D.E. Publicado em 16/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação autárquica e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012612-91.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço rural e insalubre, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença, integralizada por embargos de declaração, acolheu o pedido para: (i) reconhecer o tempo de serviço rural de 15/2/1965 a 14/1/1973, em que a parte autora alega ter laborado como "oleiro" em propriedade agrícola de sua família; (ii) reconhecer como especiais as atividades desempenhadas pelo requerente de 1º/5/1980 a 31/7/1980, de 20/4/1981 a 31/1/1983, de 1º/2/1983 a 31/5/1984, de 1º/6/1984 a 1º/12/1986, de 2/2/1987 a 12/4/1988, de 10/5/1989 a 1º/3/1993, de 1º/9/1993 a 10/5/1994, de 1º/12/1994 a 2/5/1995, de 1º/3/1996 a 14/4/1996 e de 14/7/1996 a 14/1/1997; (iii) conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data da reafirmação da DER (17/5/2014); (iv) fixar os consectários.
Inconformado, o INSS interpôs recurso de apelação, no qual sustenta a impossibilidade do reconhecimento do período em que o autor atuou como oleiro, bem como dos enquadramentos efetuados. Requer seja o pedido julgado improcedente.
Com as contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso vertente, a parte autora alega ter trabalhado na qualidade de "oleiro", de 15/2/1965 a 14/1/1973.
Para comprovar o alegado labor rural, foram trazidos aos autos: (i) Certificado de dispensa de incorporação (1976); (ii) Correspondência, na qual o autor figura como o destinatário e cujo endereço é de área rural; (iii) Atestado do delegado de polícia, no qual consta que o autor vivia em área rural; (iv) Certidão fornecida pelo Oficial de Registro de Imóveis, que atesta a existência de propriedade rural da família do autor.
Em que pese os testemunhos colhidos terem sido categóricos ao afirmar que o autor auxiliava a família no exercício da função de oleiro e apesar de a olaria funcionar na propriedade campesina da família, entendo que o trabalho não é rural e sim urbano, com atribuições diversas da agropastoril.
Vide ocupação de oleiro descrita na Classificação Brasileira de Ocupações do Ministério do Trabalho e Emprego:
Ademais, cabe esclarecer que a jurisprudência é pacífica no sentido de que trabalhador em olaria (oleiro) não possui natureza rural. Nesse sentido, os seguintes julgados:
Em decorrência, concluo que não restou demonstrado o trabalho rural alegado.
Do enquadramento e da conversão de período especial em comum
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (artigo 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o STJ, ao julgar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos: de 1º/5/1980 a 31/7/1980, de 20/4/1981 a 31/1/1983, de 1º/2/1983 a 31/5/1984, de 1º/6/1984 a 1º/12/1986, de 2/2/1987 a 12/4/1988, de 10/5/1989 a 1º/3/1993, de 1º/9/1993 a 10/5/1994, de 1º/12/1994 a 2/5/1995, de 1º/3/1996 a 14/4/1996 e de 14/7/1996 a 14/1/1997.
Quanto aos períodos de 1º/5/1980 a 31/7/1980, de 20/4/1981 a 31/1/1983, de 1º/2/1983 a 31/5/1984, de 1º/6/1984 a 1º/12/1986, de 2/2/1987 a 12/4/1988, de 10/5/1989 a 1º/3/1993, de 1º/12/1994 a 2/5/1995, de 1º/3/1996 a 14/4/1996 e de 14/7/1996 a 14/1/1997, foi produzido laudo técnico pericial capaz de comprovar a especialidade pretendida, conforme descrito a seguir.
Em relação aos períodos mencionados anteriores a 28/4/1995, consta da perícia apresentada que a parte autora laborava como "motorista de caminhão", fato que viabiliza, nos termos dos códigos 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/79 (TRF 3ª R; AC n. 2001.03.99.041797-0/SP; 9ª Turma; Rel. Des. Federal Marisa Santos; julgado em 24/11/2008; DJU 11/02/2009, p. 1304).
No que tange aos períodos posteriores a 28/4/1995, consta do referido laudo que a parte autora sofria exposição habitual e permanente ao agente deletério ruído em níveis superiores aos previstos pela norma em comento.
Já no tocante ao período de 1º/9/1993 a 10/5/1994, por sua vez, depreende-se das anotações na CTPS do autor o exercício da função de "operador de pá carregadeira", atividade esta que se equipara à de "motorista de veículos pesados", para fins de reconhecimento da natureza especial do labor até 5/3/1997 - por aplicação analógica do código 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e do código 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/79.
Neste sentido, trago à colação os seguintes julgados (g. n.):
Desta forma, devem ser enquadrados como exercidos em condições especiais os períodos de 1º/5/1980 a 31/7/1980, de 20/4/1981 a 31/1/1983, de 1º/2/1983 a 31/5/1984, de 1º/6/1984 a 1º/12/1986, de 2/2/1987 a 12/4/1988, de 10/5/1989 a 1º/3/1993, de 1º/9/1993 a 10/5/1994, de 1º/12/1994 a 2/5/1995, de 1º/3/1996 a 14/4/1996 e de 14/7/1996 a 14/1/1997, arrolados na inicial.
Mantidos, portanto, os enquadramentos efetuados pela r. sentença.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, somados os interstícios especiais ora enquadrados (devidamente controvertidos) aos lapsos incontroversos, a parte autora não possuía tempo suficiente para a aposentadoria por tempo de contribuição, na data da reafirmação da DER (17/5/2014), conforme planilha anexa.
Em decorrência concluo pela impossibilidade da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto ausente o requisito temporal.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Todavia, em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação do INSS e lhe dou parcial provimento para, nos termos da fundamentação, excluir o reconhecimento do labor desempenhado de 15/2/1965 a 14/1/1973, bem como excluir da condenação a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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Data e Hora: | 06/08/2018 15:28:28 |