
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5815766-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA LUCIA RIBEIRO ZORZETTE
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ANTONIO CHAVES - SP62413-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5815766-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA LUCIA RIBEIRO ZORZETTE
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ANTONIO CHAVES - SP62413-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO (RELATORA): Trata-se de ação movida pela parte autora contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), cujo objetivo é a concessão de aposentadoria por idade rural, com base nos arts. 48 e 143, da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS).
Processado o feito, a demanda foi julgada IMPROCEDENTE pela r. sentença (ID 75571893), com fundamento na insuficiência probatória relativa ao exercício de atividade rural.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação (ID 75571900), na busca pela reforma da r. sentença. Para tanto, aduz que trouxe aos autos diversos documentos, que serviriam como início de prova material. Além disso, reforçou que a prova testemunhal comprova o alegado exercício de atividade rural, razão pela qual faria jus ao benefício de aposentadoria por idade rural.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este E. Tribunal Regional Federal.
Nesta instância, foi proferido acórdão (ID 152430111), no qual foi negado provimento ao recurso, também em decorrência da ausência de início de prova material suficiente para demonstrar todo histórico laboral.
Em face de tal situação, a parte autora interpôs Recurso Especial (ID 163314930), arguindo ofensa à norma infraconstitucional e divergência de posicionamento entre tribunais sobre a matéria referente ao início de prova material.
Após o devido trâmite, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu decisão (ID 259677335) de parcial provimento ao recurso, com a cassação do acórdão atacado e determinação de nova apreciação do caso, com base nas orientações encampadas na Corte Superior.
Retornado os autos a esta instância recursal, impõe-se nova análise da matéria devolvida por meio da apelação da parte autora, a fim de que se determine o cabimento da concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5815766-62.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA LUCIA RIBEIRO ZORZETTE
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ANTONIO CHAVES - SP62413-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO (RELATORA): diante da regularidade formal do recurso de apelação, com base no art. 1.011, do CPC, passo à análise do objeto da insurgência recursal propriamente dita.
Aposentadoria por idade do trabalhador rural
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disposto nos arts. 39, inciso I, 48 e 143 da LBPS e regulamentado pelo art. 56 do Regulamento da Previdência Social (RPS – Decreto nº 10.410/2020).
Os §§ do art. 48, da LBPS propiciaram eficácia à regra constitucional do inciso I do art. 202 da CF, que reduz a exigência etária em 5 anos para trabalhadores rurais. Com isso, a idade mínima para aposentação por idade é de 60 anos, para o homem, e de 55 anos, para a mulher, no âmbito rural.
Cabe esclarecer que a distinção na idade foi mantida pela EC nº 103/2019, com a nova redação ao art. 201, § 7º, II, mantendo-se a exigência etária para essa aposentadoria voltada aos trabalhadores rurais e aos que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
Além do requisito etário, é imprescindível a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício ou ao implemento da idade exigida, em número de meses igual à carência, nos termos do disposto no art. 143 da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
No que tange ao cumprimento de carência pelo trabalhador rural, cumpre destacar que a LBPS não exige o recolhimento de contribuição previdenciária por determinado número de meses. No entanto, o mesmo diploma normativo exige a comprovação do exercício da atividade rural, da seguinte maneira:
“Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
(...)
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei;
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ” (Grifo nosso).
Ainda no que concerne à comprovação da atividade rural, a LBPS, positivando entendimento da jurisprudência há muito pacificado, determina que não é possível fundamentação com base exclusivamente em prova testemunhal, sendo imprescindível início de prova material. Vejamos:
Enunciado 149 da Súmula do STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
LBPS, Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.
Neste contexto, o legislador buscou disciplinar a questão da prova da atividade rural, elencando determinados documentos que teriam força probatória para cumprir com tal tarefa no seguinte dispositivo legal:
Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, complementarmente à autodeclaração de que trata o § 2º e ao cadastro de que trata o § 1º, ambos do art. 38-B desta Lei, por meio de, entre outros:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - (revogado);
IV - Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, de que trata o inciso II do caput do art. 2º da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, ou por documento que a substitua;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.
Acresce notar, entretanto, que o Poder Judiciário não está adstrito a este rol de documentos, uma vez no ordenamento jurídico pátrio vigora o sistema do livre convencimento motivado (STJ, AgRg no REsp n. 847.712/SP, relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 3/10/2006, DJ de 30/10/2006, p. 409.).
Dessa forma, é possível concluir que início de prova material, para fins de comprovação de atividade rural, é todo documento que contenha a profissão ou outro dado que evidencie a atividade rurícola. Neste ponto, cabe ao magistrado verificar se o documento se presta a tal finalidade.
Destaca-se, ainda, que não é necessário que a parte autora tenha um documento para cada ano do período de carência, bastando que os anos em que não existem tais documentos sejam relativamente próximos daqueles que contêm início de prova material (Enunciado 14 da Súmula da Turma Nacional de Uniformização – TNU).
Ademais, a Corte Superior firmou, em sede de recursos repetitivos, a relevante tese, segundo a qual “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório (STJ, Recursos repetitivos, Tema 638).
Neste contexto, é possível estabelecer que o melhor entendimento é o que considera como início de prova material toda documentação idônea que permita identificar atividade rural por parte do segurado, seja em nome próprio ou em nome de terceiro. Confira-se o esclarecedor precedente do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL. VERIFICAÇÃO DO ACERVO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA DA ATIVIDADE. EXTENSÃO DA CONDIÇÃO DE TRABALHADOR RURAL DE UM DOS CÔNJUGES.
I - A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que constitui valoração, e não reexame de provas, a verificação do acervo probatório dos autos com vistas a confirmar o alegado exercício de atividade rurícola (AgRg no REsp 880.902/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 15/02/2007, DJ 12/03/2007, p. 329).
II - O precedente indicado pela embargante como paradigma retrata, de fato, o entendimento consolidado por esta Colenda Seção, segundo o qual, diante das dificuldades encontradas pelos trabalhadores rurais para a comprovação do tempo de serviço prestado nas lides campesinas, o exame das provas colacionadas aos autos não encontra óbice na Súmula 7 do STJ, por consistir em devida revaloração do acervo probatório (AgRg no REsp 1150564/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010).
III - Este Superior Tribunal de Justiça, nas causas de trabalhadores rurais, tem adotado critérios interpretativos favorecedores de uma jurisdição socialmente justa, admitindo mais amplamente documentação comprobatória da atividade desenvolvida.
IV - Seguindo essa mesma premissa, firmou posicionamento segundo o qual as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais e contratos de parceria agrícola são aceitos como início da prova material, nos casos em que a profissão rural estiver expressamente consignada.
V - Da mesma forma, admite que a condição profissional de trabalhador rural de um dos cônjuges, constante de assentamento em Registro Civil, seja extensível ao outro, com vistas à comprovação deatividade rurícola.
VI - Orienta ainda no sentido de que, para a concessão de aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do labor agrícola se refira a todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a ampliar a eficácia probatória dos documentos (AR 4.094/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
VII - Embargos de Divergência acolhidos
(STJ, EREsp 1.171.565/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/03/2015). (Grifo nosso)
Do caso dos autos
Conforme disposto no § 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91, a aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher. Assim, de pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário, o que se verifica pela documentação apresentada.
Quanto à comprovação da atividade rural, alega a parte autora que a exerceu de forma habitual e por período superior aos exigidos na legislação previdenciária.
De fato, é o que se verifica a partir dos elementos de prova colhidos neste processo.
Inicialmente, a parte autora apresentou documentação, digna do status de início de prova material, da qual se destaca a CTPS do marido da parte autora, na qual constam diversos vínculos como trabalhador rural, entre os anos de 1981 e 2000.
Além disso, a prova testemunhal colhida nos autos não somente corrobora o início de prova material como também estende a sua eficácia probatória, ao indicar a lide rural como avulso ou diarista em diversos momentos da vida da parte autora. É o que se observa a seguir:
- Testemunho da Sra. Lúcia Giacomete: afirmou que conhece a parte autora há mais de 40 anos, pois trabalhavam juntas na roça desde os 10 anos de idade; que trabalharam nas Fazendas “Barra Preta” e “São Joaquim”, no cultivo de café, amendoim entre outras culturas; que a parte autora trabalhou até março de 2018 na Fazenda “Belo Monte”, como diarista; que trabalharam juntas por 15 anos; que também se encontravam nos pontos de serviço; que o marido da parte autora também sempre trabalhou na roça.
- Testemunho da Sra. Guiomar Amaro: afirmou que conhece a parte autora há mais de 20 anos; que a parte autora sempre trabalhou na roça; que elas trabalharam nas mesmas fazendas, entre as quais, “Santa Paula” e “Brejo Limpo”; que o marido da parte autora é lavrador; que sempre trabalharam sem registro; que entravam no trabalho de manhã e saíam às 5 da tarde, de segunda a sábado; que trabalhavam com os mesmos empreiteiros, dentre os quais o Sr. Paulo; que a parte autora trabalhou até tempos atrás, por volta de março de 2018; que a diária era de aproximadamente cinquenta reais; que sempre se encontravam nos trabalhos.
Como é possível observar, a prova testemunhal traz depoimentos coerentes e harmônicos entre si. Destes se depreende que a parte autora exerceu trabalhos rurais como avulsa ou diarista rural, por praticamente toda a sua vida. Há informações claras sobre quem eram os empreiteiros, quais eram as fazendas contratantes, além de informações sobre a rotina de trabalho típica da lide rural.
Como é sabido, o ambiente rural é marcado pela informalidade e pela simplicidade de seus trabalhadores. Isso significa que não há como exigir que o segurado traga documentos que relatem exatamente como se desenrolou o seu histórico laboral. Tal exigência seria completamente desarrazoada e configuraria prova diabólica, expediente rechaçado pelo sistema processual brasileiro. Não por menos que, na seara previdenciária, a legislação e a jurisprudência específicas permitem que o início de prova material ateste a verossimilhança das pretensões a benefícios previdenciários, desde que corroborado por idônea e robusta prova testemunhal.
Desta forma, por todos elementos de prova colhidos nos autos, é possível concluir que a parte autora exerceu atividade rural, por período superior a 15 anos (ou 180 contribuições), conforme as exigências do art. 143, da LBPS, razão pela qual faz jus ao benefício da aposentadoria por idade rural, desde a entrada do requerimento administrativo.
Honorários sucumbenciais
Diante da reversão da sucumbência, condeno o INSS a pagar honorários advocatícios, de forma exclusiva, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data desta decisão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Custas processuais
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei nº. 9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nº.s 4.952/85 e 11.608/2003). Tal isenção, contudo, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº. 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Correção monetária
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
Juros de mora
Conforme disposição inserta no art. 240 Código de Processo Civil, os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil; e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
Aplicação única da Selic a partir da EC n. 113 de 08/12/2021
A partir do mês de promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3°, sendo vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Prequestionamento
Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, diante da procedência da ação, nos moldes da fundamentação.
Comunique-se o INSS, via sistema, para fins de cumprimento do julgado no tocante à concessão da tutela específica.
GABCM/PEJESUS
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER:
Com a devida vênia ao bem conduzido voto proferida pela E. Relatora, dele divirjo nos seguintes termos:
Com efeito, após decisão proferida pelo C. STJ sob id. 259677335, os autos retornaram a esta Corte para reexame quanto a suficiência probatória da documentação exibida nos atos pela parte autora, a saber, certidão de casamento no qual o cônjuge da demandante consta como lavrador.
Ao efetuar o reexame de mérito, a E. Relatora entendeu que a certidão de casamento coligida aos autos, bem como carteira de trabalho de seu cônjuge contendo vínculos rurais, se constituem em início de prova material suficiente ao cotejo da prova testemunhal colhida em Juízo, concluindo, assim, pela possibilidade de concessão da aposentadoria pleiteada.
Com a devida venia ao entendimento exposto na Decisão id. 259677335 e ao Voto Condutor, tenho entendimento diverso.
O exame da inicial, denota que a parte autora não informa, efetivamente, os períodos de trabalho como segurada especial que pretende comprovar, referindo a demandante, tão somente ter postulado benefício de aposentadoria por idade rural em 16/03/2018, o qual foi indeferido em 19/03/2018 por não cumprimento do requisito carência.
A demonstrar seu direito à aposentação, no id 75571755 anexa certidão de casamento, contraído em 06/09/1980, na qual o marido é qualificado como lavrador.
Por sua vez, a Carteira de Trabalho do cônjuge de id 75571779, denota que nos períodos de 13/07/1981 a 12/09/1982; 20/09/1982 a 16/04/1983; 17/07/1984 a 13/10/1984; 02/01/1986 a 09/01/1987; 20/03/1988 a 31/12/1990 e; 01/01/1992 a 30/09/1995 exerceu atividade como empregado de empresas agroindustriais.
Sobreveio sentença de improcedência do feito sob id 75571893 respectivamente confirmada por Acórdão id 152430111, com oposição de embargos de declaração, pela parte autora, ocasião em que trouxe aos autos certidões de nascimento dos filhos nas quais existe a informação de que o genitor é lavrador.
Muito embora os períodos de trabalho constantes na CTPS do cônjuge e laborados em favor de empregadores rurícolas possam ser computados como tempo de atividade campestre para fins de aposentação por idade rural do próprio titular do documento, é controvertida na jurisprudência a questão relativa à utilização destes vínculos como início de prova material para comprovação de atividade rurícola dos demais componentes do grupo familiar.
Isso porque, o emprego de natureza rural não se confunde com o exercício de atividade como segurado especial no âmbito do grupo familiar.
Notadamente, na forma do artigo 2º da Lei 5.889/1973, “empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário”(grifamos).
Esta Colenda Corte, em casos semelhante, assim decidiu: “Não é possível estender a condição de trabalhador rural de um cônjuge ao outro quando o início de prova material apresentado se restringir, tão só, à CTPS, uma vez que os contratos de trabalho nela registrados não significam que o postulante tenha trabalhado no meio rural, dado o seu caráter pessoal, ou seja, somente o contratado pode prestar o serviço ao empregador”. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - 5003957-69.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 08/05/2024, DJEN DATA: 14/05/2024)
Nesse sentido, pela própria natureza da relação de emprego, impera o elemento personalíssimo do liame, não se podendo, em contraste, dessumir que os demais componentes do grupo familiar atuem em favor do mesmo empregador.
Por sua vez, na forma do inciso VII do artigo 11 da Lei 8.213/91, o segurado especial é a pessoa física que executa, em conta própria, ou com auxílio de familiares, atividade rural de subsistência, exercida com mútua dependência e colaboração, sem auxílio de empregados permanentes.
Assim, as atividades do segurado especial e do empregado rural estão absolutamente dissociadas, já que nesta o trabalho não é realizado para subsistência do grupo familiar e em condição de vulnerabilidade social, ocorrendo ainda, como é próprio da relação de emprego, em natureza personalíssima, que, portanto, não pode ser estendida a outros componentes do grupo familiar do segurado.
A parte autora não apresentou um documento sequer no qual conste sua qualificação como agricultora, ou empregada rural.
Ante ao exposto, apresento proposta de voto divergente para NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. VERIFICADO. PROVA TESTEMUNHAL COESA E HARMÔNICA. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. CUSTAS PROCESSUAIS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
- A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural é devido ao segurado especial que comprove o preenchimento do requisito etário e a atividade rural por período equivalente ao da carência exigida para o benefício, de acordo com os arts. 39, I, 48 e 143, da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS).
- Verificada a existência de início de prova material, que foi corroborado por prova testemunhal robusta, coesa e detalhada relativa à atividade rural pela parte autora, por período superior ao exigido pela legislação previdenciária.
- Reversão da sucumbência, para condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a prolação deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Isenção de custas processuais, por força das Leis Estaduais do Estado de São Paulo nº. 4.952/85 e nº. 11.608/2003.
- Tutela antecipada concedida.
- Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL