Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5055248-84.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
08/05/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/05/2019
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. REALIZAÇÃO DE NOVA PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. PESSOA
PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
LEGAIS.
I- Inicialmente, observo que a perícia médica foi devidamente realizada por Perito nomeado pelo
Juízo a quo, tendo sido apresentado o parecer técnico devidamente elaborado, com respostas
claras e objetivas, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova
pericial. Cumpre ressaltar que o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, pode concluir pela
dispensa de produção de outras provas, nos termos do parágrafo único do art. 370 do CPC.
II- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
III-In casu, a alegada incapacidade da parte autora ficou plenamente caracterizada no presente
feito, conforme parecer técnico elaborado pelo Perito. Afirmou o esculápio encarregado do exame
que a autora é portadora de doença mental psicótica grave (CID 10 – F 31.5), concluindo que a
mesma encontra-se totalepermanentemente incapacitada para o trabalho. Em resposta aos
requisitos formulados pelo Juízo a quo, esclareceu o esculápio que a autora “Não tem condições
de exercer outras funções que lhe deem o próprio sustento” (ID 6674444), informando que o início
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
da doença deu-se em 8/1/13.
IV- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. O estudo social (elaborado em 10/2/18, data em que o salário
mínimo era de R$ 954,00), demonstra que a autora, com 43 anos de idade, reside com a sua filha
de 18 anos, desempregada, em casa financiada – CDHU, composta por 01 sala, 01 cozinha, 02
quartos e 01 banheiro. Afirmou a assistente social que a casa é simples e os cômodos são
pequenos, sendo guarnecida com “Sala: 01 jogo sofá,01 racks pequena,01 televisão 21
polegadas,01 mesa com 4 cadeiras Cozinha: 01 geladeira,01 armário de fórmica, 01 fogão
Quarto:01 cama solteiro,01 guarda-roupa; Quarto:01 cama casal, 01 cômoda,01 guarda-roupa”. A
família não possui renda mensal, constando do estudo social que a autora “não exerce atividades
laborativas, vive em condições sociais precárias, vive da ajuda de terceiros (grifos meus)” e que
“Vestuários, calçados compram de acordo com as necessidades. A prestação da casa está sendo
paga por Antonio Euclides Costa (pai de Leandra). A complementação na alimentação, água e luz
estão sendo pagas pela tia paterna, Glaucia Aparecida da Costa. O restante das despesas estão
sendo pagas pelo bolsa-família que a autora recebe no valor de R$171,00”. Os gastos mensais
são de R$150,00 em financiamento CDHU, R$24,00 em água, R$38,00 em luz, R$60,00 em gás
de cozinha, R$35,00 em telefone fixo, R$ 12,00 emrecarga de celular e R$ 24,00 em IPTU.
“Alimentação - Ganha 01 cesta básica do S.O.S (2/2 meses) +200,00”. Em resposta aos quesitos
formulados pelo INSS, esclareceu a Assistente Social que “O INSS indeferiu o benefício
assistente social por achar que a autora tem capacidade laboral, mas a saúde da autora é
fragilizada, tem transtorno bipolar, já foi internada em hospital psiquiátrico, além de ter muitas
feridas pelo corpo, tem problemas emocionais, é diabética , e segundo relato não consegue
emprego fixo por todos esses motivos. A autora não possui renda, vive da ajuda de terceiros e faz
juz ao benefício assistencial.”
V- Matéria preliminar rejeitada. No mérito, apelação improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055248-84.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARCIA REGINA HIDALGO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: RODOLFO VALADAO AMBROSIO - SP184842-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055248-84.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARCIA REGINA HIDALGO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: RODOLFO VALADAO AMBROSIO - SP184842-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando à concessão do
benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser
pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família. Pleiteou a antecipação dos efeitos da tutela.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, concedendo o benefício requerido a partir do
requerimento administrativo (14/6/17), “obedecidos eventuais reajustes que vierem a ser
futuramente concedidos”. Os honorários advocatícios foram arbitrados “em 10% sobre o valor da
causa até esta sentença, levando-se em conta a qualidade do trabalho do advogado e o tempo de
duração da demanda, nos termos do art. 85, §3º, I, CPC”. Por fim, concedeu a tutela antecipada.
Inconformado, apelou o INSS, alegando em síntese:
- Preliminarmente:
- a nulidade da R. sentença, tendo em vista a suspeição do perito judicial, porquanto “O PERITO,
em atitude antiética, POIS JÁ HAVIA REALIZADO A PERÍCIA EM PROCESSO ANTERIOR,
EXAMINA A AUTORA NOVAMENTE NESSE PROCESSO DE LOAS. POR ÓBVIO QUE IRIA
FAZER PERÍCIA CÓPIA – TANTO QUE A NOVA PERÍCIA É UMA FOLHA – vide fl. 119” e que
“SE O PERITO JÁ ATUOU PELA PARTE, NÃO PODE ATUAR NOVAMENTE,
PRINCIPALMENTE EM ÂMBITO JUDICIAL, EM QUE A IMPARCIALIDADE DOS PERITOS É
MANDAMENTO LEGAL”, devendo ser aplicado o disposto no art. 158 do CPC.
No mérito:
- A improcedência do pedido, pleiteando a devolução dos valores recebidos a título de tutela
antecipada.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo desprovimento da apelação.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055248-84.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARCIA REGINA HIDALGO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: RODOLFO VALADAO AMBROSIO - SP184842-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
observo que a perícia médica foi devidamente realizada por Perito nomeado pelo Juízo a quo,
tendo sido apresentado o parecer técnico devidamente elaborado, com respostas claras e
objetivas, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova pericial.
Cumpre ressaltar que o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, pode concluir pela
dispensa de produção de outras provas, nos termos do parágrafo único do art. 370 do CPC.
Outrossim, como bem asseverou o I. Representante do parquet Federal, “Não há que se falar em
suspeição do perito, somente porque já realizou perícia anterior na autora, em caso distinto.
Inexiste qualquer disposição impeditiva nesse sentido, e vale lembrar, outrossim, que o Município
de Penápolis/SP possui pouco mais de 60 mil habitantes, não cabendo se exigir grande
diversificação dos profissionais de confiança do juízo. Quanto ao teor do laudo pericial, é bem
verdade que as considerações cingiram-se às respostas dos quesitos, em apenas uma lauda.
Mas é inconteste, outrossim, que as informações nele contidas são suficientes para formação de
juízo de valor sobre a causa. Com isso, tem-se por inaplicável o art. 158 do CPC/2015” (ID
35385842).
Quanto ao mérito, dispõe o art. 203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização das
atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender como
incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para promover,
por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade. Cumpre
registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A incapacidade para
prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da
incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V, da Constituição
Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei). Ademais, a redação do
referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou
mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
In casu, a alegada incapacidade da parte autora ficou plenamente caracterizada no presente feito,
conforme parecer técnico elaborado pelo Perito. Afirmou o esculápio encarregado do exame que
a autora é portadora de doença mental psicótica grave (CID 10 – F 31.5), concluindo que a
mesma encontra-se total e permanentemente incapacitada para o trabalho. Em resposta aos
requisitos formulados pelo Juízo a quo, esclareceu o esculápio que a autora “Não tem condições
de exercer outras funções que lhe deem o próprio sustento” (ID 6674444), informando que o início
da doença deu-se em 8/1/13.
Com relação à miserabilidade, observo que o estudo social (elaborado em 10/2/18, data em que o
salário mínimo era de R$ 954,00), demonstra que a autora, com 43 anos de idade, reside com a
sua filha de 18 anos, desempregada, em casa financiada – CDHU, composta por 01 sala, 01
cozinha, 02 quartos e 01banheiro. Afirmou a assistente social que a casa é simples e os cômodos
são pequenos, sendo guarnecida com “Sala: 01 jogo sofá,01 racks pequena,01 televisão 21
polegadas,01 mesa com 4 cadeiras Cozinha: 01 geladeira,01 armário de fórmica, 01 fogão
Quarto:01 cama solteiro,01 guarda-roupa; Quarto:01 cama casal, 01 cômoda,01 guarda-roupa”. A
família não possui renda mensal, constando do estudo social que a autora “não exerce atividades
laborativas, vive em condições sociais precárias, vive da ajuda de terceiros” e que “Vestuários,
calçados compram de acordo com as necessidades. A prestação da casa está sendo paga por
Antonio Euclides Costa (pai de Leandra). A complementação na alimentação, água e luz estão
sendo pagas pela tia paterna, Glaucia Aparecida da Costa. O restante das despesas estão sendo
pagas pelo bolsa-família que a autora recebe no valor de R$171,00”. Os gastos mensais são de
R$150,00 em financiamento CDHU, R$24,00 em água, R$38,00 em luz, R$60,00 em gás de
cozinha, R$35,00 em telefone fixo, R$ 12,00 e, recarga de celular e R$ 24,00 em IPTU.
“Alimentação - Ganha 01 cesta básica do S.O.S (2/2 meses) +200,00”. Em resposta aos quesitos
formulados pelo INSS, esclareceu a Assistente Social que “O INSS indeferiu o benefício
assistente social por achar que a autora tem capacidade laboral, mas a saúde da autora é
fragilizada, tem transtorno bipolar, já foi internada em hospital psiquiátrico, além de ter muitas
feridas pelo corpo, tem problemas emocionais, é diabética , e segundo relato não consegue
emprego fixo por todos esses motivos. A autora não possui renda, vive da ajuda de terceiros e faz
juz ao benefício assistencial.”
Dessa forma, pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da
miserabilidade encontra-se demonstrado no presente feito.
Cumpre ressaltar que o benefício deve ser revisto a cada dois anos, haja vista a expressa
disposição legal prevista no art. 21 da Lei nº 8.742/93.
Ressalto, ainda, ser vedada a acumulação do benefício assistencial de prestação continuada com
qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica,
nos termos do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93, devendo ser deduzidos na fase de execução do
julgado os pagamentos feitos pela autarquia na esfera administrativa.
Por fim, tendo em vista a procedência do pedido formulado na exordial, não há que se falar em
devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada anteriormente deferida.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. REALIZAÇÃO DE NOVA PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. PESSOA
PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
LEGAIS.
I- Inicialmente, observo que a perícia médica foi devidamente realizada por Perito nomeado pelo
Juízo a quo, tendo sido apresentado o parecer técnico devidamente elaborado, com respostas
claras e objetivas, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova
pericial. Cumpre ressaltar que o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, pode concluir pela
dispensa de produção de outras provas, nos termos do parágrafo único do art. 370 do CPC.
II- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
III-In casu, a alegada incapacidade da parte autora ficou plenamente caracterizada no presente
feito, conforme parecer técnico elaborado pelo Perito. Afirmou o esculápio encarregado do exame
que a autora é portadora de doença mental psicótica grave (CID 10 – F 31.5), concluindo que a
mesma encontra-se totalepermanentemente incapacitada para o trabalho. Em resposta aos
requisitos formulados pelo Juízo a quo, esclareceu o esculápio que a autora “Não tem condições
de exercer outras funções que lhe deem o próprio sustento” (ID 6674444), informando que o início
da doença deu-se em 8/1/13.
IV- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. O estudo social (elaborado em 10/2/18, data em que o salário
mínimo era de R$ 954,00), demonstra que a autora, com 43 anos de idade, reside com a sua filha
de 18 anos, desempregada, em casa financiada – CDHU, composta por 01 sala, 01 cozinha, 02
quartos e 01 banheiro. Afirmou a assistente social que a casa é simples e os cômodos são
pequenos, sendo guarnecida com “Sala: 01 jogo sofá,01 racks pequena,01 televisão 21
polegadas,01 mesa com 4 cadeiras Cozinha: 01 geladeira,01 armário de fórmica, 01 fogão
Quarto:01 cama solteiro,01 guarda-roupa; Quarto:01 cama casal, 01 cômoda,01 guarda-roupa”. A
família não possui renda mensal, constando do estudo social que a autora “não exerce atividades
laborativas, vive em condições sociais precárias, vive da ajuda de terceiros (grifos meus)” e que
“Vestuários, calçados compram de acordo com as necessidades. A prestação da casa está sendo
paga por Antonio Euclides Costa (pai de Leandra). A complementação na alimentação, água e luz
estão sendo pagas pela tia paterna, Glaucia Aparecida da Costa. O restante das despesas estão
sendo pagas pelo bolsa-família que a autora recebe no valor de R$171,00”. Os gastos mensais
são de R$150,00 em financiamento CDHU, R$24,00 em água, R$38,00 em luz, R$60,00 em gás
de cozinha, R$35,00 em telefone fixo, R$ 12,00 emrecarga de celular e R$ 24,00 em IPTU.
“Alimentação - Ganha 01 cesta básica do S.O.S (2/2 meses) +200,00”. Em resposta aos quesitos
formulados pelo INSS, esclareceu a Assistente Social que “O INSS indeferiu o benefício
assistente social por achar que a autora tem capacidade laboral, mas a saúde da autora é
fragilizada, tem transtorno bipolar, já foi internada em hospital psiquiátrico, além de ter muitas
feridas pelo corpo, tem problemas emocionais, é diabética , e segundo relato não consegue
emprego fixo por todos esses motivos. A autora não possui renda, vive da ajuda de terceiros e faz
juz ao benefício assistencial.”
V- Matéria preliminar rejeitada. No mérito, apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA