
POLO ATIVO: CLEIDE MARIA CORREIA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ROBERTO RODRIGUES MORAES - GO8277-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014758-74.2020.4.01.9999
APELANTE: CLEIDE MARIA CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES MORAES - GO8277-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por CLEIDE MARIA CORREIA em face de sentença que julgou improcedente seu pedido de aposentadoria rural por idade, ante a ausência de prova da qualidade de segurado, pelo tempo da carência legal.
Em apelação, alega a comprovação da qualidade de segurada especial durante o período de carência necessário para a concessão do benefício previdenciário.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014758-74.2020.4.01.9999
APELANTE: CLEIDE MARIA CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES MORAES - GO8277-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, no período imediatamente anterior à formulação do requerimento administrativo ou ao implemento do requisito etário (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado, no mínimo, mediante razoável início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que ateste a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar etc., não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
A autora, nascida em 17/10/1962 (fl. 8, ID 62241041), preencheu o requisito etário em 17/10/2017 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurada especial em 09/04/2018 (fl. 14, ID 62241041), que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 31/05/2018, pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
Assim, como atingiu a idade em 2017, para ter direito ao benefício postulado, deve comprovar o exercício de atividade campesina por 180 meses (15 anos) no período imediatamente anterior à data do requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima (Súmula 54 da TNU).
Para comprovar sua qualidade de segurado especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos (ID 62241041):
a) certidão de casamento, realizado em 27/12/1990, na qual consta a autora como "do lar" e seu marido como "lavrador" (fl. 9);
b) CTPS da autora, comprovando vínculos trabalhistas no meio rural como empregado rural (fls. 10/12).
No caso, constituem início de prova material da atividade rural da autora: certidão de casamento, celebrado em 1990, qualificando o marido como “lavrador”; vínculos como empregada rural de maio a junho de 1995 (CTPS e CNIS), de outubro de 1995 a janeiro de 1996 (CTPS e CNIS), de novembro a dezembro de 2007 (CTPS e CNIS), de abril a agosto de 2008 (CTPS e CNIS) e de maio de 2009 a fevereiro de 2010 (CNIS).
Note-se que o vínculo com “AGROSERVICE EMPREITEIRA AGRÍCOLA – EIRELI” se presume rural pelo nome do empregador, não mudando essa conclusão o mero fato de posterior concessão de auxílio-doença conter referência ao ramo de atividade “comerciário”. Com efeito, não é raro verificar registros de ramos de atividade equivocados nos sistemas do INSS relativamente a benefícios concedidos muitos anos atrás (regra de experiência comum).
Além disso, há registro de auxílio-doença, decorrente de vínculos empregatícios aparentemente rurais, nos períodos de junho a novembro de 2008 e de junho a agosto de 2010, não tendo a autora perdido a condição de segurada nesses períodos (art. 15, inciso I, Lei n. 8.213/91).
Ressalta-se que “mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório” (Tema 638/STJ).
Portanto, tais documentos servem como início de prova material da atividade rurícola exercida pela autora entre o casamento (1990) e o início do primeiro vínculo urbano posterior do marido (1992); entre o primeiro vínculo rural da autora (1995) e seu vínculo urbano subsequente (1997); e a partir de novembro de 2007, quando teve início um novo vínculo rural da autora sem registro de posteriores vínculos urbanos.
Quanto ao fato da autora já ter sido candidata a vereadora, tal situação não infirma sua condição de rurícola, posto que até o exercício do cargo é admitido expressamente pelo § 9º do art. 11 da Lei 8.213/1991. (AC 0006417-56.2017.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Rel. conv. Juiz Federal Saulo José Casali Bahia, 1ª Câmara Regional Previdenciária da Bahia, e-DJF1 22/10/2021 pag).
Por fim, a aposentadoria por idade rural, com idade reduzida e mediante comprovação de exercício de atividade rural pelo período de carência, não é restrita aos segurados especiais (art. 48, §§ 1º e 2º e 4º, da Lei n . 8.213/91).
Nesse cenário, deve-se admitir a existência de início de prova material do exercício de atividade rural pela autora, de forma descontínua, pelo mínimo de 180 meses no período imediatamente anterior à apresentação do requerimento administrativo. Conforme transcrições constantes da sentença, a prova oral corrobora o início de prova material.
Considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91. Não há parcelas prescritas.
Dessa forma, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria rural.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
CUSTAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data do acórdão de procedência (Súmula 111/STJ).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora, para condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade rural, desde a Data de Entrada do Requerimento (DER), bem como a pagar-lhe as parcelas atrasadas, compreendidas entre a Data de Entrada do Requerimento (DER) e a Data de Início do Pagamento (DIP), ressalvadas as parcelas eventualmente pagas administrativamente. Parcelas decorrentes de benefícios inacumuláveis recebidos no mesmo período devem ser objeto de compensação.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014758-74.2020.4.01.9999
APELANTE: CLEIDE MARIA CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES MORAES - GO8277-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. TEMA 638 DO STJ. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
2. A autora, nascida em 17/10/1962 (fl. 8, ID 62241041), preencheu o requisito etário em 17/10/2017 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurada especial em 09/04/2018 (fl. 14, ID 62241041), que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 31/05/2018, pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
3. Para comprovar sua qualidade de segurado especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos (ID 62241041): a) certidão de casamento, realizado em 27/12/1990, na qual consta a autora como "do lar" e seu marido como "lavrador" (fl. 9); b) CTPS da autora, comprovando vínculos trabalhistas no meio rural como empregado rural (fls. 10/12).
4. Constituem início de prova material da atividade rural da autora: certidão de casamento, celebrado em 1990, qualificando o marido como “lavrador”; vínculos como empregada rural de maio a junho de 1995 (CTPS e CNIS), de outubro de 1995 a janeiro de 1996 (CTPS e CNIS), de novembro a dezembro de 2007 (CTPS e CNIS), de abril a agosto de 2008 (CTPS e CNIS) e de maio de 2009 a fevereiro de 2010 (CNIS).
5. O vínculo com “AGROSERVICE EMPREITEIRA AGRÍCOLA – EIRELI” se presume rural pelo nome do empregador, não mudando essa conclusão o mero fato de posterior concessão de auxílio-doença conter referência ao ramo de atividade “comerciário”. Com efeito, não é raro verificar registros de ramos de atividade equivocados nos sistemas do INSS relativamente a benefícios concedidos muitos anos atrás (regra de experiência comum).
6. Há registro de auxílio-doença, decorrente de vínculos empregatícios aparentemente rurais, nos períodos de junho a novembro de 2008 e de junho a agosto de 2010, não tendo a autora perdido a condição de segurada nesses períodos (art. 15, inciso I, Lei n. 8.213/91).
7. Ressalta-se que “mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório” (Tema 638/STJ). Portanto, tais documentos servem como início de prova material da atividade rurícola exercida pela autora entre o casamento (1990) e o início do primeiro vínculo urbano posterior do marido (1992); entre o primeiro vínculo rural da autora (1995) e seu vínculo urbano subsequente (1997); e a partir de novembro de 2007, quando teve início um novo vínculo rural da autora sem registro de posteriores vínculos urbanos.
8. O fato da autora já ter sido candidata a vereadora não infirma sua condição de rurícola, posto que até o exercício do cargo é admitido expressamente pelo § 9º do art. 11 da Lei 8.213/1991. (AC 0006417-56.2017.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Rel. conv. Juiz Federal Saulo José Casali Bahia, 1ª Câmara Regional Previdenciária da Bahia, e-DJF1 22/10/2021 pag).
9. A aposentadoria por idade rural, com idade reduzida e mediante comprovação de exercício de atividade rural pelo período de carência, não é restrita aos segurados especiais (art. 48, §§ 1º e 2º e 4º, da Lei n . 8.213/91). Nesse cenário, deve-se admitir a existência de início de prova material do exercício de atividade rural pela autora, de forma descontínua, pelo mínimo de 180 meses no período imediatamente anterior à apresentação do requerimento administrativo. Conforme transcrições constantes da sentença, a prova oral corrobora o início de prova material.
10. CConsiderando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91. Não há parcelas prescritas.
11. Apelação provida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator