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REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. DECADÊNCIA AFASTADA. TORNEIRO MECÂNICO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PR...

Data da publicação: 22/12/2024, 22:52:49

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. DECADÊNCIA AFASTADA. TORNEIRO MECÂNICO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. RUÍDO. HIDROCARBONETOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO. DATA DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. Em relação à questão da decadência, podemos inferir as seguintes conclusões: i) Para os benefícios concedidos antes de 27 de junho de 1997, aplica-se um prazo decadencial de dez anos a partir de 01.08.1997, o que significa que o direito do segurado de solicitar revisão expirou em 01.08.2007; ii) Já para os benefícios concedidos a partir de 28.06.1997, o prazo decadencial de dez anos é contado a partir do primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação ou, quando aplicável, a partir do dia em que o segurado toma conhecimento de uma decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. 2. No caso em questão, o benefício foi concedido em 23/09/2009, com o primeiro pagamento em 05/11/2009. O prazo decadencial começou a correr a partir de 01/12/2009, primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação. Considerando que a ação foi proposta em 27/10/2019 e o autor solicitou a revisão em outubro de 2019, o direito não foi atingido pela decadência. 3. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, de modo habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a teor dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91. 4. Se for comprovado que o segurado exerceu uma atividade especial de acordo com os critérios estabelecidos pela legislação vigente na época do exercício, ele adquire o direito ao cômputo desse período como tempo de serviço especial. 5. Até 28/04/1995, é possível reconhecer a especialidade do trabalho com base na categoria profissional; a partir de 29/04/1995, é necessário demonstrar a exposição efetiva e contínua a agentes prejudiciais à saúde por meio de qualquer forma de prova; e a partir de 06/05/1997, a comprovação deve ser feita por meio de um formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. 6. A atividade de torneiro mecânico foi classificada como especial de acordo com o Parecer da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho (SSMT) no processo INPS nº 5.080.253/83. 7. A atividade é considerada especial quando há exposição a ruído acima de 80 dB até 05/03/1997, acima de 90 dB entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e acima de 85 dB a partir de 19/11/2003 (conforme decisão no REsp 1.398.260). A condição especial do trabalho persiste mesmo se o ruído for reduzido aos limites de tolerância pelo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI). 8. No presente caso, não há registro do uso de equipamento de proteção individual (EPI) capaz de neutralizar os efeitos prejudiciais dos óleos e graxas no organismo do autor. Portanto, os períodos requeridos de 11/01/1973 a 12/04/1976; 02/05/1976 a 25/02/1978; 01/04/1978 a 14/08/1990; 03/09/1990 até a data do requerimento administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição (28/07/2009) devem ser considerados como especiais. A soma desses períodos especiais totaliza 36 anos, 4 meses e 8 dias, o que atende aos requisitos para a concessão da aposentadoria especial. Além disso, uma vez que os requisitos foram cumpridos antes da publicação da Emenda Constitucional 103/2019 (12/11/19), o outor possui direito adquirido à aplicação das regras anteriores para a concessão do benefício pleiteado. 9. Extrai-se da documentação juntada aos autos (perfil profissiográfico previdenciário - PPP) e da perícia judicial, que a parte autora esteve exposta, de forma habitual e permanente, a níveis de ruído médio acima dos limites de tolerância, além da exposição a hidrocarbonetos que é considerado nocivo à saúde, devendo tais períodos ser considerados de labor especial. 10. Quanto ao início dos efeitos financeiros da revisão, o Superior Tribunal de Justiça entende que "os efeitos financeiros da revisão devem retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, independentemente da posterior comprovação do salário de contribuição" (2ª Turma, AgRg no AREsp 156926/SP, DJe 14/06/2012, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN; 2ª Turma, DJe 26/03/2014, AgRg no REsp 1423030/RS, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES; 2ª Turma, AgRg no REsp 1467290/SP, DJe 28/10/2014, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES). 11. Correta a sentença apelada que, após minuciosa análise do conjunto probatório constante dos autos, e com base tanto na legislação quanto na jurisprudência desta Corte, julgou procedente o pedido inicial para converter a aposentadoria por tempo de contribuição para aposentadoria especial. 12. Atualização monetária e juros de mora de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai do julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810 da repercussão geral) e do REsp. 1.495.146-MG (Tema 905). 13. Os honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença. 14. Apelação do INSS desprovida. (TRF 1ª Região, SEGUNDA TURMA, APELAÇÃO CIVEL (AC) - 1011734-72.2019.4.01.3500, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, julgado em 13/03/2024, DJEN DATA: 13/03/2024)

Brasão Tribunal Regional Federal
JUSTIÇA FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

PROCESSO: 1011734-72.2019.4.01.3500  PROCESSO REFERÊNCIA: 1011734-72.2019.4.01.3500
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)

POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO GONCALVES DA CRUZ
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CHRISTIANO GOMIDE MARTINS - GO41773-A e KATIUCY ALVES DE CASTRO GOMIDE - GO36670-A

RELATOR(A):JOAO LUIZ DE SOUSA


Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011734-72.2019.4.01.3500

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):  

Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido do autor, Pedro Gonçalves da Cruz, reconhecendo como especiais as atividades laborais desenvolvidas em períodos específicos, concedendo o direito à conversão da aposentadoria por tempo de contribuição para aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo, determinando a readequação da renda mensal do benefício de acordo com os novos critérios estabelecidos e condenando o INSS ao pagamento das eventuais diferenças não prescritas, com correção monetária e juros de mora conforme os parâmetros fixados no Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Em suas razões recursais, o INSS alega, em suma, a necessidade de pronunciamento da decadência como prejudicial de mérito, ressaltando a inadequação do laudo pericial apresentado pelo autor e a ausência de comprovação da habitualidade e permanência da exposição a agentes nocivos.

O INSS argumenta que o uso eficaz de Equipamento de Proteção Individual (EPI) afasta a especialidade das atividades laborais posteriores a uma determinada data, de acordo com a legislação vigente. Além disso, destaca a necessidade de observância das normas de regência vigentes na data de emissão do formulário utilizado para comprovação das atividades laborais, questionando a validade de documentos assinados por sindicatos da categoria profissional.

Outro ponto levantado pelo INSS refere-se à exigência de comprovação da efetiva condição de periculosidade, insalubridade ou penosidade da atividade laboral, ressaltando que tais requisitos sempre foram exigidos pela legislação previdenciária brasileira, inclusive para os enquadramentos por categoria profissional. Alega-se ainda que a exposição a agentes nocivos, como óleos e graxas, só é capaz de caracterizar a atividade como especial se ultrapassados os limites de tolerância, conforme determinado pela legislação pertinente.

Por fim, o INSS argumenta que os efeitos financeiros da revisão do benefício não podem retroagir para data anterior ao requerimento administrativo de revisão, destacando a necessidade de observância da legislação previdenciária em vigor à época da concessão do benefício.

Assim, requer o provimento do recurso e, por consequência, a improcedência dos pedidos constantes na exordial, com a condenação da parte autora ao pagamento das verbas de sucumbência.

Contrarrazões apresentadas.

É o relatório.


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PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011734-72.2019.4.01.3500

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):  

Presentes os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu efeito devolutivo (art. 1.011 do CPC).

Das preliminares:

O INSS argumenta que o suposto direito à revisão da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição recebido pela parte Autora está sujeito à decadência, conforme estabelecido pelo art. 103 da Lei 8.213/91.

No presente caso, o benefício em questão, cuja revisão está sendo solicitada, foi concedido em 23/09/2009 (conforme carta de concessão id. 1087451794).

Em outras palavras, está em debate o próprio mérito do direito, o que exclui a interpretação de que a prescrição de cinco anos se aplica apenas à pretensão de cobrar parcelas vencidas nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.

Em sua redação original, a Lei 8.213/91 estava assim redigida:

Art. 103. Sem prejuízo do direito ao benefício, prescreve em 5 (cinco) anos o direito às prestações não pagas nem reclamadas na época própria, resguardados os direitos dos menores dependentes, dos incapazes e dos ausentes.

Posteriormente, com a MP 1.523-9/97, convertida na Lei 9.528/97, o pedido de revisão passou a se sujeitar ao prazo decadencial de dez anos. A norma em questão ainda acresceu ao artigo um parágrafo único, que tratou da prescrição. Vejam-se:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil.

No ano seguinte, esse prazo decadencial foi reduzido para cinco anos, conforme previsto na Lei 9.711/98. Posteriormente, com a promulgação da Lei 10.839/2004, o prazo prescricional voltou a ser estipulado em dez anos:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

É válido salientar que a discussão sobre a validade e o alcance da imposição de prazos limitativos para a revisão do ato de concessão do benefício sempre foi um tema controverso. Tanto é que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral da questão em 16/09/2010, ao analisar o Recurso Extraordinário 626.489/SE.

Contudo, o Supremo Tribunal Federal decidiu o seguinte:

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA.

1. O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário. 2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse em evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário. 3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição. 4. Inexiste direito adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência. (cf. Informativo n. 725, de 21 a 25 de outubro de 2013)

No voto decisivo, o Ministro Roberto Barroso apresentou a seguinte justificativa:

II. VALIDADE E ALCANCE DA INSTITUIÇÃO DE PRAZO PARA REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO 6. O Regime Geral de Previdência Social (RGPS) constitui um sistema básico de proteção social, de caráter público, institucional e contributivo, que tem por finalidade segurar de forma limitada trabalhadores da iniciativa privada. A previdência social, em sua conformação básica, é um direito fundado na dignidade da pessoa humana, na solidariedade, na cidadania e nos valores sociais do trabalho (CF/88, art. 1°, II, III e IV), bem como nos objetivos da República de construir uma sociedade livre, justa e solidária, avançar na erradicação da pobreza e na redução das desigualdades sociais (CF/88, art. 3°, I e III). 7. Cabe distinguir, porém, entre o direito ao benefício previdenciário em si considerado – isto é, o denominado fundo do direito, que tem caráter fundamental – e a graduação pecuniária das prestações. Esse segundo aspecto é fortemente afetado por um amplo conjunto de circunstâncias sociais, econômicas e atuariais, variáveis em cada momento histórico. Desde a pirâmide etária e o nível de poupança privada praticado pelo conjunto de cidadãos até a conjuntura macroeconômica, com seu impacto sobre os níveis de emprego e renda. 8. Isso faz com que a definição concreta do sistema de previdência precise equacionar interesses por vezes conflitantes: dos trabalhadores ativos e dos segurados, dos contribuintes abastados e das pessoas mais humildes, da geração atual e das futuras. Em linha de princípio, a tarefa de realizar esse complexo equilíbrio situa-se na esfera de conformação do legislador, subordinando-se à decisão política das maiorias parlamentares. Somente haverá invalidade se a escolha legislativa desrespeitar o núcleo essencial do direito em questão. Resta saber se a instituição do prazo ora analisado e a sua incidência sobre os benefícios já concedidos incorreu ou não nesse tipo de vício. 9. Entendo que a resposta é negativa. No tocante ao direito à obtenção de benefício previdenciário, a disciplina legislativa não introduziu prazo algum. Vale dizer: o direito fundamental ao benefício previdenciário pode ser exercido a qualquer tempo, sem que se atribua qualquer consequência negativa à inércia do beneficiário. Esse ponto é reconhecido de forma expressa no art. 102, § 1°, da Lei n° 8.213/1991, bem como em diversas passagens em que a referida lei apenas dispõe que o atraso na apresentação do requerimento fará com que o benefício seja devido a contar do pedido, sem efeito retroativo. Nesse sentido, permanecem perfeitamente aplicáveis as Súmulas 443/STF5 e 85/STJ, na medida em que registram a imprescritibilidade do fundo de direito do benefício não requerido. 10. A decadência instituída pela MP n° 1.523-9/1997 atinge apenas a pretensão de rever benefício previdenciário. Em outras palavras: a pretensão de discutir a graduação econômica do benefício já concedido. Como é natural, a instituição de um limite temporal máximo destina-se a resguardar a segurança jurídica, facilitando a previsão do custo global das prestações devidas. Em rigor, essa é uma exigência relacionada à manutenção do equilíbrio atuarial do sistema previdenciário, propósito que tem motivado sucessivas emendas constitucionais e medidas legislativas. Em última análise, é desse equilíbrio que depende a continuidade da própria Previdência, não apenas para a geração atual, mas também para as que se seguirão. 11. Com base nesse raciocínio, não verifico inconstitucionalidade na criação, por lei, de prazo de decadência razoável para o questionamento de benefícios já reconhecidos. Essa limitação incide sobre o aspecto patrimonial das prestações. Não há nada de revolucionário na medida em questão. É legítimo que o Estado-legislador, ao fazer a ponderação entre os valores da justiça e da segurança jurídica, procure impedir que situações geradoras de instabilidade social e litígios possam se eternizar. Especificamente na matéria aqui versada, não é desejável que o ato administrativo de concessão de um benefício previdenciário possa ficar indefinidamente sujeito à discussão, prejudicando a previsibilidade do sistema como um todo. Esse ponto justifica um comentário adicional. 12. O Regime Geral de Previdência Social é um sistema de seguro na modalidade de repartição simples, a significar que todas as despesas são diluídas entre os segurados. Não se trata, portanto, de um conjunto de contas puramente individuais, e sim de um sistema fortemente baseado na solidariedade. Isso aumenta a interdependência entre os envolvidos. Diante disso, há maior razão para a estipulação de um prazo razoável para a revisão de atos de concessão, conciliando os interesses individuais com o imperativo de manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema. 13. Com essas considerações, entendo que inexiste violação ao direito fundamental à previdência social, tal como consagrado na Constituição de 1988. Não vislumbro, igualmente, qualquer ofensa à regra constitucional que exige a indicação prévia da fonte de custeio (art. 195, § 5°) – irrelevante na hipótese –, e tampouco aos princípios da irredutibilidade do valor dos benefícios (art. 194, parágrafo único, IV) e da manutenção do seu valor real (art. 201, § 4°). Tais comandos protegem a integridade dos benefícios já instituídos, e não um suposto direito permanente e incondicionado à revisão. 14. Assentada a validade da previsão de prazo, considero que o lapso de 10 (dez) anos é inequivocamente razoável. É tempo mais do que suficiente para a resolução de eventuais controvérsias interpretativas e para que o segurado busque as informações relevantes. É importante notar, nesse cenário, que a Lei n° 8.213/1991 passou a prever o mesmo prazo para eventuais pretensões revisionais da Administração, nos termos do seu art. 103-A: “Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.” 15. No encerramento deste tópico, é possível sintetizar os dois parâmetros gerais que devem reger a matéria: a) não há prazo decadencial para a formulação do requerimento inicial de concessão de benefício previdenciário, que corresponde ao exercício de um direito fundamental relacionado à mínima segurança social do indivíduo; b) a instituição de um prazo decadencial de dez anos para a revisão dos benefícios já concedidos é compatível com a Constituição Federal. Trata-se de uma conciliação razoável entre os interesses individuais envolvidos e os princípios da segurança jurídica e da solidariedade social, dos quais decorre a necessidade de se preservar o equilíbrio atuarial do sistema em benefício do conjunto de segurados atuais e futuros.

Na hipótese, o benefício foi concedido em 23/09/2009, com o primeiro pagamento em 05/11/2009.

O prazo decadencial começou a correr a partir de 01/12/2009, primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação.

Considerando que a ação foi proposta em 27/10/2019 e o polo ativo solicitou a revisão em outubro de 2019, o direito não foi atingido pela decadência.

Prescrição:

No que tange aos benefícios previdenciários de trato sucessivo, prescreve em cinco anos a pretensão para cobrar parcelas exigíveis no quinquênio anterior ao ajuizamento da ação.

Assim, reconhece-se a prescrição apenas da pretensão relativa ao período anterior ao quinquênio do ajuizamento da ação (27/10/2019), conforme regulamentado pelo Decreto 20.910/32, Decreto-Lei 4.597/42 e art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91.

Afasto as preliminares.

Do mérito

O cerne da controvérsia trazida à análise concerne à aferição do alegado direito da parte autora ao benefício previdenciário de aposentadoria especial, com efeitos retroativas à data do requerimento administrativo.

Nos termos do art. 57 e 58 da lei n. 8.213/91, a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.

Neste diapasão, o segurado deverá comprovar o tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, com exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais.

Cumpre destacar que a consideração do tempo de serviço como especial deve ser feita de acordo com a legislação vigente à época da prestação do serviço, e não da data em que perfeitas todas as condições para a aposentadoria, tal como disposto no § 1º, art. 70, do Decreto nº 3.048/99, com redação do Decreto nº 4.827/03.

Esse é o entendimento consagrado por esta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO LABORADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. CALOR. POEIRA DE SÍLICA. RUÍDO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. EPI. CÔMPUTO DO TEMPO EM GOZO DO BENEFÍCIO AUXÍLIO-DOENÇA COMO ESPECIAL. EC 20/98. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.

1.A questão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso resta prejudicada, uma vez que não concedido até esta data, não há utilidade na sua apreciação neste momento processual, uma vez que não cabe recurso com efeito suspensivo a partir deste julgado. 

2. O cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais deve observar a legislação vigente à época da prestação laboral, tal como disposto no § 1º do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.

3.O impetrante exercia atividade de operador de lingotamento em indústria metalúrgica, categoria profissional que estava inserida no código 2.5.1 do Quadro Anexo II do Decreto nº 83.080/79, sendo considerada de natureza insalubre por presunção legal até o advento da Lei 9.532/95.

4. Os formulários acostados aos autos comprovaram ainda a exposição do impetrante ao agente agressivo calor em uma intensidade acima dos limites de tolerância estabelecidos no código 1.1.1 do quadro anexo do Decreto n° 53.831/64 e pela NR-15 da Portaria n° 3.214/78, nos termos do código 2.0.4 dos Decretos n° 2.172/97 e n° 3.048/98, além da exposição ao agente poeira de sílica, com enquadramento no código 1.2.10, do Quadro anexo do Decreto 53.831/64 e no código 2.3.1, Anexo II, do Decreto nº 83.080/79.

5.Considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/97 (Súmula nº 29 da AGU), e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.

6.Para configuração da especialidade da atividade, não é necessário que o trabalhador permaneça exposto ao nível máximo de ruído aludido na legislação durante toda a sua jornada de trabalho.

7.A utilização de equipamentos de proteção individual não descaracteriza a atividade prestada sob condições especiais, pois seu uso não significa que estejam erradicadas as condições adversas que justificam a contagem de tempo de maneira específica, prestando-se tão somente a amenizar ou reduzir os danos delas decorrentes.

8.O período em gozo do benefício previdenciário de auxílio-doença, deve ser computado como tempo especial, tendo em vista que antes e depois da concessão do benefício, o impetrante laborou em condições especiais.

9.O segurado que implementou o tempo de contribuição necessário para obtenção da aposentadoria integral ou especial não se submete às regras de transição.

10. Apelação desprovida. Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente provida.

(Numeração Única: 0004403-44.2006.4.01.3813; AMS 2006.38.13.004409-3 / MG; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA; Relator JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER; Órgão 3ª TURMA SUPLEMENTAR; Publicação 31/05/2012 e-DJF1 P. 254) Destaquei

Em relação à época em que vigiam os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, para a comprovação do efetivo trabalho em atividade tida como perigosa, insalubre ou penosa, bastava que a categoria profissional a que pertencia o trabalhador se enquadrasse no rol constante nos anexos que integravam referidos diplomas, ressalvada a hipótese referente ao agente insalubre “ruído”, que sempre exigiu laudo pericial.

Na sequência, a Lei n. 9.032/95, publicada em 29.04.1995, passou a exigir a demonstração da especialidade da atividade, através dos formulários SB-40 e DSS 8030, o que persistiu até a edição da Medida Provisória 1.523/96, de 14.10.1996, convertida na Lei n. 9.528/97, de 11.12.1997, a partir de quando começou a ser exigida, obrigatoriamente, a comprovação da condição especial por meio de laudo técnico assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

Nesse contexto, nas hipóteses de tempo de serviço prestado após 29/04/95, deve o trabalhador comprovar a exposição permanente, não ocasional e nem intermitente aos agentes prejudiciais à saúde.

Saliente-se que, em razão da sobreposição de leis entre os Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, quando o primeiro fixou o limite de insalubridade em 80dB (oitenta decibéis) e o último delimitou em 90dB(noventa decibéis), estabeleceu-se que atividade especial é aquela desenvolvida em ambiente com ruído médio superior a 80dB (oitenta decibéis), em razão da vigência simultânea e sem incompatibilidade dos seus anexos.

Com o advento do Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, considera-se agente nocivo a exposição a níveis de ruído superior a 90dB; e acima de 85dB  (oitenta e cinco decibéis) a partir da edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003.  Ou seja, atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído:

I – superior a 80 decibéis até 05/03/1997;

II – superior a 90 decibéis de 06/03/1997 até 18/11/2003 e

III – superior a 85 decibéis a partir de então.

Com relação à conversão tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência mais recente do STJ permite tal transmudação, inclusive após 28/05/98 (Resp 956110/SP).

Por outro lado, em se tratando de conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo do artigo 543-C do CPC/73, então vigente, decidiu que “para que o segurado faça jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que ele tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da Lei n. 9.032/95, de 28/4/95, independentemente do momento em que foi prestado o serviço.” (EDcl no REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015).

Quanto ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado, registre-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário ARE n. 664.335, com repercussão geral reconhecida, decidiu que a utilização de EPI descaracteriza o labor exercido em condições especiais, desde que comprovada a real eficácia dos equipamentos de proteção, neutralizando a nocividade do agente.

Contudo, em relação ao agente físico ruído, restou definido pelo STF que, ainda que comprovada a utilização de EPI (protetores auriculares), a atividade mantém-se como especial. A Corte Constitucional fixou a tese no sentido de que “na hipótese de exposição do trabalho a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descarateriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”, pois, ainda que os protetores auriculares reduzam o nível de ruído aos limites de tolerância permitidos, a potência do som “causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas”.

Confira-se:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88).

2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88).

3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos "casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar".

4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo.

5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.

6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores.

8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador.

9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em 'condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física'.  

10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. 

11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.

12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores. 

14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário."

(ARE 664335, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno – STF, julgado em 04/12/2014, DJe-029 de 12/02/2015) Destaquei

Por outro lado, a atividade de torneiro mecânico foi classificada como especial de acordo com o Parecer da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho (SSMT) no processo INPS nº 5.080.253/83.

No presente caso, o autor desempenhou suas funções ao longo de todo o período necessário como Auxiliar de Retífica, mecânico e retificador.

Para demonstrar sua exposição às condições especiais de trabalho, o Requerente anexou à documentação processual sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), uma declaração do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Goiânia, bem como o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) da empresa Retífica Nacional de Motores Ltda. Foi também solicitada e concedida uma perícia pericial.

No entanto, somente os PPPs a partir de 01/04/1978 foram apresentados como prova documental.

Consequentemente, uma perícia judicial foi realizada nas instalações da empresa Retificadora Nacional de Motores, com o objetivo de avaliar as condições de trabalho em todas as empresas em que o Autor exerceu suas atividades e determinar se existiam circunstâncias nas atividades desempenhadas que poderiam ser consideradas especiais, de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Instrução Normativa INSS/PRES Nº 77, de 21 de janeiro de 2015.

O perito, identificado como (Id n. 710840459), constatou exposição ao ruído e a agentes químicos, afirmando: "Pela análise funcional das atividades, do ambiente, documentação apresentada e informações recebidas, foi constatada a presença de agentes químicos relacionados neste anexo, incluindo hidrocarbonetos (solventes, óleo e graxa mineral e óleo queimado)."

No que diz respeito ao período de exposição aos agentes identificados, o especialista afirmou: "Ruído, Solventes, Óleo e graxa mineral, Óleo queimado _ Habitual e Permanente, uma vez que a exposição tem caráter indissociável da prestação do serviço e faz parte da atividade diária." O nível de ruído registrado foi de 81dB no período de 01/04/1978 até 27/10/2019.

Respondendo às perguntas formuladas, o perito também observou que a empresa não conseguiu demonstrar o fornecimento regular de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).

A conclusão é que a perícia realizada é suficiente para avaliar as condições de trabalho em todos os vínculos de emprego que o requerente deseja que sejam reconhecidos como especiais, principalmente considerando o encerramento das atividades das empresas Lelio Souza Pereira e Retificadora Goiás de Motores Ltda na capital, conforme declarado pelo Sindicato (Id n. 144566889 e 144566891), e levando em conta a similaridade do ambiente de trabalho entre os profissionais retificadores, auxiliares de retífica e mecânicos.

De fato, a manipulação de óleos e graxas pode ser considerada uma atividade especial, de acordo com as disposições contidas nos Decretos n. 2.171/97 e 3.048/99, os quais estabelecem que o uso de óleos minerais justifica a concessão de aposentadoria especial após 25 anos de serviço.

É importante ressaltar que o óleo lubrificante está incluído na lista de agentes confirmados como carcinogênicos para seres humanos, conforme estabelecido na Portaria Interministerial n° 9 de 07 de outubro de 2014 (Grupo 1). Vários compostos químicos encontrados nos óleos lubrificantes usados, especialmente os metais pesados, têm impacto direto na saúde humana e alguns deles são reconhecidos como cancerígenos.

Quanto ao início dos efeitos financeiros da revisão, o Superior Tribunal de Justiça entende que "os efeitos financeiros da revisão devem retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, independentemente da posterior comprovação do salário de contribuição" (2ª Turma, AgRg no AREsp 156926/SP, DJe 14/06/2012, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN; 2ª Turma, DJe 26/03/2014, AgRg no REsp 1423030/RS, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES; 2ª Turma, AgRg no REsp 1467290/SP, DJe 28/10/2014, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).

Portanto, a sentença não requer revisão e deve ser mantida com base em seus próprios fundamentos.

A correção monetária deve observar o novo regramento estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 870.947/SE, no qual restou fixado o IPCA-E como índice de atualização monetária a ser aplicado a todas as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública. Juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Os honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.

Nos feitos processados perante a Justiça Estadual, no exercício de jurisdição federal, o INSS é isento do pagamento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) quando prevista a referida isenção em lei estadual específica, a exemplo do que ocorre nos Estados do Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso e Piauí.

Posto isso, nego provimento à apelação do INSS.

É como voto.




Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011734-72.2019.4.01.3500

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: PEDRO GONCALVES DA CRUZ

Advogados do(a) APELADO: CHRISTIANO GOMIDE MARTINS - GO41773-A, KATIUCY ALVES DE CASTRO GOMIDE - GO36670-A

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. DECADÊNCIA AFASTADA. TORNEIRO MECÂNICO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. RUÍDO. HIDROCARBONETOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS.  TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO. DATA DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.

1. Em relação à questão da decadência, podemos inferir as seguintes conclusões: i) Para os benefícios concedidos antes de 27 de junho de 1997, aplica-se um prazo decadencial de dez anos a partir de 01.08.1997, o que significa que o direito do segurado de solicitar revisão expirou em 01.08.2007; ii) Já para os benefícios concedidos a partir de 28.06.1997, o prazo decadencial de dez anos é contado a partir do primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação ou, quando aplicável, a partir do dia em que o segurado toma conhecimento de uma decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

2. No caso em questão, o benefício foi concedido em 23/09/2009, com o primeiro pagamento em 05/11/2009. O prazo decadencial começou a correr a partir de 01/12/2009, primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação. Considerando que a ação foi proposta em 27/10/2019 e o autor solicitou a revisão em outubro de 2019, o direito não foi atingido pela decadência.

3. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, de modo habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a teor dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91.

4. Se for comprovado que o segurado exerceu uma atividade especial de acordo com os critérios estabelecidos pela legislação vigente na época do exercício, ele adquire o direito ao cômputo desse período como tempo de serviço especial.

5. Até 28/04/1995, é possível reconhecer a especialidade do trabalho com base na categoria profissional; a partir de 29/04/1995, é necessário demonstrar a exposição efetiva e contínua a agentes prejudiciais à saúde por meio de qualquer forma de prova; e a partir de 06/05/1997, a comprovação deve ser feita por meio de um formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.

6. A atividade de torneiro mecânico foi classificada como especial de acordo com o Parecer da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho (SSMT) no processo INPS nº 5.080.253/83.

7. A atividade é considerada especial quando há exposição a ruído acima de 80 dB até 05/03/1997, acima de 90 dB entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e acima de 85 dB a partir de 19/11/2003 (conforme decisão no REsp 1.398.260). A condição especial do trabalho persiste mesmo se o ruído for reduzido aos limites de tolerância pelo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI).

8. No presente caso, não há registro do uso de equipamento de proteção individual (EPI) capaz de neutralizar os efeitos prejudiciais dos óleos e graxas no organismo do autor. Portanto, os períodos requeridos de 11/01/1973 a 12/04/1976; 02/05/1976 a 25/02/1978; 01/04/1978 a 14/08/1990; 03/09/1990 até a data do requerimento administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição (28/07/2009) devem ser considerados como especiais. A soma desses períodos especiais totaliza 36 anos, 4 meses e 8 dias, o que atende aos requisitos para a concessão da aposentadoria especial. Além disso, uma vez que os requisitos foram cumpridos antes da publicação da Emenda Constitucional 103/2019 (12/11/19), o outor possui direito adquirido à aplicação das regras anteriores para a concessão do benefício pleiteado.

9. Extrai-se da documentação juntada aos autos (perfil profissiográfico previdenciário - PPP) e da perícia judicial, que a parte autora esteve exposta, de forma habitual e permanente, a níveis de ruído médio acima dos limites de tolerância, além da exposição a hidrocarbonetos que é considerado nocivo à saúde, devendo tais períodos ser considerados de labor especial.

10. Quanto ao início dos efeitos financeiros da revisão, o Superior Tribunal de Justiça entende que "os efeitos financeiros da revisão devem retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, independentemente da posterior comprovação do salário de contribuição" (2ª Turma, AgRg no AREsp 156926/SP, DJe 14/06/2012, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN; 2ª Turma, DJe 26/03/2014, AgRg no REsp 1423030/RS, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES; 2ª Turma, AgRg no REsp 1467290/SP, DJe 28/10/2014, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).

11. Correta a sentença apelada que, após minuciosa análise do conjunto probatório constante dos autos, e com base tanto na legislação quanto na jurisprudência desta Corte, julgou procedente o pedido inicial para converter a aposentadoria por tempo de contribuição para aposentadoria especial.

12. Atualização monetária e juros de mora de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai do julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810 da repercussão geral) e do REsp. 1.495.146-MG (Tema 905).

13. Os honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.

14. Apelação do INSS desprovida.

ACÓRDÃO

Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do relator.

Brasília - DF.

ASSINADO DIGITALMENTE

Desembargador Federal João Luiz de Sousa

Relator

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