APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033942-18.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO ONO MARTINS - SP224553-N
APELADO: MANOEL RODRIGUES DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO MASSAQUI KASHIURA - SP163406-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033942-18.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO ONO MARTINS - SP224553-N
APELADO: MANOEL RODRIGUES DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO MASSAQUI KASHIURA - SP163406-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR):
Trata-se de ação ajuizada em18/05/2011
em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do tempo de trabalho rural, sem registro em CTPS, de 02/12/1965 a 05/2011.Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo, julgou parcialmente procedente o pedido para determinar que o réu proceda à averbação do período no qual o autor exerceu atividade rural, de 11/07/1972 a 03/04/2004. Pela sucumbência recíproca, as custas e despesas processuais serão proporcionalmente distribuídas e compensadas entre os litigantes, arcando cada qual com os honorários de seus respectivos patronos, nos termos do art. 21, do CPC/73.
Inconformado, apelou o INSS sustentando que o conjunto probatório não demonstra a atividade rural do autor. Afirma, ainda, que o período de atividade rural não pode ser computado para efeito de carência.
Em contrarrazões, o autor pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033942-18.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO ONO MARTINS - SP224553-N
APELADO: MANOEL RODRIGUES DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO MASSAQUI KASHIURA - SP163406-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR):
Dispõe o art. 329 do CPC/15, in verbis:"O autor poderá:
I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;
II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar."
Nestes termos, da simples leitura do dispositivo legal, depreende-se ser imprescindível, após a citação, a anuência do réu para acolhimento do aditamento, não sendo possível a alteração do pleito e da causa de pedir após o saneamento do feito.
Logo, não conheço do pedido realizado em contrarrazões de apelação.
No que tange ao reconhecimento de tempo de serviço rural, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de serviço é indispensável a existência de início de prova material, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal. Outrossim, nos termos da Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário."
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. VALIDADE DOS DOCUMENTOS EM NOME DO CÔNJUGE, DESDE QUE COMPLEMENTADA COM ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA DOS DOCUMENTOS APRESENTADOS. PERÍODO ANTERIOR E POSTERIOR. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural por idade, deve ser demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.
2. São aceitos, como início de prova material, os documentos em nome do cônjuge que o qualifiquem como lavrador, mesmo após seu falecimento, desde que a prova documental seja complementada com robusta e idônea prova testemunhal, atestando a continuidade da atividade rural.
3. No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, esta Corte, examinando a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
4. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim valoração do conjunto probatório existente (AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 11/04/2014).
5. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.452.001/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, j. em 5/3/15, v.u., DJ 12/3/15, grifos meus)
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL EXTEMPORÂNEO. RATIFICAÇÃO POR MEIO DE ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. MATÉRIA DEFINIDA EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. CUMULAÇÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE COM PENSÃO ESTATUTÁRIA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. PERCEPÇÃO DE PENSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CARACTERIZAÇÃO. RENDAS NÃO MENSURADAS. SÚMULA 7/STJ.
1. Este Superior Tribunal firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP - acórdão ainda não publicado).
2. Por serem benefícios com distintos fundamentos legais, não há óbice à cumulação de aposentadoria rural com pensão estatutária.
3. Somente se descaracteriza o regime de economia familiar, caso a renda derivada de outra atividade supere, ou dispense, a obtida no labor rural. No caso dos autos, entretanto, tal cotejamento não foi mencionado pelo acórdão de origem, sendo inviável fazê-lo em sede de recurso especial, em razão do óbice da Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.347.289/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Og Fernandes, j. em 24/4/14, v.u., DJ 20/5/14, grifos meus)
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica raramente decorre de circunstância isoladamente considerada. Os indícios de prova material, singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - torna inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Observo, por oportuno, que a listagem dos documentos mencionados no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativa, consoante precedente jurisprudencial do C. STJ (REsp. nº 433.237, 5ª Turma, Relator Min. Gilson Dipp, j. 17/9/2002, DJ 14/10/02, p. 262, v.u.).
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
Passo à análise do caso concreto.
Relativamente ao reconhecimento do tempo de serviço rural no período de
11/07/1972 a 03/04/2004
o autor, nascido em02/12/1953,
trouxe aos autos os seguintes documentos que interessam à solução da lide:- Carta endereçada ao Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Dracena, de 18/11/1975, requerendo a inscrição na mencionada entidade sindical..
- Certidão de casamento dos pais do requerente, indicando a profissão de lavrador de seu genitor.
- Certidão de óbito de filha do autor, de 14/03/1983, informando sua qualificação de lavrador.
- Certificado de reservista, de 1972, constando a profissão de lavrador do autor.
- Certidão de casamento de filho, de 2004, indicando a profissão de lavrador do requerente.
- Certidão de nascimento de filha, de 30/09/1975, qualificando-o como lavrador.
- Certidão de casamento, de 13/06/1975, constando sua qualificação de lavrador.
- Depósito efetuado do Banco Bandeirantes, de 1979, referente a “Custeio Produtos Agricultura”.
- Cédula Rural Pignoratícia, de 06/10/1978.
- Declarações cadastrais de produtor, de 1997, 2001 e 2004.
- Declaração do autor, de 26/08/1997, protocolada no Posto Fiscal de Tupi Paulista informando que sua atividade anterior era de “pecuarista”.
- Autorizações para impressão de documentos fiscais – nota fiscal de produtor, de 1997 e de 1999.
- Declaração do autor, de 08/10/2004, protocolada no Posto Fiscal de Dracena, afirmando que, para fins de cancelamento de inscrição, não possui estoque de mercadorias.
- Contrato particular de parceria agrícola, de 31/08/2000, figurando como parceiro e indicando que deve cuidar de 5.800 pés de café.
Em depoimento pessoal afirmou ter trabalhado com o Sr. Geraldo Correa de Melo, desde 1973 até a atualidade. Aduz ter laborado com o Sr. Geraldo na Fazenda Mário Arruda, em Dracena, de 1975 a 1983 e na Fazenda Ottoboni, em 2011. Afirma que o Sr. Jonas Isidoro é seu vizinho, mas que o conhece desde 1981. Relata que trabalhou para o Sr. Jonas “batendo amendoim” mas não se recorda em que ano. Informa que conhece o Sr. Valdemar desde 1976, eis que moraram próximos, na cabeceira do sítio, mas que não trabalharam juntos.
A primeira testemunha, Sr. Geraldo Correa de Melo, afirmou conhecer o autor desde 1973. Aduz que trabalhou com o autor como diarista, de 1981 a 1982, na propriedade rural do Sr. Duilio Catadori. Informa que, de 1975 a 1978 moravam na Fazenda Boa Vista, mas cada um cuidava de sua parte na lavoura de café. Relata que ficaram nesta propriedade até 1981, como parceiros e no ano seguinte passaram a trabalhar como diaristas no mesmo local. Após, começaram a trabalhar por porcentagem e voltaram a laborar como parceiros em 1982. Relata que o autor nunca trabalhou na cidade e que exerce atividade rural até a atualidade.
A segunda testemunha, Sr. Jonas Isidoro da Silva, afirma que conhecer o autor desde 1981. Informa que o requerente lhe prestou serviços, “batendo amendoim” e que, atualmente, trabalha como volante. Assevera que, na chácara do “Tuta” o autor trabalhou como parceiro e recebia 45% (quarenta e cinco por cento). Informa que o requerente trabalhava na lavoura junto com a família e não contratavam terceiros, eis que sempre foram empregados.
Dessa forma, entendo que as provas exibidas constituem um conjunto harmônico de molde a colmatar a convicção no sentido de que a parte autora tenha exercido atividades no campo no período de
11/07/1972 a 03/04/2004.
Com efeito, os indícios de prova material, singularmente considerados, não são, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas apenas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - tornaria inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Como mencionado anteriormente, o tempo rural ora reconhecido, no período anterior ao início da vigência da Lei nº 8.213/91 não será computado para efeito de carência e, o período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem recolhimento de contribuição, somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, I, da Lei nº 8.213/91.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo do INSS apenas para consignar que o tempo de trabalho como segurado especial anterior ao início da vigência da Lei nº 8.213/91, não poderá ser computado para efeito de carência e, o período posterior ao advento da mencionada lei, sem o recolhimento de contribuições, somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, I, da Lei de Benefícios e não conheço do pedido realizado em contrarrazões de apelação.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. RECONHECIMENTO.
I –- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por coerente e robusta prova testemunhal.
II - O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo acostado aos autos como início de prova material, desde que amparado por prova testemunhal idônea.
III - O C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta.
IV - No caso concreto, o acervo probatório permite o reconhecimento da atividade rural, sem registro em CTPS, em parte do período pleiteado.
V - Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
VI – Apelo do INSS parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao apelo do INSS e não conhecer do pedido do autor formulado em contrarrazões, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.