Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0002422-24.2018.4.03.6328
Relator(a)
Juiz Federal JOAO CARLOS CABRELON DE OLIVEIRA
Órgão Julgador
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/03/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/03/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CONTROVÉRSIA
INFRACONSTITUCIONAL. TEMPO RURAL REMOTO COMO CARÊNCIA.
1. A controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a
concessão de aposentadoria híbrida é infraconstitucional, como firmado pelo STF.
2. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade híbrida são aqueles fixados pelo
STJ no julgamento do Tema nº 1.007.
3. O exercício de atividade rural pelo segurado quando do implemento do requisito etário não é
necessário para a concessão de aposentadoria híbrida.
4. O tempo de atividade rural remoto e descontínuo pode ser computado como carência na
aposentadoria por idade híbrida.
5. Recurso do INSS a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002422-24.2018.4.03.6328
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELIETE ZILA BERBERT DE CASTRO
Advogado do(a) RECORRIDO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002422-24.2018.4.03.6328
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELIETE ZILA BERBERT DE CASTRO
Advogado do(a) RECORRIDO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pelo INSS pelo qual objetiva a reforma da sentença que julgou
procedente o pedido inicial, concedendo à parte autora o benefício previdenciário de
aposentadoria por idade híbrida, mediante o reconhecimento e averbação do período de tempo
de atividade rural remoto como carência.
Em suas razões recursais o INSS alega, preliminarmente, que a decisão proferida pelo Superior
Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Tema nº 1.007 não transitou em julgado, havendo
matéria constitucional a ser apreciada, a qual deverá ser objeto de apreciação pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), notadamente quanto à declaração de inconstitucionalidade pelo STJ de
dispositivo legal sem observância da cláusula de reserva de plenário.No mérito, afirma que não
há como deferir a aposentadoria híbrida no caso vertente, por não se adequar ao disposto no
art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91, sendo que o período rural sem recolhimento de contribuições
não pode ser computado como carência. Afirma que somente é permitido o cômputo de tempo
de atividade rural imediatamente anterior ao requerido para a concessão desse benefício.
Requer o provimento do recurso, com o julgamento de improcedência do pedido inicial.
Intimada, a parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002422-24.2018.4.03.6328
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELIETE ZILA BERBERT DE CASTRO
Advogado do(a) RECORRIDO: HELOISA CREMONEZI PARRAS - SP231927-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
a) Preliminar:
Inicialmente, consigno que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE 1.281.909,
reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão relativa à tese fixada no julgamento
pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) do Tema nº 1.007, fixando a seguinte tese:
“É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a
controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a
concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91” (RE 1.281.909,
Rel. Min. Luiz Fux, Plenário, j. 25.09.2020, DJE 03.12.2020).
Assim, considero superada a ordem de suspensão dos processos que discutam essa tese,
então determinada pela Vice-Presidência do STJ quando do exame prévio de admissibilidade
desse recurso extraordinário (decisão de 18.06.2020, publicada no DJe de 26.06.2020).
Superada, ainda, a alegação do INSS, em suas razões recursais, da necessidade se aguardar o
trânsito em julgado da decisão adotada pelo STJ no julgamento do Tema nº 1.007.
b) Mérito:
A controvérsia estabelecida na fase recursal diz respeito à possibilidade de concessão, em
favor da parte autora, de aposentadoria por idademediante o reconhecimento, como período de
carência, de períodos trabalhados na zona urbana e rural.
A aposentadoria em questão é denominada pela doutrina como híbrida ou mista, por conjugar
critério próprio da aposentadoria por idade urbana (requisito etário) com critério específico da
aposentadoria por idade rural: cômputo, como período de carência, de período de exercício de
atividade rural sem recolhimento de contribuições previdenciárias, no caso do trabalhador rural
segurado especial.
A aposentadoria híbrida encontra abrigo no ordenamento jurídico, conforme disposto no art. 48
da Lei nº 8.213/91, em especial por força de seus §§ 3º e 4º, incluídos pela Lei nº 11.718/2008.
Transcrevo o dispositivo citado:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º. Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 3º. Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4º. Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de recursos repetitivos (Tema nº 1.007),
confirmou que a aposentadoria híbrida encontra abrigo em nosso ordenamento jurídico, bem
como fixou seus contornos básicos. Confira-se o precedente:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1. 407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A tese defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida.
(RESP - RECURSO ESPECIAL - 1674221 2017.01.20549-0, NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:04/09/2019, negritei.)
Assim, à vista da legislação de regência, e do precedente do STJ acima transcrito, de
observância obrigatória, os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade mista ou
híbrida são os seguintes:
a) O implemento da idade mínima prevista em lei para a aposentadoria por idade urbana, qual
seja, 65 (sessenta e cinco) anos de idade para o homem e de 60 (sessenta) anos de idade para
a mulher; e
b) O cumprimento da carência legalmente estipulada.
Em relação ao período de carência, podem ser somados os períodos que o segurado tenha
laborado nas zonas urbana e rural. Quanto ao trabalho na zona rural, admite-se o cômputo dos
períodos laborados na condição de segurado empregado, contribuinte individual (trabalhador
eventual), trabalhador avulso ou segurado especial, sendo neste último caso desnecessária a
prova do recolhimento das contribuições previdenciárias respectivas.
Também não há limitação em relação ao período em que a parte autora tenha laborado na zona
rural, antes ou depois da vigência da Lei nº 8.213/91, pois admitido o cômputo do tempo de
atividade rural remoto e descontínuo, não havendo relevância, ademais, no fato de a parte
autora ter laborado, por último, na zona urbana ou rural.
No caso dos autos, a sentença recorrida reconheceu o período de atividade rural remoto
prestado pela parte autora entre 01/01/1974 a 31/12/1980, somando-o a outros períodos de
atividade urbana, o que possibilitou fosse atingido o período de carência necessário para a
concessão de aposentadoria por idade rural na modalidade híbrida.
Não houve por parte do INSS impugnação recursal quanto ao reconhecimento da atividade rural
em si, mas, sim, ao seu cômputo para fins de concessão de aposentadoria por idade.
Contudo, nos termos da fundamentação supra, a sentença recorrida não se afastou do
entendimento consolidado no âmbito do STJ sobre a matéria, pelo que deve ser negado
provimento ao recurso interposto pelo INSS.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do INSS, mantendo a sentença em todos os
seus termos.
Em razão da ausência de complexidade desta demanda, condeno o INSS ao pagamento de
honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da condenação, nos termos do art. 55 da Lei
nº 9.099/95 e da Súmula 111 do STJ.
Sem condenação em custas, por ser o recorrente delas isento.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CONTROVÉRSIA
INFRACONSTITUCIONAL. TEMPO RURAL REMOTO COMO CARÊNCIA.
1. A controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para
a concessão de aposentadoria híbrida é infraconstitucional, como firmado pelo STF.
2. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade híbrida são aqueles fixados pelo
STJ no julgamento do Tema nº 1.007.
3. O exercício de atividade rural pelo segurado quando do implemento do requisito etário não é
necessário para a concessão de aposentadoria híbrida.
4. O tempo de atividade rural remoto e descontínuo pode ser computado como carência na
aposentadoria por idade híbrida.
5. Recurso do INSS a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Terceira Turma
decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA