D.E. Publicado em 18/01/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento às apelações, da parte autora e do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002197-61.2012.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação ajuizada em 19/03/2012 por Paulo Soares da Silva (incapaz), representado por seu genitor Avelino Soares da Silva, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando:
a) restabelecimento de auxílio-doença (sob NB 517.661.540-8), com a posterior conversão em aposentadoria por invalidez; e
b) suspensão da cobrança de débito de valores relativos ao auxílio-doença outrora percebido, entre 19/08/2006 e 30/09/2009 (no montante de R$ 20.087,56 - fls. 26/27 e 21).
Data de nascimento da parte autora - 26/04/1981 (fl. 17).
Documentos (fls. 17/63) - observando-se cópia de CTPS (fls. 69/70).
Assistência judiciária gratuita (fl. 65).
Certidão de curador provisório (fl. 95) e juntada de procuração por instrumento público (fl. 98).
Tutela antecipada deferida parcialmente aos 05/11/2012, determinando-se ao INSS a suspensão imediata da cobrança do débito (fls. 99 e verso).
Citação aos 04/12/2012 (fl. 108).
Laudos médico-periciais (psiquiátrico - fls. 153/161, e neurológico - fls. 182/187).
CNIS/Plenus (fls. 123/135) - constatada percepção de "auxílio-doença" pela parte autora, desde 19/08/2006 até 30/09/2009 (sob NB 517.661.540-8, fl. 28 e 123), e contribuições individuais vertidas entre agosto/2005 e novembro/2006 (fls. 71/77).
Manifestou-se o Ministério Público Federal (fls. 192/193), pela procedência do pedido inaugural.
A r. sentença prolatada aos 21/01/2016 (fls. 196/200) julgou parcialmente procedente o pedido, apenas para declarar a inexigibilidade da cobrança dos valores outrora percebidos pela parte autora, a título de "auxílio-doença"; determinada a sucumbência recíproca entre as partes - autora e ré - e determinada, ainda, a remessa oficial. Custas ex lege.
Irresignado, o autor apelara (fls. 202/208), defendendo a concessão do benefício, desde a cessação indevida levada a efeito pelo INSS, isso porque, aponta, teria restado provada, nos autos, sua incapacidade laborativa exsurgida posteriormente à filiação ao regime previdenciário; aduz, ainda, a ocorrência de cerceamento de defesa, porquanto impedido de produzir a prova testemunhal requerida no curso da ação.
Inconformada, a autarquia previdenciária apelou (fls. 212/222), pugnando, de início, pelo reexame necessário de toda a matéria desfavorável; por mais, defendendo a possibilidade de cobrança das parcelas pagas indevidamente ao autor, ante a constatação da preexistência de doenças à filiação ao regime previdenciário - apurada em sede de revisão administrativa; doutra via, pleiteia a fixação honorária em percentual de 5%, respeitada a letra da Súmula 111 do C. STJ; a isenção de custas processuais; e a alteração de critérios de juros de mora e correção monetária.
Com contrarrazões (fls. 224/229), subiram os autos a esta E. Corte, sobrevindo parecer do Parquet Federal (fls. 232/235), opinando pelo desprovimento do recurso do autor e pelo provimento do recurso do INSS.
É O RELATÓRIO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002197-61.2012.4.03.6183/SP
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
De início, quanto à r. sentença, cumpre dar ênfase às datas, de sua prolação (aos 21/01/2016 - fl. 200vº) e ciência (disponibilização, via sistema informatizado, aos 27/01/2016 - fl. 201; e intimação pessoal do INSS, aos 11/03/2016 - fl. 210).
Da Remessa Oficial
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC - vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o princípio inquisitório (e não o princípio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, não produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, não-obstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Resta, assim, rechaçada a preliminar arguida pelo INSS.
Já no que concerne à preliminar levantada pela parte autora, acerca do suposto cerceamento de defesa, rechaço-a também, porquanto para fins de comprovação de efetiva incapacidade laborativa, a produção de prova testemunhal reputa-se deveras inócua.
Senão vejamos.
O benefício de aposentadoria por invalidez está disciplinado nos arts. 42 a 47 da Lei nº 8.213, de 24.07.1991. Para sua concessão deve haver o preenchimento dos seguintes requisitos: i) a qualidade de segurado; ii) o cumprimento da carência, excetuados os casos previstos no art. 151 da Lei nº.8.213/1991; iii) a incapacidade total e permanente para a atividade laborativa; iv) ausência de doença ou lesão anterior à filiação para a Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas.
No caso do benefício de auxílio-doença, a incapacidade há de ser temporária ou, embora permanente, que seja apenas parcial para o exercício de suas atividades profissionais habituais, ou ainda, que haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o sustento do segurado, nos termos dos arts. 59 e 62 da Lei nº 8.213/1991.
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei nº 8.213/91 em seu artigo 25, inciso I, in verbis:
Destacados os artigos que disciplinam os benefícios em epígrafe, passo a analisar o caso concreto.
Acerca do tema da incapacidade laborativa, observam-se nos autos dois laudos médico-periciais:
- laudo psiquiátrico, produzido aos 19/08/2014 (contando o autor com 33 anos de idade, à época): o postulante apresentaria "...crises epiléticas desde os 09 anos de idade, que por serem de alta frequência, foram tratadas cirurgicamente com calosotomia e implantação de eletrodo vogal ...o quadro epilético foi controlado ...ele conseguiu estudar, terminar o ensino médio e até fazer cursos complementares ...passou a trabalhar na construção civil até que em 07/10/2005 teve uma crise convulsiva, caiu da própria altura e teve traumatismo craniano encefálico com hemorragia subdural ...o quadro convulsivo começou a reaparecer ...passou a apresentar sintomas depressivos ...para tratar a depressão passou a fazer tratamento psiquiátrico, chegando a ser internado ...em 2008 teve outro episódio de queda da própria altura em crise epilética ...atualmente apresenta um quadro de epilepsia de difícil controle, e não pode ser operado, cursando com várias crises epiléticas por dia...". Constatou-se, em suma, o padecimento de "epilepsia e episódio depressivo moderado", concluindo-se pela incapacidade laborativa total e temporária, a partir de 08/03/2006;
- laudo neurológico, produzido em 07/07/2015: o demandante sofreria de "...epilepsia desde a infância ...apresentando quadro de demência pós-TCE (traumatismo craniano encefálico) ...com leve comprometimento de memória de fixação para fatos de média e curta duração, secundária a traumatismo craniano em outubro/2005 ...comprometimento cognitivo impede de realizar tarefas habituais como alimentar-se, fazer sua higiene, incapacitando-o para o trabalho...". Concluiu o experto pela incapacidade total e permanente, desde outubro/2005.
Ainda dos autos, deve-se destacar que a parte autora encontrar-se-ia interditada, sendo que, de acordo com o resultado pericial, necessitaria de auxílio de terceiros para quaisquer atividades do dia-a-dia.
No tocante aos qualidade de segurado e cumprimento de carência, sobrevêm comprovantes de recolhimento de contribuições previdenciárias - vertidas de agosto/2005 até novembro/2006 (fls. 71/77), na qualidade de "contribuinte individual" - roborados pela lauda de pesquisa ao sistema informatizado CNIS, cuja juntada ora determino.
Assim, verifica-se que a parte autora, à época do surgimento da incapacidade, possuía qualidade de segurada necessária à concessão dos benefícios em questão, entretanto, não havia preenchido o período de carência previsto no inciso I do art. 25 da Lei 8.213/91, pois não tinha recolhido as 12 (doze) contribuições exigidas.
Cumpre observar que os segurados acometidos das enfermidades elencadas no artigo 151 da Lei 8.213/91 estão dispensados da comprovação da carência. Dentre as enfermidades enumeradas pelo artigo supracitado, não se encontram as patologias da parte demandante, pelo que necessário seu cumprimento no presente caso.
Destarte, não restaram cumpridos todos os requisitos previstos legalmente para o deferimento da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença.
Nesse sentido, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal:
Lado outro, no tocante à cobrança dos valores recebidos indevidamente, o constante no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, a seguir transcrito, contempla a possibilidade de descontos de pagamento de benefício além do devido:
Cabe, no entanto, interpretar, em cotejo com o objetivo da norma em questão, ou seja, diante da sua finalidade principal, qual seria o alcance da expressão "podem ser descontados", que sugere uma prerrogativa própria da administração pública, vale dizer, um permissivo legal precedido de juízo discricionário - conveniência e oportunidade - e não o poder-dever de descontar a qualquer custo, sem a possibilidade de atentar-se para a forma mais justa e eficiente de se proceder.
Dentre os princípios e objetivos da Previdência Social, estampados nos dispositivos inaugurais da mesma lei previdenciária invocada, estão a garantia aos beneficiários, dos "meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente" (art. 1º); "a irredutibilidade do valor dos benefícios de forma a preservar-lhes o poder aquisitivo" e o estabelecimento do valor da renda mensal dos benefícios em patamar nunca inferior ao do salário mínimo (art. 2º, V e VI).
Os valores recebidos pela parte postulante decorreram de erro administrativo devidamente reconhecido pelo INSS.
Impõe-se observar, outrossim, que a Administração deferiu o benefício e o manteve, sem que houvesse má-fé da parte autora, possuindo seus valores natureza nitidamente alimentar e, por conta de tal característica, insuscetíveis de repetição.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça, sobre o tema, firmou o seguinte entendimento:
Da mesma forma, esta Corte assim decidiu:
No caso sub judice, de imediato constata-se que, da prestação paga indevidamente, não resultou na mínima deslocação patrimonial em favor da parte autora, especialmente porque, conforme já afirmado, os valores recebidos têm natureza alimentar.
Assim sendo, embora o reembolso de quantias indevidamente pagas pelo INSS encontre previsão legal, deve ser tal procedimento sopesado com os elementos concretos de cada feito, levando em conta o fundamento maior para a existência de um sistema previdenciário, voltado para a estruturação organizada da proteção social.
Conclui-se, portanto, que, sendo as verbas revestidas de natureza alimentar e tendo sido recebidas de boa-fé, não se cogita em repetição dos valores pagos.
Preservada, pois, a determinação da sucumbência recíproca entre as partes.
Isso posto, NÃO CONHEÇO DA REMESSA OFICIAL, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR e, no mérito, NEGO PROVIMENTO AOS APELOS, DA PARTE AUTORA e DO INSS, tudo conforme acima explicitado.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 12/12/2016 16:57:46 |