APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0003098-51.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: VICENTE DE PAULO SEVERIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: DAVID VITORIO MINOSSI ZAINA - SP196581-N
APELADO: VICENTE DE PAULO SEVERIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: DAVID VITORIO MINOSSI ZAINA - SP196581-N
OUTROS PARTICIPANTES:
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APELANTE: VICENTE DE PAULO SEVERIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal.
A sentença, prolatada em 14.04.2016, julgou procedente o pedido conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, e o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, extinguindo o processo com solução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para DETERMINAR ao INSS que CONCEDA o benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 à VICENTE DE PAULO SEVERIANO, no valor de 1 (um) salário mínimo, a partir da citação. Por via de consequência, condeno o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, compreendidas entre a data do início do benefício e o início do pagamento, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios, ora fixados em 10% do valor da condenação (prestações vencidas - Súmula nº 111 do C. STJ), nos termos do artigo 85, § 3º, I, do Código de Processo Civil, ficando isento das custas e despesas processuais, por disposição expressa do artigo 6º da Lei Estadual nº 11.608/03. Sobre os valores das parcelas não adimplidas e não abarcadas pela prescrição quinquenal, cumpre que se adicione correção monetária e juros de mora desde a citação. Quanto à correção monetária, contada a partir da data em que tais valores deveriam ter sido pagos, esta far-se-á segundo a Tabela Prática cível do TJSP até junho de 2009, quando o saldo então apurado e a atualização das parcelas posteriormente vencidas será convergente aos parâmetros da Lei n. 11960/09 até 25 de março de 2015, quando a correção passará a contar segundo o IPCA-E, a teor da modulação que o Supremo Tribunal Federal atribuiu à declaração parcial de inconstitucionalidade da EC 62/09, nos autos da ADI 4357 e 4425.Os juros, contados da citação, para as parcelas àquela altura vencidas (cf. STJ, REsp 1.112.114, sob o rito do art. 543-C, CPC, tema 23), e desde o momento dos respectivos vencimentos, para as parcelas supervenientes à citação, serão convergentes às seguintes taxas: a) aplica-se a taxa de 1% ao mês até a publicação da MP 2180-35/2001, que acresceu o art. 1º-F à Lei n. 9494/97; b) aplica-se a taxa de 0,5% ao mês a partir de 24.08.2001, data da publicação da MP 2180-35; c) aplica-se a taxa de juros correspondente ao dos depósitos em cadernetas de poupança após o advento da Lei n. 11960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F, da Lei n. 9494/97, haja vista que o STF declarou inconstitucional por arrasto o art. 5º, da Lei 11960/09 somente quanto à expressão "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança", de modo que, quanto aos juros, a disposição que remete à taxa praticada no regime das cadernetas de poupança permanece íntegra (cf. STJ, AgRg AREsp 550.200-PE). CONCEDO, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, sendo que o INSS deverá implementar o benefício concedido no prazo de 30 (trinta) dias, em consonância com os arts. 461, § 3º, e 475-I, "caput", do Código de Processo Civil. Oficie-se. Sentença sujeita a reexame necessário (artigo 475, inciso II, do Código de Processo Civil c.c. artigo 10 da Lei nº 9.469/97). P.R.I.”
Apela a parte autora pleiteando a reforma da sentença no tocante ao termo inicial do benefício.
Apela o INSS pugnado pela improcedência do pedido inicial, alegando para tanto que não restou preenchido o requisito de miserabilidade. Nesse sentido argumenta que a renda per capita familiar é superior ao limite legal. Alternativamente, pede a anulação da sentença ante a ocorrência do cerceamento de defesa, eis que o laudo social carece de complementação.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento dos apelos e da remessa oficial.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0003098-51.2017.4.03.9999
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APELANTE: VICENTE DE PAULO SEVERIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: DAVID VITORIO MINOSSI ZAINA - SP196581-N
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (26.03.2015), seu valor e a data da sentença (14.04.2016), que o valor total a condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.
Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao reexame necessário previstas nos § 3º e 4º do artigo 496 do CPC/2015, restrinjo o julgamento apenas à insurgência recursal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido com base no conjunto probatório apresentado, tendo se convencido restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:
“No caso dos autos, no que concerne à miserabilidade, observo que o relatório social indica que no lar da parte autora residem 02 (duas) pessoas (autor e seu irmão). Apenas aufere rendimentos o irmão do autor, no valor mensal de 01 (um) salário mínimo), proveniente de aposentadoria. No estudo social, verificou-se que os gastos mensais são os seguintes: R$ 100,00 - em média, de água e energia elétrica; R$450,00 - alimentação; R$60,00 - gás e com medicamentos, em média R$150,00, sendo que as demais necessidades básicas ficam à desejar. O total de despesas é de R$ 760,00 (setecentos e sessenta reais). De acordo com os documentos que instruem os autos, em especial o estudo social, tenho que a condição de miserabilidade do autor restou claramente evidenciada, já que, como outrora exposto, não se considera, para fins de aferição de sua miserabilidade, a aposentadoria de seu irmão. Portanto, os elementos trazidos aos autos permitem concluir com a necessária certeza que a parte autora preenche os requisitos legais para a concessão da benesse, pois, infelizmente, se enquadra no conceito de miserabilidade, fazendo jus ao benefício pretendido”
Por sua vez, o estudo social (ID 88793277 – pag. 67), elaborado em 04.01.2016, revela que a parte autora vive com seu irmão em imóvel de herança. Trata-se de construção com cinco cômodos pequenos, sendo dois quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida com móveis velhos pelo uso.
A renda da casa advém da aposentadoria do irmão da parte autora, que recebe aposentadoria no valor de R$ 788,00 (um salário mínimo).
Relataram despesas com alimentação (R$ 450,00), água e luz (R$ 100,00), gás (R$ 60,00) e medicamentos (R$ 150,00), perfazendo total de R$ 760,00.
A perita social emitiu parecer nos termos que seguem: “Diante da situação acima citada meu parecer é favorável, visto que, o requerente é idoso, saúde debilitada e não possui condições físicas para o trabalho, não possuindo renda alguma.”
Depreende-se da leitura do estudo social que, apesar de não se negar a existência de eventuais dificuldades financeiras, não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não estejam sendo supridas.
O grupo não possui despesa de aluguel posto que vive em imóvel de herança que oferece o abrigo necessário, e conta com rendimento formal de um salário mínimo, condição que, a princípio afasta a existência de vulnerabilidade econômica.
Nesta seara, observo que não há nos autos comprovação de gastos extraordinários com alimentação ou tratamento médico especial.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Conclui-se, desta forma, que as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da impossibilidade de sustento, como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993, e, portanto, ausente o requisito de miserabilidade, inviável a concessão do benefício assistencial, posto que não se presta a complementação de renda.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Por fim, revogo a tutela antecipada. Esclareço, todavia, que tratando-se de benefício assistencial, entendo indevida a devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, não se aplicando ao caso o entendimento firmado pelo STJ no REsp nº 1401560/MT, referente apenas aos benefícios previdenciários.
Ante o exposto não conheço da remessa necessária, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS e julgo prejudicado o recurso da parte autora, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0003098-51.2017.4.03.9999
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Advogado do(a) APELANTE: DAVID VITORIO MINOSSI ZAINA - SP196581-N
APELADO: VICENTE DE PAULO SEVERIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: DAVID VITORIO MINOSSI ZAINA - SP196581-N
EMENTA
REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA. REVOGADA.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida
2. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
3. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparado pelo irmão e não há evidência de que suas necessidades básicas não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
4. Benefício assistencial indevido.
5. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese do §3º do artigo 98 do CPC/2015.
6. Tutela antecipada revogada. Desnecessária a devolução dos valores. Inaplicabilidade do decidido no REsp nº 1401560/MT aos benefícios assistenciais.
7. Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida. Apelação da parte autora prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária, dar provimento à apelação do INSS e julgar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.