D.E. Publicado em 26/06/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juíza Federal Convocada
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Data e Hora: | 16/06/2015 14:30:46 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004004-12.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, pelo rito ordinário, pela qual a parte autora pretende a obtenção de benefício mais vantajoso, com a condenação do réu no reconhecimento do seu direito à renúncia ao benefício 125.581.253-0, espécie 42 (aposentadoria por tempo de contribuição), bem como a recalcular o novo benefício de aposentadoria na mesma modalidade, considerando no cálculo também o tempo de contribuição posterior à aposentadoria que atualmente recebe, sem a devolução dos valores recebidos por força da implantação do benefício que se pretende renunciar.
A inicial juntou documentos.
A sentença julgou improcedente o pedido de desaposentação, tendo em vista a natureza solidária do sistema contributivo e a não devolução dos valores, na forma do art. 269, I, do CPC. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, com observância da gratuidade da justiça.
Apelou o(a) autor(a), alegando a procedência do pedido de desaposentação. Requer a não condenação em verba honorária, pela concessão da gratuidade da justiça.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Não há que se falar em decadência ou em prescrição na desaposentação. O prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei 8.213/91 (redação dada pelas Leis 9.528/97, 9.711/98 e 10.839/2004), incide somente para os pedidos de revisão do ato de concessão do benefício, o que não é o caso dos autos. A prescrição, nas relações jurídicas de natureza continuativa, não atinge o fundo do direito, mas apenas as prestações compreendidas no quinquênio anterior à propositura da ação (Súmula 85 do STJ). O STJ já decidiu a matéria em sede de recurso repetitivo, julgamento em 27/11/2013 (RESP 1348301).
No mérito, a parte autora, ora apelante, pretende a condenação do INSS na concessão de benefício mais vantajoso porque, mesmo após a concessão de sua aposentadoria, continuou vertendo contribuições para o sistema, de modo que requer a desconstituição do ato de sua aposentadoria para, computando o período de contribuição que se sucedeu àquele ato, obter nova jubilação, mais vantajosa, no sistema previdenciário.
A esta pretensão a doutrina denominou de desaposentação, definida como "a reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou mesmo em Regime Próprio da Previdência de Servidores Públicos, com o objetivo exclusivo de possibilitar a aquisição de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário."(Castro e Lazzari, Manual de Direito Previdenciário. 4ª. Edição).
Inicialmente, destaco que o sistema de previdência adotado pelo constituinte de 1988 é baseado no princípio da solidariedade, no qual as contribuições são destinadas à composição de um fundo de custeio geral do sistema, e não destinado única e exclusivamente a compor patrimônio privado com contas individuais.
Diante desta opção, a reversão da aposentadoria para obtenção de outra jubilação mais vantajosa fere frontalmente a Constituição Federal em seus artigos 5º, XXXVI (ato jurídico perfeito), 195, caput (princípio da solidariedade) e § 5º (necessidade de custeio para a majoração do valor do benefício).
Além da afronta à Constituição Federal, o pedido da parte apelante não foi prevista pelo legislador ordinário. O artigo 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91 veda ao segurado a concessão de qualquer outro benefício após o retorno à atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação, nos termos assim expressos:
No entanto, mesmo diante desta expressa vedação legal, cabe aos intérpretes analisar a possibilidade da desaposentação em face dos princípios que regem a seguridade social.
De início, é importante destacar que a previdência social é organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, de modo que o retorno à atividade econômica não afasta a obrigação ao pagamento de contribuição previdenciária, sob o imperativo do princípio da solidariedade. Ou seja, no regime da previdência social escolhido pelo legislador constituinte não se contribui apenas para si, mas para a seguridade como um todo, assegurando equilíbrio para o sistema.
Assim, ainda que se pudesse discutir a questão da contribuição do jubilado ao sistema previdenciário, após a concessão de aposentadoria, tais contribuições não podem ser destinadas exclusivamente ao seu capital próprio, como já apreciado pelo STF por ocasião do julgamento da ADI 3105-DF, em que se apreciou a constitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e pensões dos servidores públicos de que tratou a EC 41/2003. Segue a ementa:
Deste modo, dentro do sistema previdenciário eleito pelo constituinte, os servidores inativos, por integrarem a sociedade, não poderiam invocar o direito de não contribuir, pois suas contribuições destinavam-se, também, a financiar todo o sistema, razão pela qual a exação foi tida por constitucional.
É verdade que nesta ação não se discute contribuições incidentes sobre aposentadorias, no entanto, o raciocínio a ser empregado para a solução é o mesmo, qual seja, o retorno ou a continuidade na atividade econômica, gerando remuneração pela prestação dos serviços, exige contribuições que passam a financiar todo o sistema, não se destinando ao exclusivamente ao incremento da aposentadoria da qual a parte autora recebe no RGPS.
Como as contribuições vertidas após a aposentação não se destinam ao próprio e exclusivo proveito do segurado, mas de todo o sistema, é impróprio falar em desaposentação com aproveitamento de tais contribuições para obter benefício mais vantajoso.
Nem se admite a possibilidade da desaposentação, sob a defesa de que se trata de renúncia a um direito patrimonial. "Renúncia" é um ato privativo da vontade do aposentado de modo que a administração não pode obstar esse direito.
No entanto, não se trata apenas de renunciar ao benefício ou deixar de receber as prestações devidas, abandonando o seu crédito. O que o segurado pretende, com a renúncia, é obter nova concessão, computando agora as contribuições vertidas para o sistema após a concessão do beneplácito.
Então, o que se busca com o provimento jurisdicional vai além da manifestação de vontade exclusiva do beneficiário da aposentadoria. É certo que a renúncia ao seu benefício depende exclusivamente da sua vontade. Mas não se trata de abdicação de um direito sem qualquer contrapartida, mas sim a concessão de nova aposentadoria, o que dependerá do interesse público que não pode ser obrigado a concedê-lo sem que a lei assim o determine ou que a omissão legal venha a impedir um direito constitucionalmente previsto.
Considerando, assim, que o ato de concessão da aposentadoria foi praticado nos termos da lei, sem que nenhum vício tenha sido constatado, não se poderia, em tese, excluir este ato do mundo jurídico e substituí-lo por outro, mais benéfico para a parte ser realizado, considerando somente a vontade da parte beneficiária. No caso dos autos, não vejo como afastar a aplicação do princípio da legalidade e a desconstituição de um ato jurídico perfeito e acabado, que vem produzindo efeitos ao longo do tempo.
O sistema previdenciário não possui natureza de direito privado, em que se aplica o princípio da não vinculação à lei, conforme exprime o referido dispositivo constitucional. O princípio da legalidade que deve reger os benefícios previdenciários informa que é necessária a previsão legal do benefício para autorizar a sua concessão.
Então, diante da ausência de previsão legal expressa da possibilidade de renúncia à aposentadoria, não se autoriza o direito à renúncia, quando presente a finalidade única de revisão da renda mensal.
Nesse sentido, o disposto no art. 181-B do Dec. n. 3.048/99 não extrapolou os limites de regulamentação, pois a irrenunciabilidade encontra fundamento no artigo 125 da Lei n. 8.213/91 e art. 195, §5º, da CF.
O princípio da precedência da fonte de custeio é o outro corolário do princípio da legalidade, pois somente ao benefício previsto no regime jurídico previdencíario é que se poderia deduzir sua referibilidade com as respectivas fontes de custeio.
Com isso a pretensão de desconstituir um benefício para obtenção de outro mais vantajoso encontra óbice no sistema de custeio de aposentadorias, pois a concessão de benefício leva em consideração o tempo de contribuição e a idade (fator previdenciário), para fins de cálculo da renda mensal inicial do segurado.
Resulta da equação atuarial que os trabalhadores que suportaram período mais longo de contribuição fazem jus à concessão de benefício de aposentadoria pleno, ao passo que aqueles que obtêm a concessão de aposentadoria prematura sofrem um deságio no valor do benefício concedido.
Neste sentido, a decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal desta 3ª Região, nos autos dos EI 0007647-53.2010.4.03.6183, julgado em 25/10/2012, relatada pela Desembargadora Federal MARISA SANTOS, publicada no e-DJF3 Judicial 1, conforme segue:
Portanto, não se pode obrigar a autarquia previdenciária a atender ao pedido da parte autora, porque não há lei genérica e abstrata que a preveja de modo a garantir a isonomia entre os segurados que se encontrarem em igualdade de condições, o que é inviável por meio da atuação jurisdicional devido a sua natureza casuística e com eficácia interpartes.
Em paralelo, não podemos nos olvidar do esforço de vários países, no sentido de manter o equilíbrio financeiro e atuarial dos sistemas previdenciário - especialmente, no que diz respeito à aposentadoria precoce, pois que isso exige enorme carga de contribuições da sociedade.
Para o caso das aposentadorias por tempo de serviço, a alternativa encontrada foi a de diminuir, drasticamente, o valor do benefício, pois isso põe o segurado a pensar se vale a pena pleitear o benefício prematuramente em troca de uma inatividade com poucos recursos.
A desaposentação afronta esta orientação. Ao autorizar a renúncia, permitindo o aproveitamento do tempo de serviço laborado após a aposentação, para fins de incremento do valor do benefício, ao argumento de ausência de proibição legal/constitucional, estimularia a aposentadoria precoce. Nenhum trabalhador abriria mão de se aposentar mais cedo, recebendo de duas fontes - uma, pública: a aposentadoria; e a outra, privada: os salários da empresa - por ter assegurado o direito de acrescentar mais tempo de serviço àquele que considerou por ocasião da concessão do benefício originário.
Por fim, não se olvide que o tema foi enfrentado parcialmente pelo STJ, em sede de recurso repetitivo, no julgamento do REsp 1334488, em 08/05/2013:
Após a oposição de dois embargos de declaração do julgado, a questão restou assim assentada:
Portanto, a despeito do Superior Tribunal de Justiça ter firmado orientação no sentido da possibilidade de desaposentação, a questão constitucional não apreciada encontra-se em sede de repercussão geral perante o Supremo Tribunal Federal, razão pela qual não há falar em pacificação da orientação em relação a questão. Referida analise é pressuposto de aplicabilidade do julgamento do recurso repetitivo que, ademais, não transitou em julgado.
Analisado o pedido sob a interpretação sistemática do regime jurídico da previdência social, conclui-se que é impossível a majoração do valor do benefício por conta de um tempo de serviço laborado posteriormente à concessão da aposentadoria.
Aos defensores da teoria da desaposentação impressiona o fato de serem efetuadas contribuições sem qualquer possibilidade de contraprestação ao segurado contribuinte. Daí defenderem a renúncia ao benefício e imediata concessão de outro, da mesma espécie, com acréscimo de tempo de contribuição, idade e novos salários-de-contribuição.
No entanto, esse fato não se choca com os fundamentos do sistema previdenciário brasileiro que é contributivo, mas se baseia na solidariedade, cujo motor principal é a participação de toda a coletividade no financiamento do sistema, o que afasta a necessidade de correspondência entre custeio e benefício, próprio dos sistemas eminentemente contributivos.
A gratuidade da justiça foi concedida em primeira instância, não necessitando de renovação do pedido, em sede recursal. Os honorários advocatícios foram fixados, porém foi determinada a observância da gratuidade da justiça, razão pela qual mantenho a verba honorária nos termos em que fixada em primeiro grau de jurisdição.
Pelos motivos expostos, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
MARISA CUCIO
Juíza Federal Convocada
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Data e Hora: | 16/06/2015 14:30:49 |