Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5070287-19.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
08/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/12/2021
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. REEXAME NECESSÁRIO. NÃO CONHECIMENTO. APELAÇÃO CÍVEL.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. MISERABILIDADE
CONFIGURADA. DEFICIÊNCIA CONFIGURADA. TERMO INICIAL. DER. SUSPENSÃO DO
BENEFÍCIO NO PERÍODO EM QUE O AUTOR EXERCEU ATIVIDADE REMUNERADA. ART.
21-A.
1. A Constituição garante à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não possuir
meios de prover sua própria manutenção o pagamento de um salário mínimo mensal. Trata-se de
benefício de caráter assistencial, que deve ser provido aos que cumprirem tais requisitos,
independentemente de contribuição à seguridade social.
2. Para a concessão do benefício assistencial, necessária a conjugação de dois requisitos:
alternativamente, a comprovação da idade avançada ou da condição de pessoa com deficiência
e, cumulativamente, a miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas
para prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por alguém da família.
3. Sendo possível extrair do conjunto probatório a existência de impedimentos de longo prazo, o
quadro apresentado se ajusta, portanto, ao conceito de pessoa com deficiência, nos termos do
artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 12.435/2011.
4. O autor comprovou nos autos a existência de sua deficiência mesmo à época do requerimento
administrativo, pois demonstrou de forma suficiente nos autos que, ao menos desde o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
requerimento administrativo, já apresentava quadro grave de doença mental, a qual, embora
tenha passado por períodos de melhora, nunca se estabilizou suficientemente.
5. A renda per capita familiar é inferior a ¼ do salário mínimo. Deferimento do benefício, pois há
presunção absoluta de miserabilidade, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior
Tribunal de Justiça.
6. O termo inicial do benefício mantido na data do requerimento administrativo, sendo possível
concluir pelos elementos constantes dos autos que neste momento já estavam presentes os
requisitos necessários à concessão do amparo.
7. Suspensão do benefício no período em que o autor exerceu atividade remunerada na empresa
“Chácara Marigny Artigos para Casa e Jardim EIRELI”, nos termos do art. 21-A, caput e §1º, da
Lei 8742/93.
8. Reexame oficial não conhecido. Apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
dearaujo
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5070287-19.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ANDRE DE SOUZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: FULVIO GOMES VILLAS BOAS - SP268245-A, JOSE
FRANCISCO VILLAS BOAS - SP66430-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5070287-19.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ANDRE DE SOUZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: FULVIO GOMES VILLAS BOAS - SP268245-A, JOSE
FRANCISCO VILLAS BOAS - SP66430-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de reexame necessário e de recurso de apelação interposto pelo INSS diante de
sentença de ID 156799812, que julgou procedente pedido de concessão de benefício de
prestação continuada, de caráter assistencial.
Em suas razões (ID 156799816), o apelante alega que o apelado não faz jus ao benefício
assistencial, por não se enquadrar no conceito legal de pessoa com deficiência. Caso mantida a
condenação, requer a fixação do termo inicial do benefício na data da perícia médica judicial.
Contrarrazões à ID 156799821, com pedido de expedição de ofício para implantação imediata
do benefício.
O Ministério Público Federal se manifestou pelo parcial provimento do recurso, com concessão
do benefício a partir de 18/06/2018 (ID 164792923).
É o relatório.
dearaujo
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5070287-19.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ANDRE DE SOUZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: FULVIO GOMES VILLAS BOAS - SP268245-A, JOSE
FRANCISCO VILLAS BOAS - SP66430-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
DO REEXAME NECESSÁRIO
O novo Código de Processo Civil elevou o valor de alçada para o reexame oficial "ex officio", de
60 (sessenta) salários mínimos, para 1.000 (mil) salários-mínimos, " verbis":
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas
autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará
a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-
á.
§ 2º Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico
obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito
público; [...]" - grifo nosso.
Considerando que o reexame oficial não se trata de recurso, mas de simples condição de
eficácia da sentença, as regras processuais de direito intertemporal a ele não se aplicam, de
sorte que a norma supracitada, estabelecendo que não necessitam ser confirmadas pelo
Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1000 (um mil) salários mínimos, tem
incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, ainda que para cá remetidos na
vigência do revogado CPC.
Nesse sentido, a lição de Nelson Nery Jr.:
"A remessa necessária não é recurso, mas condição de eficácia da sentença. Sendo figura
processual distinta da do recurso, a ela não se aplicavam as regras do direito intertemporal
processual vigente para os eles: a) cabimento do recurso rege-se pela lei vigente à época da
prolação da decisão; b) o procedimento do recurso rege-se pela lei vigente à época em que foi
efetivamente interposto o recurso - Nery. Recursos, n. 37, pp. 492/500. Assim, a L 10352/01,
que modificou as causas em que devem ser obrigatoriamente submetidas ao reexame do
tribunal, após a sua entrada em vigor, teve aplicação imediata aos processos em curso.
Consequentemente, havendo processo pendente no tribunal, enviado mediante a remessa
necessária do regime antigo, o tribunal não poderá conhecer da remessa se a causa do envio
não mais existe no rol do CPC 475. É o caso por exemplo, da sentença que anulou o
casamento, que era submetida antigamente ao reexame necessário (ex- CPC 475 I),
circunstância que foi abolida pela nova redação do CPC 475, dada pela L 10352/01. Logo, se
os autos estão no tribunal apenas para o reexame de sentença que anulou o casamento, o
tribunal não pode conhecer da remessa ." Código de Processo Civil Comentado e Legislação
Extravagante, 11ª edição, pág 744.
Dessa forma, tendo em vista que o valor de alçada no presente feito não supera 1.000 (um mil)
salários mínimos, não conheço do reexame necessário.
DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA
A Constituição garante à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não possuir
meios de prover sua própria manutenção o pagamento de um salário mínimo mensal. Trata-se
de benefício de caráter assistencial, que deve ser provido aos que cumprirem tais requisitos,
independentemente de contribuição à seguridade social:
“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
[...]
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.”
Como se vê, o inciso V ao art. 203 da Constituição Federal é norma de eficácia limitada, isto é,
o efetivo pagamento do benefício dependia de edição de lei regulamentadora.
Essa regulamentação foi feita pela Lei n° 8.742/93, a chamada Lei Orgânica da Assistência
Social (“LOAS”), que, entre outras coisas, disciplinou os requisitos necessários à
implementação do benefício assistencial de prestação continuada.
O art. 20 da referida lei tem a seguinte redação:
“Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo
teto.
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com
qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência
médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito
do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de
impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas
por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.
§7oNa hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica
assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais
próximo que contar com tal estrutura.
§8oA renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu
representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o
deferimento do pedido.
§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão
computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste
artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que
produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados
outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento”.
Para a concessão do benefício assistencial, necessária, então, a conjugação de dois requisitos:
alternativamente, a comprovação da idade avançada ou da condição de pessoa com deficiência
e, cumulativamente, a miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas
para prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por alguém da família.
DA DEFICIENCIA ALEGADA PELA PARTE AUTORA
No caso dos autos, o autor afirma ser portador de deficiência.
A Lei Orgânica da Assistência Social prevê que "[p]ara efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma
ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas" (art. 20, §2º) e que se considera impedimento de longo
prazo "aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos" (art. 20, §10).
O laudo médico pericial (ID 156799768), realizado em 18/06/2018, indica que o autor, à época
com 28 anos de idade, possui diagnóstico de esquizofrenia paranoide, síndrome de
dependência e transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso de cocaína. Como
sintomas dessas condições de saúde, o autor apresenta “sinais nítidos de perturbação mental”,
“comportamento social fora do normal e incapacidade de distinguir o que é ou não real”,
“delírios, pensamentos confusos e pouco claros, alucinações auditivas, etc.”
Nesse sentido, conclui o perito que o autor apresenta impedimento de longa duração, com
incapacidade laborativa total e permanente, embora não tenha sido possível estabelecer a data
de início da incapacidade.
Em complementação às informações prestadas pelo perito médico, o autor informou por
ocasião do estudo social (ID 156799798) que é portador de esquizofrenia desde a infância, que
já havia ficado internado em hospitais psiquiátricos em três ocasiões, e que realizava
acompanhamento no CAPS.
É verdade que, entre o requerimento administrativo (30/10/2013 – ID 156799731) e a realização
da perícia houve significativo transcurso de tempo. Contudo, entendo que o autor comprovou
nos autos a existência de sua deficiência mesmo à época do requerimento administrativo.
Há nos autos documentação médica (ID 156799728 e 156799777) que remonta a 20/10/2012.
Estes documentos dão conta de que o autor estava em tratamento psiquiátrico para as mesmas
condições de saúde verificadas no laudo pericial, havendo nesse sentido atestados com datas
de 20/10/2012, 07/08/2013, 12/08/2013, 22/10/2013, 26/08/2014, 25/02/2015, 17/02/2016,
15/10/2016, 25/07/2017, 08/11/2017, 07/02/2018, 04/04/2018, 27/06/2018 e 01/08/2018.
No momento do requerimento administrativo, o autor já havia passado por três internações
psiquiátricas compulsórias, em 2010, 2012 e em 2013. A mais recente delas ocorreu após
pedido médico emitido em 07/08/2013, com solicitação de urgência, sendo que a internação
teve início em 12/08/2013 e a alta ocorreu em 22/10/2013 – apenas oito dias antes do
requerimento administrativo. Os documentos mencionados acima demonstram que a doença do
autor continuou descompensada nos anos seguintes, tendo culminado em novo pedido de
internação compulsória em 07/01/2020, após a realização da perícia, em razão de “episódio
psicótico agudo” (ID 15679979).
Assim, entendo que o autor demonstrou de forma suficiente nos autos que, ao menos desde o
requerimento administrativo, já apresentava quadro grave de doença mental, a qual, embora
tenha passado por períodos de melhora, nunca se estabilizou suficientemente.
Sendo possível extrair do conjunto probatório a existência de impedimentos de longo prazo, o
quadro apresentado se ajusta, portanto, ao conceito de pessoa com deficiência, nos termos do
artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 12.435/2011.
DA SITUAÇÃO SOCIAL DA PARTE AUTORA
A LOAS prevê que há miserabilidade quando a renda familiar mensal per capita é inferior a ¼
de um salário mínimo (art. 20, §3º), sendo que se considera como “família” para aferição dessa
renda “o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto” (art. 20, §1º).
Embora esse requisito tenha sido inicialmente declarado constitucional pelo Supremo Tribunal
Federal na Ação Direita de Inconstitucionalidade n º 1.232-1, ele tem sido flexibilizado pela
jurisprudência daquele tribunal. Nesse sentido, com o fundamento de que a situação de
miserabilidade não pode ser aferida através de mero cálculo aritmético, o STF declarou, em
18.04.2013, ao julgar a Reclamação 4.374, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de
nulidade, e do art. 20, §3º da LOAS.
Seguindo essa tendência foi incluído em 2015 o §11 ao art. 20 da LOAS com a seguinte
redação:
“§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados
outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento”.
No caso dos autos, conforme o estudo social (ID 156799798), realizado em 03/02/2020, o autor
reside com sua companheira, Angélica. Nenhum dos dois possui renda, e o casal vem
sobrevivendo mediante auxílio da mãe do autor e doações.
Assim, a renda per capita familiar é nula – inferior, portanto, a ¼ do salário mínimo. Deste
modo, é caso de deferimento do benefício, pois há presunção absoluta de miserabilidade, nos
termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, § 3º, DA LEI N. 8.742/93 (LOAS)NECESSIDADE OU
HIPOSSUFICIÊNCIA SÓCIO-ECONÔMICA. CONSTATAÇÃO DA RENDA PER CAPITA
INFERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO POR INDIVÍDUO ATRAVÉS DE OUTROS MEIOS.
ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO ASSENTADO NO
RESP N. 1.112.557/MG, JULGADO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC.
1. Segundo decidido no REsp n. 1.112.557/MG, submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-
C do CPC, "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única
forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se
aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada
a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo".
2. Agravo regimental não provido.”
(AgRg no AREsp 267.781/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 18/12/2014, DJe 03/02/2015)
Ademais, as condições descritas no estudo social comprovam a situação de miserabilidade
alegada. O casal reside em casa de construção inacabada, localizada em bairro periférico,
composto de cozinha, quarto e banheiro. Os móveis da residência são poucos, simples e
antigos, e não são suficientes a garantir a subsistência da família em condições compatíveis
com a dignidade humana. Não há nem mesmo cama ou armários, e o casal dorme em
colchonete no chão.
Assim, é caso de deferimento do benefício.
DO TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(30/10/2013), sendo possível concluir pelos elementos constantes dos autos que neste
momento já estavam presentes os requisitos necessários à concessão do amparo.
Neste sentido, colaciono os seguintes julgados:
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 20, §1º, DA LEI N. 8.742/93. COMPOSIÇÃO DO NÚCLEO
FAMILIAR. IRMÃ DO AUTOR, CUNHADO E SOBRINHO. NÚCLEOS FAMILIARES DIVERSOS.
INTERPRETAÇÃO INCONTROVERSA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO DE LEI. OCORRÊNCIA.
INCAPACIDADE. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. TERMO INICIAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
[...] XI - O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data de entrada do requerimento
administrativo (06.11.2007), momento no qual a autarquia previdenciária tomou ciência da
pretensão deduzida em Juízo. Não há falar-se em prescrição, tendo em vista que entre a data
do indeferimento do pedido administrativo (14.11.2007) e a data do ajuizamento da ação
subjacente (17.03.2009). [...]”
(TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR 0015567-03.2010.4.03.0000, Rel.
DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, julgado em 25/06/2015, e-DJF3
Judicial 1 DATA:15/07/2015)
“AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. JULGAMENTO POR DECISÃO MONOCRÁTICA. ART.
557, CAPUT DO CPC. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
[...] 3. O termo inicial do benefício deve ser mantido conforme decisão monocrática à data do
requerimento administrativo mais recente (06/05/2010), uma vez que a parte autora demonstrou
ter preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
4. Agravo legal desprovido.”
(TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, APELREEX 0003353-70.2011.4.03.6102, Rel. JUIZ
CONVOCADO VALDECI DOS SANTOS, julgado em 14/04/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:22/04/2015)
DA SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO
Dispõe o art. 21-A da Lei 8742/93:
“Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando
a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual.
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste
artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não
tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21”.
Verifica-se no CNIS do autor (ID 156799816, p. 11) que ele trabalhou na empresa “Chácara
Marigny Artigos para Casa e Jardim EIRELI” no período de 10/12/2014 a 08/01/2015. Assim,
somente nesse período, deve-se considerar que o benefício ficou suspenso, não fazendo jus o
autor ao recebimento das prestações em atraso.
Diante do exposto, NÃO CONHEÇO do reexame necessário e DOU PARCIAL PROVIMENTO à
apelação do INSS, apenas para reconhecer que o benefício ficou suspenso no período de
10/12/2014 a 08/01/2015, não sendo devidas as prestações em atraso relativas a esse
intervalo.
Considerando tratar-se de benefício de caráter alimentar, concedo a tutela de urgência, a fim de
determinar ao INSS a imediata implementação do benefício de prestação continuada em favor
da parte autora, sob pena de desobediência, oficiando-se àquela autarquia, com cópia desta
decisão.
É o voto.
dearaujo
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. REEXAME NECESSÁRIO. NÃO CONHECIMENTO. APELAÇÃO
CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. MISERABILIDADE
CONFIGURADA. DEFICIÊNCIA CONFIGURADA. TERMO INICIAL. DER. SUSPENSÃO DO
BENEFÍCIO NO PERÍODO EM QUE O AUTOR EXERCEU ATIVIDADE REMUNERADA. ART.
21-A.
1. A Constituição garante à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não
possuir meios de prover sua própria manutenção o pagamento de um salário mínimo mensal.
Trata-se de benefício de caráter assistencial, que deve ser provido aos que cumprirem tais
requisitos, independentemente de contribuição à seguridade social.
2. Para a concessão do benefício assistencial, necessária a conjugação de dois requisitos:
alternativamente, a comprovação da idade avançada ou da condição de pessoa com deficiência
e, cumulativamente, a miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas
para prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por alguém da família.
3. Sendo possível extrair do conjunto probatório a existência de impedimentos de longo prazo, o
quadro apresentado se ajusta, portanto, ao conceito de pessoa com deficiência, nos termos do
artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 12.435/2011.
4. O autor comprovou nos autos a existência de sua deficiência mesmo à época do
requerimento administrativo, pois demonstrou de forma suficiente nos autos que, ao menos
desde o requerimento administrativo, já apresentava quadro grave de doença mental, a qual,
embora tenha passado por períodos de melhora, nunca se estabilizou suficientemente.
5. A renda per capita familiar é inferior a ¼ do salário mínimo. Deferimento do benefício, pois há
presunção absoluta de miserabilidade, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior
Tribunal de Justiça.
6. O termo inicial do benefício mantido na data do requerimento administrativo, sendo possível
concluir pelos elementos constantes dos autos que neste momento já estavam presentes os
requisitos necessários à concessão do amparo.
7. Suspensão do benefício no período em que o autor exerceu atividade remunerada na
empresa “Chácara Marigny Artigos para Casa e Jardim EIRELI”, nos termos do art. 21-A, caput
e §1º, da Lei 8742/93.
8. Reexame oficial não conhecido. Apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
dearaujo ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu NÃO CONHECER do reexame oficial e DAR PARCIAL PROVIMENTO à
apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA