
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LAZARA FERREIRA DOS SANTOS LIMA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: RONALDO ALVES LAMONIER - GO35344-A
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001075-96.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAZARA FERREIRA DOS SANTOS LIMA
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social–INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido de benefício de aposentadoria por idade rural concedido a partir data do requerimento administrativo (16/05/2019).
Em suas razões de apelação, o INSS afirma não haver provas suficientes para configurar o direito da parte autora. Requer, ainda, o recebimento da apelação no duplo efeito.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001075-96.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAZARA FERREIRA DOS SANTOS LIMA
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A concessão do benefício de Aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
O requisito de carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11 da Lei do RGPS, a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração.
Para reconhecimento de tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge ou companheiro como trabalhador rural.
Com o objetivo de comprovar a sua condição de trabalhadora rural, a parte autora documentos, com destaque para: cópia da certidão de casamento com a informação de que o cônjuge da autora era lavrador desde a data de casamento, celebrado em 29/06/1985; certidão de nascimento de filho com a informação de que o marido era ‘lavrador’; cópia do prontuário médico da autora com informação de domicílio rural ( Fazenda Córrego Fundo, zona rural do município de Ivolândia/GO); fichas de matrícula escolar das filhas da autora demonstrado que a autora é lavradora e residia na Fazenda Córrego Fundo, Zona Rural, Ivolândia desde a época escolar de suas filhas; e certidão, exarada em 05/06/2020, por oficial de justiça avaliador nos termos: “ dirigi-me no endereço nele especificado ai sendo procedi a verificação de que a promovente Lázara Ferreira dos Santos Lima reside no local mencionado há vários anos. Certifico mais, que a promovente exerce a atividade rurícola. O referido é verdadeiro e dou fé”.
Em suas razões de recurso, o INSS sustenta que o cônjuge da autora possui vínculo urbano no CNIS, referente aos anos de trabalho como empregado na prefeitura do município de Ivolândia/GO o que, segundo o entendimento da autarquia previdenciária, por si só descaracterizaria a condição de segurado especial da autora.
Porém, julgo que tal registro não compromete a condição de segurada especial, pois o fato de o esposo da autora ter se tornado empregado de ente público municipal, em parte do período reclamado, não afeta, por si só, a condição de segurada especial da recorrida (Tema 532 STJ: “O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)”. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme nesse sentido:
Previdenciário. Aposentadoria rural por idade. Averbação de tempo de serviço rural. Início razóavel de prova material corroborado pela prova testemunhal. Qualidade de segurado especial comprovada. Atividade rurícola da autora não descaracterizada pelo vínculo urbano do cônjuge. Indenização do tempo rural. Inexigência no caso de aposentadoria por idade a segurado especial. Benefício devido. Consectários legais. Alteração. Litigância de má-fé afastada. Abuso do direito de recorrer não caracterizado. Sentença parcialmente reformada.(...) 8. Ressalte-se, a propósito, que o fato de seu ex-marido ter passado a exercer atividade comercial por intermédio de um 'mercadinho', encontrando-se cadastrado como empresário individual desde 03/06/1998 (fl. 53), por si só, não desqualifica, de forma automática, o exercício de atividades rurais, anteriores e posteriores a tal data, por parte da autora. Isso porque os vínculos urbanos somente retiram a condição do membro que se afasta do trabalho rural, uma vez que, nos termos do art. 11. §9º, caput: "Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento". A matéria, inclusive, já foi analisada, sob o rito de recursos repetitivos nos autos do REsp 1.304.479-SP, ocasião em que o STJ assentou que o fato de um dos membros do grupo exercer atividade incompatível com o regime de economia familiar não descaracteriza, por si só, a atividade agrícola dos demais componentes. (...) (TRF1 – AC 0052843-05.2012.4.01.9199, rel. Juiz Federal Guilherme Bacelar
Patrício de Assis, 2ª Câmara Regional Previdenciária de Minas Gerais, e-DJF1
08/06/2020.)( grifo nosso)
Ademais, as testemunhas ouvidas em Juízo, com destaque às declarações das testemunhas Jorge Malaquias de Medeiros e Aparecida Dias de Alicrim, que foram firmes e convincentes em atestar o trabalho rural da parte autora pelo período de carência previsto na Lei 8.213/91.
Oportuno recordar ainda que os benefícios destinados ao segurado especial e seus dependentes têm caráter social e visam, por óbvio, a proteção dos trabalhadores que mais dificuldades encontram para exercerem qualquer direito inerente à cidadania.
Neste sentido, todos os esforços devem ser carreados para a proteção destes trabalhadores, considerados hipossuficientes sob qualquer ângulo que para eles se olhe.
Por conseguinte, os documentos configuram o início razoável de prova material da atividade campesina, em atenção à solução pro misero adotada no âmbito do Colendo STJ e pelos Tribunais Regionais Federais.
Dessa forma, o recurso não merece provimento. O conjunto probatório revela o cumprimento do requisito etário, o exercício do labor rural, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, de modo que atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário - início de prova material apta a demonstrar a condição de rurícola da parte autora, corroborada por prova testemunhal, e idade mínima -, é devido o benefício de aposentadoria por idade.
Assim, sem reparos à sentença que concedeu à parte autora aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
Correção monetária pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (súmula 111 do STJ).
Ante o exposto, nego provimento à apelação interposta pelo INSS.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001075-96.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAZARA FERREIRA DOS SANTOS LIMA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. NEGADO O RECEBIMENTO DA APELAÇÃO NO DUPLO EFEITO. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO DEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei 8.213/91.
2. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
3. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, uma vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
4. Ressalte-se, ainda, que “... para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea.”. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 9/12/2021.)
5. No caso dos autos, a parte autora comprovou o efetivo exercício de atividade rural, cumprindo-se a carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, confirmada pela prova testemunhal, em conformidade com o entendimento jurisprudencial já sedimentado nesta Corte.
6. Anote-se que a existência de vínculo urbano do cônjuge não possui, por si só, o condão de descaracterizar a qualidade de segurada especial da autora, pois o fato de o cônjuge da autora ter se tornado empregado de ente público municipal, em parte do período reclamado, não afeta, por si só, a condição de segurada especial da recorrida (Tema 532 STJ: “O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)”.
7. Atendidos os requisitos legais com a apresentação de início de prova material da atividade campesina, devidamente corroborado por prova testemunhal o que ainda se agrega a comprovação da idade mínima, correta a sentença que acolheu a pretensão deduzida na petição inicial.
8. A correção monetária e juros de mora devem observar o disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do Tema 905 STJ e Tema 810 STF, observada a prescrição quinquenal.
9. Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (súmula 111 do STJ).
10. Apelação do INSS a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA