Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5016036-58.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/06/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. TENSÃO ELÉTRICA. PERICULOSIDADE. EXPOSIÇÃO HABITUAL E
PERMANENTE A AGENTES NOCIVOS NÃO DEMONSTRADA. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a tensão elétrica
superiores a 250 volts em parte dos períodos.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Possibilidade do reconhecimento como especial, do tempo de serviço no qual o segurado ficou
exposto a periculosidade, por ser meramente exemplificativo o rol de agentes nocivos constante
do Decreto n. 2.172/1997. Precedentes do STJ.
- A exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela
eletricidade. Precedentes.
- Em relação aos demais períodos, não demonstrada a exposição habitual e permanente a agente
nocivo.
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, por
estarem ausentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da
Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Apelações da parte autora e do INSS desprovidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5016036-58.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ELENICE GONCALVES MARTINS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: VIRGINIA SANTOS NASCIMENTO - SP294327-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELENICE GONCALVES
MARTINS
Advogado do(a) APELADO: VIRGINIA SANTOS NASCIMENTO - SP294327-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5016036-58.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ELENICE GONCALVES MARTINS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
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MARTINS
Advogado do(a) APELADO: VIRGINIA SANTOS NASCIMENTO - SP294327-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de
atividade especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, nos termos do artigo 487, inciso I, do
Código de Processo Civil.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, no qual aduz a impossibilidade do
enquadramento efetuado. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Não resignada, a parte autora também interpôs recurso de apelação, no qual pugna pela
procedência integral dos pedidos contidos na exordial.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5016036-58.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ELENICE GONCALVES MARTINS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: VIRGINIA SANTOS NASCIMENTO - SP294327-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELENICE GONCALVES
MARTINS
Advogado do(a) APELADO: VIRGINIA SANTOS NASCIMENTO - SP294327-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: os recursos atendem aos pressupostos
de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
A apresentação do PPP, instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n. 9.528/1997, dispensa a realização
de laudo técnico ambiental para fins de comprovação da especialidade pretendida, desde que
demonstrado que seu preenchimento foi efetuado conforme as normas que o regulamentam,
como é o caso dos autos.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Neste caso, em relação ao interstício de 19/05/1986 a 23/09/1991, a parte autora logrou
demonstrar, via PPP, exposição habitual e permanente à tensão elétrica superior a 250 volts, bem
como à periculosidade decorrente do risco à integridade física do segurado.
Sobre a periculosidade, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o REsp n. 1.306.113,
sob o regime do artigo 543-C do CPC/1973, concluiu, ao analisar questão relativa à tensão
elétrica superior a 250 volts, pela possibilidade do enquadramento especial, mesmo para período
posterior a 5/3/1997, desde que amparado em laudo pericial, por ser meramente exemplificativo o
rol de agentes nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997 (STJ, REsp n. 1.306.113/SC, Rel.
Herman Benjamin, Primeira Seção, J: 14/11/2012, DJe: 7/3/2013).
Cumpre observar, ainda, que a exposição de forma intermitente à tensão elétrica não
descaracteriza o risco produzido pela eletricidade, uma vez que o perigo existe tanto para aquele
que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, por diversas
vezes, ainda que não de forma permanente, tem contato com a eletricidade (STJ, 6º Turma, REsp
658016, Rel. Hamilton Carvalhido, DJU 21-11-2005).
Ademais, diante das circunstâncias da prestação laboral descritas no formulário, conclui-se que,
na hipótese, o uso de EPI não elimina os riscos à integridade física do segurado.
Quanto ao intervalo de 01/08/2003 a 22/04/2008, consta do PPP que a parte autora exercia a
atividade de técnica eletrônica no setor operacional da empresa empregadora. Assim, ainda que
o os formulários anotem a exposição a “agentes químicos”, é certo que a parte autora não esteve
exposto de forma habitual e permanente ao fator de risco indicado no formulário, que, inclusive, é
expresso no sentido de que a exposição era intermitente e em baixa concentração.
Desse modo, à míngua de comprovação da alegada exposição ao agente agressivo de forma
habitual e permanente, é de rigor a manutenção da improcedência do pedido de enquadramento.
Por fim, no tocante aos interstícios de 05/05/2008 a 30/09/2011, 01/10/2011 a 23/01/2013, o PPP
coligido aos autos não indica a exposição a nenhum fator de risco no desempenho das atividades
de técnico de eletrônica e supervisor de manutenção.
Com efeito, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a
peça inicial, qual seja: carrear prova documental como formulários padrão, laudo técnico
individualizado e PPP - documentos aptos a individualizar a situação fática da autora e comprovar
a especificidade ensejadora do reconhecimento de possível agressividade, inviabilizando,
portanto, o enquadramento pretendido.
Destarte, deve ser mantido o reconhecimento do caráter especial das atividades executadas
somente no interregno de 19/05/1986 a 23/09/1991.
Nessas circunstâncias, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição,
pois, não obstante o reconhecimento de parte dos períodos requeridos, não se faz presente o
requisito temporal na data da EC n. 20/1998, consoante o artigo 52 da Lei n. 8.213/1991, e nem
na data do requerimento administrativo (DER 02/06/2016), nos termos do artigo 201, § 7º, inciso I,
da Constituição Federal, com a redação dada pela EC n. 20/1998.
Diante do exposto, nego provimento às apelações da parte autora e do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. TENSÃO ELÉTRICA. PERICULOSIDADE. EXPOSIÇÃO HABITUAL E
PERMANENTE A AGENTES NOCIVOS NÃO DEMONSTRADA. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a tensão elétrica
superiores a 250 volts em parte dos períodos.
- Possibilidade do reconhecimento como especial, do tempo de serviço no qual o segurado ficou
exposto a periculosidade, por ser meramente exemplificativo o rol de agentes nocivos constante
do Decreto n. 2.172/1997. Precedentes do STJ.
- A exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela
eletricidade. Precedentes.
- Em relação aos demais períodos, não demonstrada a exposição habitual e permanente a agente
nocivo.
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, por
estarem ausentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da
Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Apelações da parte autora e do INSS desprovidas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento às apelações da parte autora e do INSS, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA