Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000035-79.2016.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
12/09/2017
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 19/09/2017
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. IRREGULARIDADE NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
EXIGIBILIDADE DE DÉBITO. LEGALIDADE DA CONDUTA DA AUTARQUIA. DESCONTOS
NOS PROVENTOS. LIMITAÇÃO A 10%. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
I - No que tange à legalidade da reavaliação do auxílio-doença percebidos pelo autor, dispõe o
artigo 69 da Lei nº 8.212/91 que O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da
manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas
existentes.
II - Não obstante a incapacidade para o labor durante o período de 01.05.2007 e 12.11.2007
tenha sido comprovada nos autos, não foi atendida a carência para o reconhecimento do direito
ao benefício de auxílio-doença. De fato, o compulsar dos autos revela que malgrado o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
demandante contasse com mais de 12 contribuições durante a sua vida laboral, ele cessara o
recolhimento de contribuições previdenciárias em setembro de 1999, voltando a contribuir aos
cofres do RGPS apenas em fevereiro de 2005, ocorrendo, portanto, a perda da qualidade de
segurado, consoante se infere do extrato do CNIS anexado aos autos. Destarte, para que as
contribuições anteriores à aludida perda da qualidade de segurado fossem consideradas, mister
se fazia o recolhimento de, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o
auxílio-doença, ou seja, 04 contribuições, a partir de nova filiação, a teor do art. 24, parágrafo
único, da Lei n. 8.213/91. Todavia, ele recolheu apenas 03 contribuições anteriormente à data de
início da incapacidade fixada em 14.04.2005 (fevereiro, março e abril de 2005), não recuperando
sua condição de segurado e não podendo aproveitar as contribuições anteriores para fins de
carência.
III - Considerando que o autor não preenchia os requisitos legais para a concessão do auxílio-
doença, ante a perda da qualidade de segurado, efetivamente houve irregularidade no
deferimento anteriormente ocorrido, sendo devida a cobrança.
IV – O presente caso não versa sobre interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da
Administração, não havendo, tampouco, que se cogitar de boa-fé do autor ou não participação no
esquema fraudulento, de modo que a restituição das quantias indevidamente recebidas encontra
abrigo nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto 3.048/99. Todavia, o
desconto nos proventos do autor não deve ultrapassar o percentual de 10% (dez por cento) do
valor do benefício, em razão de sua natureza alimentar, a fim de não comprometer demais a sua
subsistência.
V - As quantias já descontadas na aposentadoria por idade do demandante não devem ser objeto
de devolução, e sim debitadas do valor ainda devido por ele.
VI - Ante a sucumbência recíproca, arcará o réu com os honorários do patrono da autora, que
arbitro em R$ 500,00. Deixa-se de condenar a demandante ao pagamento de honorários em
favor do procurador da Autarquia, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
VII – Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000035-79.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: FRANCISCO FIORAVANTI
Advogado do(a) APELANTE: ROSANGELA CARRAMASCHI CORREA - SP114264
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO (198) Nº 5000035-79.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: FRANCISCO FIORAVANTI
Advogado do(a) APELANTE: ROSANGELA CARRAMASCHI CORREA - SP1142640A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS PROCURADOR:
PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO:
Advogado do(a) PROCURADOR:
R E L A T Ó R I O
O Exmo Sr. Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação
interposta em face de sentença que julgou improcedente pedido formulado em ação ordinária, em
que busca a parte autora a declaração de inexistência de débito, em relação à cobrança de
valores pagos indevidamente quando da concessão do auxílio-doença n. 516.296.481-1, entre
01.05.2007 e 12.11.2007, a repetição em dobro dos valores descontados no atual benefício que
recebe, bem como a indenização por danos morais. O demandante foi condenado ao pagamento
de despesas processuais, custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor
atualizado da causa, observado o disposto no artigo 98, § 3º, da Lei nº 8.213/91.
Em suas razões recursais, alega a parte autora não há que se falar em irregularidade obtenção
do benefício por incapacidade que percebeu, pois sempre agiu dentro dos padrões exigidos pelo
INSS, inclusive no que tange à submissão a perícias médicas. Assevera que cabe à Autarquia
assumir a responsabilidade e cobrar dos reais culpados por eventuais erros ou irregularidades
administrativas de seus prepostos, visto que não participou de qualquer ato ilícito para tirar
proveito do auxílio-doença pleiteado. Pugna pela condenação do réu ao pagamento de
indenização por danos morais e pela inversão do ônus da prova.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000035-79.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: FRANCISCO FIORAVANTI
Advogado do(a) APELANTE: ROSANGELA CARRAMASCHI CORREA - SP1142640A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS PROCURADOR:
PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO:
Advogado do(a) PROCURADOR:
V O T O
Objetiva a autora a suspensão da cobrança relativa às quantias que a Autarquia entende terem
sido pagas indevidamente a título de benefício de auxílio-doença.
Da análise dos autos depreende-se que o autor obteve a concessão do benefício de auxílio-
doença em 04.04.2006, o qual foi prorrogado até 10.12.2007.
Em decorrência do Relatório Circunstanciado do Grupo de Trabalho - Portaria APE-GR/SP/MPS
nº29, de 12.03.2008, referente à Operação Providência desencadeada pela Polícia Federal em
11.09.2008, a autarquia previdenciária reavaliou o benefício do demandante e identificou indício
de irregularidade, consistente na concessão e manutenção indevidas do auxílio-doença no
período de 01.05.2007 a 10.12.2007, pois não houve comprovação de incapacidade laboral que a
justifiquem, bem como que a data de início da incapacidade não teria sido fixada corretamente.
Após regular trâmite administrativo, o requerente foi notificado da existência de débito no valor de
R$ 10.086,33, que passou a ser descontado dos proventos da aposentadoria por idade de que
hoje é titular.
Sustenta a parte autora que o recebimento do benefício de auxílio-doença foi devido e que
recebeu os valores de boa-fé.
Inicialmente, cumpre destacar que, conforme mencionado, o benefício do autor foi reavaliado em
virtude da chamada “Operação Providência”, desencadeada pela Polícia Federal, a qual foi bem
explanada pelo ilustre magistrado a quo, cujas palavras ora transcrevo:
Esclareço que se trata de benefício envolvido na Operação Providência, instaurada para apurar
fraudes cometidas por médicos peritos do INSS, servidores administrativos e grupo de
particulares, que simulavam incapacidade laborativa inexistente, com a realização de perícia em
trânsito, a cargo de um dos médicos envolvidos na quadrilha. Havia modificação da data do início
da incapacidade, para coincidir com a capacidade de segurado, de modo a permitir a concessão
dos benefícios pleiteados ou inserção de dados nos sistemas relativos a essa mesma
incapacidade, afastando eventual necessidade de carência.
Nessa operação, um grupo de três peritos e três servidores do INSS, aliado a outros, estes
particulares, praticavam fraude contra o INSS, de forma bastante organizada. Tal fraude consistia:
(i) direcionamento da perícia para um dos médicos, por meio do expediente denominado perícia
em trânsito: (ii) esse mesmo médico, atestava a incapacidade de forma a se poder conceder o
benefício; (iii) os servidores faziam alterações nos sistemas do INSS para dar aparência de
legalidade a esses atos.
No caso dos autos, entendeu-se que, na data em que fixada a incapacidade laborativa do
demandante, ele não ostentava a qualidade de segurado da Previdência Social.
No que tange à legalidade da reavaliação do auxílio-doença percebido pelo autor, assim dispõe o
artigo 69 da Lei nº 8.212/91:
Art. 69. O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios
da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.
In casu, os elementos constantes dos autos revelam que o demandante efetivamente não fez jus
ao benefício que recebeu no intervalo de 01.05.2007 e 12.11.2007.
Com efeito, o benefício de auxílio-doença está previsto no artigo 59 da Lei n.º 8.213/91, que
assim dispõe:
O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período
de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Com relação ao requisito da incapacidade laborativa, verifica-se, o laudo pericial judicial,
elaborado em 30.01.2017, após a juntada de toda a documentação médica do autor, concluiu ser
ele portador de diabetes, hipertensão arterial sistêmica, cardiopatia isquêmica com
enquadramento como cardiopatia grave, encontrando-se incapacitado para o trabalho desde
14.04.2005.
De outro giro, não obstante a incapacidade para o labor durante o período de 01.05.2007 e
12.11.2007 tenha sido comprovada nos autos, não foi atendida a carência para o reconhecimento
do direito ao benefício de auxílio-doença. De fato, o compulsar dos autos revela que malgrado o
demandante contasse com mais de 12 contribuições durante a sua vida laboral, ele cessara o
recolhimento de contribuições previdenciárias em setembro de 1999, voltando a contribuir aos
cofres do RGPS apenas em fevereiro de 2005, ocorrendo, portanto, a perda da qualidade de
segurado, consoante se infere do extrato do CNIS anexado aos autos. Destarte, para que as
contribuições anteriores à aludida perda da qualidade de segurado fossem consideradas, mister
se fazia o recolhimento de, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o
auxílio-doença, ou seja, 04 contribuições, a partir de nova filiação, a teor do art. 24, parágrafo
único, da Lei n. 8.213/91. Todavia, ele recolheu apenas 03 contribuições anteriormente à data de
início da incapacidade fixada em 14.04.2005 (fevereiro, março e abril de 2005), não recuperando
sua condição de segurado e não podendo aproveitar as contribuições anteriores para fins de
carência.
Em síntese, considerando que o autor não preenchia os requisitos legais para a concessão do
auxílio-doença, ante a perda da qualidade de segurado, efetivamente houve irregularidade no
deferimento anteriormente ocorrido, sendo devida a cobrança.
Destaco que o presente caso não versa sobre interpretação equivocada, má aplicação da lei ou
erro da Administração, não havendo, tampouco, que se cogitar de boa-fé do autor ou não
participação no esquema fraudulento, de modo que a restituição das quantias indevidamente
recebidas encontra abrigo nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto
3.048/99.
Nesse sentido, já decidiu o E. STJ, no julgamento do RESP 1110075; 5ª Turma; Relator Ministro
Jorge Mussi; DJE de 03.08.2009.
Como bem salientou o ilustre magistrado a quo, Não se trata, pois, de mera irregularidade
administrativa, desconhecida pelo autor, que se beneficiou da concessão indevida. Do mesmo
modo, não há mero erro da Administração, mas fraude arquitetada com certo profissionalismo,
envolvendo médicos peritos da autarquia previdenciária, que davam aparência de legalidade à
concessão do auxílio-doença. O autor, mesmo leigo, tinha pleno conhecimento de que não mais
contribuía para a Previdência Social (na linguagem comum: para o INSS), de sorte que, em
virtude disso, sabia que não faria jus ao auxílio-doença, mesmo incapacitado para o trabalho.
Todavia, o desconto nos proventos do autor não deve ultrapassar o percentual de 10% (dez por
cento) do valor do benefício, em razão de sua natureza alimentar, a fim de não comprometer
demais a sua subsistência.
Destaco, ainda, que as quantias já descontadas na aposentadoria por idade do demandante não
devem ser objeto de devolução, e sim debitadas do valor ainda devido por ele.
Resta prejudicado o pedido de indenização por danos morais.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do autor, para julgar parcialmente
procedente o pedido, tão-somente a fim de limitar o desconto em 10% (dez por cento) do valor do
benefício, sem qualquer devolução das quantias já consignadas em sua aposentadoria por idade.
Ante a sucumbência recíproca, arcará o réu com os honorários do patrono da autora, que arbitro
em R$ 500,00. Deixo de condenar a demandante ao pagamento de honorários em favor do
procurador da Autarquia, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Expeça-se e-mail ao INSS, dando-lhe ciência da presente decisão, que limitou em 10% o valor
dos descontos a serem efetuados no benefício do autor.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. IRREGULARIDADE NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
EXIGIBILIDADE DE DÉBITO. LEGALIDADE DA CONDUTA DA AUTARQUIA. DESCONTOS
NOS PROVENTOS. LIMITAÇÃO A 10%. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
I - No que tange à legalidade da reavaliação do auxílio-doença percebidos pelo autor, dispõe o
artigo 69 da Lei nº 8.212/91 que O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da
manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas
existentes.
II - Não obstante a incapacidade para o labor durante o período de 01.05.2007 e 12.11.2007
tenha sido comprovada nos autos, não foi atendida a carência para o reconhecimento do direito
ao benefício de auxílio-doença. De fato, o compulsar dos autos revela que malgrado o
demandante contasse com mais de 12 contribuições durante a sua vida laboral, ele cessara o
recolhimento de contribuições previdenciárias em setembro de 1999, voltando a contribuir aos
cofres do RGPS apenas em fevereiro de 2005, ocorrendo, portanto, a perda da qualidade de
segurado, consoante se infere do extrato do CNIS anexado aos autos. Destarte, para que as
contribuições anteriores à aludida perda da qualidade de segurado fossem consideradas, mister
se fazia o recolhimento de, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o
auxílio-doença, ou seja, 04 contribuições, a partir de nova filiação, a teor do art. 24, parágrafo
único, da Lei n. 8.213/91. Todavia, ele recolheu apenas 03 contribuições anteriormente à data de
início da incapacidade fixada em 14.04.2005 (fevereiro, março e abril de 2005), não recuperando
sua condição de segurado e não podendo aproveitar as contribuições anteriores para fins de
carência.
III - Considerando que o autor não preenchia os requisitos legais para a concessão do auxílio-
doença, ante a perda da qualidade de segurado, efetivamente houve irregularidade no
deferimento anteriormente ocorrido, sendo devida a cobrança.
IV – O presente caso não versa sobre interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da
Administração, não havendo, tampouco, que se cogitar de boa-fé do autor ou não participação no
esquema fraudulento, de modo que a restituição das quantias indevidamente recebidas encontra
abrigo nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto 3.048/99. Todavia, o
desconto nos proventos do autor não deve ultrapassar o percentual de 10% (dez por cento) do
valor do benefício, em razão de sua natureza alimentar, a fim de não comprometer demais a sua
subsistência.
V - As quantias já descontadas na aposentadoria por idade do demandante não devem ser objeto
de devolução, e sim debitadas do valor ainda devido por ele.
VI - Ante a sucumbência recíproca, arcará o réu com os honorários do patrono da autora, que
arbitro em R$ 500,00. Deixa-se de condenar a demandante ao pagamento de honorários em
favor do procurador da Autarquia, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
VII – Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do autor, para julgar parcialmente
procedente o pedido, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA