D.E. Publicado em 02/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER da Remessa Oficial e, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, DAR PROVIMENTO à Apelação Autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004028-15.2007.4.03.6121/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Trata-se de Apelação interposta pelo INSS (fls. 191-192) em face da r. Sentença (fls. 164-167 e 183) que julgou procedente o pedido de restabelecimento de auxílio doença, desde a data da cessação administrativa (02.09.2007) até o dia anterior à data da juntada do laudo pericial aos autos (15.02.2009), e conversão em aposentadoria por invalidez, a partir da data da juntada do laudo pericial aos autos (16.02.2009). Confirma a decisão que antecipou os efeitos da tutela (fls. 148-150). Condenou a Autarquia ré ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das diferenças vencidas, consideradas desde 02.09.2007 até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ. Sentença submetida ao reexame necessário.
Em seu recurso, a Autarquia federal pugna pela reforma da r. Sentença, sob fundamento de que não restaram preenchidos os requisitos para concessão de aposentadoria por invalidez, ressaltando o equívoco do laudo pericial no tocante à conclusão da incapacidade laborativa de forma permanente. Destaca o requerimento do próprio autor no sentido da cessação do benefício de aposentadoria por invalidez, sob alegação de que está apto ao exercício de atividades laborativas e de que deseja retornar ao mercado de trabalho, inclusive juntando relatório médico particular atestando a capacidade laborativa (fls. 179-181).
Subiram os autos a esta Eg. Corte, sem as contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Do reexame necessário
Conforme Enunciado do Fórum Permanente de Processualistas Civis n° 311: "A regra sobre remessa necessária é aquela vigente ao tempo da prolação da sentença, de modo que a limitação de seu cabimento no CPC não prejudica os reexames estabelecidos no regime do art. 475 CPC/1973" (Grupo: Direito Intertemporal e disposições finais e transitórias).
Pela análise dos autos, considerados o valor do benefício, o tempo decorrido para sua obtenção e a compensação dos valores administrativos já pagos, o direito controvertido foi inferior ao patamar fixado no art. 475, parágrafo 2º, do CPC/1973, de 60 salários mínimos, razão pela qual não há que se falar em remessa necessária. Frise-se, conforme se verá a seguir, que a parte autora faz jus ao benefício de auxílio doença, desde o requerimento administrativo em 09.10.2007 (pesquisa CNIS e Plenus) até 11.01.2010 (fl. 180), quando comprovou estar apto ao trabalho, o que evidencia que não será atingido o valor acima mencionado.
Nestes termos, não conheço da remessa oficial, visto que estão sujeitas ao reexame necessário as sentenças em que o valor da condenação e o direito controvertido excedam a 60 (sessenta) salários mínimos, nos termos do parágrafo 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil de 1973, com a redação dada pela Lei nº 10.352/2001.
Sem preliminares, passo a análise do mérito.
Cumpre, primeiramente, apresentar o embasamento legal relativo aos benefícios previdenciários concedidos em decorrência de incapacidade para o trabalho.
Nos casos em que está configurada uma incapacidade laboral de índole total e permanente, o segurado faz jus à percepção da aposentadoria por invalidez. Trata-se de benefício previsto nos artigos 42 a 47, todos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Além da incapacidade plena e definitiva, os dispositivos em questão exigem o cumprimento de outros requisitos, quais sejam: a) cumprimento da carência mínima de doze meses para obtenção do benefício, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; b) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram.
É possível, outrossim, que a incapacidade verificada seja de índole temporária e/ou parcial, hipóteses em que descabe a concessão da aposentadoria por invalidez, mas permite seja o autor beneficiado com o auxílio-doença (artigos 59 a 62, todos da Lei nº 8.213/1991). A fruição do benefício em questão perdurará enquanto se mantiver referido quadro incapacitante ou até que o segurado seja reabilitado para exercer outra atividade profissional.
Destacados os artigos que disciplinam os benefícios em epígrafe, passo a analisar a questão dos requisitos mencionados, no caso concreto.
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto ou não da decisão que julgou procedente o pedido de restabelecimento de auxílio doença e conversão em aposentadoria por invalidez.
A parte autora requereu a concessão de aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação administrativa do benefício de auxílio doença (02.09.2007 - fl. 19, 54 e CNIS), alegando direito a benefício por incapacidade por ser portador de hérnia inguinal esquerda, ressaltando que não obteve êxito na cirurgia já realizada (24.01.2007), além de outros problemas que comprometem sua capacidade para o trabalho (fls. 02-03). Frise-se que os únicos documentos juntados aos autos (fls. 25-35, 59, 70-71, 74, 77 e 180) informam apenas as patologias hérnia inguinal esquerda, e discopatia degenerativa da coluna lombar, posteriormente, no curso do processo.
Em perícia judicial, realizada por médica da área de clínica geral na data de 24.11.2008 (fls. 132 e 137), restou apurada a mesma doença apontada pela parte autora (hérnia inguinal esquerda), e mais a discopatia degenerativa da coluna lombar (fls. 137-138), havendo a informação de que a hérnia inguinal já tinha sido corrigida cirurgicamente (quesito do autor 3 - fl. 137) e que a discopatia lombar aparentava estar em estágio avançado, sendo necessária a realização de tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética para elucidar melhor tal diagnóstico, contudo havendo afirmação de que tal patologia pode ocasionar quadros álgicos exuberantes capazes de acarretar a incapacidade laborativa (quesito do INSS 4 - fl. 138), apontando ser este o quadro clínico do autor, qual seja, em virtude da dorsalgia intensa o autor teria dificuldades para realizar qualquer atividade laborativa (quesito do INSS 7 - fl. 138), estando incapacitado temporariamente (quesito do INSS 12 - fl. 138), ressaltando a possibilidade de melhora do quadro clínico com tratamento adequado (quesito do INSS 15 - fl. 138).
Entretanto, posteriormente, no corpo do laudo pericial, há informação de outras patologias, tais como, insuficiência vascular crônica de membros inferiores (com amputação de membro inferior esquerdo), hipertensão arterial sistêmica, cardiopatia hipertensiva, nefropatia hipertensiva, artrose de coluna e hiperplasia prostática (quesitos do requerente fls. 67 e 68 e quesitos do juízo fls. 138/139 - fls. 138-140). Vale destacar que a conclusão pericial no sentido da incapacidade total e permanente foi embasada no diagnóstico de insuficiência vascular crônica de membros inferiores (com amputação de membro inferior esquerdo), hipertensão arterial sistêmica, cardiopatia hipertensiva, nefropatia hipertensiva, artrose de coluna e hiperplasia prostática (Conclusão - fls. 140-141), doenças das quais a parte autora não demonstrou ser portador, ressaltando-se o documento de fl. 193, que noticia a validade da CNH da parte autora até 24.09.2012, de categoria D, nada informando sobre deficiência e/ou necessidades especiais, em virtude da ausência de membro inferior esquerdo.
Observa-se que a Autarquia federal assevera que não restaram preenchidos os requisitos para concessão de aposentadoria por invalidez, ressaltando o equívoco do laudo pericial no tocante à conclusão da incapacidade laborativa de forma permanente, e o requerimento do próprio autor às fls. 179-181, no sentido da cessação do benefício de aposentadoria por invalidez, sob alegação de que está apto ao exercício de atividades laborativas e de que deseja retornar ao mercado de trabalho, inclusive juntando relatório médico particular atestando a capacidade laborativa.
De fato, a contradição da prova pericial é evidente em relação à conclusão pericial no sentido da incapacidade laborativa da parte autora ser de forma permanente, embasada em patologias que restaram não demonstrada ser a parte autora portadora. Contudo não se pode invalidar o laudo pericial em sua integralidade, tendo em vista que restou analisado o quadro clínico do autor (fls. 137-138), destacando-se que as folhas indicadas no laudo pericial para resposta aos quesitos apresentados no presente feito (fls. 137-138) correspondem exatamente aos quesitos ofertados pelas partes indicadas no referido laudo (fls. 51 e 99-100), restando inferido que a incapacidade da parte autora é temporária, em virtude da necessidade de tratamento da patologia discopatia degenerativa da coluna lombar que se encontrava em quadro álgico exuberante, aparentando estar em estágio avançado (quesitos do INSS 4 e 12 - fl. 138).
Ademais cabe ressaltar o tempo decorrido entre a realização da perícia judicial, ocorrida em 24.11.2008 (fls. 132 e 137) até a presente data, quase 09 (nove) anos, não podendo o autor ser prejudicado por fato já comprovado à época, e que possivelmente poderia restar não comprovado atualmente em virtude de não possuir documentos contemporâneos ao período controvertido. Frise-se que não é incomum se descartar documentos e/ou exames antigos e que se acredita que não serão mais utilizados.
Nesse ponto, cumpre destacar que embora o laudo pericial não vincule o Juiz, forçoso reconhecer que em matéria de benefício previdenciário por incapacidade a prova pericial assume grande relevância na decisão. E, conforme já explicitado, a perita judicial foi categórica ao afirmar que o quadro clínico da parte autora o leva a total e temporária incapacidade laborativa para o exercício de sua atividade habitual, requisito este essencial para a concessão do benefício de auxílio-doença, mas insuficiente para a aposentadoria por invalidez.
Acrescente-se que a conclusão do laudo pericial no sentido de ser temporária a incapacidade laborativa da parte autora restou corroborada pelo requerimento de cessação da aposentadoria por invalidez pelo autor, em 23.02.2010 (fl. 179), inclusive juntando relatório médico que atesta a capacidade laborativa em 11.01.2010 (fl. 180).
Portanto, deve ser parcialmente reformada a r. sentença, pelas razões já expostas, devendo ser concedido à parte autora o benefício de auxílio doença.
No tocante ao termo inicial do benefício, verifico que a r. sentença fixou a data da concessão do auxílio doença a partir da cessação administrativa (02.09.2007). Todavia, deve ser ressaltado que a r. sentença determinou o referido termo inicial, embasada na conclusão equivocada do laudo pericial, conforme já fundamentado.
Destarte, neste caso peculiar, a despeito do não conhecimento da remessa oficial, e de não haver insurgência de ambas as partes em relação ao referido termo inicial, reputo que deve ser reformado.
Observo que a cessação administrativa do auxílio doença em 02.09.2007 (fl. 19, 54, 80-87) foi decorrente da patologia hérnia inguinal esquerda, bem como que a perita judicial afirmou estar a referida patologia corrigida, não constatando incapacidade laborativa em relação a tal afecção (quesitos do INSS 5 e 6 - fl. 138). Ademais, não houve comprovação, conforme documentos juntados aos autos (fls. 25-35, 59, 70-71, 74 e 77) que após a cessação administrativa do auxílio doença, em 02.09.2007, a incapacidade laborativa decorrente da específica patologia perdurou. Observe-se que o relatório médico com data de 04.07.2007 (fl. 71) informa a patologia da parte autora, a correção com tratamento cirúrgico, noticiando o acompanhamento ambulatorial, bem como a previsão de consulta com o cirurgião Dr. Hélio em 21.07.2007, e ressalta que só após tal consulta médica se poderá verificar a capacidade laborativa do autor, a fim de ser liberado para suas atividades profissionais. Note-se que no relatório médico, com data de 25.07.2007 (fl. 59), o citado Dr. Hélio solicita mais 30 dias de auxílio doença, que corresponde, aproximadamente, à data da cessação administrativa do benefício (02.09.2007). Após tal data não há documento comprobatório da continuidade da alegada incapacidade laborativa, o que corrobora a conclusão do laudo pericial no sentido de que tal patologia já estava corrigida.
Todavia reputo que o benefício de auxílio doença deve ser concedido a partir da data do requerimento administrativo em 09.10.2007 (pesquisa CNIS e Plenus), pois devidamente comprovado o diagnóstico da discopatia degenerativa da coluna lombar em 09.2007 (quesito do INSS 3 - fl. 138), bem como que já aparentava estar em estágio avançado, segundo análise da perita judicial (quesito do INSS 4 - fl. 138), cabendo ressaltar a idade de 62 anos do autor à época da perícia, havendo a constatação da incapacidade laborativa temporária do autor no tocante à referida patologia pela jurisperita, o que corrobora o entendimento de que o indeferimento do referido requerimento administrativo foi indevido. Ressalte-se que o referido benefício deve ser cessado na data de 11.01.2010 (fl. 180), quando a parte autora comprovou estar apto ao trabalho.
Cabe salientar que o posicionamento adotado se harmoniza com o entendimento sedimentado no RESP 1.369.165/SP (representativo de controvérsia), de que, havendo prévio requerimento administrativo, a data de sua formulação deverá, em princípio, ser tomada como termo inicial, como na hipótese destes autos.
Ressalto que os valores eventualmente pagos, na esfera administrativa, após a data acima, serão compensados por ocasião da execução do julgado.
O entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1401560/MT, processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de que os valores recebidos em razão da decisão que antecipou a tutela jurisdicional devem ser devolvidos, se tal decisão for revogada.
Todavia, a despeito do entendimento sedimentado no C. STJ, expresso no Recurso Especial n° 1401560/MT, processado sob o rito dos recursos repetitivos, em virtude das peculiaridades do presente caso, há que se analisar com cuidado a necessidade de que os valores recebidos pela parte autora a título de antecipação dos efeitos da tutela devam ser devolvidos.
Cabe ressaltar a boa fé do segurado que, numa sociedade muitas vezes sem propensão à verdade, decidiu informar que havia recuperado a capacidade laborativa, requerendo a cessação do benefício de aposentadoria por invalidez em 23.02.2010 (fl. 179), inclusive juntando relatório médico que atesta a capacidade laborativa em 11.01.2010 (fl. 180).
Neste ponto, válido salientar que verificando o juízo a quo a mudança da situação fática, demonstrada pelo próprio autor, nada obstava a que expedisse ofício à Autarquia federal comunicando a informação recebida e determinando o cancelamento do benefício à época própria. Tal atitude evitaria prejuízo à parte autora, ressaltando-se que no momento que a parte autora fez o requerimento (23.02.2010 - fl. 179), o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n° 1401560/MT, processado sob o rito dos recursos repetitivos, ainda não era vigente.
Acrescente-se ainda a informação da parte autora, no sentido de que requereu no posto de atendimento do INSS o cancelamento do seu benefício (fl. 179), bem como a ciência pela Autarquia ré do requerimento de cancelamento do benefício de aposentadoria por invalidez pelo autor (fls. 183, 191-192 e 197). Frise-se que tanto a Autarquia federal quanto seu procurador, que tem a prerrogativa da sua defesa, não deveriam se manter inertes.
É de se ressaltar que o Poder Judiciário não pode aceitar que as partes tenham seus direitos suprimidos. O processo civil moderno reclama uma atividade mais presente e intensa do juiz. Uma sociedade que espera justiça não pode se contentar com meros indícios, quando é possível chegar a uma versão mais próxima da justiça.
Com efeito, o processo tem uma finalidade de caráter público, consistente em garantir a efetividade integral do direito. O processo é um instrumento de produção jurídica e uma forma incessante de realização do direito, de maneira que seria inadequado admitir que ele gere injustiças, quando há meios para a busca da verdadeira justiça.
Desta forma concretiza-se o principio de que a demora do processo não pode prejudicar o autor que tem razão e, mais do que isso, o tempo do processo não pode ser um ônus suportado unicamente pelo autor.
O pagamento originado de decisão devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas, e mediante o permissivo do art. 273 do CPC/1973, tem presunção de legitimidade e assume contornos de definitividade no sentir do segurado, dada a finalidade a que se destina de prover os meios de subsistência. Portanto, no presente caso, evidenciada a boa-fé da parte autora, não pode ficar compelida à contingência de devolver valores que já foram consumidos, já com 70 anos de idade, em virtude da não análise do seu requerimento no momento oportuno.
Posto isto NÃO CONHEÇO da Remessa Oficial e, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, voto por DAR PROVIMENTO à Apelação Autárquica, nos termos expendidos na fundamentação.
É o voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 24/05/2017 11:31:22 |