D.E. Publicado em 09/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001402-14.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.
A sentença recorrida julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a pagar o benefício pleiteado desde a data do requerimento administrativo (27.06.2012 - fls. 20). Fixou os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula nº 111 do STJ.
Apela o INSS requerendo a reforma do julgado, alegando para tanto que a autora não logrou êxito em comprovar sua deficiência e miserabilidade. Subsidiariamente, caso mantida a procedência do pedido, pede a reforma da sentença no tocante ao termo inicial do benefício e aos honorários advocatícios.
Com a apresentação de contrarrazões os autos vieram a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
No caso em tela, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade da postulante.
Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29, que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento."
A autora, desempregada, relata que é portadora de Epilepsia e Ataxia Cerebelar Tardia, condição que a torna incapaz para o trabalho.
O laudo médico pericial de fls. 68/72 constatou a existência de incapacidade parcial e definitiva, com restrição para atividades que possa se colocar ou colocar terceiros em risco e/ou que exijam nível de coordenação motora aquém das capacidades da pericianda, havendo redução da capacidade para desempenho da atividade profissional habitual.
Os atestados médicos de fls. 13/17 indicam que a autora apresenta incapacidade laboral desde 27/11/2012, sem previsão de alta, e que a autora apresenta fraqueza muscular e fala arrastada.
O laudo social relata que se trata de pessoa simples, com dificuldade na comunicação, e que apresenta ruptura de vínculos afetivos e comunitário, o que demonstra que a condição de saúde da autora constitui impedimento de longo prazo, que obstrui sua participação na sociedade de forma plena, em condições de igualdade com as demais pessoas, nos termos do art. 3º da Lei 12.470/2011, restando caracterizada sua deficiência.
Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Dessa forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social de fls. 26/28 revela que a parte autora reside sozinha, em casa própria, de alvenaria, com quatro cômodos, em precário estado de conservação.
A autora não tem rendimento algum e sobrevive de auxílio do programa social Bolsa Família no valor de R$ 70,00.
Recebe medicação da rede pública da saúde.
Nota-se claramente que a autora se encontra em situação de vulnerabilidade, vivendo em isolamento social e sem rendimento algum.
Depreende-se do conjunto probatório, que a eventual recuperação da capacidade laboral da autora requer aporte financeiro, para que ela possa ter acesso a tratamento médico/psicológico adequado.
Desta forma, considerando conjunto probatório que se apresenta nestes autos, verifico estarem preenchidos os requisitos necessários à manutenção do benefício concedido pelo MM. Juiz a quo.
Quanto ao termo inicial do benefício, havendo requerimento prévio administrativo em 27.09.2012 - fls. 20, é nesta data que deve ser mantido o inicio do benefício, uma vez que foi neste momento que a autarquia teve ciência da pretensão da parte autora.
Neste sentido confira-se: "CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIARIO. AGRAVO LEGAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. TERMO INICIAL. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É pacífico o entendimento nesta E. Corte, segundo o qual não cabe alterar decisões proferidas pelo relator, desde que bem fundamentadas e quando não se verificar qualquer ilegalidade ou abuso de poder que possa gerar dano irreparável ou de difícil reparação. 2. A r. decisão ora agravada deve ser mantida, por seus próprios e jurídicos fundamentos, a teor do disposto no art. 557, do CPC, inexistindo qualquer ilegalidade ou abuso de poder. 3. Em havendo requerimento administrativo, o termo inicial do benefício deve se dar a partir deste, por ser o momento em que o Réu toma ciência da pretensão. 4. Agravo improvido. (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC 0017473-96.2013.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, julgado em 12/01/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/01/2015)"
Os honorários de advogado, devem ser mantidos em 10% sobre o valor da condenação, consoante entendimento desta Turma e artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, aplicável ao caso concreto eis que fixado em sua vigência, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Diante do exposto NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 31/05/2016 15:56:12 |