D.E. Publicado em 07/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038202-41.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por TEREZA MARQUES FEITOSA em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Contestação às fls. 33/39.
Réplica às fls. 46/47.
Estudo Social às fls. 59/62.
Parecer Ministerial às fls. 75/77.
O pedido foi julgado procedente, condenando-se o INSS a conceder o benefício assistencial à parte autora, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo, corrigido monetariamente, bem como, a arcar com honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor da condenação (fls. 78/81).
O INSS interpôs apelação alegando ausência de comprovação da hipossuficiência econômica (fls. 84/86).
Com as contrarrazões (fls. 100/102), os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 109/110).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Inicialmente, assinale-se que o benefício aqui postulado é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.231/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.231/1991:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que originariamente o dispositivo em análise estabelecia a idade mínima de 70 (setenta) anos como requisito para a obtenção do benefício, sendo estabelecida, ao mesmo tempo, regra de transição no art. 38 do mesmo estatuto legal, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos contados 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos em 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-50/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso, mediante a edição da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, acabou-se por eleger a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário para a percepção do benefício assistencial, nos seguintes termos:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já se servia de outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Note-se que, no tocante a idoso, para fins de composição da renda familiar per capita, o parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) faz ressalva do valor oriundo de benefício já concedido a qualquer membro da família:
A propósito, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade por omissão do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, para abranger na ressalva legal os benefícios assistenciais percebidos por deficientes e de previdenciários, no montante de até um salário mínimo, destinados a idosos.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
A parte autora contava com 65 anos quando do ajuizamento da ação (fl. 11), preenchendo assim o requisito etário legal.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o Estudo Social produzido indica que o núcleo familiar é integrado pela parte postulante e seu esposo. À época (02/2015) foi informado que a renda mensal constituía em R$ 834,65, proveniente da aposentadoria por tempo de contribuição recebida pelo esposo. O imóvel em que residem é próprio, apresentando boas condições de higiene e limpeza. As despesas declaradas somam o valor de R$ 677,00.
Considerando que o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição recebido pelo esposo é superior a 1 (um) salário mínimo, não pode ser excluído do cômputo da renda familiar.
Com efeito, verifica-se que conquanto a economia doméstica não seja de fartura, a renda auferida se mostra adequada ao suprimento das necessidades essenciais do núcleo familiar.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o orçamento da Seguridade Social.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para julgar improcedente o pedido.
Observo que, apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.
Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a condição de beneficiário da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei 13.105/15).
É o voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 28/11/2017 17:53:49 |