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BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. AMPARO SOCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA E DEFICIÊNCIA COMPROVADAS. BENEFÍCIO CONCEDIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE. NA PARTE CONHECIDA JUL...

Data da publicação: 17/07/2020, 18:36:16

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. AMPARO SOCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA E DEFICIÊNCIA COMPROVADAS. BENEFÍCIO CONCEDIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE. NA PARTE CONHECIDA JULGADA DESPROVIDA. - Não se conhece da apelação do INSS no que se refere ao pedido de limitação da base de cálculo dos honorários advocatícios ao valor da condenação na data da sentença por ausência de interesse processual. - A legislação estabelece a deficiência ou a idade avançada, aliada à hipossuficiência financeira, como requisitos para a concessão do benefício. - Não há parâmetro objetivo inflexível para apuração da hipossuficiência financeira. O próprio Supremo Tribunal Federal já reconhece o processo de inconstitucionalização do artigo 20, §3º, da Lei nº 8.742/93 (Reclamação 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, 18/04/2013). É que, para dar cumprimento ao comando constitucional, a miserabilidade deve ser aferida por outros meios, sendo de todo inconveniente a aplicação rígida de referido dispositivo legal. - No caso dos autos, o Perito nomeado pelo Juízo concluiu que a parte autora satisfaz o parâmetro legal de deficiência. - Com relação à situação socioeconômica da demandante, foi apurado no estudo social elaborado em sua residência que o núcleo familiar compõe-se de quatro pessoas: a requerente, seus pais e seu irmão, sendo a renda bruta mensal familiar composta por dois salários mínimos provenientes do benefício de prestação continuada recebido por sua mãe e da aposentadoria por idade recebida por seu pai. - Contudo, a importância relativa aos referidos benefícios não pode ser considerada para se aferir a renda mensal per capita do grupo familiar. Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade por omissão parcial do artigo 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, firmando o entendimento de que o benefício assistencial ou previdenciário no valor de um salário mínimo percebido por membro do grupo familiar, não deve ser considerado para fins de verificação da renda per capita, nos termos do artigo 20, §3º da Lei nº 8.742/1993. - Soma-se a isso, que o trabalho desempenhado pelo irmão da autora é informal, eventual e esporádico. Logo, se trata de renda incerta. - Desse modo, no caso dos autos, conforme se verifica do laudo socioeconômico, é evidente o risco e vulnerabilidade sociais da demandante, porquanto o valor recebido não é suficiente para garantir a subsistência digna do núcleo familiar. - Assim, tendo a parte autora comprovado o preenchimento dos requisitos respectivos, é de rigor a concessão do benefício de assistencial pleiteado. - Benefício mantido. Apelação do INSS conhecida em parte, e na parte conhecida julgada desprovida. (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2212260 - 0042357-87.2016.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 26/11/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/01/2019 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0042357-87.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.042357-2/SP
RELATOR:Desembargador Federal PAULO DOMINGUES
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):MARIA ANDREIA BARBOSA
ADVOGADO:SP307940 JOÃO ROBERTO DA SILVA JUNIOR
No. ORIG.:15.00.00054-3 1 Vr ALTINOPOLIS/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

A EXMA SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LETÍCIA DEA BANKS FERREIRA LOPES:


Acompanhando o voto do relator, não conheço da apelação do INSS no que se refere ao pedido de limitação da base de cálculo dos honorários advocatícios ao valor da condenação na data da sentença por ausência de interesse processual.

Cinge-se a controvérsia quanto à comprovação pela parte autora dos requisitos necessários a concessão do benefício assistencial a pessoa com deficiência.

A Constituição Federal de 1988, que tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e como objetivo erradicar a pobreza e a marginalização, prevê a concessão de benefício no valor de um salário mínimo às pessoas com deficiência e aos idosos que não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida pelos familiares.

A assistência social promovida pelo Estado encontra previsão nos artigos 203 e 204 da Constituição Federal, no capítulo destinado à Seguridade Social.

O artigo 203, inciso V, trata do benefício assistencial nos seguintes termos:

Art. 203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

(...)

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.




A Lei n° 8.742/93, em seu artigo 20, define os requisitos para a concessão do benefício. Confira-se:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.


Como se observa, a legislação estabelece a deficiência ou a idade avançada, aliada à hipossuficiência financeira, como requisitos para a concessão do benefício.

Especificamente no que toca à hipossuficiência financeira, entendo que não há parâmetro objetivo inflexível para a sua apuração.

Conforme prevê o §3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, é hipossuficiente aquele que possua renda familiar per capita inferior a um quarto de salário mínimo por mês. Deixo consignado que a Lei nº 12.435/11 alterou o conceito de família, dando nova redação ao artigo 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, não mais remetendo ao artigo 16 da Lei nº 8.213/91 para identificação dos componentes do grupo familiar. É o que se depreende do dispositivo acima transcrito.

Como se sabe, porém, o critério objetivo fixado em lei vem sendo flexibilizado pela jurisprudência pátria. O próprio Supremo Tribunal Federal já reconhece o processo de inconstitucionalização do artigo 20, §3º, da Lei nº 8.742/93 (Reclamação 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, 18/04/2013). É que, para dar cumprimento ao comando constitucional, a miserabilidade deve ser aferida por outros meios, sendo de todo inconveniente a aplicação rígida de referido dispositivo legal.

No caso dos autos, o Perito nomeado pelo Juízo concluiu que a parte autora satisfaz o parâmetro legal de deficiência. O profissional observou que a requerente apresenta "quadro compatível com Retardo Mental moderado com comprometimento significativo do comportamento requerendo vigilância e tratamento (CID-10 F71.1), associado a quadro Depressivo Recorrente, episódio atual Moderado (CID-10 F33.1), com incapacidade total e permanente ao trabalho e a vida civil" (fls. 119/122).


Com relação à situação socioeconômica da demandante, foi apurado no estudo social elaborado em sua residência (fls. 146/150) que o núcleo familiar compõe-se de quatro pessoas: a requerente, seus pais e seu irmão.

Indica o laudo social que a parte autora encontra-se em situação socioeconômica vulnerável e que a renda bruta mensal familiar é composta por dois salários mínimos provenientes do benefício de prestação continuada recebido por sua mãe e da aposentadoria por idade recebida por seu pai (fls. 146/150).

Contudo, a importância relativa aos referidos benefícios não pode ser considerada para se aferir a renda mensal per capita do grupo familiar.

Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade por omissão parcial do artigo 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, firmando o entendimento de que o benefício assistencial ou previdenciário no valor de um salário mínimo percebido por membro do grupo familiar, não deve ser considerado para fins de verificação da renda per capita, nos termos do artigo 20, §3º da Lei nº 8.742/1993.

Nesse sentido, os julgados abaixo colacionados:

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - RENDA FAMILIAR PER CAPITA CRITÉRIO DE AFERIÇÃO DE MISERABILIDADE - CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO AFASTAMENTO-DECLARAÇÃODEINCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93 SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE - VERBAS CONSIDERADAS NO RESPECTIVO CÁLCULO EXCLUSÃO DE OUTRO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL OU PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE ATÉ UM SALÁRIO MÍNIMO, PERCEBIDO POR MEMBRO DA FAMÍLIA - EXTENSÃO DA REGRA AOS DEFICIENTES FÍSICOS BENEFICIÁRIOSDECLARAÇÃODEINCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03 SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE - AGRAVO DESPROVIDO. (...) No exame do Recurso Extraordinário nº 580.963/PR, da relatoria do ministro Gilmar Mendes, o Supremo declarou incidentalmente a inconstitucionalidade, por omissão parcial, do parágrafo único do artigo 34 da Lei nº 10.741/03, sem pronúncia de nulidade, mantendo a exclusão do benefício assistencial percebido por qualquer membro da família do idoso do cálculo da renda por cabeça a que se refere a Lei de Organização da Assistência Social - LOAS. Consignou também a não consideração, para os mesmos propósitos, de benefício previdenciário recebido, no valor de até um salário mínimo. Ao fim, estendeu tais regras aos deficientes físicos beneficiários da prestação assistencial continuada. (...). 4. Publiquem. (STF - ARE: 872137 SP - SÃO PAULO 0017462-04.2012.4.03.9999, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 19/03/2015, Data de Publicação: DJe-062 31/03/2015, grifei)


RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/1993. RE Nº 567.985/MT. (...) 1. A assistência social foi criada com o intuito de beneficiar os miseráveis, pessoas incapazes de sobreviver sem a ação da Previdência. 2. O preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei n.º 8.742/93, não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade da família do autor. 3. Partindo-se de uma exegese teleológica do dispositivo contido no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, o qual determina que 'o benefício concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas', verifica-se que o mesmo deve ser aplicado ao caso ora sob análise. Interpretando-se extensivamente tal norma, temos que não somente os valores referentes ao benefício assistencial ao idoso devem ser abstraídos do cálculo, mas também aqueles referentes ao amparo social ao deficiente e os decorrentes de aposentadorias - desde que seu valor corresponda a um salário mínimo -, e que a regra não deve incidir apenas para efeito de concessão de um segundo amparo ao idoso, mas também nos casos de concessão de amparo ao deficiente. (...)(STF - RE: 808846 SP , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 21/05/2014, Data de Publicação: DJe-100 DIVULG 26/05/2014 PUBLIC 27/05/2014, grifei)


Registro, ainda, que o trabalho desempenhado pelo irmão da autora é informal, eventual e esporádico. Logo, se trata de renda incerta.

Em resumo, a renda da parte autora é zero e a própria Perita Assistente Social confirmou que há situação de "extrema vulnerabilidade social" (vide mais uma vez as fls. 146/150).

Desse modo, no caso dos autos, conforme se verifica do laudo socioeconômico, é evidente o risco e vulnerabilidade sociais da demandante, porquanto o valor recebido não é suficiente para garantir a subsistência digna do núcleo familiar.

Assim, tendo a parte autora comprovado o preenchimento dos requisitos respectivos, é de rigor a concessão do benefício de assistencial pleiteado.

Logo, pelas razões anteriormente expostas, a parte autora se enquadra dentre os necessitados que o legislador quis alcançar ao instituir o benefício assistencial.

Ante o exposto, acompanho o i. Relator para não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, com a devida vênia, dele divirjo, para NEGAR PROVIMENTO, mantendo a sentença proferida em 1º grau tal como lançada.

É o voto.



LETÍCIA BANKS
Juíza Federal Convocada


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D.E.

Publicado em 28/01/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0042357-87.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.042357-2/SP
RELATOR:Desembargador Federal PAULO DOMINGUES
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):MARIA ANDREIA BARBOSA
ADVOGADO:SP307940 JOÃO ROBERTO DA SILVA JUNIOR
No. ORIG.:15.00.00054-3 1 Vr ALTINOPOLIS/SP

EMENTA

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. AMPARO SOCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA E DEFICIÊNCIA COMPROVADAS. BENEFÍCIO CONCEDIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE. NA PARTE CONHECIDA JULGADA DESPROVIDA.
- Não se conhece da apelação do INSS no que se refere ao pedido de limitação da base de cálculo dos honorários advocatícios ao valor da condenação na data da sentença por ausência de interesse processual.
- A legislação estabelece a deficiência ou a idade avançada, aliada à hipossuficiência financeira, como requisitos para a concessão do benefício.
- Não há parâmetro objetivo inflexível para apuração da hipossuficiência financeira. O próprio Supremo Tribunal Federal já reconhece o processo de inconstitucionalização do artigo 20, §3º, da Lei nº 8.742/93 (Reclamação 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, 18/04/2013). É que, para dar cumprimento ao comando constitucional, a miserabilidade deve ser aferida por outros meios, sendo de todo inconveniente a aplicação rígida de referido dispositivo legal.
- No caso dos autos, o Perito nomeado pelo Juízo concluiu que a parte autora satisfaz o parâmetro legal de deficiência.
- Com relação à situação socioeconômica da demandante, foi apurado no estudo social elaborado em sua residência que o núcleo familiar compõe-se de quatro pessoas: a requerente, seus pais e seu irmão, sendo a renda bruta mensal familiar composta por dois salários mínimos provenientes do benefício de prestação continuada recebido por sua mãe e da aposentadoria por idade recebida por seu pai.
- Contudo, a importância relativa aos referidos benefícios não pode ser considerada para se aferir a renda mensal per capita do grupo familiar. Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade por omissão parcial do artigo 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, firmando o entendimento de que o benefício assistencial ou previdenciário no valor de um salário mínimo percebido por membro do grupo familiar, não deve ser considerado para fins de verificação da renda per capita, nos termos do artigo 20, §3º da Lei nº 8.742/1993.
- Soma-se a isso, que o trabalho desempenhado pelo irmão da autora é informal, eventual e esporádico. Logo, se trata de renda incerta.
- Desse modo, no caso dos autos, conforme se verifica do laudo socioeconômico, é evidente o risco e vulnerabilidade sociais da demandante, porquanto o valor recebido não é suficiente para garantir a subsistência digna do núcleo familiar.
- Assim, tendo a parte autora comprovado o preenchimento dos requisitos respectivos, é de rigor a concessão do benefício de assistencial pleiteado.
- Benefício mantido. Apelação do INSS conhecida em parte, e na parte conhecida julgada desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, por maioria, negar provimento, mantendo a sentença proferida em 1º grau tal como lançada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 26 de novembro de 2018.
LETÍCIA BANKS
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0042357-87.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.042357-2/SP
RELATOR:Desembargador Federal PAULO DOMINGUES
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):MARIA ANDREIA BARBOSA
ADVOGADO:SP307940 JOÃO ROBERTO DA SILVA JUNIOR
No. ORIG.:15.00.00054-3 1 Vr ALTINOPOLIS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.

A sentença prolatada em 29.08.2016 julgou procedente o pedido, condenando o INSS ao pagamento das parcelas atrasadas com DIB na data do requerimento administrativo, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros da mora de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos da Justiça Federal. Condenou, também, ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 15% do valor das parcelas vencidas, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.

Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.

Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, preliminarmente, que a antecipação de tutela tornaria o provimento da ação irreversível, haja vista que não há garantia, em caso de reversão do julgado, do pagamento das prestações já pagas. No mérito, sustenta que não restou preenchido o requisito de miserabilidade para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto ao termo inicial do benefício, aos critérios de correção monetária e juros de mora para que sejam aplicados de acordo com a Lei 11.960/09, aos honorários advocatícios, com a redução do montante arbitrado e com a limitação da sua base de cálculo às parcelas vencidas até a data da sentença.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso do INSS.

É o relatório.

VOTO

Não conheço da apelação do INSS no que se refere ao pedido de limitação da base de cálculo dos honorários advocatícios ao valor da condenação na data da sentença, ante a ausência de interesse recursal.

No mais, conheço do recurso.

A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.

O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.

O artigo 20, § 3º, da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).

Em relação ao requisito de incapacidade, para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).

A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29, que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento"

Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:

"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - loas . (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)

Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a loas ."

Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.

E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)"

Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que todavia, foi julgada improcedente.

Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.

Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).

4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido.

(STJ, Terceira Seção, REsp 1112557/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/2009, DJe 20/11/2009)

O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.

Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.

Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.

Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.

Tecidas tais considerações, no caso dos autos, verifico que na data do ajuizamento da ação a autora, nascida em 23 de julho de 1976, contava com 38 anos. Assim, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade do postulante.

A autora relata ser portadora de transtorno depressivo recorrente, condição que a torna incapaz para o trabalho.

O laudo médico pericial de fls. 119/122 diagnosticou quadro de Retardo Mental Moderado, constatando a existência de incapacidade total e permanente com impossibilidade de realização de qualquer atividade laboral.

Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.

O estudo social elaborado em 24 de junho de 2015 (fls. 91/94), complementado posteriormente na data de 30 de junho de 2016 (fls. 147/150) revela que a parte autora reside com seus pais e irmão, em casa própria, de alvenaria, com móveis e eletrodomésticos básicos.

A renda do grupo familiar advém do benefício de aposentadoria por idade do pai da autora, no valor de R$788,00 (setecentos e oitenta e oito reais),e de amparo social ao idoso recebido pela sua genitora, também no valor de R$788,00 (setecentos e oitenta e oito reais) de acordo com documentos juntados pela autarquia de fls. 55/77., totalizando R$1.576,00 (um mil quinhentos e setenta e seis reais). Foi informado ainda, no Laudo Social, que o irmão da apelada realiza atividade laboral autônoma com vencimentos diários em média de R$50,00 (cinquenta reais), entretanto não foram apresentados documentos para comprovar o recebimento dessa quantia.

Relataram despesas no valor de R$100,00 (cem reais) de energia elétrica, R$35,00 (trinta e cinco reais) de água, R$60,00 (sessenta reais) de gás, R$500,00 (quinhentos reais) de medicamentos, R$400,00 (quatrocentos reais) de alimentação e R$ 300,00 (trezentos reais) de consultas médicas.

Por certo que nos termos do § 1o do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).

Contudo, em que pese a princípio o valor advindo dos benefícios recebidos pelos genitores não devam ser computados para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica e da jurisprudência, o fato é que não se pode negar que habitando na mesma casa, concorrem com os gastos e devem participar com o seu custeio e manutenção.

Não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família.

Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.

Nesse sentido, aliás, a decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), datada de 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS nos autos do processo nº 0517397-48.2012.4.05.8300, que firmou posicionamento no sentido que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".

Dessa forma, em que pese a ausência de rendimentos da apelada, depreende-se do estudo social que coabita residência com os pais e irmão, estando as necessidades básicas da família supridas, não se prestando o benefício assistencial à complementação de renda.

Assim, diante do conjunto probatório que se apresenta nos autos, verifico que não restou caracterizada a condição de miserabilidade, necessária para concessão do benefício assistencial.

Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.

Por fim, revogo a tutela antecipada. Esclareço, todavia, que tratando-se de benefício assistencial, entendo indevida a devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, não se aplicando ao caso o entendimento firmado pelo STJ no REsp nº 1401560/MT, referente apenas aos benefícios previdenciários.

Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe provimento, na forma acima fundamentada.

É o voto.

PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal


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