Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000158-05.2021.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/05/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 26/05/2022
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BPC. DEFICIENTE. RENDA PER CAPTA SUPERIOR A MEIO SALÁRIO
MÍNIMO. CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS QUE INFIRMAM O ESTADO DE MISERABILIDADE.
NECESSIDADES BÁSICAS SUPRIDAS PELOS FAMILIARES. RECURSO DA PARTE AUTORA
DESPROVIDO.
1. O critério da renda percapita implica presunção relativa do estado de necessidade.
2. As reais condições de moradia e a potencial ajuda de familiares, ainda que não pertencentes
ao grupo familiar na forma da lei, devem ser consideradas frente a responsabilidade subsidiária
do Estado em prover a subsistência do indivíduo.
3. No caso dos autos, não há indícios de falta de recursos para atendimento das necessidades
básicas.
4. Recurso a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000158-05.2021.4.03.6336
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: LUIZ RENATO FURLANETTO
Advogado do(a) RECORRENTE: MERIELLIN BARBOSA RODRIGUES - SP254940-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000158-05.2021.4.03.6336
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: LUIZ RENATO FURLANETTO
Advogado do(a) RECORRENTE: MERIELLIN BARBOSA RODRIGUES - SP254940-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela Autora, ora Recorrente, em face da sentença que
julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial de prestação continuada
ao deficiente.
Nas razões recursais, sustenta que há nos autos prova do preenchimento dos requisitos para a
concessão do benefício.
Por essa razão requer a reforma da sentença e a procedência do pedido.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000158-05.2021.4.03.6336
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: LUIZ RENATO FURLANETTO
Advogado do(a) RECORRENTE: MERIELLIN BARBOSA RODRIGUES - SP254940-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O artigo 1.013 do Código de Processo Civil preconiza que o recurso devolve à instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
Desde já é importante dizer que o benefício pleiteado é uma excepcionalidade criada pelo
legislador com o objetivo de política social de inclusão. Não é benefício previdenciário, mas sim
da Assistência Social. Não exige contribuições e por sua natureza deve ser prestado àqueles
que além de não auferirem renda, seja por velhice, seja por deficiência ou impedimento de logo
prazo, não tem nenhum membro da família que lhes possa prestar qualquer auxílio.
É de se ressaltar, ainda, que a concessão indiscriminada do benefício assistencial, fora de sua
configuração constitucional, é fator que vem ajudando a comprometer a higidez do orçamento
da Seguridade Social, com graves prejuízos a toda a sociedade. O benefício foi previsto como
um mecanismo apto a retirar pessoas da miséria e não como instrumento apto a alçar à classe
média ainda que baixa os menos favorecidos ou complementar renda.
Do que diz a Lei n. 13.846, de 18/09/2019 (conversão da MP n. 871, de 18/01/2019).
A Medida Provisória n. 871, de 18/01/2019, que entre outros assuntos instituiu o Programa
Especial para Análise de Benefícios com Indícios de Irregularidade e o Programa de Revisão de
Benefícios por Incapacidade, foi convertida na Lei n. 13.846, de 18/09/2019.
Esta legislação prevê em seu art. 25 a alteração do art. 20 da lei n. 8.742/98, incluindo um
parágrafo 12, nos seguintes termos:
Art.20. Obenefíciodeprestaçãocontinuadaéagarantiadeumsalário-
mínimomensalàpessoacomdeficiênciaeaoidosocom65(sessentaecinco)anosoumaisquecomprov
emnãopossuirmeiosdeproveraprópriamanutençãonemdetê-
laprovidaporsuafamília.(RedaçãodadapelaLeinº12.435,de2011) (VideLeinº13.985,de2020)
§12.Sãorequisitosparaaconcessão,amanutençãoearevisãodobenefícioasinscriçõesnoCadastrod
ePessoasFísicas(CPF)enoCadastroÚnicoparaProgramasSociaisdoGovernoFederal-
CadastroÚnico,conformeprevistoemregulamento. (IncluídopelaLeinº13.846,de2019)
Caso a parte autora não demonstre sua inscrição no CPF e CADÚNICO, está vedada a
concessão de benefícios.
Destaco que cabe a parte autora provar sua inscrição (ônus da prova).
O Cadastro Único é um conjunto de informações sobre as famílias brasileiras em situação de
pobreza e extrema pobreza.
Essas informações são utilizadas pelo Governo Federal, pelos Estados e pelos municípios para
implementação de políticas públicas capazes de promover a melhoria da vida dessas famílias e
sua aprovação serve como critério objetivo do estado de vulnerabilidade dos cidadãos inscritos.
Devem estar cadastradas as famílias de baixa renda que ganham até meio salário mínimo por
pessoa; ou que ganham até 3 salários mínimos de renda mensal total.
Maiores informações no site da Caixa Econômica Federal
(https://www.caixa.gov.br/servicos/cadastro-unico/Paginas/default.aspx).
Superada esta questão impeditiva, passo aos requisitos da concessão propriamente ditos.
Conceitodegrupofamiliar.
Considera-se como parte do mesmo grupo familiar “o cônjuge ou companheiro, os pais e, na
ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados
solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto” (art. 20 da Lei n.º
8.742/93,§ 1º).
Deixo consignado que a Lei nº 12.435/11 alterou o conceito de família, dando nova redação ao
artigo 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, não mais remetendo ao artigo 16 da Lei nº 8.213/91 para
identificação dos componentes do grupo familiar. É o que se depreende do dispositivo acima
transcrito.
ConceitodeDeficienteeIdoso.
A Constituição Federal, em seu art. 203, V, dispôs sobre
“agarantiadeumsaláriomínimodebenefíciomensalàpessoaportadoradedeficiênciaeaoidosoqueco
mprovemnãopossuirmeiosdeproveràprópriamanutençãooudetê-
laprovidaporsuafamília,conformedispuseralei”.
Regulamentando a matéria, a Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis 9.720/98,
12.435/2011 e 13.146/2015, estipulou:
“Art.20.Obenefíciodeprestaçãocontinuadaéagarantiadeumsaláriomínimomensalàpessoacomdefi
ciênciaeaoidosocom65(sessentaecinco)anosoumaisquecomprovemnãopossuirmeiosdeproverap
rópriamanutençãonemdetê-laprovidaporsuafamília.
§1º.Paraosefeitosdodispostonocaput,afamíliaécompostapelorequerente,ocônjugeoucompanheir
o,ospaise,naausênciadeumdeles,amadrastaouopadrasto,osirmãossolteiros,osfilhoseenteadosso
lteiroseosmenorestutelados,desdequevivamsobomesmoteto.
§2ºParaefeitodeconcessãodobenefíciodeprestaçãocontinuada,considera-
sepessoacomdeficiênciaaquelaquetemimpedimentodelongoprazodenaturezafísica,mental,intele
ctualousensorial,oqual,eminteraçãocomumaoumaisbarreiras,podeobstruirsuaparticipaçãoplenae
efetivanasociedadeemigualdadedecondiçõescomasdemaispessoas.
§3ºConsidera-
seincapazdeproveramanutençãodapessoacomdeficiênciaouidosaafamíliacujarendamensalperca
pitasejainferiora1/4(umquarto)dosaláriomínimo.(par.alteradopelaleinº12.435,de06/07/2011)
(...)
§10.Considera-
seimpedimentodelongoprazo,paraosfinsdo§2odesteartigo,aquelequeproduzaefeitospeloprazomí
nimode2(dois)anos.(InclídopelaLeinº12.470,de2011)
Portanto, o benefício assistencial pretendido pela parte autora requer dois pressupostos para a
sua concessão: de um lado, sob o aspecto subjetivo, a deficiência ou idade avançada, e de
outro lado, sob o aspecto objetivo, o estado de miserabilidade, caracterizado pela inexistência
de meios de a pessoa portadora de deficiência ou do idoso prover à própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família.
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas.
Importante dizer que o conceito de deficiência, em sentido amplo, não abrange, portanto,
somente os casos de incapacidade laboral. Para efeitos da concessão do benefício se
considera deficiente o indivíduo que em razão do quadro clínico apresenta alguma faceta (ex.
motora ou estigma visual) que o impeça de concorrer em condições de igualdade com demais
pessoas que apresentam compleição íntegra.
Dodeficientemenorde16anos.
No caso de deficiente menor de 16 anos, a incapacidade é presumida, todavia não é fator de
afastamento da hipótese legal, visto que tal situação pode onerar o grupo familiar, seja na
impossibilidade de trabalhar de um dos membros economicamente ativos (art. 4º, § 2º do
Decreto 6.214/2007 c/c art. 5º, XXXIII da Constituição Federal) e, também, o “impacto na
economia do grupo familiar do menor, seja por exigir a dedicação de um dos membros do grupo
para seus cuidados, prejudicando a capacidade daquele familiar de gerar renda, seja por terem
que dispor de recursos maiores que os normais para sua idade, em razão de remédios ou
tratamentos” (TNU, Pedilef 2007.83.03.50.1412-5/PE).
Doscritériosparaaferiçãodamiserabilidade.
Pois bem. O benefício assistencial requer o preenchimento de dois requisitos cumulativos para
a sua concessão: a) a existência de deficiência ou de idade mínima; e b) hipossuficiência
econômica.
Em relação à questão econômica, cabe observar que, a despeito da controvérsia quanto à
adequação do valor fixado pelo legislador no § 3o., do art. 20, da Lei 8742/93, alterada pela Lei
n. 14.176/21, restou fixado o critério de renda percapita inferior a ¼ do salário mínimo, podendo
ser este flexibilizado para até ½ salário mínimo nos termos do art. 11-A, e 20-B da aludida lei.
§11-A.
Oregulamentodequetratao§11desteartigopoderáampliarolimitederendamensalfamiliarpercapitapr
evistono§3ºdesteartigoparaaté1/2(meio)salário-mínimo,observadoodispostonoart.20-BdestaLei.
(Vigência) (VideLeinº14.176,de2021)
.............................................................................................”(NR)
“Art.20-B.
Naavaliaçãodeoutroselementosprobatóriosdacondiçãodemiserabilidadeedasituaçãodevulnerabili
dadedequetratao§11doart.20destaLei,serãoconsideradososseguintesaspectosparaampliaçãodo
critériodeaferiçãodarendafamiliarmensalpercapitadequetratao§11-Adoreferidoartigo: (Vigência)
(VideLeinº14.176,de2021)
I–ograudadeficiência;
II–adependênciadeterceirosparaodesempenhodeatividadesbásicasdavidadiária;e
III–ocomprometimentodoorçamentodonúcleofamiliardequetratao§3ºdoart.20destaLeiexclusivam
entecomgastosmédicos,comtratamentosdesaúde,comfraldas,comalimentosespeciaisecommedic
amentosdoidosooudapessoacomdeficiêncianãodisponibilizadosgratuitamentepeloSUS,oucomse
rviçosnãoprestadospeloSuas,desdequecomprovadamentenecessáriosàpreservaçãodasaúdeeda
vida.
§1º
Aampliaçãodequetrataocaputdesteartigoocorreránaformadeescalasgraduais,definidasemregula
mento.
§2º Aplicam-
seàpessoacomdeficiênciaoselementosconstantesdosincisosIeIIIdocaputdesteartigo,eàpessoaido
saosconstantesdosincisosIIeIIIdocaputdesteartigo.
§3º
OgraudadeficiênciadequetrataoincisoIdocaputdesteartigoseráaferidopormeiodeinstrumentodeav
aliaçãobiopsicossocial,observadosostermosdos§§1ºe2ºdoart.2ºdaLeinº13.146,de6dejulhode201
5(EstatutodaPessoacomDeficiência),edo§6ºdoart.20edoart.40-BdestaLei.
§4º
OvalorreferenteaocomprometimentodoorçamentodonúcleofamiliarcomgastosdequetrataoincisoIII
docaputdesteartigoserádefinidoematoconjuntodoMinistériodaCidadania,daSecretariaEspecialde
PrevidênciaeTrabalhodoMinistériodaEconomiaedoINSS,apartirdevaloresmédiosdosgastosrealiz
adospelasfamíliasexclusivamentecomessasfinalidades,facultadaaointeressadoapossibilidadedec
omprovação,conformecritériosdefinidosemregulamento,dequeosgastosefetivosultrapassamosval
oresmédios.”
Contudo, esta Relatora já vinha adotando o critério de ½ salário mínimo por entender que a
certeza absoluta do estado de miserabilidade das famílias cujos membros sobrevivam com
menos um quarto de salário mínimo não faz inferir a negativa desse estado de carência em
relação àqueles que sobrevivem com pouco mais.
E o E. Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Recurso Extraordinário 567.985-MT, julgado em
18.04.2013, nos termos do voto condutor, entendeu que “sob o ângulo da regra geral, deve
prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. Ante razões
excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao intérprete do Direito constatar que a
aplicação da lei à situação concreta conduz à inconstitucionalidade, presente o parâmetro
material da Carta da República, qual seja, a miserabilidade, assim frustrando os princípios
observáveis – solidariedade, dignidade, erradicação da pobreza, assistência aos
desemparados. Em tais casos, pode o Juízo superar a norma legal sem declará-la
inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames constitucionais.
Aliás, a comprovação da insuficiência de recursos familiares não se limita à demonstração da
renda percapita mensal inferior a ¼ do salário mínimo. “O STF esclareceu que ao longo dos
últimos anos houve uma proliferação de leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a
concessão de outros benefícios assistenciais (Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; Lei
n. 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Informação; e a Lei n.
10.219/2001, que criou o Bolsa Escola) e apontou a utilização do valor de meio salário mínimo
como valor padrão da renda familiar percapita para análise do preenchimento do requisito da
hipossuficiência econômica que deve ser analisado em conjunto com as peculiaridades do caso
concreto”. (PEDILEF 00009172220084036304, JUIZ FEDERAL BOAVENTURA JOÃO
ANDRADE, TNU, DOU 09/10/2015 PÁGINAS 117/255.)
Nesse sentido, a Súmula nº 21 (TRU 3ª Região):
"Naconcessãodobenefícioassistencial,deveráserobservadocomocritérioobjetivoarendapercapita
de½saláriomínimogerandopresunçãorelativademiserabilidade,aqualpoderásserinfirmadaporcrité
riossubjetivosemcasoderendasuperiorouinferiora½saláriomínimo."
Daexclusãoderendaedoindivíduoqueaufereproventosdeaposentadoriaoubenefíciodeprestaçãoco
ntinuadanovalordeatéumsaláriomínimoeexclusãodevaloresobtidoscomprogramaassistencialdeB
olsaFamília.
O benefício previdenciário ou assistencial no valor de até 1 (um) salário mínimo pago a
qualquer um dos membros do grupo familiar da parte autora não pode ser considerado para o
cálculo da renda familiar, por aplicação analógica do artigo 34 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do
Idoso), in verbis:
“Artigo34.Aosidosos,apartirde65(sessentaecinco)anos,quenãopossuammeiosparaproversuasub
sistência,nemdetê-laprovidaporsuafamília,éasseguradoobenefíciomensalde1(um)salário-
mínimo,nostermosdaLeiOrgânicadaAssistênciaSocial-Loas.
Parágrafoúnico.Obenefíciojáconcedidoaqualquermembrodafamílianostermosdocaputnãoseráco
mputadoparaosfinsdocálculodarendafamiliarpercapitaaqueserefereaLoas.”
Nesse mesmo sentido a jurisprudência:
“BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTIGO 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E LEI Nº
8.742/93. PESSOA IDOSA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. O benefício previdenciário em valor igual a um salário mínimo, recebido por qualquer membro
da família, não se computa para fins de cálculo da renda familiar percapita a que se refere o art.
20 da Lei nº 8.742/93, diante do disposto no parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/2003
(Estatuto do Idoso), cujo preceito é aplicável por analogia.
2. Preenchido o requisito idade, bem como comprovada a ausência de meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, é devida a concessão do benefício
assistencial de que tratam o art. 203, inciso V, da Constituição Federal e a Lei nº 8.742/93.
3. Apelação do INSS improvida.
(APELAÇÃO CIVEL - 825039, Rel. Desembargador GALVÃO MIRANDA, DÉCIMA TURMA,
julgado em 19.12.2006, DJ 31.01.2007 p. 585)”
Nesse passo, diante dos princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana, evidencia-
se razoável a adoção de interpretação mais ampla, por analogia ao disposto no parágrafo único
do artigo 34 da Lei n.º 10.741/03, de modo a desconsiderar, no cômputo da renda percapita,
não somente o benefício recebido por pessoa idosa maior de 65 anos como também o amparo
social ao deficiente e os decorrentes de aposentadoria, de valor mínimo, percebido por
integrante do grupo familiar. Nesse sentido é a jurisprudência do E. Tribunal Regional da 3ª
Região:
ASSISTENCIALECONSTITUCIONAL.AGRAVOLEGAL.ART.557,§1º,DOCPC.BENEFÍCIODEAS
SISTÊNCIASOCIAL.ART.203,V,DACF.RENDAFAMILIARPERCAPITA.ART.20,§3º,DALEIN.º8.7
42/93.APLICAÇÃOANALÓGICADOPARÁGRAFOÚNICODOART.34DALEInº10.741/2003.REQ
UISITOSLEGAISPREENCHIDOS.1.Paraaconcessãodobenefíciodeassistênciasocial(LOAS)faz-
senecessárioopreenchimentodosseguintesrequisitos:1)serpessoaportadoradedeficiênciaouidoso
com65(sessentaecinco)anosoumais(art.34doEstatutodoIdoso-
Lein.º10.741de01.10.2003);2)nãopossuirmeiosdesubsistênciaprópriosoudetê-
laprovidaporsuafamília,cujarendamensalpercapitasejainferiora¼dosaláriomínimo(art.203,V,daC
F;art.20,§3º,eart.38daLein.º8.742de07.12.1993).2.Preenchidososrequisitoslegaisensejadoresàc
oncessãodobenefício.3.OC.SupremoTribunalFederaljádecidiunãohaverviolaçãoaoincisoVdoart.2
03daMagnaCartaouàdecisãoproferidanaADINnº1.232-1-
DF,aaplicaçãoaoscasosconcretosdodispostosupervenientementepeloEstatutodoIdoso(art.34,par
ágrafoúnico,daLein.º10.741/2003).4.Poraplicaçãoanalógicadoparágrafoúnicodoart.34doEstatuto
doIdoso,nãosomenteosvaloresreferentesaobenefícioassistencialaoidosodevemserdescontadosd
ocálculodarendafamiliar,mastambémaquelesreferentesaoamparosocialaodeficienteeosdecorrent
esdeaposentadorianoimportedeumsaláriomínimo.5.AgravoLegalaquesenegaprovimento.(APELR
EEX00084908020094036109,DESEMBARGADORFEDERALFAUSTODESANCTIS,TRF3-
SÉTIMATURMA,e-DJF3Judicial1DATA:18/09/2013)
Excluída a renda de até um salário mínimo, de rigor excluir o beneficiário do cálculo da renda
percapita.
É de se observar que, uma vez excluídos os rendimentos de até um salário mínimo, pago ao
idoso ou deficiente físico, para efeito de apuração da renda percapita do núcleo familiar,
também é de ser excluído aquele que recebe tais rendimentos, e tal sistemática atende ao
disposto no parágrafo único, art. 34 do Estatuto do Idoso.
Veja que constitui equívoco a exclusão da referida renda se também não excluído aquele que a
recebe, para efeito de apuração da renda percapita do núcleo familiar em exame.
Com efeito, embora a lei não explicite a exclusão do idoso ou deficiente que já recebe benefício
assistencial ou previdenciário no valor de um salário mínimo, ditando, apenas, que referida
renda deve ser excluída, tal se mostra decorrência lógica do ditame legal, pois o indivíduo em
questão já está devidamente socorrido pela seguridade social, e, portanto, deve ser excluído do
núcleo familiar para efeito de apuração da renda percapita, de modo a restar sem efeito, nessa
apuração, o valor em questão.
É evidente o escopo da lei em preservar a "neutralidade", para efeito de apuração da renda
percapita, dos valores pagos a título de benefício assistencial, neutralidade esta que inexistiria
se retirada essa renda, em obediência ao ditame legal, mas mantido aquele que a recebe, como
se fosse membro do núcleo familiar sob análise, e, por isso, ainda carente dos recursos
financeiros totais obtidos pelo referido grupo.
Esse equívoco, o de excluir os rendimentos pagos a idosos ou deficientes, a título de benefício
assistencial ou previdenciário no valor de um salário mínimo, porém, com a manutenção do
componente em questão para efeito de apuração da renda percapita, resultaria em apuração de
renda percapita artificialmente diminuída, na medida em que incluiria membro que, em verdade,
não afeta os rendimentos do núcleo familiar, pois, como ressaltado, já tem suas necessidades
básicas atendidas por meio de seus rendimentos próprios, de modo que extirpar esses
vencimentos, mas manter dito componente, implica em renda percapita equivocadamente
apurada, na medida em que leva em consideração indivíduo que não depende economicamente
do núcleo familiar sob exame.
Insta salientar que é falsa a conclusão de que “excluir o componente do grupo e sua renda
resulta no mesmo que não excluir ambos”, o que, evidentemente, não tenderia ao disposto no
parágrafo único do art. 34 do Estatuto do idoso.
Basta analisar cada um dos casos concretos, e apurar a renda percapita com a exclusão do
componente devidamente assistido pelo benefício de um salário mínimo, mas excluído do
núcleo familiar, e comparar o resultado matemático considerando sua inclusão mais seus
rendimentos (nesta última hipótese simulação contrária à lei), e se constatará diferença
comprobatória de que não há equivalência entre "excluir o componente do grupo e sua renda e
manter ambos", última hipótese, repita-se, contrária ao dispositivo legal examinado, com o que
tenho que a correta aplicação do disposto no art. 34 do Estatuto do Idoso tem como vetor a
desconsideração de qualquer efeito financeiro decorrente do cômputo dos rendimentos de um
salário mínimo pago ao idoso ou deficiente a título de benefício assistencial ou previdenciário,
com fim de que tal seja indiferente à apuração da renda percapita, neutralidade esta obtida
desde que haja, também, a desconsideração daquele assistido por esse recurso financeiro,
uma vez que, pontuasse, não depende economicamente do núcleo familiar em questão, porque
já supridas suas necessidades básicas por meio de seus rendimentos próprios.
Quanto ao bolsa-família, consigno que o próprio regulamento do benefício assistencial ora
almejado (Decreto 6.214/2007) prevê a desconsideração, do cálculo da renda mensal, dos
valores oriundos de programas sociais de transferência de renda:
“Art.4ºParaosfinsdoreconhecimentododireitoaobenefício,considera-se:
(...)
VI-
rendamensalbrutafamiliar:asomadosrendimentosbrutosauferidosmensalmentepelosmembrosdaf
amíliacompostaporsalários,proventos,pensões,pensõesalimentícias,benefíciosdeprevidênciapúb
licaouprivada,seguro-desemprego,comissões,pro-
labore,outrosrendimentosdotrabalhonãoassalariado,rendimentosdomercadoinformalouautônomo
,rendimentosauferidosdopatrimônio,RendaMensalVitalíciaeBenefíciodePrestaçãoContinuada,res
salvadoodispostonoparágrafoúnicodoart.19.
§2o
ParafinsdodispostonoincisoVIdocaput,nãoserãocomputadoscomorendamensalbrutafamiliar:(Red
açãodadapeloDecretonº7.617,de2011)
I-
benefícioseauxíliosassistenciaisdenaturezaeventualetemporária;(IncluídopeloDecretonº7.617,de
2011)
II-valoresoriundosdeprogramassociaisdetransferênciaderenda;(...)”
O Bolsa Família é, por dicção legal, um programa social de transferência de renda, vide o caput
do art. 1º da Lei 10.836/04:
“Art.1ºFicacriado,noâmbitodaPresidênciadaRepública,oProgramaBolsaFamília,destinadoàsaçõe
sdetransferênciaderendacomcondicionalidades.”
Assim, verifica-se que segundo o próprio entendimento da Administração Previdenciária, o valor
oriundo do Bolsa Família deve ser desconsiderado para fins de concessão do LOAS.
Quantoàcapacidadefinanceiradafamíliaemproverosustentodeseuenteidosooudeficiente.
Mesmo que já apurada a renda percapita, é necessária também a aferição da capacidade
financeira da família da parte autora (aqui entendida de forma ampla) em prover o seu sustento,
visto que a assistência estatal é subsidiária à assistência que deve ser provida pelos entes
familiares (parte final do art.203, V, da CF88). Ou seja, apenas na impossibilidade da família
sustentar seus idosos ou deficientes é que deve a sociedade arcar com este custo.
Ressalto que, diferentemente do cálculo da renda percapita utilizado para aferição do estado de
miserabilidade, entendo que, neste requisito, toda e qualquer renda deve ser considerada, de
forma a verificar, de fato, se a família é capaz de adimplir ao dever de alimentar.
Tal entendimento está pautado na principiologia constitucional (Princípio da Solidariedade, art.
3º, I, da CF88), transpassando o direito de família (Princípio da Solidariedade Familiar, art.
1.694 do Código Civil) e é excludente legal do direito de concessão do benefício assistencial
(art. 203, V, da CF88), a ver (grifo nosso):
Art.3ºConstituemobjetivosfundamentaisdaRepúblicaFederativadoBrasil:
I-construirumasociedadelivre,justaesolidária;
Art.1.694.Podemosparentes,oscônjugesoucompanheirospedirunsaosoutrososalimentosdequene
cessitemparaviverdemodocompatívelcomasuacondiçãosocial,inclusiveparaatenderàsnecessidad
esdesuaeducação.
Art.203,V-
agarantiadeumsaláriomínimodebenefíciomensalàpessoaportadoradedeficiênciaeaoidosoqueco
mprovemnãopossuirmeiosdeproveraprópriamanutençãooudetê-
laprovidaporsuafamília,conformedispuseralei.
É preciso levar em consideração para a correta interpretação dos requisitos necessários para a
obtenção do benefício assistencial pretendido o disposto nos arts. 229 e 230, caput, da
Constituição Federal, verbis:
Art.229.Ospaistêmodeverdeassistir,criareeducarosfilhosmenores,eosfilhosmaiorestêmodeverde
ajudareampararospaisnavelhice,carênciaouenfermidade.
Art.230.Afamília,asociedade,eoEstadotêmodeverdeampararaspessoasidosas,assegurandosuap
articipaçãonacomunidade,defendendosuadignidadeebem-estaregarantindo-lhesodireitoàvida.
Assim, ainda que o interessado em obter o benefício assistencial não resida com seus pais ou
filhos maiores sob o mesmo teto, a responsabilidade destes não pode ser desprezada para
efeito de avaliação do requisito da miserabilidade, porque
éaosfamiliares,emprimeirolugar,queaConstituiçãoFederalatribuiodeverdeprestaralimentos.
Esse dever é repetido e detalhado no Código Civil, especialmente nos arts. 1.695 a 1.697, que
reproduzo abaixo por questão de clareza:
Art.1.695.Sãodevidososalimentosquandoquemospretendenãotembenssuficientes,nempodeprov
er,peloseutrabalho,àprópriamantença,eaquele,dequemsereclamam,podefornecê-
los,semdesfalquedonecessárioaoseusustento.
Art.1.696.Odireitoàprestaçãodealimentosérecíprocoentrepaisefilhos,eextensivoatodososascend
entes,recaindoaobrigaçãonosmaispróximosemgrau,unsemfaltadeoutros.
Art.1.697.Nafaltadosascendentescabeaobrigaçãoaosdescendentes,guardadaaordemdesucessã
oe,faltandoestes,aosirmãos,assimgermanoscomounilaterais.
Em outras palavras, diante do dever dos pais e dos filhos maiores e, na falta destes, dos
irmãos, a responsabilidade do Estado pelo sustento do idoso é tão somente subsidiária.
Ressalto que o conceito de família expresso no art. 203, V, da CF88, é amplo e não se
relaciona à restrição contida no §1º do artigo 20 da lei 8742/93, este o qual possui caráter
evidentemente operacional e deve ser utilizado exclusivamente para cálculo da renda percapita.
Entendo que a análise da capacidade financeira da família para o sustento de seu ente em
estado de necessidade deve ser efetuada de forma objetiva, a partir da verificação de qual
percentual da renda dos familiares corresponde a um salário mínimo (valor do benefício a ser
concedido).
Em suma, caso um pequeno percentual da renda da família seja equivalente ao valor a ser
pago pelo benefício assistencial, salvo prova em contrário, entendo que se presume a
capacidade dos parentes em prover o sustento do seu ente necessitado, afastando assim, a
necessidade da tutela assistencial.
Dasreaiscondiçõesdemoradiaedapossívelocultaçãoderenda.
O critério de rendapercapta é apenas um dos elementos do estado de miserabilidade e constitui
presunção relativa de vulnerabilidade social se abaixo de percentual de salário mínimo,
entendimento do Enunciado n.º 5 das Turmas Recursais do Juizado Especial Federal
Previdenciário da 3ª Região.
Porém, outros elementos, tais como as condições de moradia incoerentes com a renda
declarada, podem indiciar a existência de ocultação de renda, sobretudo, nos casos em que o
membro da unidade familiar não possui vínculo de emprego com renda demonstrada nos autos
(cópia da CTPS, CNIS ou holerites) ou não consta histórico das contribuições individuais no
CNIS.
Há que se ter em conta, ainda, que a miserabilidade não pode ser presumida, muito menos de
forma absoluta utilizando-se apenas como critério o valor da renda percapita, conforme recente
decisão da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) que
abaixo transcrevo:
Édeconhecimentonotórioqueaeconomiabrasileiraémarcadaporaltopercentualdeinformalidade,nã
osendorarososcasosdefamíliasque,adespeitodenãoregistraremrendaformal,ostentamqualidaded
evidasatisfatória,deacordocompadrõesinternacionalmenteaceitos.Ademais,aadoçãodapresunçã
odemiserabilidadebaseadaexclusivamentenarendaformal,retiradojuizolivreconvencimentomotiva
docombasenaprovadosautos(CPC–artigos131e436)queéumdoscânonesdodireitoprocessualpátri
o.Processo5009459-
52.2011.4.04.7001,RelatorJUIZFEDERALPAULOERNANEMOREIRABARROS.
No mérito.
A sentença recorrida decidiu o pedido inicial de modo exauriente, analisando todas as questões
suscitadas pelas partes, revelando-se desnecessárias meras repetições de sua fundamentação.
Vejamos seu conteúdo quanto a análise do mérito pertinente ao objeto do recurso:
“(...)
No presente caso, a parte autora pretende o restabelecimento do benefício assistencial de
prestação continuada E/NB 87/505.426.682-4, cessado em 04/12/2016.
Requisito subjetivo da deficiência satisfeito. A controvérsia, portanto, diz com a miserabilidade.
Deve-se adotar como premissa de análise a miserabilidade concretamente verificada, que tem
primazia em face dos critérios abstratos de exclusões ou inclusões de valores na rendaper
capitado grupo familiar.
Este é o entendimento da TNU:“[...] o indicador fundamental é o de efetiva necessidade do
auxílio estatal, mediante análise concreta dos meios que o indivíduo possui de prover sua
subsistência, por si só ou com ajuda de sua família. Irrelevância da exclusão, no cômputo da
renda mensal familiar, dos rendimentos no valor de um salário mínimo percebidos por idosos e
deficientes beneficiários da previdência ou da assistência social. Caso concreto em que a
instância ordinária não se restringiu ao aspecto formal da renda per capita familiar, avaliando as
diversas condições socioeconômicas da parte autora, de seu marido e de sua filha, concluindo
que as necessidades básicas de todos os membros familiares estão supridas satisfatoriamente;
o quadro fático-probatório delineado denota ausência de miserabilidade e de estrita
necessidade do benefício assistencial. Perspectiva em que é possível inferir que a mera
aplicação da tese que excluiria formalmente a renda do marido e/ou da filha - proveniente de
benefícios previdenciários - em nada alteraria o resultado prático da demanda. inaplicabilidade,
no caso concreto, do tema 640 do STJ”(TNU. PEDILEF 0035169-36.2017.4.01.3800, Relatora
JUÍZA FEDERAL TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL, julgado em 26/06/2020 e
publicado no DJE em 13/07/2020).
No caso, o grupo familiar é composto pelo autor e seus pais. Enquanto a genitora é dona de
casa, o genitor possui vínculo de emprego com remuneração que supera os R$ 3.000,00 por
mês (id. 103938477).
A receita é compatível com as despesas declaradas, não havendo notícia de dívidas
acumuladas.
Analisando-se o caso, a perita assistencial concluiu que não há miserabilidade na espécie dos
autos (id. 63191705).
Anote-se que o benefício foi cessado em 2016, ao passo que a ação judicial foi distribuída em
2021, tantos anos depois, indício que corrobora os demais elementos de prova no sentido de
que o benefício em questão não é imprescindível à existência digna do requerente.
O Parquet Federal também oficiou pela improcedência do pedido (id. 63191716).
Por fim, destaque-se que a genitora do autor ainda é jovem, possui apenas 52 anos de idade e
pode, em tese, nos momentos em que o filho frequentar a APAE, desenvolver atividade
laborativa para complementar a renda.
Esse o quadro, não comprovada a miserabilidade, o pedido não pode ser acolhido.
(...)”
Apenas a título de complementação, ainda que inexista renda própria, a parte autora não vive,
na prática, situação de miserabilidade que enseje a ajuda estatal que, como já dito nos
fundamentos deste voto, tem por escopo socorrer o indivíduo da indigência e não complementar
renda familiar.
Destaque-se que as proporcionalmente elevadas despesas com abastecimento de veículo
próprio, Modelo CRV, ano 2008, sem alienação fundiária (R$ 450,00 segundo as razões
recursais), bem como as condições de moradia e dos móveis e eletrodomésticos que se verifica
dos registros fotográficos, não se coadunam com a alegada situação de miserabilidade. O que
se apresenta nesses registros é uma situação bastante distante da miserabilidade que se
constata nos inúmeros processos que tramitam nesta justiça federal.
Ao que tudo indica, ainda que com eventuais dificuldades inerentes à situação econômica da
maioria dos brasileiros de classe média baixa, as necessidades básicas do autor têm sido
atendidas.
Assim, ante a falta de comprovação da miserabilidade, a parte autora não faz jus ao benefício
pleiteado e a sentença que deve ser mantida.
Desta feita, o artigo 46 combinadamente com o § 5º do art. 82, ambos da Lei nº 9099/95,
facultam à Turma Recursal dos Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na
sentença.
Ademais a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção
dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX,
da Constituição Federal, vejamos, por exemplo, o seguinte julgado:
EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA
INDIRETA. JUIZADO ESPECIAL. REMISSÃO AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. Controvérsia decidida à luz de legislações infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição
do Brasil.
2. O artigo 46 da Lei nº 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão
aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao artigo 93, IX ,da
Constituição do Brasil.
Agravo Regimental a que se nega provimento. ( AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª
Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008).
O parágrafo 5º do artigo 82 da Lei nº 9.099/95, dispõe “se a sentença for confirmada pelos
próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão”.
O dispositivo legal prevê, expressamente, a possibilidade de o órgão revisor adotar como razão
de decidir os fundamentos do ato impugnado, o que não implica violação do artigo 93, IX, da
Constituição Federal.
Assim, considerando que a sentença recorrida bem decidiu a questão, deve ser mantida nos
termos do artigo 46 da Lei nº 9.099/95.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por
cento) do valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil e do
art. 55 da Lei nº 9.099/95, considerando a baixa complexidade do tema. Para o beneficiário da
gratuidade de justiça, o pagamento da verba honorária se sujeita ao disposto no art. 98, § 3º, do
Código de Processo Civil.
É como voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BPC. DEFICIENTE. RENDA PER CAPTA SUPERIOR A MEIO
SALÁRIO MÍNIMO. CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS QUE INFIRMAM O ESTADO DE
MISERABILIDADE. NECESSIDADES BÁSICAS SUPRIDAS PELOS FAMILIARES. RECURSO
DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.
1. O critério da renda percapita implica presunção relativa do estado de necessidade.
2. As reais condições de moradia e a potencial ajuda de familiares, ainda que não pertencentes
ao grupo familiar na forma da lei, devem ser consideradas frente a responsabilidade subsidiária
do Estado em prover a subsistência do indivíduo.
3. No caso dos autos, não há indícios de falta de recursos para atendimento das necessidades
básicas.
4. Recurso a que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA