D.E. Publicado em 22/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos interpostos pelo autor e INSS, apenas para reconhecer a atividade rural no período de 10.05.1978 a 01.06.1978 e a atividade especial desempenhada pelo autor no período de 14.06.1978 a 28.04.1995, que deve ser convertido em tempo comum, pelo fator de conversão de 1,40, bem como conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo, com os devidos consectários legais, e para o período de atividade rural sem registro de 01.01.1973 a 09.05.1978, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, conforme art. 485, IV, do CPC, sendo que o Des. Federal Toru Yamamoto ressalvou seu entendimento em relação à extinção do processo sem julgamento de mérito.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023341-50.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e por JUSCELINO MOREIRA, contra a sentença de fls. 101/107, que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, no seguinte sentido:
O autor requer o reconhecimento do labor rural e especial exercido nos períodos de 01.11.1973 a 13.06.1978 e 14.06.1978 a 29.04.1995 e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo, bem como que a autarquia arque com o ônus da sucumbência (fls. 113/125).
O INSS, em síntese, alega que não restou comprovado o labor rurícola do período de 01.11.1973 a 13.06.1978, uma vez que aludido labor desenvolvido antes da edição da Lei nº 8.213/91, pelo que não deve ser computado para efeito de carência, e que se faz necessária a indenização de todo o período, para que seja computado para fins de aposentadoria. Alega, ainda, que não há nos autos prova material para aludido período, bem como pela impossibilidade de cômputo de labor para menores de 14 anos. Subsidiariamente, entende que os juros e correção monetária devem ser aplicados nos termos da Lei 10.960/2009 (fls. 128/140).
Com contrarrazões da parte autora (fls. 145/148), os autos subiram a esta Corte Regional.
É o relatório.
VOTO
EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL DRA. INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Recebo as apelações interpostas sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e diante da ausência, nos autos, da data da intimação pessoal do procurador do INSS, bem como impugnação quanto à tempestividade pela parte autora em suas contrarrazões, consideram-se tempestivos os recursos, sendo possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO -
Como é sabido, pela regra anterior à Emenda Constitucional 20, de 16.12.98 (EC 20/98), a aposentadoria por tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição) poderia ser concedida na forma proporcional, ao segurado que completasse 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, restando assegurado o direito adquirido, para aquele que tivesse implementado todos os requisitos anteriormente a vigência da referida Emenda (Lei 8.213/91, art. 52).
Após a EC 20/98, aquele que pretende se aposentar com proventos proporcionais impõe-se o cumprimento das seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da Emenda; contar com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 anos, homem, e 25 anos, mulher, de tempo de serviço; e adicionar o "pedágio" de 40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.
Vale lembrar que, para os segurados filiados ao RGPS posteriormente ao advento da EC/98, não há mais que se falar em aposentadoria proporcional, sendo extinto tal instituto.
De outro lado, comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei 8.213/91, art. 53, I e II).
Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar, também, o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Por fim, insta salientar que o art. 4º, da referida Emenda estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO RURAL -
Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessária a comprovação do recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região, 2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região, 2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região, 2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015).
No tocante ao segurado especial, o artigo 39, inciso I, da Lei 8213/1991, garantiu ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente.
No entanto, com relação ao período posterior à vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Vale lembrar, que dentre os documentos admitidos pelo Eg. STJ estão aqueles que atestam a condição de rurícola do cônjuge, cuja qualificação pode estender-se a esposa, desde que a continuação da atividade rural seja comprovada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp nº 272.248/MG, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/04/2013; AgRg no REsp nº 1342162/CE, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 27/09/2013).
Em reforço, a Súmula nº 6 da TNU: "A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola".
E atendendo as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Frisa-se, ademais, que a C. 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, também representativo de controvérsia, admite, inclusive, o tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que, claro, corroborado por prova testemunhal idônea. Nesse sentido, precedentes desta E. 7ª Turma (AC 2013.03.99.020629-8/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018).
Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do menor.
Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário, especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE 906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
Nesse sentido os precedentes desta E. 7ª Turma: AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017; AC 2003.61.25.001445-4, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018.
DO TRABALHO RURAL SEM REGISTRO - CASO CONCRETO
O autor, nascido aos 11/09/1960, alega que exerceu atividade rural, sem registro, de 01.11.1973 a 13.06.1978, na Fazenda Santa Teresa.
No que diz respeito ao trabalho rural sem registro (01.11.1973 a 13.06.1978), para comprovar o alegado, o autor juntou aos autos os seguintes documentos:
- Título eleitoral emitido em 05.01.1979, com a menção da atividade do autor de lavrador, na Fazenda Santo Antônio da Alegria (fl. 33);
- Certificado de Dispensa de Incorporação, datado de 22.06.1979, com menção da profissão do autor de lavrador e residência na Fazenda Santo Antônio da Alegria, em Mococa/SP (fl. 34);
- Entrevista rural do autor perante à autarquia federal, realizada na data de 15.04.2014 (fls. 45/46);
- CTPS contendo os seguintes vínculos: 10.05.1978 a 01.06.1978 (diarista agrícola na Fazenda Santa Tereza), de 14.06.1978 a 13.12.2001 (serviços gerais agropecuários na Fazenda Santo Antônio da Alegria); 20.04.2004 a 11.11.2004 (safrista); 03.04.2006 a 05.10.2006 (trabalhador rural - agropecuária); 02.04.2007 a 03.08.2007, 06.02.2008 a 06.05.2009, 23.09.2009 a 18.06.2010, 09.08.2010 a 15.10.2011 e 12.01.2012 a 10.04.2012 (trabalhador rural).
Foram ouvidas duas testemunhas (mídia audiovisual à fl. 100).
Francisco Vitor Ribeiro afirmou que trabalhou com o autor na Fazenda Santo Antônio da Alegria, quando foram devidamente registrados, entre o período de 1978 a 2002, e que realizavam todos os serviços rurais.
Pedro Tadeu Bacin relatou ter trabalhado com o autor na Fazenda Santa Tereza, por seis ou sete anos, após o ano de 1974, sempre nas lavouras de cereais ou cebola.
Diante das provas produzidas, em que pesem os depoimentos de Pedro Tadeu Bacin, entendo que a atividade rural desempenhada pelo autor sem registro, na Fazenda Santa Teresa, não restou suficientemente comprovada para todo o período que pretende comprovar (de 01.11.1973 a 13.06.1978).
O único documento colacionado pelo autor, referente ao labor na Fazenda Santa Tereza, é o registro em CTPS, no período de 10.05.1978 a 01.06.1978.
Os demais documentos estão fora do período que pretende comprovar (de 1979 a 2012) e se referem a uma época em que já era trabalhador rural, já devidamente registrado, em outras fazendas.
Por outro lado, a Declaração de Exercício de Atividade Rural do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mococa não possui data de emissão, bem como se encontra incompleta e apócrifa (fl. 32).
Enfim, embora existam indícios de que o autor era lavrador na época, entendo que a prova documental é insuficiente para dar um mínimo de segurança e comprovar que o autor era empregado rural da referida propriedade rural, por todo período de 1973 a 1978. Pensar ao contrário seria aceitar a comprovação da referida atividade com base exclusivamente em prova testemunhal, o que não é possível.
Por outro lado, havendo registro em CTPS, reconheço o período ali existente, de 10.05.1978 a 01.06.1978 (fl. 28). Isto porque as anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso o contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.
Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e Previdência social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conte no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)."
Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que infirme as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser considerados como tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das contribuições previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos termos do artigo 30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1344300 - 0005016-55.2005.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017).
Por outro lado, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural por todo o período pleiteado, seria o caso de se julgar improcedente o pedido, referente ao período de 01.11.1973 a 09.05.1978, uma vez que parte autora não se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
Entretanto, adoto o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973, no sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito propiciando ao autor intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL , julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Assim, com relação ao período de atividade rural sem registro, de 01.11.1973 a 09.05.1978, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial . Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
DAS ATIVIDADES ESPECIAIS - CASO CONCRETO
A r. sentença não reconheceu as atividades alegadas como especiais pelo autor, nos períodos compreendidos entre 01.11.1973 a 13.06.1978 e 14.06.1978 a 29.04.1995.
O autor postula o reconhecimento das atividades especiais desenvolvidas no período.
Vejamos.
a) de 01.11.1973 a 09.05.1978 - Não há nos autos quaisquer documentos que embasem a atividade rurícola do autor em todo o período, muito menos de que foi exercida em condições especiais.
b) de 10.05.1978 a 01.06.1978 - consta da CTPS do autor, que nesse período trabalhou na Fazenda Santa Tereza como trabalhador rural agrícola, sem vinculação urbana.
Quanto ao enquadramento do labor insalubre em decorrência da profissão, destaco que por força da Lei 9.032/95, ficou assentado que o enquadramento de atividade especial em decorrência da profissão somente é possível até a sua edição, ou seja, até 28.04.1995.
A atividade do trabalhador da agropecuária era admitida como especial até 28.04.1995, por enquadramento no item 2.2.1 do Decreto 53.831/64.
Por outro lado, a atividade de trabalhador rural, desde que o empregado possua vinculação urbana, também é passível de enquadramento no item 2.2.1 do Decreto 53.831/64, fato este reforçado pelo Enunciado nº 33 do Conselho de Recursos da Previdência Social, publicado no Diário Oficial da União em 29 de junho de 2012:
Se a própria autarquia federal admite a atividade do rurícola, vinculado ao regime urbano, não há porque o Judiciário valer-se de regras mais gravosas ao segurado para o reconhecimento da atividade especial (como é o caso da exigência de conjugar as atividades da lavoura com a pecuária).
Nesse sentido, julgado pedido de uniformização da Turma Nacional de Uniformização:
Feitas tais considerações, observo que no período de 10.05.1978 a 01.06.1978, o autor foi registrado como trabalhador rural da Fazenda Santa Tereza, não havendo qualquer menção em sua CTPS que fosse vinculado ao regime urbano. Por outro lado, não há nos autos formulários, PPP ou laudo técnico a embasar que a atividade no período deveras foi desenvolvida em condições especiais.
Assim, não reconheço a atividade especial requerida pelo autor, no período acima mencionado.
c) de 14.06.1978 a 28.04.1995 - consta da CTPS do autor, que nesse período trabalhou na Fazenda Santo Antônio da Alegria, na função de serviços gerais agropecuários (fl. 28), atividade admitida explicitamente como especial no item 2.2.1 do Decreto 53.831, de 25 de março de 1964.
Convertendo-se o tempo especial reconhecido em tempo comum, pelo fator de conversão de 1,40, chega-se a um acréscimo de 06 anos e 09 meses.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Considerando o tempo de contribuição incontroverso fixado na data do requerimento administrativo - 14.03.2014 (28 anos, 04 meses e 02 dias - fls. 48/49) - somado aos acréscimos decorrentes do reconhecimento de labor em CTPS (22 dias) e da conversão do tempo especial em comum (06 anos e 09 meses), relativo ao período reconhecido como especial (14.06.1978 a 28.04.1995), o autor reúne 35 anos, 01 mês e 24 dias, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (consoante planilha que ora determino a juntada).
Assim, na data do requerimento administrativo, 14.03.2014 (fl. 23), já estavam implementados os requisitos para a concessão do benefício, razão pela qual o termo inicial deve ser fixado na data do pedido administrativo, momento em que o INSS tomou ciência da pretensão da parte autora.
CONSECTÁRIOS
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E..
Sucumbente em maior parte o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei 9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, dou parcial provimento aos recursos interpostos pelo autor e INSS, apenas para reconhecer a atividade rural no período de 10.05.1978 a 01.06.1978 e a atividade especial desempenhada pelo autor somente no período de 14.06.1978 a 28.04.1995, que deve ser convertido em tempo comum, pelo fator de conversão de 1,40, bem como conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo, com os devidos consectários legais, e para o período de atividade rural sem registro de 01.01.1973 a 09.05.1978, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC, nos termos expendidos acima.
É o voto.
Desembargadora Federal
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