No âmbito dos processos previdenciários movidos contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a remessa necessária é um mecanismo processual que visa assegurar o duplo grau de jurisdição. Isso significa que, em determinadas situações, mesmo que não haja recurso por parte do INSS, a sentença proferida em primeira instância deve ser obrigatoriamente revisada pelo tribunal competente. Essa prática busca proteger o dinheiro público e garantir a uniformidade das decisões judiciais.
O que é a remessa necessária?
A remessa necessária, também conhecida como reexame necessário, está prevista no artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015). Esse dispositivo estabelece que o reexame necessário deve ser aplicado para sentenças proferidas contra a União, Estados, Municípios e suas respectivas autarquias e fundações públicas, bem como as sentenças que julgarem procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. No entanto, a remessa necessária será dispensada quando o proveito econômico for inferior a determinado montante – no caso das sentenças contra a União, não será aplicada essa reavaliação quando o valor da condenação ou o proveito econômico obtido pelo autor for menor do que 1.000 salários mínimos.
Antes do CPC de 2015, a partir da Lei nº 10.352/2001, a remessa necessária só era aplicada quando o valor aferido ultrapassasse 60 salários mínimos, qualquer que fosse o ente réu. Ademais, havia entendimento sumulado (Súmula 490 do STJ) de que a remessa necessária não seria aplicada quando não houvesse valor determinado, ou seja, para sentenças ilíquidas.
De todo modo, ao ser submetida ao tribunal de segunda instância, a sentença é reavaliada em todos os seus aspectos, incluindo o mérito da decisão, ou seja, o conteúdo e os fundamentos que levaram o juiz de primeira instância a proferir determinado julgamento. Isso significa que o tribunal verifica se a decisão inicial está correta, tanto em relação aos fatos quanto à aplicação do direito.
Contudo, embora a sentença seja revisada, a remessa necessária não possui natureza recursal, pois não decorre da iniciativa da parte sucumbente, mas sim de uma obrigação imposta por lei ao próprio juiz que proferiu a sentença. Assim, mesmo que a parte vencedora não recorra, a sentença desfavorável à Fazenda Pública será submetida ao reexame obrigatório pelo tribunal.
O Tema 1.081 do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O critério principal para a obrigatoriedade da remessa necessária é que seja maior de 1.000 salários mínimos o valor que a União seja condenada a pagar. Contudo, em diversos casos, a sentença não chega a determinar o valor líquido devido, tão somente o direito do autor.
Nesses casos, surge a discussão sobre a necessidade ou não da remessa necessária. O entendimento predominante é que, mesmo em sentenças ilíquidas, quando o valor da condenação pode ser facilmente aferido por cálculos simples e é possível estimar que não ultrapassará o referido limite, a remessa necessária pode ser dispensada.
No caso dos processos previdenciários, por exemplo, mesmo que o autor tenha direito ao benefício no valor do teto da previdência, não chegaria nem perto de 1.000 salários mínimos. Vejamos: se o autor tem direito a 65 meses de atrasados no teto da previdência (R$ 8.157,40 x 65 = R$ 530.231) e o processo venha a demorar mais 50 meses (R$ 8.157,40 x 50 = R$ 407.870), o total seria de R$ 938.10,00, o que equivaleria a 621 salários mínimos.
Diante das divergências jurisprudenciais sobre a obrigatoriedade da remessa necessária em processos previdenciários com condenações de valor presumidamente inferior a 1.000 salários mínimos, o STJ afetou os Recursos Especiais nº 1.882.236/RS, 1.893.709/RS e 1.894.666/SC para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, originando o Tema 1.081. A questão submetida a julgamento é:
“Definir se a demanda previdenciária cujo valor da condenação seja aferível por simples cálculos aritméticos deve ser dispensada da remessa necessária, quando for possível estimar que será inferior ao montante previsto no artigo 496, § 3º, inc. I do Código de Processo Civil.”
A afetação ocorreu em 10 de março de 2021, e o julgamento desse tema busca uniformizar o entendimento sobre a necessidade da remessa necessária em tais circunstâncias. Enquanto não há decisão definitiva, muitos tribunais têm adotado o entendimento de que, em casos em que é evidente que o valor da condenação não ultrapassará o limite estabelecido, a remessa necessária pode ser dispensada.
Impacto da remessa necessária nos processos previdenciários
A exigência da remessa necessária pode impactar significativamente o tempo de tramitação dos processos previdenciários. Quando uma sentença favorável ao segurado é proferida e submetida ao reexame necessário, isso significa que todo o processo será reavaliado pelo tribunal, o que logicamente toma tempo e pode postergar o recebimento de benefícios ou valores devidos ao segurado, afetando diretamente sua subsistência.
Para os advogados que atuam em processos previdenciários contra o INSS, é fundamental estar atento às nuances da remessa necessária. Compreender os critérios que determinam sua aplicabilidade permite uma atuação mais estratégica, seja na elaboração das peças processuais, seja na orientação adequada aos clientes sobre os prazos e possíveis desdobramentos do processo.
Além disso, acompanhar o desfecho do julgamento do Tema 1.081 pelo STJ é essencial, pois a definição dessa controvérsia estabelecerá diretrizes claras sobre a necessidade ou dispensa da remessa necessária em processos previdenciários com condenações de valor inferior a 1.000 salários mínimos. Essa uniformização contribuirá para a celeridade processual e para a previsibilidade das decisões judiciais.
Conclusão
A remessa necessária é um instrumento processual que visa garantir a revisão automática de sentenças proferidas contra entes públicos, como o INSS, em determinadas circunstâncias. No contexto dos processos previdenciários, a aplicação desse mecanismo tem sido objeto de debates, especialmente quando o valor da condenação é inferior a 1.000 salários mínimos e pode ser facilmente calculado.
O Tema 1.081 do STJ busca esclarecer essa questão e uniformizar a jurisprudência, trazendo maior segurança jurídica e eficiência ao trâmite dos processos previdenciários. Para os advogados que atuam nessa área, é crucial compreender os impactos da remessa necessária e acompanhar a definição jurisprudencial, a fim de melhor representar os interesses de seus clientes e assegurar a efetividade dos direitos previdenciários.
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