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APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A COMPROVAÇÃO DO PERÍODO RURAL. AUSÊNCIA DE T...

Data da publicação: 24/12/2024, 16:25:24

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A COMPROVAÇÃO DO PERÍODO RURAL. AUSÊNCIA DE TEMPO NECESSÁRIO PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA. AVERBAÇÃO DO PERÍODO DE TRABALHO RURAL. 1 - É controversa na jurisprudência a possibilidade de o trabalhador, urbano ou rural, poder computar tempo de serviço prestado quando ainda criança, antes de implementados doze anos de idade. 2 - Nesse sentido, tanto a Constituição Federal, quanto a legislação pátria infraconstitucional, em especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.079/90 – e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, resguardam os direitos dos menores, com o escopo de sua proteção como indivíduo hipossuficiente e ainda em formação. 3 - Não parece razoável que ao infante seja imposta dupla punição: a perda da plenitude de sua infância, tendo que trabalhar enquanto deveria estar brincando e estudando, e, por outro lado, não poder ter reconhecido o direito de computar o período trabalhado para fins previdenciários. 4 - Com maior razão, ao trabalho árduo e penoso do infante, como ocorre com a lida rural, deve a lei ampliar ainda mais a proteção das crianças e dos adolescentes, tendo em vista o elevado desgaste físico, mental e emocional gerado a essas pessoas nessa espécie laborativa, com manifesto ferimento a preceitos fundamentais, como o da dignidade humana e o direito da criança a vivenciar com plenitude a sua infância. 5 - Compartilhando dos entendimentos acima citados, vislumbro a possibilidade de reconhecimento do labor rural anteriormente aos 12 anos de idade. 6 - Documentos trazidos aos autos consubstanciam início razoável de prova material de que o autor era lavrador no período reivindicado. 7 - É entendimento pacífico no STJ que os documentos apresentados em nome dos pais ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constitui início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos. (AG Nº 463855, Min. Paulo Galotti, sexta turma, 09/03/03). 8 - A prova testemunhal é harmônica e coesa no sentido de que o autor trabalhava como rurícola com os pais, em regime de economia familiar, no período. 9 - Comprovado o labor rural do autor no período de 12/03/1980 a 11/03/1982, tendo restado incontroverso o período de trabalho rural compreendido entre 12/03/1982 e 30/09/1989 que não foi objeto de recurso. 10 - No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, aplica-se a regra inserta no § 2º do artigo 55, com a ressalva de que o tempo de serviço rural não conta para efeito de carência, para fins de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. 11 - O autor não perfaz o tempo necessário para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. 12 - Averbação do período de trabalho rural de 12/03/1980 a 11/03/1982, restando mantida, no mais, a r. sentença. 13 - Apelação da parte autora parcialmente provida. (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5056819-80.2024.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 15/08/2024, DJEN DATA: 15/08/2024)


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

8ª Turma


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5056819-80.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: SERGIO MARCONATO

Advogado do(a) APELANTE: ROSEMARIE GAZETTA MARCONATO - SP139831-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5056819-80.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: SERGIO MARCONATO

Advogado do(a) APELANTE: ROSEMARIE GAZETTA MARCONATO - SP139831-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

  

R E L A T Ó R I O

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando o reconhecimento do tempo de labor rural e especial, com a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.

A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer, em favor do autor, o direito ao cômputo do tempo de serviço laborado como rurícola no período de 12/03/1982 a 30/09/1989, restando improcedentes os demais pedidos. Condenou o autor ao pagamento dos honorários da autarquia ré, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa.

A parte autora interpôs recurso de apelação requerendo o reconhecimento do tempo rural, sem registro em CTPS, laborado em regime de economia familiar, de  12/03/1980 a 11/03/1982, visto que o STJ já reconheceu o trabalho rural antes dos 12 anos de idade. Requer seja reconhecido todo o período rural requerido, concedendo–lhe o benefício postulado na inicial.

O INSS não apresentou contrarrazões.

Os autos voltaram conclusos.

É o relatório.

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LOUISE FILGUEIRAS:

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando o reconhecimento do tempo de labor rural e especial, com a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.

A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer, em favor do autor, o direito ao cômputo do tempo de serviço laborado como rurícola no período de 12/03/1982 a 30/09/1989, ao fundamento de impossibilidade de reconhecimento do labor rural anteriormente aos 12 anos de idade, restando improcedentes os demais pedidos. Condenou o autor ao pagamento dos honorários da autarquia ré, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa.

A parte autora interpôs recurso de apelação, apenas requerendo o reconhecimento do tempo rural, sem registro em CTPS, laborado em regime de economia familiar, desde os 10 anos de idade (nascida em 12/03/1970), no período de 12/03/1980 a 11/03/1982, visto que o STJ já reconheceu o trabalho rural antes dos 12 anos de idade. Requereu ainda, seja reconhecido todo o período rural deduzido na inicial, concedendo–lhe o benefício postulado na demanda.

O Exmo. Desembargador Federal relator negou provimento à apelação da autora e manteve a sentença, ao entendimento de que “a respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, este não deve ser reconhecido em período anterior aos 12 anos de idade, uma vez que, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, principalmente por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante” e trouxe em seu voto jurisprudência a embasar o seu convencimento.

Destaque-se que a sentença reconheceu início de prova material do labor rurícola exercido pelo autor no período por ele almejado, o que foi corroborado pelas testemunhas ouvidas na instrução processual, porém, consignou a impossibilidade do reconhecimento do trabalho rural anterior aos 12 anos de idade, em decisão devidamente fundamentada.

Nesse passo, com a devida vênia do douto relator, divirjo apenas nesse ponto.

A respeito, trago as seguintes considerações:

Do trabalho prestado pelo menor de 12 anos

É controversa na jurisprudência a possibilidade de o trabalhador, urbano ou rural, poder computar tempo de serviço prestado quando ainda criança, antes de implementados doze anos de idade.

Nesse sentido, tanto a Constituição Federal, quanto a legislação pátria infraconstitucional, em especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.079/90 – e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, resguardam os direitos dos menores, com o escopo de sua proteção como indivíduo hipossuficiente e ainda em formação.

De acordo com o IBGE, são inúmeras as situações de trabalho infantil ainda registradas no Brasil, não se limitando apenas ao trabalhador rural, devendo ser destacado também crianças colocadas por seus próprios pais em atividades domésticas, agricultura, pesca, silvicultura, e até mesmo em atividades urbanas, tais como, venda de bens de consumo, meio artístico e televisivo, entre várias outras atividades.

Dessa forma, melhor refletindo sobre o tema, e, alterando posicionamento anterior, não me parece razoável que ao infante seja imposta dupla punição: a perda da plenitude de sua infância, tendo que trabalhar enquanto deveria estar brincando e estudando, e, por outro lado, não poder ter reconhecido o direito de computar o período trabalhado para fins previdenciários.

Assim, com maior razão, ao trabalho árduo e penoso do infante, como ocorre com a lida rural, deve a lei ampliar ainda mais a proteção das crianças e dos adolescentes, tendo em vista o elevado desgaste físico, mental e emocional gerado a essas pessoas nessa espécie laborativa, com manifesto ferimento a preceitos fundamentais, como o da dignidade humana e o direito da criança a vivenciar com plenitude a sua infância.

Sobre o tema, cito precedente do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, que, ao julgar ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, trouxe à baila dados estatísticos importantes, reveladores da grande exploração do trabalho infantil ainda vigente no Brasil, especialmente, no meio rural: 

“(...) 11. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) no ano de 2014, o trabalho infantil no Brasil cresceu muito em comparação com os anos anteriores, quando estava em baixa. 12. E, de acordo com o IBGE, no ano de 2014 havia 554 mil crianças de 5 a 13 anos trabalhando. Na atividade agrícola, nesta mesma faixa etária, no ano de 2013 trabalhavam 325 mil crianças, enquanto no ano de 2014 passou a ser de 344 mil, um aumento de 5,8%. Já no ano de 2015, segundo o PNAD (IBGE) houve novamente uma diminuição de 19,8%. No entanto, constatou-se o aumento de 12,3% do 'trabalho infantil na faixa entre 5 a 9 anos'. 13. O Ministério do Trabalho e Previdência Social – MPTS noticia que em mais de sete mil ações fiscais realizadas no ano de 2015, foram encontradas 7.200 crianças em situação de trabalho irregular. Dos 7.200 casos, 32 crianças tinham entre 0 e 4 – todas encontradas no Amazonas. Outras 105 estavam na faixa etária de 5 a 9 anos e foram encontradas, também, no Amazonas (62) e nos estados de Pernambuco (13), Pará (7) Roraima (5), Acre (4) Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul (3 em cada Estado), Bahia e Sergipe (2 em cada Estado). Na Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia e Tocantins encontrou-se uma criança em cada Estado com essa faixa etária de 5 a 9 anos. 14. Insta anotar que a realidade fática revela a existência de trabalho artístico e publicitário com nítido objetivo econômico e comercial realizados com a autorização dos pais, com a anuência do Poder Judiciário, de crianças recém nascidas, outras com 01, 2, 3, 4 e 5 anos de idade. Aliás, é possível a proteção previdenciária nesses casos? No caso de eventual ocorrência de algum acidente relacionado a esse tipo de trabalho, a criança teria direito a algum benefício previdenciário, tal como o auxílio acidente? Apelação do MPF provida” (APELAÇÃO CÍVEL 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, Rel. HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR. DJe 13.4.2018).

Cito, ademais, precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, o último deles julgado em junho de 2020, “verbis”: 

AGRAVO INTERNO. PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INOVAÇÃO NO ÂMBITO DO AGRAVO INTERNO. IMPOSSIBILIDADE. RURÍCOLA. LABOR DE MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. É assente nesta Corte que a via especial não se presta à apreciação de alegação de ofensa a dispositivo da Constituição da República, ainda que para fins de prequestionamento, não sendo omisso o julgado que silencia acerca da questão. 2. Impossível o conhecimento de questão não suscitada nas razões do recurso especial, no âmbito do agravo interno, sob pena de inovação recursal. 3. É firme neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido da possibilidade de cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade. 4. Agravo ao qual se nega provimento (AgRg no REsp. 1.150.829/SP, Rel. MinCELSO LIMONGI, DJe 4.10.2010) – grifei.

AGRAVO INTERNO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL. MENOR DE 12 ANOS. CÔMPUTO. POSSIBILIDADE. INOVAÇÃO RECURSAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. 1. É inadmissível, no agravo interno, a apreciação de questão não suscitada anteriormente, como, no caso, a incidência do disposto nos artigos 7°, XXXIV, e 201, todos da Constituição da República. 2. A análise de suposta ofensa a dispositivos constitucionais compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, inciso III, da Constituição da República, sendo defeso o seu exame em âmbito de recurso especial. 3. Consoante entendimento firmado neste Superior Tribunal de Justiça, o exercício da atividade empregatícia rurícola, abrangida pela previdência social, por menor de 12 (doze) anos, impõe-se o cômputo, para efeitos securitários, desse tempo de serviço. 4. Agravo a se nega provimento (AgRg no REsp. 1.074.722/SP, Rel. Min. JANE SILVA, DJe 17.11.2008).

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991 SEM O RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS DE IDADE. INDISPENSABILIDADE DA MAIS AMPLA PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES. POSSIBILIDADE DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO PRESTADO PELO MENOR, ANTES DE ATINGIR A IDADE MÍNIMA PARA INGRESSO NO MERCADO DE TRABALHO. EXCEPCIONAL PREVALÊNCIA DA REALIDADE FACTUAL DIANTE DE REGRAS POSITIVADAS PROIBITIVAS DO TRABALHO DO INFANTE. ENTENDIMENTO ALINHADO À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA TNU. ATIVIDADE CAMPESINA DEVIDAMENTE COMPROVADA. AGRAVO INTERNO DO SEGURADO PROVIDO.

1. Cinge-se a controvérsia em reconhecer a excepcional possibilidade de cômputo do labor de menor de 12 anos de idade, para fins previdenciários. Assim, dada a natureza da questão envolvida, deve a análise juducial da demanda ser realizada sob a influência do pensamento garantístico, de modo a que o julgamento da causa reflita e espelhe o entendimento jurídico que confere maior proteção e mais eficaz tutela dos direitos subjetivos dos hipossuficientes.

2. Abono da legislação infraconstitucional que impõe o limite mínimo de 16 anos de idade para a inscrição no RGPS, no intuito de evitar a exploração do trabalho da criança e do adolescente, ancorado no art. 7o., XXXIII da Constituição Federal. Entretanto, essa imposição etária não inibe que se reconheça, em condições especiais, o tempo de serviço de trabalho rural efetivamente prestado pelo menor, de modo que não se lhe acrescente um prejuízo adicional à perda de sua infância.

3. Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o art. 7o., XXXIII, da Constituição não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos Trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos (RE 537.040/SC, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 9.8.2011). A interpretação de qualquer regra positivada deve atender aos propósitos de sua edição; no caso de regras protetoras de direitos de menores, a compreensão jurídica não poderá, jamais, contrariar a finalidade protetiva inspiradora da regra jurídica.

4. No mesmo sentido, esta Corte já assentou a orientação de que a legislação, ao vedar o trabalho infantil, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo. Reconhecendo, assim, que os menores de idade não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciário, quando comprovado o exercício de atividade laboral na infância.

5. Desta feita, não é admissível desconsiderar a atividade rural exercida por uma criança impelida a trabalhar antes mesmo dos seus 12 anos, sob pena de punir duplamente o Trabalhador, que teve a infância sacrificada por conta do trabalho na lide rural e que não poderia ter tal tempo aproveitado no momento da concessão de sua aposentadoria. Interpretação em sentido contrário seria infringente do propósito inspirador da regra de proteção.

6. Na hipótese, o Tribunal de origem, soberano na análise do conjunto fático-probatório dos autos, asseverou que as provas materiais carreadas aliadas às testemunhas ouvidas, comprovam que o autor exerceu atividade campesina desde a infância até 1978, embora tenha fixado como termo inicial para aproveitamento de tal tempo o momento em que o autor implementou 14 anos de idade (1969).

7. Há rigor, não há que se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos e não em um limite mínimo de idade abstratamente pré-estabelecido. Reafirma-se que o trabalho da criança e do adolescente deve ser reprimido com energia inflexível, não se admitindo exceção que o justifique; no entanto, uma vez prestado o labor o respectivo tempo deve ser computado, sendo esse cômputo o mínimo que se pode fazer para mitigar o prejuízo sofrido pelo infante, mas isso sem exonerar o empregador das punições legais a que se expõe quem emprega ou explora o trabalho de menores.

8. Agravo Interno do Segurado provido.

(AgInt no AREsp 956.558/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 17/06/2020) – grifei. 

Compartilhando dos entendimentos acima citados, vislumbro a possibilidade de reconhecimento do labor rural anteriormente aos 12 anos de idade.

Passo ao exame do caso concreto.

Em breve síntese, o Autor alega que começou a laborar com 10 anos de idade (1980), juntamente com os pais, sob regime de economia familiar, na pequena propriedade da família, denominada Sítio Santo Antônio, localizada próximo à cidade de Itápolis/SP, no Bairro da Roseirinha. Ali se cultivava café e laranja para a venda. O autor permaneceu trabalhando, exclusivamente, na citada propriedade até 30/09/1989, quando passou a contribuir como autônomo para o INSS. Diante do exposto, requereu o reconhecimento do período rural de 12/03/1980 a 30/09/1989.

Para a comprovação do trabalho rurícola pleiteado no período de 12/03/1980 a 11/03/1982, período aqui controverso, o autor trouxe aos autos:  

• Certidão de seu casamento na data de 29/11/2003, na qual consta a profissão de lavrador;

• Matrícula de imóvel rural com 36 hectares, encravado na fazenda Roseira, Roseirinha ou Boa Vista de São Lourenço, em Itápolis, de propriedade dos genitores, constando registros anteriores referentes a 28/12/1970 e 05/11/1987;

• Declaração cadastral de produtor em nome do pai, constando o início da atividade em 10/03/1969, revalidada em 05/04/1994 e com validade indeterminada a partir de 08/10/1997;

• Nota de produtor emitida pelo pai do autor nos anos de 1969 a 1972, 1980 a 1991;

• Certidão de casamento dos pais do autor em 15/11/1965, em que consta que seu genitor era lavrador.

Os documentos acima consubstanciam início razoável de prova material de que o autor era lavrador no período reivindicado.

É entendimento pacífico no STJ de que os documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constitui início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos. (AG Nº 463855, Min. Paulo Galotti, sexta turma, 09/03/03).

Por outro lado, a prova testemunhal é harmônica e coesa no sentido de que o autor trabalhava como rurícola com os pais, em regime de economia familiar, no período.

Assim sendo, reputo comprovado o labor rural do autor no período de 12/03/1980 a 11/03/1982, tendo restado incontroverso o período de trabalho rural compreendido entre 12/03/1982 e 30/09/1989 que não foi objeto de recurso.

No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, aplica-se a regra inserta no § 2º do artigo 55, com a ressalva de que o tempo de serviço rural não conta para efeito de carência, para fins de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

Com efeito, eventuais períodos rurais reconhecidos sem contribuições anteriores a novembro de 1991 não são computados como período de carência, nos termos do artigo 55, §2º da Lei nº 8.213/91, "in verbis": 

"§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento."

Cabe destacar ainda que o artigo 60, inciso X, do Decreto nº 3.048/99, admite o cômputo do tempo de serviço rural anterior a novembro de 1991 como tempo de contribuição.

Destarte, tendo em vista o requerido na apelação, assim resta a contagem de tempo de serviço com os períodos ora reconhecidos, lembrando que o INSS reconheceu o tempo de serviço de 21 anos, 02 meses e 03 dias na data da DER, em 10/11/2021:

CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

TEMPO DE SERVIÇO COMUM

Data de Nascimento

12/03/1970

Sexo

Masculino

DER

10/11/2021

Tempo já reconhecido pelo INSS:

Marco Temporal

Tempo

Carência

Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)

0 anos, 0 meses e 0 dias

0 carências

Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)

0 anos, 0 meses e 0 dias

0 carências

Até a data da Reforma - EC nº 103/19 (13/11/2019)

0 anos, 0 meses e 0 dias

0 carências

Até 31/12/2019

0 anos, 0 meses e 0 dias

0 carências

Até 31/12/2020

0 anos, 0 meses e 0 dias

0 carências

Até a DER (10/11/2021)

21 anos, 2 meses e 3 dias

180 carências

Períodos acrescidos:

Nome / Anotações

Início

Fim

Fator

Tempo

Carência

1

rural eco fam (Rural - segurado especial)

12/03/1980

30/09/1989

1.00

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

Marco Temporal

Tempo de contribuição

Carência

Idade

Pontos (Lei 13.183/2015)

Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

28 anos, 9 meses e 4 dias

inaplicável

Pedágio (EC 20/98)

8 anos, 2 meses e 4 dias

Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

29 anos, 8 meses e 16 dias

inaplicável

Até a data da Reforma - EC nº 103/19 (13/11/2019)

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

49 anos, 8 meses e 1 dias

59.2222

Até 31/12/2019

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

49 anos, 9 meses e 18 dias

59.3528

Até 31/12/2020

9 anos, 6 meses e 19 dias

0

50 anos, 9 meses e 18 dias

60.3528

Até a DER (10/11/2021)

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

51 anos, 7 meses e 28 dias

82.3889

Até 31/12/2021

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

51 anos, 9 meses e 18 dias

82.5278

Até Lei nº 14.331/2022 (04/05/2022)

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

52 anos, 1 meses e 22 dias

82.8722

Até 31/12/2022

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

52 anos, 9 meses e 18 dias

83.5278

Até 31/12/2023

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

53 anos, 9 meses e 18 dias

84.5278

Até a data de hoje (15/05/2024)

30 anos, 8 meses e 22 dias

180

54 anos, 2 meses e 3 dias

84.9028

- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição

Em 16/12/1998 (EC 20/98), o segurado não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpre o tempo mínimo de serviço de 30 anos, nem a carência mínima de 102 contribuições.

Em 28/11/1999 (Lei 9.876/99), o segurado não tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 35 anos e nem a carência de 108 contribuições. Ainda, não tem interesse na aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98), porque o pedágio é superior a 5 anos.

Em 13/11/2019 (último dia de vigência das regras pré-reforma da Previdência - art. 3º da EC 103/2019), o segurado não tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 35 anos e nem a carência de 180 contribuições. Ainda, não tem interesse na aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98) porque o pedágio da EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a 5 anos.

Em 31/12/2019, o segurado não tem direito aos benefícios dos arts. 15, 16, 17 e 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não preenche a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II).

Em 31/12/2020, o segurado não tem direito aos benefícios dos arts. 15, 16, 17 e 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não preenche a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II).

Em 10/11/2021 (DER), o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (98 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (62 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Em 31/12/2021, o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (98 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (62 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Em 04/05/2022 (Lei nº 14.331/2022), o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (99 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (62.5 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Em 31/12/2022, o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (99 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (62.5 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Em 31/12/2023, o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (100 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (63 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Em 15/05/2024 (na data de hoje), o segurado:

  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 15 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a quantidade mínima de pontos (101 pontos). Também não tem direito à aposentadoria conforme art. 16 da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem a idade mínima exigida (63.5 anos).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 33 anos), o tempo mínimo de contribuição (35 anos) e nem o pedágio de 50% (12 anos, 8 meses e 21 dias).
  • não tem direito à aposentadoria conforme art. 20 das regras de transição da EC 103/19, porque não cumpre o tempo mínimo de contribuição (35 anos), a idade mínima (60 anos) e nem o pedágio de 100% (25 anos, 5 meses e 11 dias).

Portanto, o autor não perfaz o tempo necessário para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

DISPOSITIVO

Ante as razões expendidas, divirjo parcialmente do I. Relator para dar parcial provimento à apelação da parte autora a fim de determinar a averbação do período de trabalho rural de 12/03/1980 a 11/03/1982, restando mantida, no mais, a r. sentença.

Diante do parcial provimento do recurso, deixo de fixar os honorários advocatícios, em conformidade com o Tema 1059, do STJ.

É como voto.


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5056819-80.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: SERGIO MARCONATO

Advogado do(a) APELANTE: ROSEMARIE GAZETTA MARCONATO - SP139831-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

V O T O

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):

Verifico, em juízo de admissibilidade, que os recursos ora analisados mostram-se formalmente regulares, motivados (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-os e passo a apreciá-los nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.

Tendo em vista a data do requerimento administrativo do benefício, o pedido será apreciado sob as regras vigentes anteriormente ao advento da EC nº 103/2019.

A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.

A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.

Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.

Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.

Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.

Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.

Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.

Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:

1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:

a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;

b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);

c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;

2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:

- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.

Consigno que a sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o tempo rural exercido pelo autor no período compreendido entre 12/03/1982 e 30/09/1989, deixando de reconhecer o período rural compreendido entre 12/03/1980 e 11/03/1982, assim como o tempo especial de 20/07/2004 a 30/06/2011.

Assim, considerando que houve apenas recurso da parte autora em relação ao período não reconhecido como tempo rural, compreendido entre 12/03/1980 a 11/03/1982, restou incontroverso o período rural de 12/03/1982 a 30/09/1989.

Aduz a parte autora, em suas razões de apelação, ser totalmente possível o reconhecimento da atividade rural antes dos 12 anos de idade. 

A sentença fixou o marco inicial do tempo rural em 12/03/1982, quando o autor completou 12 anos de idade, a teor do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, REsp 200300071455, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 18/09/2006).

Cumpre observar que o artigo 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social.

Por seu turno, o artigo 55 da Lei nº 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em Regulamento.

E, no que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, aplica-se a regra inserta no § 2º do artigo 55.

Cabe destacar ainda que o artigo 60, inciso X, do Decreto nº 3.048/99, admite o cômputo do tempo de serviço rural anterior a novembro de 1991 como tempo de contribuição.

Sobre a demonstração da atividade rural, a jurisprudência dos nossos Tribunais tem assentado a necessidade de início de prova material, corroborado por prova testemunhal. Nesse passo, em regra, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou os conviventes, aparecem qualificados como lavradores; o abandono da ocupação rural, por parte de quem se irroga tal qualificação profissional, em nada interfere no deferimento da postulação desde que se anteveja a persistência do mister campesino; mantém a qualidade de segurado o obreiro que cessa sua atividade laboral, em consequência de moléstia; a prestação de labor urbano, intercalado com lides rurais, de per si, não desnatura o princípio de prova documental amealhado; durante o período de graça, a filiação e consequentes direitos, perante a Previdência Social, ficam preservados.

Ressalte-se ser possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado, já aos 12 (doze) anos de idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores: STF, AI 476.950-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 11.3.2005; STJ, AR 3629/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Revis. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julg. 23.06.2008, DJe 09.09.2008.

A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, este não deve ser reconhecido em período anterior aos 12 anos de idade, uma vez que, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, principalmente por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.

A propósito, esse entendimento já foi assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:

"ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATORIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS. MENOR DE DOZE ANOS QUE PRESTAVA SERVIÇOS A UM EMPREGADOR, SOB A DEPENDÊNCIA DESTE, E MEDIANTE SALARIO. TENDO SOFRIDO O ACIDENTE DE TRABALHO FAZ JUS AO SEGURO PRÓPRIO. NÃO OBSTA AO BENEFÍCIO A REGRA DO ART. 165-X DA CARTA DA REPUBLICA, QUE FOI INSCRITA NA LISTA DAS GARANTIAS DOS TRABALHADORES EM PROVEITO DESTES, NÃO EM SEU DETRIMENTO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS CONHECIDOS E PROVIDOS".

(2ª Turma, RE nº 104.654/SP, DJ: 25/04/1986, Rel. Min. FRANCISCO REZEK).

"Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes.

3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte.

4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86.

5. Agravo de instrumento a que se nega provimento".

(2ª Turma, AI nº 529.694/RS, DJ 11/03/2005, Rel. Min. GILMAR MENDES).

Nesse diapasão caminha o entendimento do TRF-3ª Região, destacando-se as seguintes ementas:

"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.

(...)

- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 - doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.

- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte autora".

(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, DJe: 16/03/2017, Rel. Des. Fed. FAUSTO DE SANCTIS).

"PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. POSSIBILIDADE. DISPENSA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES.

(...)

4. É possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado já aos 12 (doze) anos de idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores.

5. De acordo com os documentos anexados aos autos, corroborados pela prova testemunhal, a autora comprovou o exercício de atividade rural no período de 07/1975 a 07/1988, devendo ser procedida a contagem do referido tempo de serviço, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/91.

6. Apelação provida".

(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, DJe: 13/03/2017, Rel. Des. Fed. TORU YAMAMOTO).

Assim, considerando que o autor nasceu em 12/03/1970, mantenho a sentença em seus exatos termos, visto que de acordo com o entendimento majoritário desta E. Corte e de instâncias superiores, o cômputo ao tempo de serviço rural só pode ser reconhecido a partir dos 12 anos de idade.

Impõe-se, por isso, a manutenção da r. sentença.

Determino ainda a majoração da verba honorária em 2% (dois por cento) a título de sucumbência recursal, nos termos do §11 do artigo 85 do CPC/2015.

Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo, in totum, a sentença, nos termos fundamentados.

É como voto.


E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE.  REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A COMPROVAÇÃO DO PERÍODO RURAL. AUSÊNCIA DE TEMPO NECESSÁRIO PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA. AVERBAÇÃO DO PERÍODO DE TRABALHO RURAL.

1 - É controversa na jurisprudência a possibilidade de o trabalhador, urbano ou rural, poder computar tempo de serviço prestado quando ainda criança, antes de implementados doze anos de idade.

2 - Nesse sentido, tanto a Constituição Federal, quanto a legislação pátria infraconstitucional, em especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.079/90 – e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, resguardam os direitos dos menores, com o escopo de sua proteção como indivíduo hipossuficiente e ainda em formação.

3 - Não parece razoável que ao infante seja imposta dupla punição: a perda da plenitude de sua infância, tendo que trabalhar enquanto deveria estar brincando e estudando, e, por outro lado, não poder ter reconhecido o direito de computar o período trabalhado para fins previdenciários.

4 - Com maior razão, ao trabalho árduo e penoso do infante, como ocorre com a lida rural, deve a lei ampliar ainda mais a proteção das crianças e dos adolescentes, tendo em vista o elevado desgaste físico, mental e emocional gerado a essas pessoas nessa espécie laborativa, com manifesto ferimento a preceitos fundamentais, como o da dignidade humana e o direito da criança a vivenciar com plenitude a sua infância.

5 - Compartilhando dos entendimentos acima citados, vislumbro a possibilidade de reconhecimento do labor rural anteriormente aos 12 anos de idade.

6 - Documentos trazidos aos autos consubstanciam início razoável de prova material de que o autor era lavrador no período reivindicado.

7 - É entendimento pacífico no STJ que os documentos apresentados em nome dos pais ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constitui início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos. (AG Nº 463855, Min. Paulo Galotti, sexta turma, 09/03/03).

8 - A prova testemunhal é harmônica e coesa no sentido de que o autor trabalhava como rurícola com os pais, em regime de economia familiar, no período.

9 - Comprovado o labor rural do autor no período de 12/03/1980 a 11/03/1982, tendo restado incontroverso o período de trabalho rural compreendido entre 12/03/1982 e 30/09/1989 que não foi objeto de recurso.

10 - No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, aplica-se a regra inserta no § 2º do artigo 55, com a ressalva de que o tempo de serviço rural não conta para efeito de carência, para fins de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

11 - O autor não perfaz o tempo necessário para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

12 - Averbação do período de trabalho rural  de 12/03/1980 a 11/03/1982, restando mantida, no mais, a r. sentença.

13 - Apelação da parte autora parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, a Oitava Turma, por maioria, deu parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras, com quem votaram a Juíza Federal Convocada Raecler Baldresca e as Desembargadoras Federais Silvia Rocha e Therezinha Cazerta, vencido, parcialmente, o Relator, que lhe negava provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
LOUISE FILGUEIRAS
JUÍZA FEDERAL CONVOCADA

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