Processo
ReeNec - REEXAME NECESSÁRIO / SP
5000275-68.2016.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
25/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/04/2019
Ementa
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO.
DESCARACTERIZAÇÃO DA APLICAÇÃO DO NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO
PREVIDENCIÁRIO - NTEP. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO IMPETRANTE. VIOLAÇÃO AOS
PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
ARTIGO 5º, LIV e LV, DA CF.
1 – O objeto do Mandado de Segurança é a concessão da ordem para compelir a autoridade
impetrada a restabelecer a natureza acidentária do auxílio-doença (NB:605.991.473-3),
modificada para auxílio-doença previdenciário após acolhimento de contestação do empregador,
porém sem a prévia manifestação do impetrante.
2 - Demonstrado que o impetrante não teve ciência da descaracterização do Nexo Técnico
Epidemiológico - NTEP, antes da alteração do benefício da modalidade acidentária para benefício
previdenciário comum, o que viola os princípios constitucionais do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF), restou configuradaa ilegalidade do ato.
3 - Nego provimento ao reexame necessário.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5000275-68.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: OTACILIO LOPES DA SILVA FILHO
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
APELADO: GERENTE EXECUTIVO DO INSS DE SÃO BERNARDO DO CAMPO, INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5000275-68.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: OTACILIO LOPES DA SILVA FILHO
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284
APELADO: GERENTE EXECUTIVO DO INSS DE SÃO BERNARDO DO CAMPO, INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de
mandado de segurança impetrado por OTACILIO LOPES DA SILVA FILHO contra ato coator do
Gerente Executivo do Instituto Nacional do Seguro Social em São Bernardo do Campo, com
pedido de liminar, pelo qual objetiva que a autoridade impetrada restabeleça a natureza
acidentária do auxílio-doença NB: 605.991.473-3, até que sejam observadas todas as esferas da
via administrativa, com o contraditório e a ampla defesa.
A r. sentença confirmou a liminar e concedeu à segurança para determinar que aautoridade
coatora mantenha a natureza acidentária do auxílio-doença (NB: 605.991.473-3) até que o
beneficiário seja intimado da contestação apresentada pela empregadora Mercedes Benz do
Brasil Ltda. e, caso queira, a impugne; não sendo apresentada a impugnação, que seja
restabelecida a decisão que modificou a natureza do benefício do impetrante; e se ofertada, que a
alteração da natureza do benefício somente ocorra após a sua apreciação.
Sem a interposição de recurso voluntário, os autos subiram a esta Egrégia Corte por força do
reexame necessário.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pela ausência de interesse público ou social,
individual indisponível, interesse de incapaz ou outro interesse público relevante a justificar a sua
intervenção no feito.
É o relatório.
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5000275-68.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: OTACILIO LOPES DA SILVA FILHO
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP1952840A
APELADO: GERENTE EXECUTIVO DO INSS DE SÃO BERNARDO DO CAMPO, INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Objetiva o
impetrante o restabelecimento da natureza acidentária do benefício de auxílio-doença
(NB:605.991.473-3), convertido em auxílio-doença previdenciário após o acolhimento a
contestação pela empregadora, mas sem a garantia do contraditório prévio.
Alegaque, em 28/04/2014, passou a receber o benefício de auxílio-doença de natureza
previdenciário (NB: 605.991.473-3/31), eis que a perícia do INSS concluiu ser portador de
problemas na coluna e LER nos ombros. Em 18/06/2015, ao requerer a prorrogação do benefício,
a perícia médica reconheceu seu direito ao auxílio-doença de natureza acidentária. Contudo, sem
que lhe fosse garantido o direito ao contraditório, foi alterada a natureza do benefício para auxílio
doença previdenciário, e que apenas em 09/05/2016 foi comunicadoda decisão que acolheu a
contestação apresentada pela empregadora a empresa MERCES-BENZ DO BRASIL LTDA, com
a descaracterização do Nexo Técnico Epidemiológico. Requer a concessão da segurança para
que a autoridade coatora restabeleça a natureza acidentária do benefício, com a garantia do
contraditório e da ampla defesa.
Nos termos do artigo 5.º, inciso LXIX, da Constituição Federal, o mandado de segurança exige,
para a sua concessão, que o direito tutelado seja líquido e certo, vale dizer, apresente-se
"manifesto na sua existência, delimitado em sua extensão e apto a ser exercitado no momento da
impetração".
Isto porque o rito especialíssimo do mandado de segurança não comporta dilação probatória,
devendo todos os elementos de prova acompanhar a petição inicial. Se depender de
comprovação posterior, não será considerado líquido e certo para fins de mandado de segurança.
Cinge-se a questão ao eventual direito líquido e certo do impetrante de que a alteração da
natureza de seu benefício acidentário para benefício previdenciário somente ocorra após a
garantia do contraditório.
Com efeito, a normatização acerca da caracterização da natureza acidentária da incapacidade e
a possibilidade de recurso administrativo por parte da empresa interessada, encontra-se no artigo
21-A, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 11.430/2006, a saber:
"Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da
incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o
agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da
incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o
que dispuser o regulamento.
§ 1º A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a
inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.
§ 2º A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão
caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da
Previdência Social".
O Decreto nº 3.048/99, regulamentando a legislação supra, assim estabelece:
"Art. 337. O acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS,
mediante a identificação do nexo entre o trabalho e o agravo.
I - o acidente e a lesão;
II - a doença e o trabalho; e
III - a causa mortis e o acidente.
(...)
§ 7º A empresa poderá requerer ao INSS a não aplicação do nexo técnico epidemiológico ao
caso concreto mediante a demonstração de inexistência de correspondente nexo entre o trabalho
e o agravo.
(...)
§ 13. Da decisão do requerimento de que trata o § 7o cabe recurso, com efeito suspensivo, por
parte da empresa ou, conforme o caso, do segurado ao Conselho de Recursos da Previdência
Social, nos termos dos arts. 305 a 310. "
Regulamentando o prazo para interposição do recurso em comento, a Instrução Normativa
INSS/PRES nº 31/08, em seu artigo 4º, § 1º, assim estabelece:
§ 1º A empresa poderá interpor recurso ao Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS)
até trinta dias após a data em que tomar conhecimento da concessão do benefício em espécie
acidentária por nexo técnico profissional ou do trabalho, conforme art. 126 da Lei nº 8.213/91
quando dispuser de dados e informações que demonstrem que os agravos não possuem nexo
técnico com o trabalho exercido pelo trabalhador.
Por sua vez, o art. 7º da referida instrução normativa estabelece nos §§ 4º e 5º:
“§ 4º A Agência da Previdência Social-APS, mantenedora do benefício, encaminhará o
requerimento e as provas produzidas à perícia médica, para análise prévia. Sempre que a
instrução do pedido evidenciar a possibilidade de reconhecimento de inexistência do nexo técnico
entre o trabalho e o agravo, o segurado será oficiado sobre a existência do requerimento da
empresa, informando-lhe que poderá retirar uma das vias apresentada pela mesma para,
querendo, apresentar contra razões no prazo de quinze dias da ciência do requerimento.
§ 5º Com as contra razões, o segurado formulará as alegações que entender necessárias e
apresentará a documentação probatória, com o objetivo de demonstrar a existência do nexo
técnico entre o trabalho e o agravo.”
Portanto, a perícia médica do INSS pode, com base no Nexo Técnico Epidemiológico, reconhecer
a natureza do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez como sendoacidentária,
considerando os CIDS e CNAE constantes da lista C do anexo II do Decreto 6.042/2007,
facultando ao empregador a apresentação de contestação com vistas a afastar descaracterizar a
natureza do benefício.
Contudo, apresentada contestação, o segurado deve ser intimado para exercer o contraditório, no
termos do art. 337, § 12 do Decreto 3.048/1999:
“O acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS, mediante
a identificação do nexo entre o trabalho e o agravo.(Redação dada pelo Decreto nº 6.042, de
2007).
(...)
§12.O INSS informará ao segurado sobre a contestação da empresa para que este, querendo,
possa impugná-la, obedecendo, quanto à produção de provas, ao disposto no § 10, sempre que a
instrução do pedido evidenciar a possibilidade de reconhecimento de inexistência do nexo entre o
trabalho e o agravo.(Redação dada pelo Decreto nº 6.939, de 2009)”
A Constituição Federal garante, no artigo 5º, inciso LV e LV, que, aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditórioeampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
A revisão do ato administrativo deve se pautar pelo respeito às garantias constitucionais que
protegem o cidadão dos atos estatais, notadamente o devido processo legal, o contraditórioe a
ampla defesa.
No caso dos autos, verifica-se que o impetrante requereu o benefício por incapacidade laborativa
em 28/04/2014. Inicialmente, foi deferido o auxílio-doença previdenciário (NB:31/605.991.473-3),
em 14/05/2014, com data de afastamento do trabalho em 10/04/2014. Em 18/06/2015, foi
revisadocom a concessão do benefício na espécie 91. Contudo, a empregadora apresentou
defesa, a qual restou acolhida, e o INSS novamente alterou a natureza do benefício para espécie
31 (documento 235696, página 3).
Razão assiste ao impetrante, pois a intimação do segurado ocorreu apenas em 05/09/2016, após
o acolhimento da contestação apresentada pela empregadora, em 29/10/2015, com a conversão
do benefício de espécie 91 (acidentário) para espécie 31 (previdenciário), sem a garantia do
exercício do contraditório (documento 235696, páginas 1 a 4).
Assim sendo, é de se reconhecer que o INSS não ofertou oportunidade de defesa ao impetrante
paraexercer o contraditório, restando ausente o direito à ampla defesa amparado
constitucionalmente, haja vista que somente se pode ter por obedecido o devido processo legal
com a efetiva ciência dos atos realizados no processo administrativo.
Nesse sentido, confiram-se os julgados assim ementados:
RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
IMPRESCINDIBILIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO ONDE SEJAM GARANTIDAS A
AMPLA DEFESA E O CONTRADITÓRIO .
Para a suspensão do benefício previdenciário, sob o qual existe suspeita de fraude, é
indispensável o prévio processo administrativo, onde sejam garantidos, ao interessado, a ampla
defesa e o contraditório .
Recurso desprovido
(REsp nº 477.555 - RJ, 5ª Turma, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, unânime, DJU de
24.3.2003).
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO.
SUSPENSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA.
Esta Corte consolidou o entendimento segundo o qual não pode a autarquia suspender ou
cancelar benefício previdenciário sem prévio processo administrativo, em que sejam assegurados
os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Agravo regimental improvido.
(Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 492.131 - RJ, 6ª Turma, Relator Ministro Paulo
Medina, unânime, DJU de 15.9.2003).
AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. NEXO ETIOLÓGICO RECONHECIDO EM PERÍCIA MÉDICA
DO INSS. INTERESSE RECURSAL DA EMPRESA. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO
ADMININSTRATIVO AFASTADA. AGRAVO RETIDO NÃO REITERADO. NÃO
CONHECIMENTO.
1. Não se conhece do agravo retido cujo conhecimento não fora reiterado em contrarrazões de
apelação, nos termos do art. 523, §1º, do CPC.
2. Em decorrência da garantia constitucional do devido processo legal, a empresa interessada
poderá interpor recurso ao Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS) até 30 dias após
a data em que tomar conhecimento da concessão do benefício em espécie acidentária por nexo
técnico profissional ou do trabalho, em razão dos reflexos que tal decisão ocasiona em sua esfera
jurídico tributária.
3. A ciência da decisão por meio de disponibilização do ato administrativo na página do órgão
público na Internet não supre a exigência legal de intimação do interessado, pois constitui ciência
ficta, sem a certeza exigida pela Lei nº 9.784/99. Ausente comunicação formal do ato
administrativo, de forma que esteja assegurada a ciência da empresa interessada, não pode o
órgão previdenciário considerar decorrido o prazo para interposição de recurso, sob pena de
indisfarçável afronta às garantias legais e constitucionais em comento.
4. Agravo retido não conhecido. Sentença que afastou a intempestividade do recurso
administrativo mantida. Apelação do INSS e reexame necessário improvidos.
(TRF-3ª Região, AMS 2010.61.26.000814-5, D.E. 10.09.2012, rel. Juiz Fed. Conv. Fernando
Gonçalves)
Assim, face à ausência de comunicação prévia do ato administrativo ao segurado interessado,
não pode o impetrado revisar a natureza do benefício, sob pena de afronta às garantias legais e
constitucionais, devendo ser mantida a sentença concessiva da segurança.
Diante do exposto, nego provimento ao reexame necessário.
É o voto.
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO.
DESCARACTERIZAÇÃO DA APLICAÇÃO DO NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO
PREVIDENCIÁRIO - NTEP. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO IMPETRANTE. VIOLAÇÃO AOS
PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
ARTIGO 5º, LIV e LV, DA CF.
1 – O objeto do Mandado de Segurança é a concessão da ordem para compelir a autoridade
impetrada a restabelecer a natureza acidentária do auxílio-doença (NB:605.991.473-3),
modificada para auxílio-doença previdenciário após acolhimento de contestação do empregador,
porém sem a prévia manifestação do impetrante.
2 - Demonstrado que o impetrante não teve ciência da descaracterização do Nexo Técnico
Epidemiológico - NTEP, antes da alteração do benefício da modalidade acidentária para benefício
previdenciário comum, o que viola os princípios constitucionais do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF), restou configuradaa ilegalidade do ato.
3 - Nego provimento ao reexame necessário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao reexame necessário, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA