Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5310269-90.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal AUDREY GASPARINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
24/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO
PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5310269-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANTONIA FURLAN DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA ASSAF GUERRA BERG - SP264561-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5310269-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANTONIA FURLAN DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA ASSAF GUERRA BERG - SP264561-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento
dos requisitos legais necessários à concessão pretendida.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5310269-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANTONIA FURLAN DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA ASSAF GUERRA BERG - SP264561-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39,
inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que
a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão
do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria
comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do
benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de
verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral
durante o período respectivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada
Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 13/06/2018,
devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
A autora alega que exerce o labor campesino “desde tenra idade, quando trabalhava na lavoura
com seus pais e continua trabalhando até os dias de hoje”. Afirma que “após seu casamento em
31.01.1986, passou a trabalhar nas fazendas em que seu marido era contratado. Contudo, na
época somente o cônjuge varão era registrado” (ID n.º 140104640 - Pág. 2).
Argumenta que, apesar “de preencher os requisitos necessários à concessão do benefício
pleiteado, o pedido administrativo foi indeferido” (ID n.º 140104640 - Pág. 2).
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- certidão de casamento, celebrado em 31/01/1986, qualificando o cônjuge da autora (Sr.
VALTER DE ANDRADE) como lavrador;
- certidão de nascimento da 1.ª filha do casal (DAINE FURLAN DE ANDRADE) em 22/06/1986,
qualificando o pai como lavrador;
- certidão de nascimento da 2.ª filha do casal (CARLA FURLAN DE ANDRADE) em 01/02/1990,
qualificando o pai como lavrador;
- certidão de nascimento do 3.º filho do casal (VALTER DE ANDRADE JUNIOR) em 01/02/1990,
qualificando o pai como lavrador;
- CTPS do cônjuge, contendo vínculos empregatícios como: “servente” em estabelecimento de
construção civil, no período de 01/04/1986 a 31/5/1986; “serviços gerais” em estabelecimento
agropecuário (“Fazenda Santa Maria”), de 01/03/1997 a 01/11/1999 e novo contrato também para
a “Fazenda Santa Maria”, no cargo de “serviços gerais”, com data de admissão em 01/11/1999 e
sem data de saída.
No caso em tela, embora as provas constantes dos autos tenham demonstrado o trabalho rural
desempenhado pelo marido da demandante em parte do período de carência, não há qualquer
documento em nome próprio que possa evidenciar a comprovação do labor campesino da autora.
Na peça contestatória, o INSS alega que os requisitos necessários à concessão da aposentadoria
por idade vindicado pela autora não foram implementados, bem que “há prova contundente de
que ela jamais foi trabalhadora rural”. (ID n.º 140104654 - Pág. 6).
A autarquia previdenciária informou que, “no ano de 2012, a parte autora ingressou com ação de
aposentadoria por invalidez, sendo que nesta declarou que a sua profissão seria ‘do lar’ (feito n.º
0001394-30.2012.8.26.0452). Por conta de tal ação, a autora foi submetida a uma perícia médica
perante o Juízo, sendo que em tal ato probatório informou que nunca exerceu atividades
laborativas remuneradas, somente doméstica.” (ID n.º 140104654 - Pág. 6).
Cabe ressaltar a existência de prova oral. Por meio de audiência realizada em 03/10/2018
perante o Juízo da 1.ª Vara da Comarca de Piraju/SP, procedeu-se à colheita do depoimento
pessoal da autora, bem como à oitiva das testemunhas ORLANDO DE SOUZA OLIVEIRA,
DIJALMA FERREIRA DOS SANTOS e BENEDITO DE PAULA FELIPE. Conforme registrado pela
magistrada sentenciante, in verbis:
“De se notar que, em depoimento pessoal, a autora não narrou os fatos com a convicção que se
esperava. Disse que era “boia-fria”, mas sequer soube informar o nome dos “gatos/turneiros” que
a transportam diariamente. Ademais, limitou-se a afirmar, genericamente, que trabalhou nas
glebas de Nilton e Nicolau e que, atualmente, trabalha na Fazenda Santa Maria. Não soube
precisar os nomes das propriedades rurais onde laborou ao longo dos anos, denominações que,
certamente, seriam por ela conhecidas, considerando que, conforme narrativa da prefacial, de há
muito, a requerente trabalha na região.” (ID n.º 140104672 - Pág. 5).
Além disso, o extrato da consulta ao CNIS constante dos autos revela que a requerente efetuou
recolhimentos na condição de “contribuinte facultativa” de 01/08/2009 a 31/08/2009, de
01/10/2009 a 30/11/2011, de 01/12/2011 a 31/12/2011, de 01/01/2012 a 31/01/2012, de
01/03/2012 a 31/07/2013, de 01/09/2013 a 28/02/2015 (ID n.º 140104658 - Págs. 1 a 7 e ID n.º
140104659 – Pág. 1).
Assinale-se, ainda, que houve percepção, pela autora, do benefício de “auxílio-doença
previdenciário” (espécie 31), a partir de 24/04/2012 (ID n.º 140104659 – Pág. 1).
Da consulta realizada em 27/08/2020 ao CNIS, infere-se que o último recolhimento como
contribuinte facultativa ocorreu em fevereiro de 2015, bem como que o referido benefício de
“auxílio-doença previdenciário” foi registrado sob o n.º 608833382, tendo sido cessado em
04/04/2018.
O endereço cadastrado no referido sistema como de residência da autora não faz parte da zona
rural, mas do centro da cidade de Tejupá/SP. Confira-se: “Avenida Capitão Diogo Goulart, n.º
224, complemento: casa, bairro: Centro, Tejupá - SP, Cep: 18830000”.
Não se pode perder de vista que autarquia previdenciária apresentou cópia dos autos do
processo judicial n.º 0001394-30.2012.8.26.0452, ação proposta pela autora em 2012, vindicando
o benefício de “auxílio-doença” ou de “aposentadoria por invalidez”, cujas informações
contradizem os argumentos trazidos pela requerente nos presente autos (ID’s n.º 140104655 e
140104656).
Cumpre enfatizar que a autora teve a oportunidade de se manifestar a respeito das alegações do
INSS, ocasião em que apresentou argumentos reiterando a afirmação de exercício exclusivo do
labor campesino, sem refutar precisamente as mencionadas apurações feitas pelo Instituto Réu.
Nas razões de apelação, também não há qualquer referência a esse assunto (ID n.º 140104677 –
Págs. 1 a 6).
Dentre as peças extraídas do referido processo, que tramitou perante o Juízo da 2.ª Vara Cível da
Comarca de Piraju/SP, merecem destaque:
- a exordial, que descreve a qualificação da autora como “do lar”, residente e domiciliada na
“Avenida Capitão Diogo Goulart, n.º 224, complemento: casa, bairro: Centro, Tejupá - SP, Cep:
18830000”, sem fazer qualquer menção ao labor campesino (ID n.º 140104655 – Págs. 1 a 4-
g.n.).
- o laudo pericial, subscrito pelo Dr. Sérgio L. R. Canuto (médico do trabalho), consignando que a
Sra. Maria Antônia Furlan de Andrade “nunca exerceu atividades laborativas remuneradas,
somente doméstica”, mas que que estava “desempregada na ocasião da perícia”. (ID n.º
140104656 – Págs. 1 a 15 - g.n.).
Interessante observar que o referido laudo foi elaborado em 18/09/2013, dentro período de
carência para o benefício de aposentadoria por idade rural vindicado nos presentes autos,
partindo do pressuposto de que a parte autora deveria fazer prova do exercício de atividade rural
de 13/06/2003 a 13/06/2018 (180 meses),
Da leitura da referida perícia judicial, verifica-se não haver qualquer menção ao exercício de
trabalho rural pela demandante, mas apenas da profissão de empregada doméstica e das
atividades do lar. (ID n.º 140104656 – Págs. 1 a 15).
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado o exercício de
atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO
PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA