Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5007311-39.2017.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
28/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI.
PRETENSÃO A REEXAME DE PROVAS. PRINCÍPIO JURA NOVIT CURIA. APLICAÇÃO.
CAUSA DE PEDIR QUE DESCREVE A EXISTÊNCIA DE ERRO DE FATO. DECISÃO
RESCINDENDA QUE DEIXOU DE EXAMINAR DOCUMENTOS DA AÇÃO ORIGINÁRIA.
EQUÍVOCO QUANTO AOS FATOS DA CAUSA. “LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO”. ERRO
DE FATO CONFIGURADO. JUÍZO RESCISÓRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO ORIGINÁRIO.
I- Improcede a alegação de violação a literal disposição de lei, uma vez que a autora objetiva a
desconstituição do julgado por divergir da interpretação dada pela decisão aos elementos de
prova reunidos no processo de origem.
II- Tendo a parte autora afirmado, na petição inicial, que o V. Acórdão rescindendo “reconheceu a
perda da qualidade de segurada da requerente, quando se provou no processo a ausência de
interrupção do período contributivo, sendo indelével apontar que entre 2007 e 2011, conforme
atestados de saúde ocupacional fornecidos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de
Presidente Venceslau, bem como CTPS e demais documentos, verifica-se que não houve
interrupção do contrato de trabalho”, impõe-se o exame da alegação de erro de fato, descrito na
causa de pedir acima exposta. Incidência do princípio jura novit curia.
III- No que tange ao art. 485, inc. IX, do CPC/73, depreende-se que a rescisão fundada em erro
de fato é cabível nos casos em que o julgador -- desatento para os elementos de prova existentes
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
nos autos -- forme uma convicção equívoca sobre os fatos ocorridos, supondo, incorretamente,
existente ou inexistente um determinado fato contra a prova dos autos.
IV- O V. Acórdão rescindendo manteve a improcedência da ação originária por entender que
houve perda da qualidade de segurado, sem examinar, porém, o “Atestado de Saúde
Ocupacional”, elaborado na data de 20/09/11 por médico do trabalho do “Instituto de Medicina do
Trabalho da Alta Sorocabana”, nem a “Declaração” firmada pela “Irmandade da Santa Casa de
Presidente Venceslau” na data de 20/09/11, documentos acostados nos autos da ação originária.
V - Referidos elementos de prova demonstram que a demandante permaneceu empregada na
Irmandade da Santa Casa de Presidente Venceslau, ao menos até 20/09/2011.
VI - O V. Acórdão rescindendo, por deixar de examinar os documentos acima destacados,
declarou como verdadeiro fato inexistente, afirmando que os “Extratos de Informações do
‘Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS’, juntados aos autos às fls. 91-93, informam
que o vínculo empregatício da autora, iniciado em 10.12.1986, foi rescindido em 12.2005” (grifei).
VII - O presente caso trata da tormentosa hipótese descrita como “limbo jurídico previdenciário”
ou “emparedamento”. O INSS, após realizar exame médico, atesta que o segurado se encontra
apto para o exercício de suas atividades laborais, determinando seu retorno ao trabalho. O
empregador, porém, ao submeter o empregado a novo exame médico, verifica que este continua
incapacitado para o trabalho, decidindo mantê-lo afastado de suas funções até que o mesmo se
recupere.
VIII - Daí porque, nestes casos, afirma-se que o segurado se encontra em um “limbo
previdenciário”: enquanto não é solucionada a discordância entre o INSS e a empresa
empregadora, relativamente à existência ou não da incapacidade para o trabalho, o empregado
não recebe nem o seu salário, nem o auxílio-doença.
IX - Considerando-se que não houve demissão ou outra forma de extinção do vínculo de trabalho
da autora, a mesma continuou a ser empregada da empresa “Irmandade da Santa Casa de
Presidente Venceslau”, mantendo, portanto, a sua condição de segurada obrigatória da
Previdência Social, na forma do art. 11, inc. I, “a” da Lei nº 8.213/91.
X- Cabe observar que a hipótese descrita como “limbo jurídico previdenciário” não provoca nem a
suspensão nem a interrupção do contrato de trabalho, de modo que este continua a produzir
plenos efeitos, tanto em seara trabalhista quanto previdenciária. Precedentes desta E. Corte e do
C. Tribunal Superior do Trabalho.
XI- Na situação descrita como “limbo jurídico previdenciário”, há duas possibilidades: a) ou o
INSS recusou indevidamente o auxílio-doença, caso em que o segurado faz jus ao benefício,
mantendo a sua qualidade de segurado por força do art. 15, inc. I, da Lei nº 8.213/91; b) ou a
empresa, diante da alta do empregado, recusou-se injustamente a reintegrá-lo a seu posto de
trabalho, caso em que o contrato de trabalho permanece vigente, persistindo a qualidade de
segurado na forma do art. 11, inc. I, “a” da Lei nº 8.213/91.
XII- Em ambas as hipóteses, portanto, há a manutenção da qualidade de segurado,
independentemente de como o impasse entre o INSS e a empresa empregadora venha a ser
resolvido, seja em âmbito administrativo ou judicial.
XIII- Procedência da rescisória. Procedência do pedido originário.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5007311-39.2017.4.03.0000
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
AUTOR: MARLI FELISMINA BORBA DE SANTANA
Advogado do(a) AUTOR: ROBERLEI CANDIDO DE ARAUJO - SP214880-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5007311-39.2017.4.03.0000
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
AUTOR: MARLI FELISMINA BORBA DE SANTANA
Advogado do(a) AUTOR: ROBERLEI CANDIDO DE ARAUJO - SP214880-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Senhor Desembargador Federal Newton De Lucca (Relator): Trata-se de ação rescisória
proposta por Marli Felismina Borba de Santana, em 25/05/2017, em face do INSS - Instituto
Nacional do Seguro Social, com fundamento no art. 966, inc. V, do CPC, visando desconstituir o
V. Acórdão proferido nos autos do processo nº 0008639-96.2011.4.03.6112, que negou
provimento ao agravo da parte autora, mantendo a improcedência dos pedidos de auxílio-doença
ou aposentadoria por invalidez.
Afirma que o V. Acórdão rescindendo “reconheceu a perda da qualidade de segurada da
requerente, quando se provou no processo a ausência de interrupção do período contributivo,
sendo indelével apontar que entre 2007 e 2011, conforme atestados de saúde ocupacional
fornecidos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Presidente Venceslau, bem como
CTPS e demais documentos, verifica-se que não houve interrupção do contrato de trabalho.”
(doc. nº 649.638, p. 1).
Sustenta que se encontra caracterizada a hipótese de violação à norma, uma vez que, em se
tratando de segurada empregada, compete ao empregador recolher as contribuições devidas à
Seguridade, na forma do art. 30, inc. I, “a”, da Lei nº 8.212/91.
Aduz que os documentos apresentados, entre os quais a cópia da CTPS, fazem prova do tempo
de contribuição, conforme estabelece o art. 62, do Decreto nº 3.048/99 e o Enunciado nº 75, da
TNU. Ainda, de acordo com a jurisprudência desta E. Corte, as anotações em CTPS constituem
meio idôneo para se provar tempo de serviço.
Requer a rescisão do V. Acórdão, julgando-se procedente o pedido originário, bem como a
concessão de tutela provisória.
A petição inicial veio acompanhada de documentos (docs. nº 649.712 a 649.997). Entre estes,
juntou documentos relacionados a vínculo de emprego com a Irmandade da Santa Casa de
Presidente Venceslau (docs. nº 649.720 a 649.741).
Determinada a emenda da petição inicial para que fossem: a) regularizados o instrumento de
mandato e a declaração de hipossuficiência; b) esclarecida a finalidade dos docs. 649.720 a
649.741 e, c) juntadas as cópias do processo de Origem (doc. nº 759.418).
A autora, por meio das petições apresentadas em 21/07/2017 (doc. nº 869.183), em 05/10/2017
(doc. nº 1.191.996) e em 28/11/2017 (doc. nº 1.429.030) cumpriu as determinações,
esclarecendo, ainda, que os docs. nº 649.720 a 649.741 foram juntados com a finalidade de
comprovar que ela ainda mantém vínculo de emprego com a Santa Casa de Presidente
Venceslau.
Recebidas as petições como emenda à inicial, concedidos os benefícios da assistência judiciária
gratuita (doc. nº 1.642.147) e indeferido o pedido de tutela provisória.
Citada, a autarquia apresentou contestação (doc. nº 1.740.237), alegando, preliminarmente, a
ausência de interesse de agir, uma vez que a autora pretende apenas a rediscussão do quadro
fático-probatório. No mérito, aduz não haver violação à norma, tendo em vista ter ocorrido a perda
da qualidade de segurada da autora, uma vez que o último recolhimento que consta em seu favor
ocorreu em 12/2005, sendo que, após, a mesma recebeu auxílio-doença até 01/12/2007. Afirma
que, diante do laudo pericial, não é possível retroagir a incapacidade até o ano de 2008.
A autora manifestou-se sobre a contestação (doc. nº 2.398.806) e apresentou razões finais (doc.
nº 3.146.208).
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5007311-39.2017.4.03.0000
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
AUTOR: MARLI FELISMINA BORBA DE SANTANA
Advogado do(a) AUTOR: ROBERLEI CANDIDO DE ARAUJO - SP214880-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Senhor Desembargador Federal Newton De Lucca (Relator): A preliminar trazida em
contestação confunde-se com o mérito e com ele será analisada.
Outrossim, destaco que a presente demanda, ajuizada em 25/05/2017, visa desconstituir decisão
judicial transitada em julgado em 25/05/2015 (doc. nº 649.722, p. 1). Dessa forma, as alterações
na disciplina da ação rescisória trazidas no CPC de 2015 -- cuja vigência se deu a partir de
18/03/2016 -- não se aplicam ao caso. Nesse sentido, esclarece o Professor Leonardo Carneiro
da Cunha:
"O CPC-2015 implementou novas regras para a ação rescisória, fazendo algumas alterações nas
hipóteses de rescindibilidade e na contagem de prazo para seu ajuizamento.
Tais novidades somente se aplicam às ações rescisórias que forem ajuizadas para combater
decisões transitadas em julgado já sob a vigência do novo Código. As decisões transitadas em
julgado durante a vigência do Código revogado podem ser questionadas por ação rescisória
fundada nas hipóteses e nos prazos regulados no CPC-1973."
(in Direito intertemporal e o novo código de processo civil. Forense, 2016, Rio de Janeiro, p. 159,
grifos meus)
Passo ao exame.
A autora, na petição inicial, fundamenta seu pedido na hipótese de rescisão então prevista no art.
485, inc. V (violação a literal disposição de lei), do CPC/73.
Ao manter a improcedência do pedido originário, o V. Acórdão rescindendo adotou os seguintes
fundamentos (doc. nº 649.992, p. 22/25):
“Trata-se de agravo interposto contra decisão que deu provimento à apelação do INSS e julgou
improcedente o pedido, com fulcro no artigo 557, §1º-A, do Código de Processo Civil, em
demanda objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez.
Às fl. 144, assim decidi:
‘(...)
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos artigos 42 e
seguintes da Lei n° 8.213/91 e consistem na qualidade de segurado, incapacidade total e
permanente para o trabalho e cumprimento da carência, quando exigida. O auxílio-doença, por
sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 do mesmo Diploma Legal, sendo
concedido nos casos de incapacidade temporária.
No tocante ao requisito da qualidade de segurada, a autora acostou CTPS que registra vínculo de
trabalho iniciado em 10.12.1986, sem data de término (fls. 29-30).
Extratos de informações do ‘Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS’, juntados aos
autos às fls. 91-93, informam que o vínculo empregatício da autora, iniciado em 10.12.1986, foi
rescindido em 12.2005, e que ela recebeu o benefício de auxílio-doença nos períodos de
02.12.2005 a 04.03.2007 e de 05.03.2007 a 1º.12.2007, o qual foi restabelecido por força da
antecipação dos efeitos da tutela a partir de 1º.03.2012.
Ajuizou a ação em 08.11.2011.
Laudo médico pericial, realizado em 13.02.2012, atestou a incapacidade total e permanente da
autora para o exercício de atividades laborativas. Esclareceu, o Sr. Perito, que a autora é
portadora de ‘Tendinite Crônica de Ombros Direito e esquerdo, com ruptura parcial de Supra
espinhoso em Ombro esquerdo, Síndrome do Túnel do Carpo Leve em Punho Esquerdo, Artrose
avançada de Coluna Cervical e Lombar e Protrusão Discal em níveis C4-C5, C5-C6, L4-L5 e L5-
S1’. Não fixou termo inicial da incapacidade (fls. 56-67).
Dessa forma, conquanto comprovada a incapacidade para o trabalho, o conjunto probatório é
insuficiente para retroagi-la ao ano de 2008, quando perdeu qualidade de segurado.
Forçoso, portanto, o reconhecimento da perda da qualidade de segurada.
(...)’
No tocante à qualidade de segurado, é assente, no Superior Tribunal de Justiça, a possibilidade
de considerá-la mantida quando comprovado que as contribuições deixaram de ser recolhidas em
virtude da doença incapacitante. Entende-se, no caso, que circunstância alheia à vontade do
segurado - qual seja, a incapacidade para o trabalho, temporária ou definitiva - levaram-no a
deixar de contribuir.
(...)
Constata-se, no entanto, que os julgados ressaltam a indispensabilidade de prova de que a
moléstia de que o segurado é portador era impeditiva do trabalho na época e, como registrado na
decisão agravada, tal circunstância não se verificou.’
(...)
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo.”
Entendo que não se encontra caracterizada a hipótese de violação a literal disposição de lei. No
presente caso, a análise dos dispositivos normativos invocados pela autora – art. 30, inc. I, “a” da
Lei nº 8.212/91 e art. 62 do Decreto nº 3.048/99 – demandaria o reexame dos elementos de prova
colhidos no processo originário, situação que é incompatível com a hipótese de rescisão prevista
no art. 485, inc. V, do CPC/73.
A respeito, trago à colação o seguinte precedente do C. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO
À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA RESCISÓRIA COM
APOIO NO ART. 485, INCISO V, DO CPC/73 PARA SE REANALISAREM OS FATOS E
PROVAS PRODUZIDAS NO PROCESSO DE ORIGEM. ENTENDIMENTO DOMINANTE NESTA
CORTE SUPERIOR. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. AUSÊNCIA DE ESPECÍFICA
IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AGRAVO INTERNO
DESPROVIDO."
(AgInt no AREsp nº 987.673/MA, Terceira Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, v.u., j.
07/03/17, DJe 16/03/17, grifos meus)
Não obstante, impõe-se a aplicação do princípio jura novit curia ao presente caso.
A autora, na petição inicial, afirma expressamente que o V. Acórdão rescindendo “reconheceu a
perda da qualidade de segurada da requerente, quando se provou no processo a ausência de
interrupção do período contributivo, sendo indelével apontar que entre 2007 e 2011, conforme
atestados de saúde ocupacional fornecidos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de
Presidente Venceslau, bem como CTPS e demais documentos, verifica-se que não houve
interrupção do contrato de trabalho.” (doc. nº 649.638, p. 1).
A alegação amolda-se com perfeição à hipótese de rescisão prevista no art. 485, inc. IX, do
CPC/73. Como se observa, a demandante afirma claramente na exordial que o V. Acórdão
apenas declarou ter havido a “perda da qualidade de segurado” porque não foram examinados,
no julgamento originário, elementos de prova existentes no processo primitivo, comprobatórios de
que manteve vínculo de emprego até o ano de 2011.
Portanto, mesmo sem haver invocação expressa ao art. 485, inc. X, do CPC/73, é inquestionável
que a causa de pedir exposta pela autora na petição inicial veicula autêntica alegação de erro de
fato. Sobre o tema, já decidiu esta E. Terceira Seção:
"AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO E DOCUMENTO NOVO. AFASTAMENTO. VIOLAÇÃO A
LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ACOLHIMENTO DE OFÍCIO. FATOS NARRADOS NA INICIAL
QUE POSSIBILITAM O RECONHECIMENTO DE JULGAMENTO ULTRA PETITA PELO
TRIBUNAL. PRINCÍPIOS 'JURA NOVIT CURIA' E 'DA MIHI FACTO DABO TIBI JUS'. AÇÃO
RESCISÓRIA PROCEDENTE. PEDIDO ORIGINÁRIO PROCEDENTE
1. Considerando que os documentos de fls. 08/10 sequer ainda existiam quando do ajuizamento
da ação primitiva e da prolação da r. sentença 'a quo', improcede esta ação rescisória com
fundamento no artigo 485, inciso VII (documento novo), do CPC/1973.
2. Como os documentos trazidos como novos não fizeram parte do contexto probatório do feito
originário, não há falar-se em erro de fato pelo julgado rescindendo, porquanto evidentemente
não poderiam ser sopesados pelo eminente Relator da apelação, já que sequer estavam juntados
aos autos subjacentes, estando ausente, assim, o requisito legal tipificado no artigo 485, inciso IX,
do CPC/1973 - 'resultante de atos ou de documentos da causa'.
3. A r. decisão rescindenda incidiu em clara 'reformatio in pejus', e julgamento 'ultra petita', no que
resulta em sua manifesta nulidade, porquanto realizado em violação a literal disposição de lei,
especificamente, ao artigo 515, ‘caput’, do CPC/1973, que é expresso ao dispor que 'A apelação
devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada', isto é, somente a questão
impugnada pelo INSS - data do início do benefício - poderia ter sido conhecida e julgada por este
Tribunal.
4. A r. sentença de primeiro grau não foi submetida à remessa necessária, sendo, inclusive,
expressa nesse sentido (fl. 85), de maneira que, também por essa razão, a matéria em questão
não foi devolvida a este Tribunal, e, portanto, não poderia ter sido analisada de ofício.
5. Outrossim, conclui-se que a r. decisão rescindenda deve ser rescindida com fundamento no
artigo 485, inciso V, do CPC/1973, por violação a literal disposição dos artigos 460 e 515, 'caput',
do CPC/1973.
6. Observada a coisa julgada alcançada no feito originário quanto ao deferimento do benefício -
que em relação ao ponto trata-se de coisa julgada material e soberana, não passível, pois, de
rescisão, uma vez que há muito já decorrido o prazo decadencial para o INSS -, bem como a sua
desconstituição apenas em relação aos pontos citados em juízo rescisório, tem-se que a data de
início do benefício - DIB - deve ser fixada na data do indeferimento do benefício na esfera
administrativa, qual seja, em 22.07.2006.
7. Ação rescisória procedente. Pedido originário procedente."
(AR nº 2014.03.00.027126-0, Terceira Seção, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 08/03/2018, DJe
21/03/2018, grifos meus)
Feitas estas considerações, passo à análise.
No tocante ao art. 485, inc. IX, do CPC/73, assinalo que a rescisão fundada em erro de fato é
cabível nos casos em que o julgador -- desatento para os elementos de prova existentes nos
autos -- forme uma convicção equívoca sobre os fatos ocorridos, supondo, incorretamente,
existente ou inexistente um determinado fato contra a prova dos autos. Impossível, porém, a
desconstituição do julgado nos casos em que tenha existido "pronunciamento judicial sobre o
fato", sendo, portanto, inviável a utilização da ação rescisória para reexame de prova, ou nos
casos em que tenha existido "má apreciação" do conjunto probatório.
No presente caso, encontra-se caracterizada a hipótese de erro de fato.
O V. Acórdão rescindendo manteve a improcedência do pedido originário por perda da qualidade
de segurado. Declarou que a autora recebeu auxílio-doença até dez/2007 e o laudo pericial foi
capaz apenas de comprovar a existência da invalidez a partir de 13/02/2012 (data de elaboração
do laudo).
É possível constatar, porém, que o V. Aresto foi prolatado sem que houvesse o exame dos
documentos de fls. 35/36 dos autos originários (doc. nº 649.967, p. 11/12).
A fls. 36 do processo originário (doc. nº 649.967, p. 12), a autora juntou documento comprovando
que, a pedido da empregadora “Irmandade da Santa Casa de Presidente Venceslau” foi
elaborado, em 20/09/2011, “Atestado de Saúde Ocupacional” emitido por médico do trabalho do
“Instituto de Medicina do Trabalho da Alta Sorocabana”, para fins de cumprimento do “disposto no
art. 168 da CLT e NR7, subitem SSST do Ministério do Trabalho” (exame para fins de retorno ao
trabalho).
No documento, o médico relata que a autora (Marli Felismina Borba de Santana), que havia sido
designada para a função de “copeira”, era portadora de problemas de saúde que obrigavam seu
retorno ao INSS, bem como sua submissão a tratamento cirúrgico.
O exame em questão encontra-se acompanhado da “Declaração” de fls. 35 dos autos de Origem
(doc. nº 649.967, p. 11), firmada pela própria “Irmandade da Santa Casa de Presidente
Venceslau” na data de 20/09/2011, informando que a autora Marli Felismina Borba de Santana é
funcionária daquela empresa desde 10/12/86, tendo permanecido no exercício de suas atividades
até 17/11/2005 – ou seja, laborou fisicamente até seu afastamento no ano de 2005 (doc. nº
649.967, p. 11).
Observa-se, desta forma, que o V. Acórdão impugnado, por deixar de examinar os documentos
acima destacados, declarou como verdadeiro fato inexistente, consignando que os “Extratos de
informações do ‘Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS’, juntados aos autos às fls. 91-
93, informam que o vínculo empregatício da autora, iniciado em 10.12.1986, foi rescindido em
12.2005” (grifei).
No entanto, o "Atestado de Saúde Ocupacional” e a “Declaração” da “Irmandade da Santa Casa
de Presidente Venceslau” juntados pela autora aos autos de Origem provam exatamente o
oposto: não houve o encerramento do vínculo de emprego em dez/2005. Na realidade, a
demandante permaneceu empregada na Irmandade da Santa Casa de Presidente Venceslau e,
portanto, era segurada obrigatória da Previdência Social até, ao menos, a data de 20/09/2011.
Observa-se que a situação da autora corresponde à tormentosa hipótese descrita como “limbo
jurídico previdenciário” ou “emparedamento”. O INSS, após realizar exame médico, atesta que o
segurado se encontra apto para o exercício de suas atividades laborais, determinando seu
retorno ao posto de trabalho. A empresa empregadora, por sua vez, ao submeter o empregado a
novo exame médico, verifica que este continua incapacitado para o trabalho, decidindo, por este
motivo, mantê-lo afastado de suas funções até que o mesmo se recupere.
Daí porque, nestes casos, afirma-se que o segurado se encontra em um “limbo previdenciário”:
enquanto não se soluciona a discordância entre o INSS e o empregador relativamente à
existência ou não da incapacidade para o trabalho, o empregado não recebe nem o seu salário,
nem o auxílio-doença.
No V. Aresto rescindendo, imaginou-se que o vínculo de emprego da autora havia se encerrado
em dez/2005, pois a empresa empregadora não efetuou o recolhimento de contribuições em
período posterior.
Tal, porém, não ocorreu. A empresa empregadora deixou de recolher novas contribuições apenas
porque não promoveu o pagamento de salários durante o período em que manteve a autora
afastada de suas funções.
Perceptível, portanto, não ter havido a perda da qualidade de segurado. Não tendo ocorrido
demissão ou outra forma de extinção do vínculo de trabalho, a autora continuou a ser empregada
da “Irmandade da Santa Casa de Presidente Venceslau” mantendo, portanto, a sua condição de
segurada obrigatória da Previdência Social, na forma do art. 11, inc. I, “a”, da Lei nº 8.213/91.
Cabe observar que a hipótese descrita como “limbo jurídico previdenciário” não provoca a
suspensão, nem tampouco a interrupção do contrato de trabalho, de modo que este continua a
produzir plenos efeitos, tanto na seara trabalhista, quanto na previdenciária. Neste sentido, já
decidiu esta E. Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR A 1000 SALÁRIOS MÍNIMOS.
REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO.
REQUISITO PREENCHIDO. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. A sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -,
razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a
sentença seja ilíquida, é certo que o valor da condenação não supera 1.000 salários mínimos,
sendo incabível, portanto, a remessa oficial.
2. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos
dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência.
3. Da análise da cópia da Carteira de Trabalho juntada aos autos, extrai-se que à época do óbito,
ocorrido em 17/10/2016, o falecido mantinha vínculo empregatício, de modo que possuía a
condição de segurado.
4. Não obstante a autarquia alegue que após a cessação do benefício de auxílio-doença por
acidente de trabalho em 31/12/2009 o falecido não voltou a trabalhar, perdendo a qualidade de
segurado, verifica-se que no caso ocorreu a situação conhecida como ‘limbo previdenciário’, em
que o INSS reconhece a capacidade do requerente, mas, ao retornar ao trabalho, a empresa o
considera inapto para o exercício da atividade laborativa.
5. Ressalte-se, por oportuno, que embora o falecido não estivesse efetivamente trabalhando no
referido período, estava à disposição da empregadora, devendo-se destacar, ainda, que após a
cessação do aludido benefício, o contrato de trabalhou voltou a vigorar normalmente, de modo
que se manteve a condição de segurado durante todo esse lapso temporal.
6. Preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao
recebimento da pensão por morte.
(...)
8. Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os
consectários legais.”
(AC nº 5254581-80.2019.4.03.9999, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Nelson Porfirio, v.u., j.
15/05/2019, DJe 17/05/2019, grifos meus)
Destaco que a orientação ora descrita não diverge daquela adotada na jurisprudência do C.
Tribunal Superior do Trabalho, do qual extraio os seguintes precedentes:
“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RETORNO DO EMPREGADO APÓS ALTA
PREVIDENCIÁRIA. TRABALHADOR CONSIDERADO INAPTO PELA EMPRESA. LIMBO
JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO.
O Regional concluiu que a ausência de pagamento de salários à autora, no período de ‘limbo
previdenciário’, não configura hipótese de dano moral. À luz do que dispõe o art. 187 do Código
Civil, verifica-se que a conduta da empresa, ao impedir o retorno do empregado à atividade
laboral e, consequentemente, inviabilizar o percebimento da contraprestação pecuniária, mesmo
após a alta previdenciária, se mostra ilícita. Ressalte-se, ainda, que, segundo os termos do art.
476 da CLT, com o término do benefício previdenciário, o contrato de trabalho voltou a gerar
todos os efeitos, permanecendo com o empregado o dever de prestar serviços e, com o
empregador, o de pagar salários. Assim, impedido de retornar ao emprego, e já cessado o
pagamento do benefício previdenciário, o empregado permanece no ‘limbo jurídico previdenciário
trabalhista’, como denominado pela doutrina. Com efeito, a jurisprudência desta Corte vem se
consolidando no sentido de que, cessado o benefício previdenciário, há conduta ilícita do
empregador em não permitir o retorno do empregado ao trabalho. Precedentes. Assim, faz jus a
reclamante ao pagamento de danos morais. Recurso de revista conhecido e provido.”
(RR nº 2400-14.2015.5.02.0023, Quinta Turma, Rel. Min. Breno Medeiros, v.u., j. 30/10/19, DEJT
08/11/19, grifei)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEI 13.467/2017. LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO
CARACTERIZADO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR PELO PAGAMENTO DOS
SALÁRIOS APÓS A ALTA PREVIDENCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO,
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA RECLAMANTE E OFENSA AO PRINCÍPIO DA
SEGURANÇA JURÍDICA NÃO CONFIGURADOS. TRANSCENDÊNCIA.
Não há transcendência da causa relativa à decisão regional que, assinalando a alta previdenciária
e a incapacidade de retornar ao serviço atestada pelos exames clínicos da autora e do próprio
corpo médico da empresa, estando o contrato de trabalho em vigor sem que a reclamante esteja
trabalhando e percebendo salários, reconhece o limbo jurídico previdenciário e conclui, com fulcro
no artigo 476 da CLT, que é responsabilidade do empregador o pagamento de salários durante o
período posterior ao término do benefício previdenciário, não afastando tal responsabilidade a
ausência de conduta patronal que impeça o retorno do trabalhador ou a inexistência de função
adequada na empresa que possibilite a readaptação. Transcendência do recurso de revista não
reconhecida e agravo de instrumento desprovido.”
(AIRR nº 10827-85.2017.5.15.0146, Sexta Turma, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, v.u., j.
06/11/19, DEJT 08/11/19, grifei)
Note-se que a hipótese ora descrita não se confunde com aquela prevista no art. 15, inc. II, da Lei
nº 8.213/91 – com a redação então vigente –, que prescrevia a manutenção da qualidade de
segurado por 12 (doze) meses em relação aquele que “deixar de exercer atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração”.
Ora, nos termos do art. 476, da CLT: “Em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o
empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício.”
Notório, portanto, que é inaplicável o art. 476, da CLT, aos casos em que o empregado não se
encontra no gozo de auxílio-doença –, uma vez que este foi negado pelo INSS.
Na situação descrita como “limbo jurídico previdenciário”, há duas possibilidades: a) ou o INSS
recusou indevidamente o auxílio-doença, caso em que o segurado faz jus ao benefício, mantendo
a sua qualidade de segurado por força do art. 15, inc. I, da Lei nº 8.213/91; b) ou a empresa,
diante da alta do empregado, recusou-se injustamente a reintegrá-lo ao seu posto de trabalho,
caso em que o contrato de trabalho permanece vigente, persistindo a qualidade de segurado na
forma do art. 11, inc. I, “a”, da Lei nº 8.213/91.
Em ambas as hipóteses, portanto, mantém-se a qualidade de segurado, independentemente de
como o impasse entre o INSS e a empresa empregadora venha a ser resolvido, seja no âmbito
administrativo ou judicial.
Por fim, é de se recordar que compete ao empregador o recolhimento das contribuições
previdenciárias, na forma do art. 30, inc. I, “a”, da Lei nº 8.212/91.
Acolho, portanto, o pedido de rescisão do V. Acórdão impugnado, com fundamento no art. 485,
inc. IX, do CPC/73.
Passo ao juízo rescisório.
A autora, na ação originária, postulou a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez.
Nos exatos termos do art. 42 da Lei n.º 8.213/91, in verbis:
"A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será
devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-
lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de
incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o
segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão."
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
"O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período
de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos."
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez
compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da
Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) a
incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no
que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, devo ressaltar que, em se
tratando de segurado empregado, tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o
dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas
em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado
pela inércia alheia.
Importante deixar consignado, outrossim, que a jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no
sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que está impossibilitado de trabalhar,
por motivo de doença incapacitante.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
In casu, encontram-se comprovados o cumprimento da carência e a existência da qualidade de
segurada, uma vez que, como observado, há nos autos da ação originária prova de que a autora
manteve vínculo de emprego com a Santa Casa de Presidente Venceslau ao menos até
20/09/2011.
Outrossim, a alegada incapacidade ficou plenamente demonstrada pela perícia médica, conforme
parecer técnico elaborado pelo Perito em 13/02/2012 (doc. nº 649.974, p. 8/19), no qual relata
que a autora, que exerce a função de “copeira”, encontra-se total e permanentemente
incapacitada para desempenhar seu trabalho, por ser portadora de “Tendinite Crônica de Ombros
Direito e Esquerdo, com ruptura parcial de Supra espinhoso em Ombro Esquerdo, Síndrome do
Túnel do Carpo Leve em Punho Esquerdo, Artrose Avançada de Coluna Cervical e Lombar e
Protusão Discal em níveis de C4-C5, C5-C6 L4-L5 e L5-S1” (doc. nº 649.974, p. 13), doença cujo
estágio, no caso da periciada, é insuscetível de reabilitação ou readaptação.
Dessa forma, deve ser concedida a aposentadoria por invalidez pleiteada na exordial. Deixo
consignado, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o disposto nos
artigos 42 e 101, da Lei nº 8.213/91.
Observo, por oportuno, que antes da propositura da ação originária, a autora havia ajuizado outra
demanda com vistas à obtenção de auxílio-doença (AC nº 0051373-46.2008.4.03.9999), a qual foi
julgada improcedente por decisão proferida em 30/05/2011 e transitada em julgado em
24/06/2011 (doc. nº 649.977, p. 13).
Registro, contudo, que a ação originária claramente não se identifica com mera repropositura de
demanda anterior. Como é sabido, as ações relativas a benefícios por incapacidade,
frequentemente, sujeitam-se a alterações fáticas abruptas, decorrentes da melhora ou
agravamento da moléstia.
Além disso, no presente caso, é perceptível que a constatação - pela própria empresa
empregadora - de que a autora ainda não se encontrava apta a retornar para suas atividades, por
continuar a apresentar incapacidade laborativa, é motivo legítimo para que se entenda existir
nova situação de fato e, portanto, nova causa de pedir, a autorizar a propositura de uma outra
demanda com o objetivo de compelir o INSS a conceder o benefício.
De se observar, ainda, que a ação originária foi proposta com base em requerimento
administrativo diverso daquele que constituiu o objeto da primeira demanda ajuizada.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, formulado em
21/09/2011 (doc. nº 649.967, p. 23).
O pressuposto fático da concessão do benefício é a incapacidade da parte autora, que é anterior
ao seu ingresso em Juízo, sendo que a elaboração do laudo médico-pericial somente contribuiu
para o livre convencimento do juiz acerca dos fatos alegados, não sendo determinante para a
fixação da data de aquisição dos direitos pleiteados na demanda (Recurso Especial
Representativo de Controvérsia nº 1.369.165/SP).
Quadra acrescentar, ainda, que deverão ser deduzidos na fase de execução do julgado, valores
percebidos pela parte autora na esfera administrativa, decorrentes de eventuais benefícios
inacumuláveis.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
Quadra ressaltar haver constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que “a adoção do
INPC não configura afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de
repercussão geral (RE 870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação do
IPCA-E para fins de correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual se
trata de benefício de natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso concluir
que o INPC, previsto no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção monetária dos
benefícios de natureza previdenciária.” Outrossim, como bem observou o E. Desembargador
Federal João Batista Pinto Silveira: “Importante ter presente, para a adequada compreensão do
eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência – INPC e IPCA-
E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a
TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo
STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões
judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.” (TRF-
4ª Região, AI nº 5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª Turma, v.u., j. 16/10/19).
A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
Ante o exposto, em sede de juízo rescindente, julgo procedente o pedido, com fundamento no inc.
IX, do art. 485, do CPC/73 para desconstituir o V. Acórdão e, em sede de juízo rescisório, julgo
procedente o pedido de aposentadoria por invalidez, nos termos da fundamentação supra.
Condeno a parte ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios, ora arbitrados em
R$1.000,00, conforme entendimento dessa E. Terceira Seção. Comunique-se o MM. Juiz a quo
do inteiro teor deste.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI.
PRETENSÃO A REEXAME DE PROVAS. PRINCÍPIO JURA NOVIT CURIA. APLICAÇÃO.
CAUSA DE PEDIR QUE DESCREVE A EXISTÊNCIA DE ERRO DE FATO. DECISÃO
RESCINDENDA QUE DEIXOU DE EXAMINAR DOCUMENTOS DA AÇÃO ORIGINÁRIA.
EQUÍVOCO QUANTO AOS FATOS DA CAUSA. “LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO”. ERRO
DE FATO CONFIGURADO. JUÍZO RESCISÓRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO ORIGINÁRIO.
I- Improcede a alegação de violação a literal disposição de lei, uma vez que a autora objetiva a
desconstituição do julgado por divergir da interpretação dada pela decisão aos elementos de
prova reunidos no processo de origem.
II- Tendo a parte autora afirmado, na petição inicial, que o V. Acórdão rescindendo “reconheceu a
perda da qualidade de segurada da requerente, quando se provou no processo a ausência de
interrupção do período contributivo, sendo indelével apontar que entre 2007 e 2011, conforme
atestados de saúde ocupacional fornecidos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de
Presidente Venceslau, bem como CTPS e demais documentos, verifica-se que não houve
interrupção do contrato de trabalho”, impõe-se o exame da alegação de erro de fato, descrito na
causa de pedir acima exposta. Incidência do princípio jura novit curia.
III- No que tange ao art. 485, inc. IX, do CPC/73, depreende-se que a rescisão fundada em erro
de fato é cabível nos casos em que o julgador -- desatento para os elementos de prova existentes
nos autos -- forme uma convicção equívoca sobre os fatos ocorridos, supondo, incorretamente,
existente ou inexistente um determinado fato contra a prova dos autos.
IV- O V. Acórdão rescindendo manteve a improcedência da ação originária por entender que
houve perda da qualidade de segurado, sem examinar, porém, o “Atestado de Saúde
Ocupacional”, elaborado na data de 20/09/11 por médico do trabalho do “Instituto de Medicina do
Trabalho da Alta Sorocabana”, nem a “Declaração” firmada pela “Irmandade da Santa Casa de
Presidente Venceslau” na data de 20/09/11, documentos acostados nos autos da ação originária.
V - Referidos elementos de prova demonstram que a demandante permaneceu empregada na
Irmandade da Santa Casa de Presidente Venceslau, ao menos até 20/09/2011.
VI - O V. Acórdão rescindendo, por deixar de examinar os documentos acima destacados,
declarou como verdadeiro fato inexistente, afirmando que os “Extratos de Informações do
‘Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS’, juntados aos autos às fls. 91-93, informam
que o vínculo empregatício da autora, iniciado em 10.12.1986, foi rescindido em 12.2005” (grifei).
VII - O presente caso trata da tormentosa hipótese descrita como “limbo jurídico previdenciário”
ou “emparedamento”. O INSS, após realizar exame médico, atesta que o segurado se encontra
apto para o exercício de suas atividades laborais, determinando seu retorno ao trabalho. O
empregador, porém, ao submeter o empregado a novo exame médico, verifica que este continua
incapacitado para o trabalho, decidindo mantê-lo afastado de suas funções até que o mesmo se
recupere.
VIII - Daí porque, nestes casos, afirma-se que o segurado se encontra em um “limbo
previdenciário”: enquanto não é solucionada a discordância entre o INSS e a empresa
empregadora, relativamente à existência ou não da incapacidade para o trabalho, o empregado
não recebe nem o seu salário, nem o auxílio-doença.
IX - Considerando-se que não houve demissão ou outra forma de extinção do vínculo de trabalho
da autora, a mesma continuou a ser empregada da empresa “Irmandade da Santa Casa de
Presidente Venceslau”, mantendo, portanto, a sua condição de segurada obrigatória da
Previdência Social, na forma do art. 11, inc. I, “a” da Lei nº 8.213/91.
X- Cabe observar que a hipótese descrita como “limbo jurídico previdenciário” não provoca nem a
suspensão nem a interrupção do contrato de trabalho, de modo que este continua a produzir
plenos efeitos, tanto em seara trabalhista quanto previdenciária. Precedentes desta E. Corte e do
C. Tribunal Superior do Trabalho.
XI- Na situação descrita como “limbo jurídico previdenciário”, há duas possibilidades: a) ou o
INSS recusou indevidamente o auxílio-doença, caso em que o segurado faz jus ao benefício,
mantendo a sua qualidade de segurado por força do art. 15, inc. I, da Lei nº 8.213/91; b) ou a
empresa, diante da alta do empregado, recusou-se injustamente a reintegrá-lo a seu posto de
trabalho, caso em que o contrato de trabalho permanece vigente, persistindo a qualidade de
segurado na forma do art. 11, inc. I, “a” da Lei nº 8.213/91.
XII- Em ambas as hipóteses, portanto, há a manutenção da qualidade de segurado,
independentemente de como o impasse entre o INSS e a empresa empregadora venha a ser
resolvido, seja em âmbito administrativo ou judicial.
XIII- Procedência da rescisória. Procedência do pedido originário. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu, em sede de juízo rescindente, julgar procedente o pedido, com fundamento
no inc. IX, do art. 485, do CPC/73 para desconstituir o V. Acórdão e, em sede de juízo rescisório,
julgar procedente o pedido de aposentadoria por invalidez , nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA