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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA DOCUMENTAL ROBUSTA DE TRABALHO REALIZADO EM FAZENDA E ASS...

Data da publicação: 12/07/2020, 16:44:47

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA DOCUMENTAL ROBUSTA DE TRABALHO REALIZADO EM FAZENDA E ASSENTAMENTO RURAL. PEQUENO PRODUTOR PARA SUBSISTÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1.A autora Julia Sanches de Vareiro nasceu em 02/02/1955 e completou o requisito idade mínima (55 anos) em 02/02/2010 (fl. 13), devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 174 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91. 2.Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou vários documentos em seu nome e em nome do convivente, dentre eles o de ser moradora do Assentamento PA Itamarati II FETAGRI e declaração de atividade rural em regime de economia familiar no lote/gleba/parcela rural nº 064 - com a área individual de 4,0000HA que lhe foi destinada em 26/11/2009. 3. Há vínculos insertos no CNIS que demonstram que o convivente da autora exerceu majoraritariamente trabalho rural, atividade extensiva à autora que trouxe prova documental nesse sentido também em seu nome. 4.Diante do quanto apresentado, entendo por comprovada a predominância da atividade rural exercida, sendo os documentos juntados dotados de início razoável de prova material que bem demonstra o labor rurícola sempre exercido pela autora e pelo tempo necessário à concessão do benefício, à luz da prova documental colhida, que não precisa expressar a totalidade do tempo requerido para a obtenção do benefício, bastando que seja corroborada pela prova testemunhal idônea a reforçar o tempo de atividade rurícola exigido, no caso, conforme estabelece o art. 142 da Lei previdenciária. 5.Improvimento do recurso. (TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2088419 - 0001865-12.2013.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 25/04/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/05/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001865-12.2013.4.03.6005/MS
2013.60.05.001865-0/MS
RELATOR:Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:RJ185391 TIAGO ALLAM CECILIO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):JULIA SANCHES DE VAREIRO
ADVOGADO:MS015101 KARINA DAHMER DA SILVA e outro(a)
No. ORIG.:00018651220134036005 2 Vr PONTA PORA/MS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA DOCUMENTAL ROBUSTA DE TRABALHO REALIZADO EM FAZENDA E ASSENTAMENTO RURAL. PEQUENO PRODUTOR PARA SUBSISTÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. IMPROVIMENTO DO RECURSO.
1.A autora Julia Sanches de Vareiro nasceu em 02/02/1955 e completou o requisito idade mínima (55 anos) em 02/02/2010 (fl. 13), devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 174 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
2.Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou vários documentos em seu nome e em nome do convivente, dentre eles o de ser moradora do Assentamento PA Itamarati II FETAGRI e declaração de atividade rural em regime de economia familiar no lote/gleba/parcela rural nº 064 - com a área individual de 4,0000HA que lhe foi destinada em 26/11/2009.
3. Há vínculos insertos no CNIS que demonstram que o convivente da autora exerceu majoraritariamente trabalho rural, atividade extensiva à autora que trouxe prova documental nesse sentido também em seu nome.
4.Diante do quanto apresentado, entendo por comprovada a predominância da atividade rural exercida, sendo os documentos juntados dotados de início razoável de prova material que bem demonstra o labor rurícola sempre exercido pela autora e pelo tempo necessário à concessão do benefício, à luz da prova documental colhida, que não precisa expressar a totalidade do tempo requerido para a obtenção do benefício, bastando que seja corroborada pela prova testemunhal idônea a reforçar o tempo de atividade rurícola exigido, no caso, conforme estabelece o art. 142 da Lei previdenciária.
5.Improvimento do recurso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de abril de 2016.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001865-12.2013.4.03.6005/MS
2013.60.05.001865-0/MS
RELATOR:Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:RJ185391 TIAGO ALLAM CECILIO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):JULIA SANCHES DE VAREIRO
ADVOGADO:MS015101 KARINA DAHMER DA SILVA e outro(a)
No. ORIG.:00018651220134036005 2 Vr PONTA PORA/MS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em sede de ação proposta cujo objeto é a concessão de aposentadoria por idade devida a trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo tempo necessário previsto em lei, e que, portanto, faria jus ao benefício.

Com a inicial vieram documentos (fls.11/39).

Justiça gratuita concedida por decisão de fl.43.

Contestação da parte ré às fls. 47/56.

Em juízo foram colhidos depoimentos em audiência (fls.79).

Por sentença de fls.71/75, datada de 26/08/2014, o MMº Juízo "a quo" julgou procedente o pedido, considerando que a parte autora comprovou suficientemente fazer jus ao benefício.

Em razões de fls. 86/91, o INSS alega, em síntese, ausência de comprovação da condição de segurada, não demonstrada a atividade rural durante a carência mínima exigida e que os documentos apresentados não são hábeis à demonstração do trabalho rural, porquanto desprovidos de cunho oficial e ausência de autenticação, estando a maioria em nome de terceiros.

Ademais, em consulta ao CNIS do histórico laborativo do companheiro da autora constam informações de diversos vínculos urbanos, a descaracterizar o labor rural.

Volta-se contra a data do início do benefício, para que seja fixada na data da realização da audiência de instrução e julgamento e os honorários advocatícios diminuídos de 10% determinados na sentença para 5% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.

Prequestiona a matéria.

Regularmente intimada, a autora deixou decorrer in albis o prazo para contrarrazões recursais.

Os autos subiram a este Egrégio Tribunal.

É o relatório.




VOTO

Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em seu artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando este completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.

Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:

"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:

I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal" - grifo nosso.

Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido os requisitos etário e de efetivo exercício de atividade rural pelo período de carência do benefício pretendido - conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei -, para que homens e mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:

"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.

§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;

§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei" - grifei.

Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial - isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período legal de carência do benefício, "verbis":

"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido".

Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:

"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".

Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial - produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus ao benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":

"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

[...]

III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei".

Conclui-se, portanto, que o benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural está disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação da idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela Lei.

Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício em questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela jurisprudência pátria.

Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "verbis":

"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.

Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.

Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.

Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.

Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.

Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.

Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.

De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.

Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.

O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação.

Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, tal como estabelecido no art. 143 da Lei nº 8.213/91, com redação alterada pela Lei nº 9.063/95.

Adoto o entendimento que inexiste a exigência de que o tempo de trabalho rural deva ser exercido no período imediatamente anterior ao requerimento. Com efeito, a Lei 10.666/2003 dispõe:

"Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.

§1º. Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício".

Ora, vê-se que a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento anterior.

A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola, pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus.

A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.

No entanto, penso que, se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos anos antes do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco) anos mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger o idoso que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de se aposentar mais cedo. Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, ao prever o afastamento da redução etária se, para completar o tempo de carência, houver contagem de períodos sob outras categorias.

No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).

Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.

Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período. (TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro de 2015, v.u).

No mesmo sentido: Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO JORDAN, TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2104.


Do caso dos autos.

A autora Julia Sanches de Vareiro nasceu em 02/02/1955 e completou o requisito idade mínima (55 anos) em 02/02/2010 (fl. 13), devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 174 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.

Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou os seguintes documentos: cópia de título eleitoral expedido em 26/08/1985, no qual consta profissão de lid. do lar, residência na Fazenda Envernadinha, Mun. Antonio João/MS; Conta de luz em seu nome da residência no bairro Itamarati rural/ Ponta Porã - MS referente ao mês 07/2013, Certidão do INCRA em seu nome de que é assentada no Projeto de Assentamento PA Itamarati II FETAGRI e de atividade rural em regime de economia familiar no lote/gleba/parcela rural nº 064 - com a área individual de 4,0000HA que lhe foi destinada em 26/11/2009; Carta dirigida por seu convivente Waldemar Flores Batista dirigida ao gerente de projetos de assentamentos no município de Ponta Porã para requerimento de análise de ocupação por mais de ano do lote nº 64 - Grupo Antonio João - FETAGRI do PA Itamarati II, em Ponta Porã/MS; Comprovante e nota discal de aquisição por Waldemar de vacina contra febre aftosa para bovino em 04/06/2013 (fl.20/21); Recibos de pagamentos ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ponta Porã nas datas de 27/07/2007, 03/03/2011, 06/08/2013, 28/06/2006, 19/05/2008 (fls. 22/24) em nome de Waldemar, cópia de pagamento de contribuição sindical do agricultor em regime de economia familiar em nome de Waldemar Flores Baptista (fl.25); Declaração de exercício de atividade rural em nome da autora Juliana Aparecida Sanches Flores no assentamento Itamarati II lote 064 Grupo Antonio João na categoria de trabalhadora rural em regime de economia familiar no período de 18/06/2007 à 08/11/2008 (fl.26), em que consta cultivo de arroz, feijão, milho e rama para fins de subsistência; Relatório de Vigilância Sanitária em Saúde Animal sobre vacinação de bovinos, em nome de Waldemar; movimentação de rebanho animal (fls.29/30); Comprovante de cadastramento do produtos (fl.31); Declaração de exercício de atividade rural em nome da autora no assentamento Itamarati II no período de 26/11/2009 à 03/03/2011 em regime de economia familiar (fl.32); Nota fiscal de venda em nome de Waldemar (fl.33)

Com a contestação, o INSS juntou aos autos as informações do CNIS, nas quais constam em nome de Waldemar os vínculos empregatícios iniciados em 25/05/1982 até 25/07/1983 no Departamento de Estradas e Rodagem do Mato Grosso do Sul; de 01/11/1988 a 10/10/1989 nos Supermercados Borgatto Ltda-ME; DE 18/06/2002 ATÉ 18/01/2003 NA Produtora de Charque Alvorada Ltda e de 02/05/2005 até 01/06/2006 na Luiz Carlos Schweig Schineider - na fazenda Retiro da Ilha como empregado rural.

Verifico dos vínculos ali insertos que o convivente da autora exerceu majoraritariamente trabalho rural, ativida extensiva à autora que trouxe prova documental nesse sentido também em seu nome.

.Diante do quanto apresentado, entendo por comprovada a predominância da atividade rural exercida, sendo os documentos juntados dotados de início razoável de prova material que bem demonstra o labor rurícola sempre exercido pela autora e pelo tempo necessário à concessão do benefício, à luz da prova documental colhida, que não precisa expressar a totalidade do tempo requerido para a obtenção do benefício, bastando que seja corroborada pela prova testemunhal idônea a reforçar o tempo de atividade rurícola exigido, no caso, conforme estabelece o art. 142 da Lei previdenciária.

Com efeito, as testemunhas ouvidas em juízo (Dario Fernandes e Nanci de Souza Barros - fl.79) afirmaram que o demandante sempre exerceu atividade rural, desde que a conheceram. Dario disse que sabe que a autora cria pequenos animais e cuida de plantações do seu lote. Nanci disse que mora no assentamento Itamarati há 9 anos e conheceu a autora em 2002 quando estavam acampadas época em que trabalhavam como bóias-frias; já viu a autora criando pequenos animais e cuidando da lavoura no lote.

Tais depoimentos corroboram a robusta prova documental apresentada aos autos quanto à atividade rural, possibilitando a conclusão pela prevalência de efetivo exercício de atividade rural pela parte autora, apta a tornar viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma vez que, como visto, houve início razoável de prova material corroborado pela prova oral produzida em juízo, a demonstrar que a parte autora manteve-se de forma predominante nas lides rurais.

Dessa forma, preenchidos os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por idade pleiteado, RMI de um salário mínimo, cujo termo inicial é a data do requerimento administrativo do benefício (05/06/2013 - fl.16), consoante determinado na sentença recorrida.

Com relação à correção monetária e aos juros de mora, consectários da condenação, devem ser observados os critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal em vigor, também em conformidade com a sentença.

Mantenho a condenação da ré e os honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a prolação da sentença, nos termos do enunciado da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.

O STJ entende que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal (art. 8º, da Lei nº 8.620/1993). Contudo, a Colenda 5ª Turma desta Corte tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do artigo 14, § 4º, da Lei 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.

Na hipótese, a parte autora é beneficiária da justiça gratuita, não sendo devido, desse modo, o reembolso das custas processuais pelo INSS.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social e, com isso, julgar procedente o pedido, mantida in totum a r. sentença de primeiro grau.

É como voto.



LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 26/04/2016 15:57:27



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