D.E. Publicado em 06/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação da parte ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001156-18.2016.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta pelo INSS em face da Sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural.
Os autos subiram a este Tribunal com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A proteção previdenciária do trabalhador rural teve início com o "Estatuto do Trabalhador rural", criado pela Lei n.º 4.214, de 02 de março de 1963. Na sequência, surgiram outros diplomas normativos importantes, como, por exemplo, a Lei n.º 5.889, de 08 de junho de 1973 e as Leis Complementares n.º 11, de 25 de maio de 1971 e 16, de 30 de outubro 1973, que acabaram por dar concretude à proteção previdenciária ao trabalhador rural.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, a proteção previdenciária ao trabalhador rural passou a ser disciplinada constitucionalmente. Foram asseguradas a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços aos segurados urbanos e rurais, igualdade de direitos aos trabalhadores rurais independentemente do sexo, bem como redução de 05 anos para a concessão da aposentadoria por idade.
O arcabouço normativo previdenciário restou completado com a edição das Leis n.º 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991. Essas leis melhor detalharam e conferiram eficácia às disposições constitucionais, tendo sofrido diversas alterações ao longo do tempo.
Cumpre ressaltar que a proteção previdenciária devida aos trabalhadores rurais está inserida dentro de uma política pública, que visa, dentro outros objetivos, promover o combate à pobreza no meio rural e estimular o desenvolvimento da agricultura familiar, de modo a incentivar a manutenção dos agricultores no meio rural.
O artigo 48, § 1º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991, determina que, para a obtenção da aposentadoria rural por idade, é necessário que o homem tenha completado 60 anos e a mulher, 55 anos. Para aqueles que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social a partir de 25 de julho de 1991, é necessário o cumprimento da carência pelo prazo de 180 meses.
Com a edição das Leis n.º 8.212/91 e 8.213/91, as disposições constitucionais sobre os trabalhadores rurais ganharam contornos mais definidos, ficando clara a existência das seguintes categorias: empregado rural, trabalhador avulso, autônomo rural e segurado especial.
O artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 prevê os benefícios devidos ao segurado especial. Estabelece, ainda, que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não é exigido o cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na forma especificada no dispositivo em comento.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/200), bem como ao pescador artesanal ou a este assemelhado a condição de segurado especial.
O § 1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120 (cento e vinte) dias, nos termos do § 7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o § 8º descreve determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto que os incisos do § 9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Por outro lado, o empregado rural, o trabalhador avulso e o autônomo rural, com a edição das Leis n.º 8.212 e 8.213, ambas de 1991, passaram a ser segurados obrigatórios do RGPS, devendo verter contribuições à Previdência Social. Desse modo, esses trabalhadores rurais têm direito à mesma cobertura devida aos trabalhadores urbanos, nos moldes exigidos pela legislação previdenciária, ou seja, comprovação da carência de 180 meses, conforme estipulado no artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Com a edição da Lei n.º 8.213/91, foram estabelecidas regras de transição abrangendo, dentre outros, quem já exercia atividade rural anteriormente ao advento da Lei de Benefícios Previdenciário e o trabalhador rural coberto pela Previdência Social rural.
O artigo 142 da lei sob análise traz tabela de carência, levando-se em consideração o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Por seu turno, o artigo 143 da Lei n.º 8.213/1991, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispôs que:
"O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, foi facultado aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas que comprovassem o exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do referido benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento da benesse previdenciária.
A Lei n.º 11.368, de 09 de novembro de 2006, prorrogou por mais 02 (anos) o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, em relação ao trabalhador rural empregado. Com a edição da Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008, o termo final do prazo acima mencionado foi postergado para até o dia 31 de dezembro de 2010, aplicando-se esta disposição, inclusive, para o trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego (art. 2º, caput e parágrafo único).
De acordo com as regras transitórias acima expostas não se exige comprovação de recolhimentos de contribuições ou período de carência para a concessão da aposentadoria por idade rural, mas apenas idade mínima e prova do exercício de atividade campesina, pelo período previsto em lei para a concessão do benefício.
Por força do artigo 3º da Lei n.º 11.718/08 foi possibilitado ao empregado rural que, na concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, fossem contados para efeito de carência, de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, para cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 03 (três), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano e, no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, para cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 02 (dois), também limitado a 12 (doze) meses dentro do correspondente ano (incisos II e III do art. 3º da Lei n.º 11.718/08). O parágrafo único do artigo citado permitiu a extensão da comprovação da carência, na forma do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, para o trabalhador rural classificado como contribuinte individual, desde que comprove a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas sem relação de emprego.
O parágrafo único do artigo 3º da Lei n.º 11.718/2008 permitiu a extensão da comprovação da carência, na forma do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, para o trabalhador rural classificado como contribuinte individual, desde que comprove a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas sem relação de emprego. Assim, no caso dos trabalhadores boias-frias, para fins de concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, a atividade desenvolvida até 31 de dezembro de 2010 poderá ser contada para efeito de carência se comprovada na forma do artigo 143 da Lei n.º 8.213/1991.
Em resumo, a obtenção da aposentadoria por idade rural pelos trabalhadores rurais, pelo regime transitório, que tenham exercido o labor campesino como empregado rural, avulso rural ou autônomo rural, somente será possível mediante a simples comprovação do exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, pelo número de meses idêntico ao da carência, enquanto não houver expirado o prazo previsto nas normas transitórias. Todavia, após o período a que se refere esses dispositivos, além do requisito etário, será necessário o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991.
Somente ao segurado especial, referido no inciso VII do artigo 11 da Lei de Benefícios da Previdência Social, será garantido a concessão, dentre outros, do benefício aposentadoria por idade, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício, nos termos do artigo 39, inciso I, da referida lei.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a comprovação da atividade rural requer a existência de início de prova material, a qual poderá ser corroborada com a prova testemunhal, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material do labor se estenda por todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal capaz de ampliar a eficácia probatória dos documentos. Todavia, é necessário que a prova testemunhal remonte até a época em que formado o documento, pois se assim não fosse, os testemunhos restariam isolados e, no período testemunhado, somente remanesceria a prova testemunhal, a qual é insuficiente à comprovação do labor rural, conforme a mencionada Súmula n.º 149 do STJ.
Nessa linha, trago à baila o seguinte julgado:
Tendo em vista, o julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea.
O conceito de prova material previsto no artigo 106 da Lei n.º 8.213/1991 não configura rol exaustivo, visto não se tratar de tarifamento da prova. Qualquer elemento material idôneo poderá configurar início de prova documental, cabendo ao Julgador sopesar sua força probatória, quando da análise do caso concreto.
Nessa trilha, é o julgado abaixo do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
As sentenças trabalhistas poderão constituir prova do labor rural, desde que não sejam meramente homologatórias, ou seja, desde que o trabalho rural tenha sido demonstrado no curso do processo, em procedimento desenvolvido sob o crivo do contraditório.
Nesse sentido, são os arestos abaixo transcritos desta Corte:
As declarações extemporâneas aos fatos declarados não constituem início de prova material, consubstanciando prova testemunhal, com a agravante de não terem sido produzidas sob o crivo do contraditório.
Confira a respeito, o seguinte julgado:
O uso de maquinário não é impeditivo ao reconhecimento do trabalho rural, devendo a análise levar em consideração outros elementos para que se possa aquilatar a forma que era realizada a exploração agrícola. A lei não especifica o modo em que o labor rural deverá ser desenvolvido, com ou sem o auxílio de máquinas, as quais constituem apenas instrumentos de trabalho no campo.
Trago à colação o julgado abaixo acerca do tema:
Além disso, é pacífico o entendimento de que o exercício de atividade urbana intercalada com a rural não constitui, por si só, óbice ao reconhecimento do labor, conforme dispõe a Súmula n.º 46 da TNU, que assim dispõe:
A questão da imediatidade do trabalho rural antes do requerimento ou do ajuizamento da ação é tema dos mais espinhosos na jurisprudência. Entendo que a questão deverá ser analisada caso a caso, não havendo, a priori, um período determinado antes do qual se poderá fazer o requerimento do benefício. A caracterização da condição de rurícola deverá, necessariamente, levar em consideração o histórico laboral do trabalhador, não podendo sua condição de trabalhador rural ser estabelecida com base no momento em que foi realizado ou não o requerimento de concessão da benesse previdenciária.
Nesse sentido, o próprio Superior Tribunal de Justiça entende não ser imprescindível que a prova material abranja todo o período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, desde que a prova testemunhal amplie a sua eficácia, permitindo sua vinculação ao tempo de carência.
A título de ilustração, trago à colação o julgado abaixo:
Em outras palavras, a caracterização de trabalhador rural deverá ser aferida de modo casuístico, tendo como vetor interpretativo a perquirição de qual atividade foi preponderantemente desempenhada durante toda a vida laborativa do segurado. Por exemplo, uma pessoa que trabalhou muito tempo no meio rural, mas que deixou as lides campesinas recentemente (e, em alguns casos, até há muitos anos) deve ser considerada trabalhadora rural, pois, a toda evidência, esta foi a forma por ela eleita para manter sua subsistência na maior parte do curso de sua vida. Por outro lado, aquele que, em tempos remotos, chegou a exercer alguma atividade de cunho rural por breve intervalo de tempo, mas que, posteriormente, foi abandonada para que se dedicasse a outras formas de trabalho, não pode ser considerada trabalhadora rural, já que a atividade campesina não foi exercida de modo preponderante, mas apenas de forma episódica e ocasional, correspondendo a pequena fração da atividade laborativa do segurado desempenhada no curso de sua vida.
Em face do exposto no parágrafo anterior e melhor refletindo sobre o assunto, tendo em vista a necessidade de assegurar a proteção previdenciária ao trabalhador que realmente elegeu o meio de vida no campo para sua subsistência, passo a tecer algumas considerações.
Consigno que perfilho do entendimento de que é possível que uma vez atingida a idade estabelecida em lei e comprovado o exercício de labor rural em número de meses idênticos à carência do benefício, conforme tabela constante do artigo 142 da Lei n.º 8.213/1991, seja adquirido o direito à obtenção da aposentadoria por idade rural , ainda que o conjunto probatório mostre-se apto apenas para afiançar o exercício da atividade rural anteriormente ao advento da Lei n.º 8.213/1991 ou que ela foi exercida há algum tempo antes da data do ajuizamento ou do requerimento administrativo visando à concessão da aposentadoria por idade rural.
Antes da edição da Lei n.º 8.213/1991, os benefícios do sistema previdenciário rural eram disciplinados pela Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971. Nessa época, a aposentadoria por idade era denominada de aposentadoria por velhice e era devida ao trabalhador rural que tivesse completado 65 (sessenta e cinco) anos de idade, conforme disciplinava o art. 4º, caput, da lei em comento. Todavia, o parágrafo único do dispositivo citado determinava que o benefício somente cabia ao chefe ou arrimo da família.
Os trabalhadores rurais que não puderam se aposentar por idade sob a égide da Lei Complementar n.º 11/1971, tiveram a possibilidade de obtenção do benefício da aposentadoria por idade com o ingresso da Lei de Benefícios, em 1991, uma vez preenchidas as condições nela estipuladas.
O surgimento de nova lei previdenciária no ordenamento jurídico, instituindo direitos, passa a disciplinar os fatos nela previstos, a não ser que houvesse determinação em sentido contrário. Em outras palavras, a novel lei de benefícios previdenciários regulou os efeitos jurídicos sobre as situações consignadas em seu seio. In casu, a incidência dos efeitos jurídicos da nova lei sobre fatos pretéritos à sua vigência somente seria obstada, no caso da imposição de sanções ou quando expressamente previsto no texto legal.
Dessa maneira, havendo o exercício de labor rural pelo prazo determinado na Lei n.º 8.213/1991, bem como o implemento da idade por ela estipulada, as situações fáticas que importam na aquisição de direito a benefícios previdenciários, mesmo que constituídas anteriormente à sua vigência, se subsumem aos seus efeitos jurídicos.
Porém, é necessário, como já explanado alhures, que a atividade campesina não tenha sido exercida de forma efêmera e dissociada do restante da vida laborativa do requerente. Deve existir, no caso concreto, verdadeira vinculação do trabalhador à terra, de forma a não desvirtuar o instituto, que visa proteger quem efetivamente elegeu o labor campesino como meio de vida.
Portanto, aquele que exerceu a faina rural por curto intervalo de tempo durante sua vida e depois migrou para outras atividades laborativas não pode ser considerado como rurícola, já que a faina campesina não foi eleita como forma de seu sustento e de sua família.
Volto a frisar, é necessário que a atividade rural tenha sido desempenhada de forma preponderante durante a vida laborativa do segurado e que não tenha sido exercida de forma ocasional e episódica ou que, posteriormente, restou abandonada para o exercício de outras atividades laborativas.
Confira a respeito o seguinte julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
Esclarecedor, para o deslinde do caso dos autos é o trecho do voto do Ministro Relator Félix Fischer, proferido no Recurso Especial acima mencionado, que merece ser transcrito:
Em suma, ao completar o período de trabalho exigido no artigo 142 da Lei de Benefícios quando alcançado o requisito etário, o rurícola incorpora ao seu patrimônio jurídico o direito de pleitear o benefício de aposentadoria por idade rural a qualquer momento. Trata-se de direito adquirido, instituto constitucionalmente protegido (artigo 5º, inciso XXXVI, da Carta Magna), uma vez que, no momento em que completara o requisito etário, já poderia ter requerido o benefício de aposentadoria por idade rural, pois preenchidos os requisitos necessários à sua obtenção.
O fato de postergar o seu pedido de aposentadoria por idade rural, não tem o condão de subtrair-lhe este direito, pois a exigência de trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento não constitui prazo decadencial para a obtenção da aposentadoria, direito que não pode ser renunciado, em razão de constituir direito social previsto no artigo 7º, inciso XXIV da Constituição Federal.
Embora somente nos dias atuais, a mulher venha ganhando espaço na sociedade, com o reconhecimento de sua igualdade perante os homens no mercado de trabalho, ainda resta muito a ser feito para a assecuração plena de direitos ao sexo feminino. No passado, não tão remoto, praticamente toda a organização familiar subordinava-se ao cônjuge varão, principalmente no meio rural. Assim, é patente a dificuldade para que elas tenham início de prova material em seu nome, a qual, via de regra, é obtida a partir dos documentos do seu marido, companheiro, genitor etc.
Diante do exposto, é importante destacar que, em razão das especificidades da vida no campo, admite-se que em documento no qual consta o marido como trabalhador rural e a esposa como "doméstica" ou "do lar", seja estendida a condição de rurícola para a mulher, conforme julgado abaixo transcrito:
Nesse sentido, é o entendimento da Súmula n.º 6 da TNU, in verbis:
Todavia, tratando-se de prova emprestada, caso o início de prova material da mulher esteja em nome do seu marido, ocorrendo alteração na situação fática do cônjuge que acarrete seu abandono das lides campesinas, será necessária a apresentação de novo elemento de prova material para a comprovação do labor rural no período subsequente à modificação da situação do esposo.
No caso de óbito do cônjuge, cuja prova material aproveitava à esposa, é possível que o início de prova documental ainda assim lhe sirva, desde que a sua permanência nas lides rurais seja fortemente corroborada por testemunhos idôneos.
Também é possível aproveitar em favor da mulher solteira, documentos em nome de seus genitores, que atestem a faina rural por eles desempenhada, no período imediatamente anterior à constituição de nova família com o casamento ou coabitação em união estável.
Em suma, a análise do labor rural da mulher, quando não houver documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, deverá levar em consideração todo o acervo probatório, não existindo fórmula empírica que possa conferir maior força probante a esta ou aquela prova amealhada aos autos.
Do caso concreto.
A idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação pessoal da parte autora acostada à fl. 12. A requerente nasceu em 22.11.1955, portanto, completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade aos 22.11.2010.
Desse modo, a teor do art. 142 da Lei 8.213/1991, a parte autora deveria demonstrar o exercício de atividade rural por 174 meses, ainda que descontínuos, no período imediatamente anterior ao requerimento.
Contudo, o benefício deve ser negado, tendo em vista que o início de prova material não encontra harmonia com os demais elementos probatórios colhidos nos autos.
A requerente juntou sua certidão de casamento, datada de 25.03.1974, em que seu marido consta qualificado como lavrador (fl. 13).
A testemunha Cleusa Fernandes, ouvida em 02.04.2013, informou que conhece a requerente há 19 ou 20 anos, que a mesma trabalhou e trabalha na roça, e que seu esposo era funcionário registrado nas fazendas em que ela trabalhou (fls. 52).
A testemunha Gener C. Aelmasn, ouvido por sistema audiovisual em 05.08.2014, disse que conhece a autora há 12 anos, que ela morava na fazenda com o esposo e que o ajudava na lavoura. Também que a mesma continua trabalhando na fazenda com seu esposo, ambos empregados (fl. 131).
Porém, os testemunhos, além de lacônicos, não corroboram o início de prova material trazido aos autos. Existe um enorme lapso temporal entre a data da certidão de casamento e os períodos abrangidos nos depoimentos.
De fato, a certidão de casamento da requerente é datada de 25.03.1974. Em depoimento prestado em 02.04.2013, Cleuza Fernandes afirmou que conhece a autora há 19 (dezenove) ou 20 (vinte) anos, o que remete aos anos de 1993 e 1994. Portanto, há um hiato de 19 (dezenove) ou 20 (vinte) anos entre o início de prova material consistente na certidão apresentada (25.04.1974) e a tentativa de corroboração do período pela prova testemunhal (1993 e 1994).
O mesmo ocorre no testemunho apresentado por Gener C. Aelmasn. Agora, porém, com um lapso temporal ainda maior entre o início de prova material e a prova testemunhal. Seu depoimento é de 05.08.2014 e a testemunha afirmou que conhece a requerente há 12 (doze) anos. Logo, testemunha e autora se conhecem desde o ano de 2002, existindo um espaço de tempo de 28 (vinte e oito) anos entre o documento e o testemunho que o deveria corroborar.
Por outro lado, verifico que as versões apresentadas pelas testemunhas se contradizem com a CTPS da autora, que possui anotação de registro de faxineira em 01.10.2008, sem data de saída anotada (fl. 14).
Portanto, a autora não comprovou os requisitos necessários á concessão do benefício.
Dispositivo.
Tendo em vista a sucumbência da parte autora, condeno-a ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica condicionada ao disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060 /50 (art. 98, §3º, do CPC).
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO à apelação interposta pela parte ré, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 27/09/2016 15:58:46 |