D.E. Publicado em 26/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o pedido para rescindir o julgado e, em novo julgamento, julgar procedente o pedido deduzido na ação originária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0023879-26.2014.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória proposta com fundamento no Art. 485, V e IX, do Código de Processo Civil/1973, com vista à desconstituição de sentença que julgou improcedente pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
A r. sentença transitou em julgado em 15.01.2013 (fls. 75). Esta ação foi ajuizada em 19.09.2014 (fls. 02).
Sustenta o autor, em síntese, que a decisão rescindenda equivocou-se ao concluir que havia prova nos autos indicativa de que recebeu auxílio acidente no ramo de atividade comerciário, inferência contrária a todos os demais elementos colacionados aos autos, que demonstrariam seu labor como trabalhador rural durante o período necessário à concessão do benefício. Aduz que logrou obter a correção das informações cadastrais junto ao INSS, mediante requerimento formulado junto à Gerência da Agência da Previdência Social em Tatuí/SP, que, em resposta, pronunciou-se no sentido de que "em atenção ao pedido de revisão datada de 04/02/14, informamos que o benefício nº 94/100.864.903/9, segurado Heitor Martinelli Sobrinho, foi revisado, tendo sido alterado o ramo de atividade de "comerciário" para "rural", conforme documento anexo" (grifos no original). Argumenta, ainda, que sempre exerceu seu ofício nas lides campestres, com exceção do curto período de 5 meses, de 01.09.1980 a 27.02.1981, em que tentou melhor sorte na zona urbana, após o qual retornou ao trabalho rural, onde permanece até os dias de hoje. Acrescenta, por fim, que o acidente por ele sofrido, que deu origem à percepção do benefício acidentário referido, ocorreu quando ele desenvolvia atividades rurícolas. Requer a desconstituição do julgado para que nova decisão seja proferida.
A inicial veio instruída com os documentos de fls. 12/97.
Foi determinado à parte autora que providenciasse a regularização de sua representação processual, bem como apresentasse declaração de hipossuficiência econômica (fls. 99). A diligência restou cumprida a fls. 100/103, e, em seguida, foram-lhe concedidos os benefícios da Justiça gratuita (fl. 105).
Em contestação, o réu argui, preliminarmente, a carência de ação, por ausência do interesse de agir, sob a alegação de que o autor pretende apenas o revolvimento do quadro fático-probatório produzido na lide originária. Ainda em sede de preliminar, sustenta a inépcia da inicial quanto à hipótese do Art. 485, V, do CPC/1973, por não terem sido mencionados os dispositivos legais tidos por violados. No mérito, argumenta que não houve violação a literal disposição de lei no julgado, uma vez que a decisão rescindenda, com base no conjunto probatório coligido aos autos da ação subjacente, entendeu que não ficou comprovado o exercício de trabalho rural, ainda que de forma descontínua, por período equivalente à carência necessária ao deferimento do benefício, em momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou ao ajuizamento da ação originária, conforme a exigência legal. Aduz que o julgado não somente se manifestou sobre todas as provas produzidas como fez uma lúcida análise de todo o conjunto probatório, concluindo pela improcedência do pedido, não havendo que se falar em erro de fato, dado que não houve admissão de fato inexistente ou inadmissão de fato existente. Acrescenta que a cópia do procedimento administrativo de concessão de benefício por acidente do trabalho deferido ao autor, bem como o pedido de revisão do benefício para alteração de sua categoria profissional, de comerciário para trabalhador rural, não se enquadram no conceito de documento novo, previsto no inciso VII, do Art. 485, CPC/1973, pois não existiam na época de prolação da decisão rescindenda (fls. 111/123). À peça de contestação, foram anexados os documentos de fls. 124/128.
Réplica da parte autora a fls. 131/134.
Por considerar desnecessária a produção de novas provas, determinei o encaminhamento dos autos ao Ministério Público Federal, para que oferecesse o seu parecer (fl. 136).
O MPF opinou pela procedência da ação rescisória para a rescisão do decisum anterior, proferindo-se novo julgamento que conceda o benefício requerido, por entender que a correção cadastral deferida ao autor implicou no reconhecimento de sua condição de rurícola, por parte do réu, de sorte que os documentos novos juntados aos autos corroboram as provas testemunhais produzidas no feito originário, mostrando-se suficientes à demonstração do direito invocado. Aduz que o documento com dados incorretos, utilizado pelo INSS na ação subjacente, induziu em equívoco o magistrado, resultando em erro de fato. Argumenta, ainda, que, uma vez que o autor reunia todas as condições exigidas ao benefício, houve violação aos dispositivos que tratam da matéria, especificados na Lei 8.213/91. Salienta, por fim, que a atividade urbana exercida pelo autor, no período de menos de seis meses, não descaracteriza a natureza eminentemente rural de sua atuação profissional, não comprometendo a concessão da aposentadoria requerida (fls. 137/143).
É o relatório.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0023879-26.2014.4.03.0000/SP
VOTO
Não há inépcia se a inicial preenche os requisitos legais e permite identificar a causa de pedir, bem como o provimento jurisdicional almejado.
Decorre logicamente dos fatos narrados nos autos a irresignação da parte autora quanto eventual inobservância das normas legais que disciplinam a concessão do benefício requerido.
A preliminar de carência de ação, por sua vez, confunde-se com o mérito, âmbito em que deve ser analisada.
Passo a examinar a questão de fundo.
A ação originária objetivava a concessão de aposentadoria por idade rural, sob a alegação de que, desde tenra idade, o autor exerceu atividades na lavoura.
A r. sentença proferida naqueles autos, ao julgar o caso, assim consignou:
Como se infere da leitura do excerto acima transcrito, a decisão rescindenda esposou o entendimento no sentido de que os documentos de fls. 27 e 30 dos autos originários, que indicariam que a parte autora exerceu atividade urbana como comerciário, infirmavam o alegado labor rural.
O Art. 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/73, preceitua que:
Incide em erro de fato o julgado que admite como existente fato inexistente ou considera inexistente fato efetivamente ocorrido, sem que tenha havido controvérsia nem pronunciamento judicial sobre o fato.
No caso concreto, a decisão rescindenda utilizou-se de dois extratos do Cadastro Nacional de Informações Sociais, relativos ao auxílio-acidente, por acidente do trabalho, usufruído pelo autor no período de 17.10.1995 a 23.11.1995 (fls. 37 e 39 destes autos), os quais foram considerados de modo isolado, sem o necessário cotejo com outras provas aduzidas. Não atentou, portanto, para a circunstância de que, naquele intervalo de tempo, o requerente encontrava-se empregado junto a estabelecimento rural, no cargo de "serviços gerais", conforme se observa da cópia da CTPS, a fls. 24, vínculo que, de acordo com o CNIS (fls. 36), perdurou de 02.05.1991 a 12/1998.
A propósito, o primeiro registro de emprego do autor, anotado em CTPS, no interregno de 01.03.1988 a 18.12.1989, constituiu-se de ocupação da mesma natureza (fls. 23).
Anote-se, ainda, que o extrato do sistema Dataprev, a fls. 38, que integrou os autos subjacentes, já apontava, de forma clara, que o auxílio doença por acidente do trabalho concedido ao autor, de 14.10.1994 a 16.10.1995, reportava ao ramo de atividade rural, sendo posteriormente transformado em auxílio-acidente, a partir de 17.10.1995.
Verifica-se, portanto, que o início de prova material anexados aos autos originários mostrava-se suficiente para demonstrar que a parte autora desenvolveu atividades agrícolas tanto no período anterior como no posterior ao benefício acidentário, e que não havia motivo para deduzir que tais atividades foram eminentemente urbanas, a ponto de infirmar as provas indiciárias de trabalho na lavoura.
Pela aplicação dos princípios iura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus, cabe ao magistrado dar aos fatos narrados o devido enquadramento jurídico. Assim, embora o autor não tenha invocado expressamente a hipótese do inciso VII, do Art. 485, do CPC/1973, é possível analisar a causa sob esse aspecto, uma vez que houve expressa menção aos novos elementos que integram estes autos com a finalidade assegurar o provimento jurisdicional pretendido.
Segundo o dispositivo supracitado, a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável.
É de se salientar que, em relação aos rurícolas, a jurisprudência flexibilizou a exigência de demonstração de que o autor da rescisória ignorava a existência dos documentos novos, ou de que deles não pode fazer uso no momento oportuno, considerando adequada a solução pro misero àqueles que, em situação bastante desigual à de outros trabalhadores, não possuem noções mínimas de seus direitos fundamentais, conforme numerosos precedentes nesse sentido, oriundos desta Corte e do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
A exemplo, confira-se: TRF-3, AR 2005.03.00.069251-3, 3ª Seção, Rel. Des. Fed. Newton de Lucca, julg. 28/04/2011, DJF3 CJ1 04/05/2011, p. 84; STJ, AR 2.197/MS, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Des. Conv. do TJ/RS), 3ª Seção, julg. 28/03/2012, DJe 13/04/2012.
O autor apresenta, a título de documentos novos, cópias do procedimento administrativo de concessão do benefício de auxílio-acidente por acidente do trabalho (fls. 83/90), e do requerimento formulado junto à Administração do INSS, em 04.02.2014, mediante o qual pleiteou a revisão de suas informações cadastrais, quanto ao ramo de atividade, que havia constado como "comerciário", quando, em verdade, deveria ser anotado como "rural", pedido que foi deferido pela autarquia previdenciária, em 02.04.2014 (fls. 91/95).
Incumbe analisar a eficácia desses novos elementos frente às provas já colacionadas aos autos originários e ao pronunciamento judicial exarado naquela demanda.
No que concerne aos documentos que instruíram a ação subjacente, destacam-se os seguintes: a) certidão de casamento que registra o assento do matrimônio do autor, em 21.10.1972, documento em que é qualificado como profissionalmente como agricultor (fls. 19); b) certificado de dispensa de incorporação, com data de 09.05.1969, em que o autor consta qualificado como lavrador (fls. 20); c) cópias da CTPS, com registros de vínculos empregatícios nos períodos de 01.03.1988 a 18.12.1989 e de 02.05.1991 a 30.12.1997, no cargo de "serviços gerais", junto a estabelecimentos rurais (fls. 21/24).
Além destes, juntou o réu extratos do sistema CNIS/Dataprev (fls. 35/39), dos quais apenas um, o de fls. 39, com base no qual a decisão rescindenda extraiu sua conclusão, trazia a anotação do ramo de atividade comerciário, restando incompatível com as demais provas colacionadas.
Saliente-se que os documentos ora colacionados apenas tornam mais evidente a inexatidão da informação veiculada pela autarquia previdenciária, a qual acabou por induzir em erro a magistrada sentenciante, que, baseada em fato inexistente (exercício de atividades urbanas como comerciário), concluiu que o autor não preenchia os requisitos necessários à concessão do benefício.
Válido acrescentar, nesse sentido, que a declaração prestada pelo empregador do autor, a fls. 87, que serviu à instrução da comunicação de acidente do trabalho, noticia que, na época do acidente, o obreiro exercia o cargo de serviços gerais, em funções tais como tirar leite, fazer cerca, roçar pasto, cuidar do gado, desde 02 de maio de 1991. Ademais, na descrição do acidente, foi informado que o autor "estava carregando madeira em cima do caminhão e quando ele puxou o palanque escorregou, caiu e quebrou a bacia e o fêmur" (fls. 86).
Digno de nota, ainda, o parecer da perícia médica realizada pelo Posto do Seguro Social de Apucarana, em 17.10.1997, que qualificou o requerente como lavrador (fls. 84).
Sem embargo destas considerações adicionais, reporto-me ao erro de fato já dantes configurado, apto a viabilizar a rescisão do julgado nos termos do Art. 485, IX, do CPC/73, sem necessidade de esgotar a análise da ação sob os demais fundamentos declinados na inicial.
Desconstituído o julgado, ingresso no juízo rescisório.
O benefício de aposentadoria por idade está previsto no Art. 48, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
A aposentadoria por idade, no caso de trabalhadores rurais, referidos na alínea a, do inciso I, na alínea g, do inciso V e nos incisos VI e VII, do Art. 11, da Lei 8.213/91, portanto, é devida ao segurado que, cumprido o número de meses exigidos no Art. 143, da Lei 8.213/91, completar 60 anos de idade para homens e 55 para mulheres (Art. 48, § 1º).
A regra de transição contida no Art. 143, retrocitado, tem a seguinte redação:
O período de 15 anos a que se refere o dispositivo exauriu-se, assim como as sucessivas prorrogações, em 31.12.2010, como disposto no Art. 2º, da Lei nº 11.718/08:
Assim, a partir de 01.01.2011 há necessidade de recolhimento de contribuições, na forma estabelecida no Art. 3º, da Lei nº 11.718/08.
Entretanto, importante frisar que as contribuições previdenciárias dos trabalhadores rurais diaristas, denominados de volantes ou boia-fria, são de responsabilidade do empregador, cabendo à Secretaria da Receita Previdenciária a sua arrecadação e fiscalização.
Nesse sentido a orientação desta Corte Regional:
Da leitura do dispositivo legal, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural compreendem a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo.
Tecidas estas observações, verifico que os documentos apresentados pela parte autora nos autos da ação originária constituem razoável início de prova de labor rural , e abrangem, ao menos, o período de 05/1969 (certificado de dispensa de incorporação - fls. 20) até 12/1997 (último vínculo empregatício no ramo de atividade rural registrado em CTPS - fls. 24).
A prova oral produzida em Juízo corrobora a prova material apresentada, eis que as testemunhas inquiridas confirmaram que o autor trabalhou na lavoura para vários empregadores e que continua a trabalhar, ainda que com as limitações decorrentes do acidente sofrido, as quais obrigam à diminuição de sua jornada diária (fls. 51/53).
A prova testemunhal ampliou a eficácia probatória referente ao período exigido à concessão do benefício postulado.
Nesse sentido:
A jurisprudência já consignou ser desnecessária a produção de prova material para a totalidade do período reclamado, ou no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício:
Satisfeitos os requisitos, é de se reconhecer o direito do autor à percepção do benefício pleiteado, segundo orientação do Superior Tribunal de Justiça:
Destarte, incumbirá ao réu conceder ao autor o benefício de aposentadoria por idade, a partir da data da citação no processo originário (14.10.2011 - fls. 28), e pagar as prestações em atraso, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme entendimento consolidado na c. 3ª Seção desta Corte (AL em EI nº 0001940-31.2002.4.03.610). A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso desde a data de citação na ação originária até a data da presente decisão, de acordo com entendimento firmado por esta Egrégia Terceira Seção,
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, julgo procedente o pedido para rescindir o julgado e, em novo julgamento, procedente o pedido deduzido na ação originária.
É o voto.
Desembargador Federal
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