Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002280-72.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
25/08/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/08/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO
PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002280-72.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002280-72.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício pretendido, a partir da data da entrada do requerimento administrativo (21.05.2019).
Concedeu a tutela antecipada.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Se vencido, requer o
reconhecimento da prescrição quinquenal. Ao final, prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002280-72.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts.
39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha
que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a
concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural
deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do
pedido do benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de
Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever
de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício
laboral durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício
de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante
15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu
art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º
8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e,
em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor
equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro
de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991;
II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado
por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016
a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a
12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria
por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por
tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício
pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da
retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em
08.05.2019, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- certidão de casamento, celebrado em 23.03.1985, qualificando o autor como lavrador;
- certidões de nascimento das filhas do requerente, registradas em 03.05.1986 e 01.07.1993,
qualificando-o como lavrador e
- CTPS dodemandante, com registros de atividades em serviços rurais nos períodos de
01.09.1983 a 30.10.1984, 01.05.1985 a 20.10.1985, 01.08.1986 a 31.03.1987, 01.08.1987 a
31.12.1991, 01.03.1995 a 10.04.1995, 15.08.1996 a 30.08.1996, 01.08.1997 a 11.09.1997,
02.05.1998 a 30.11.1998, 27.04.2000 a 26.08.2000, 01.10.2000 a 30.08.2003, 01.06.2004 a
20.09.2004, 01.06.2006 a 22.07.2006, 01.06.2017 a 01.10.2017, 04.06.2018 a 17.08.2018,
07.01.2019 a 07.03.2019 e 17.06.2019 a 09.08.2019, bem como atividades urbanas de
11.05.1994 a 21.10.1994 no cargo: “servente” e 26.09.2006 a 31.08.2016, no cargo
“Armazenista”.
O INSS juntou com a contestação as informações do Sistema CNIS da Previdência Social em
nome do autor, constando os registros indicados na CTPS, exceto os períodos de 01.09.1983 a
30.10.1984, 01.05.1985 a 20.10.1985 e 01.08.1986 a 31.03.1987, bem como o recebimento
auxílio-doença por acidente do trabalho de 24.03.1993 a 10.05.1993.
Cabe ressaltar a existência de prova oral. As testemunhas declaram genericamente que
conhecem a parte autora há bastante tempo e afirmam o alegado labor rural.
O valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir a profissão
exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar, é inconteste.
No entanto, embora o requerente tenha trazido início de prova material do exercício de
atividade rural em seu nome, este passou a exercer atividades predominantemente urbanas,
em contraposição ao declarado pelas testemunhas.
Cumpre mencionar que conforme consulta detalhada no sistema CNIS acima mencionado,
realizada em 14.07.2021, verifica-se que o vínculo empregatício de 26.09.2006 a 31.08.2016,
possui a natureza da atividade urbana com as seguintes ocupações:
- De 26.09.2006 a 31.03.2009, como almoxarife – 4141-05;
- De 01.04.2009 a 30.04.2009, como armazenista – 4141-10;
- De 01.05.2009 a 31.08.2009, como almoxarife – 4141-05;
- De 01.09.2009 a 31.10.2009, como armazenista – 4141-10;
- De 01.11.2009 a 28.02.2010, como almoxarife – 4141-05;
- De 01.03.2010 a 31.03.2010, como armazenista – 4141-10;
- De 01.04.2010 a 31.07.2010, como almoxarife – 4141-05;
- De 01.08.2010 a 31.08.2010, como armazenista – 4141-10;
- De 01.09.2010 a 31.08.2011, como almoxarife – 4141-05;
- De 01.09.2011 a 30.09.2011, como armazenista – 4141-10 e
- De 01.10.2011 a 31.08.2016, como almoxarife – 4141-05;
Dessa forma, embora a documentação juntada qualifique o autor como lavrador, não é
suficiente esse início de prova material a corroborar o exercício da atividade rural, eis que o
conjunto probatório é insuficiente para demonstrá-lo pelo prazo exigido em lei.
Esclareça-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP
n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a
necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado o exercício de
atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do artigo 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar improcedente o
pedido formulado. Revogo a antecipação dos efeitos da tutela concedida.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA
NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA