Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5006589-95.2018.4.03.6102
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
13/05/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 14/05/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. BENEFÍCIO DE AMPARO
ASSISTENCIAL AO IDOSO. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA. INEXIGIBILIDADE DOS
VALORES RECEBIDOS POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. PRINCÍPIO DA
IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS.
1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos
valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da
irrepetibilidade dos alimentos.
2. Remessa oficial, havida como submetida e apelação desprovidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006589-95.2018.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: ELSA RUFINI MUNIZ
Advogados do(a) APELADO: LUCAS GARBELINI DE SOUZA - SP309843-A, RENATO COSTA
QUEIROZ - SP153584-A, SAMUEL MOREIRA REIS DE AZEVEDO SILVA - SP251859-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006589-95.2018.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELSA RUFINI MUNIZ
Advogados do(a) APELADO: LUCAS GARBELINI DE SOUZA - SP309843-A, RENATO COSTA
QUEIROZ - SP153584-A, SAMUEL MOREIRA REIS DE AZEVEDO SILVA - SP251859-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de remessa oficial, havida como submetida, e apelação interposta em ação declaratória
de inexigibilidade de débito, com pedido de tutela antecipada, em que se busca seja obstada a
devolução dos valores recebidos a título de benefício assistencial ao idoso - NB 88/570.920.282-
3, no período de 10/2009 a 10/2015, no montante de R$62.491,80.
Após o regular processamento do feito e a realização da audiência em que foi colhido o
depoimento da parte autora, o MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido para declarar
inexigível a cobrança, sob o fundamento de que a cassação do benefício assistencial ocorreu
exclusivamente em razão da superação da renda per capita e, mesmo havendo notícia do
cometimento de fraudes por José Donizete Costa e a afirmação da autora de que essa pessoa
teria participado da concessão do seu benefício, para a repetição dos valores seria imprescindível
a má-fé da beneficiária, que sequer foi alegada no ato da cessação. Em virtude da sucumbência,
condenou o réu em honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa.
Tutela antecipada deferida, para determinar ao INSS que se abstenha de realizar qualquer ato
tendente à exigibilidade ou à cobrança dos valores.
Inconformada, apela a autarquia, pleiteando a reforma da r. sentença, sustentando que são
exigíveis os valores cobrados pelo período em que o benefício foi pago indevidamente,
independentemente da boa-fé do beneficiário ou por erro administrativo. Prequestiona a matéria
debatida.
Com contrarrazões, subiram os autos.
O Ministério Público Federal ofertou parecer, opinando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006589-95.2018.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELSA RUFINI MUNIZ
Advogados do(a) APELADO: LUCAS GARBELINI DE SOUZA - SP309843-A, RENATO COSTA
QUEIROZ - SP153584-A, SAMUEL MOREIRA REIS DE AZEVEDO SILVA - SP251859-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A autora, com 72 anos de idade (nascida em 05/06/1941), era titular de benefícioassistencial, que
recebeu no período de 03/12/2007 a 01/11/2015.
A autora alega na inicial que foi vítima de uma quadrilha, pois em meados de 2007 foi procurada
por “Donizeti Costa”, conforme cartão de visita que anexa, tendo sido convencida que teria direito
a aposentar-se em razão de ser idosa, o qual, agindo como seu procurador, requereu em seu
favor o benefício assistencial perante o INSS, tendo sido deferido o seu pedido em03/12/2007.
Restou demonstrado nos autos que o nominado e outras pessoas agiam liderados por um
servidor da Agência de Ribeirão Preto/SP, e que foram condenados criminalmente pela prática de
fraudes para a concessão indevida de benefícios previdenciários junto ao INSS (ID 90039053 e
90039054).
Como posto pelo douto Juízo sentenciante, o conjunto probatório demonstra que a autora
recebeu o benefício de boa-fé, pois não consta que tenha prestado informação falsa acerca da
sua pessoa, como estado civil e identificação do seu cônjuge, e que essas informações estavam
disponíveis para o INSS, o qual tinha pleno acesso às informações quanto à aposentadoria do
seu cônjuge.
Ora, se a autarquia, com estas informações, ainda tivesse dúvidas sobre as declarações
prestadas pela autora quando do requerimento do benefícioassistencial, lhe restava indeferir ou
requerer mais provas. Contudo,assim não o fez e deferiu o benefício. A autarquia dispõe de toda
a informação constante do CNIS para averiguar o preenchimento dos requisitos, tendo se mantido
inerte.
Acresça-se que não se pode olvidar que cabe à autarquia previdenciária, a cada dois anos,
reavaliar as condições do beneficiário, a fim de verificar a manutenção dos requisitos necessários
e determinara manutenção ou nãodo benefícioassistencial e, no presente caso, a reavaliação
somente foi realizadaem 25/07/2014 (ID 90039069 – pág. 5).
Cabe salientar que no processo administrativo e nas razões do apelo não foi imputada má-fé à
beneficiária.
O e. Supremo Tribunal Federal ao analisar a questão da devolução de valores recebidos a título
de benefício, pacificou a questão no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores
recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade
dos alimentos.
Confira-se:
"MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE
CONSIDEROU ILEGAL APOSENTADORIA E DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DE VALORES.
ACUMULAÇÃO ILEGAL DE CARGOS DE PROFESSOR. AUSÊNCIA DE COMPATIBILIDADE
DE HORÁRIOS. UTILIZAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA OBTENÇÃO DE VANTAGENS
EM DUPLICIDADE (ARTS. 62 E 193 DA LEI N. 8.112/90). MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA.
DESNECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. INOCORRÊNCIA DE
DESRESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AO DIREITO ADQUIRIDO.
1. A compatibilidade de horários é requisito indispensável para o reconhecimento da licitude da
acumulação de cargos públicos. É ilegal a acumulação dos cargos quando ambos estão
submetidos ao regime de 40 horas semanais e um deles exige dedicação exclusiva.
2. O § 2ºdo art. 193 da Lei n. 8.112/1990 veda a utilização cumulativa do tempo de exercício de
função ou cargo comissionado para assegurar a incorporação de quintos nos proventos do
servidor (art. 62 da Lei n. 8.112/1990) e para viabilizar a percepção da gratificação de função em
sua aposentadoria (art. 193, caput, da Lei n. 8.112/1990). É inadmissível a incorporação de
vantagens sob o mesmo fundamento, ainda que em cargos públicos diversos.
3. O reconhecimento da ilegalidade da cumulação de vantagens não determina,
automaticamente, a restituição ao erário dos valores recebidos, salvo se comprovada a má-fé do
servidor, o que não foi demonstrado nos autos.
4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federaltem-se firmado no sentido de que, no exercício
da competência que lhe foi atribuída pelo art. 71, inc. III, da Constituição da República, o Tribunal
de Contas da União cumpre os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo
legal quando garante ao interessado - como se deu na espécie - os recursos inerentes à sua
defesa plena.
5. Ato administrativo complexo, a aposentadoria do servidor, somente se torna ato perfeito e
acabado após seu exame e registro pelo Tribunal de Contas da União.
6. Segurança parcialmente concedida.
(STF , MS 26085, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 07/04/2008, DJe-107
divulg 12-06-2008 public 13-06-2008 ement vol
-02323-02 PP-00269 RTJ VOL-00204-03 PP-01165)".
Ainda, no julgamento do RE 587.371, o Pleno do STF ressaltou, conforme excerto do voto do
Ministro Relator: "... 2) preservados, no entanto, os valores da incorporação já percebidos pelo
recorrido, em respeito ao princípio da boa-fé , (...)" ( STF , RE 587371, Relator: Min. Teori
Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 14/11/2013, acórdão eletrônico Repercussão Geral-Mérito,
DJe-122 divulg 23.06.2014, public 24.06.2014).
O Pleno do STF, ao julgar o RE 638115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores
recebidos de boa fé, conforme a ata de julgamento de 23.03.2015, abaixo transcrita:
"Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, apreciando o tema 395 da repercussão geral,
conheceu do recurso extraordinário, vencidos os Ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia
e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário,
vencidos os Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O Tribunal, por maioria, modulou
os efeitos da decisão para desobrigar a devolução dos valores recebidos deboa-fé pelos
servidores até esta data, nos termos do voto do relator, cessada a ultra-atividade das
incorporações concedidas indevidamente, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não modulava os
efeitos da decisão. Impedido o Ministro Roberto Barroso. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo
Lewandowski. Plenário, 19.03.2015.
(RE 638115, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 19/03/2015, processo
eletrônico Repercussão Geral-Mérito DJe-151 divulg 31-07-2015 public 03-08-2015)".
Cito, ainda, o seguinte precedente:
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO
COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO
DEBOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
DEVOLUÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício
previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está
sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 2. Decisão
judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo
segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº8.213/1991.
Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICODJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015);
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE
DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE
1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO
JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE
BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA
LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência desta
Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos
indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-
fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-
AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de valores
indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição. 3.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, MS 25921 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 01/12/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-060 DIVULG 01-04-2016 PUBLIC 04-04-2016).”
Destarte, é de se manter a r. sentença tal como posta.
Por derradeiro, quanto ao prequestionamento das matérias para fins recursais, não há afronta a
dispositivos legais e constitucionais, porquanto o recurso foi analisado em todos os seus
aspectos.
Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial, havida como submetida, e à apelação.
É o voto.
E M E N T A
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. BENEFÍCIO DE AMPARO
ASSISTENCIAL AO IDOSO. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA. INEXIGIBILIDADE DOS
VALORES RECEBIDOS POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. PRINCÍPIO DA
IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS.
1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos
valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da
irrepetibilidade dos alimentos.
2. Remessa oficial, havida como submetida e apelação desprovidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento a remessa oficial, havida como submetida, e a apelacao,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA