paradigma, é o que prevaleceu na TNU em julgamento representativo de controvérsia (Processo nº 2008.72.64.000511-6, Relator para acórdão Juiz Rogerio Moreira Alves, DJU 30/11/2012). 4. Pedido improvido.
Diante do exposto, deve o Advogado Previdenciarista estar atento ao caso concreto, a fim de estabelecer a melhor estratégia para obter o benefício de seu cliente.
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