Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001936-84.2019.4.03.6144
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
16/02/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2013, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. QUALIDADE DE SEGURADO. A DE CUJUS ERA
TITULAR DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA
COMPROVADA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO
ADOLESCENTE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. PRESCRIÇÃO. NÃO
INCIDÊNCIA.
- O óbito de Sônia Maria Wagner, ocorrido em 15 de outubro de 2013, está comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurado da de cujus, uma vez que ela
era titular do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/6028885707), desde
03 de junho de 2013, cuja cessação decorreu de seu falecimento.
- Do acervo probatório, depreende-se ser a postulante filha de Nivia Maria dos Santos, que veio a
óbito em 01 de janeiro de 2009, conforme demonstrado pela respectiva certidão.
- A segurada falecida (Sônia Maria Wagner), logo após o falecimento da genitora da menor,
ajuizou a ação nº 18/2009, a qual tramitou pela Vara Distrital de Jandira – SP, requerendo sua
guarda.
- A r. sentença proferida nos aludidos autos, em 18 de março de 2009, julgou procedente o
pedido e conferiu a guarda da autora à segurada Sônia Maria Wagner.
- Do laudo de estudo social realizado na referida demanda, verifica-se que o deferimento da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
guarda havia sido respaldado em parecer favorável da assistente social.
- O Ministério Público Estadual atuou na aludida demanda e também emitiu parecer favorável ao
deferimento da guarda.
- Com efeito, também instruem os presentes autos cópias dos ajustes anuais do Imposto de
Renda, declarados à Receita Federal, atinentes aos exercícios fiscais de 2006 a 2013, dos quais
se verifica que a segurada relacionava o nome da autora no campo destinado à descrição dos
dependentes econômicos.
- Comprovada a dependência econômica em relação à guardiã, o menor faz jus ao benefício de
pensão por morte, uma vez que os direitos fundamentais da criança e do adolescente têm seu
campo de incidência amparado pelo status de prioridade absoluta, requerendo, assim, uma
hermenêutica própria comprometida com as regras protetivas estabelecidas na Constituição
Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedente do Colendo Superior Tribunal de
Justiça (REsp 1.411.258/RS).
- Assinale-se, ademais, que, de acordo com o julgamento do REsp 1.411.258/RS, Relator Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, sob a sistemática de recurso repetitivo, referente ao TEMA 732,
publicado no Diário da Justiça Eletrônico do dia 21/02/2018, restou firmada a seguinte tese de
que : "O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu
mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, §3º do Estatuto
da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência
da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão
na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à
Legislação Previdenciária".
- Termo inicial mantido na data do falecimento da segurada (15/10/2013), ante a não incidência
de prescrição contra o menor absolutamente incapaz. Precedente.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001936-84.2019.4.03.6144
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
CURADOR: DEBORA WAGNER RODRIGUES
APELADO: LAURA DOS SANTOS RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: GUILHERME APARECIDO DIAS - SP345779-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001936-84.2019.4.03.6144
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
CURADOR: DEBORA WAGNER RODRIGUES
APELADO: L. D. S. R.
Advogado do(a) APELADO: GUILHERME APARECIDO DIAS - SP345779-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se apelação interposta em ação ajuizada por L.D.S.R. (incapaz), representada por sua
guardiã, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o
benefício de pensão por morte, na condição de menor sob guarda de segurada, esta falecida
em 15 de outubro de 2013.
A r. sentença recorrida julgou procedente o pedido e condenou a Autarquia Previdenciária à
concessão do benefício pleiteado, a contar da data do óbito (15/10/2013), com parcelas
acrescidas dos consectários legais. Por fim, deferiu a tutela de urgência e determinou a
implantação do benefício (id 196157235 – p. 1/11).
Em suas razões recursais, pugna o INSS pela reforma do decisum e improcedência do pedido,
ante a ausência de dependência econômica da parte autora em relação à falecida segurada.
Argui a inexistência de previsão legal a legitimar a concessão de pensão por morte ao menor
sob guarda. Alternativamente, requer que seja decretada a prescrição quinquenal. Suscita, por
fim, o prequestionamento legal, para efeito de interposição de recursos (id 196157240 – p.
1/14).
Contrarrazões (id 196157243 – p. 1/4).
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do Ministério Público Federal, em que se manifesta pelo improvimento do recurso de
apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, a fim de que seja mantido à apelada a
concessão do benefício de pensão por morte, desde o óbito da guardiã (id. 221367112 – p.
1/14).
É o relatório.
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001936-84.2019.4.03.6144
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
CURADOR: DEBORA WAGNER RODRIGUES
APELADO: L. D. S. R.
Advogado do(a) APELADO: GUILHERME APARECIDO DIAS - SP345779-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais,
passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi
a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente
atendido pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos."
(Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social. São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12
(doze) meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo
oral, ou pela percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c.
o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida
o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais, e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de
21 (vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são
equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a
dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Sônia Maria Wagner, ocorrido em 15 de outubro de 2013, está comprovado pela
respectiva Certidão (id 196157118 – p. 1).
Também restou superado o requisito da qualidade de segurado da de cujus, uma vez que ela
era titular do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/6028885707),
desde 03 de junho de 2013, cuja cessação decorreu de seu falecimento (id. 196157194 – p. 4).
Do acervo probatório, depreende-se ser a postulante filha de Nivia Maria dos Santos, que veio a
óbito em 01 de janeiro de 2009, conforme demonstrado pela respectiva certidão (id. 196157125
– p. 11).
A segurada falecida (Sônia Maria Wagner), logo após o falecimento da genitora da menor,
ajuizou a ação nº 18/2009, a qual tramitou pela Vara Distrital de Jandira – SP, requerendo sua
guarda (id. 196157120 – p. 1).
A r. sentença proferida nos aludidos autos, em 18 de março de 2009, julgou procedente o
pedido e conferiu a guarda da autora a segurada Sônia Maria Wagner (id. 196157188 – p.
37/38).
Do laudo de estudo social realizado na referida demanda, verifica-se que o deferimento da
guarda havia sido respaldado em parecer favorável da assistente social (id. 196157188 – p.
23/25).
O Ministério Público Estadual atuou na aludida demanda e também emitiu parecer favorável ao
deferimento da guarda (id. 196157188 – p. 33/34).
Com efeito, também instruem os presentes autos cópias dos ajustes anuais do Imposto de
Renda, declarados à Receita Federal, atinentes aos exercícios fiscais de 2006 a 2013, dos
quais se verifica que a segurada relacionava o nome da autora no campo destinado à descrição
dos dependentes econômicos (id. 196157121 – p. 1/27).
Após o falecimento de Sônia Maria Wagner, a guarda da menor foi deferida judicialmente à filha
da de cujus (Débora Wagner Rodrigues), que a representa nos presentes autos.
Desta forma, verifico já existir sentença com trânsito em julgado, proferida pela justiça estadual,
a qual reconhece que a parte autora efetivamente se encontrava sob a dependência econômica
de Sônia Maria Wagner.
Comprovada a dependência econômica em relação ao guardião, o menor faz jus ao benefício
de pensão por morte, uma vez que os direitos fundamentais da criança e do adolescente têm
seu campo de incidência amparado pelo status de prioridade absoluta, requerendo, assim, uma
hermenêutica própria comprometida com as regras protetivas estabelecidas na Constituição
Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedente do Colendo Superior Tribunal
de Justiça (REsp 1.411.258/RS).
Assinale-se, ademais, que, de acordo com o julgamento do REsp 1.411.258/RS, Relator
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, sob a sistemática de recurso repetitivo, referente ao TEMA
732, publicado no Diário da Justiça Eletrônico do dia 21/02/2018, restou firmada a seguinte
tese:
"O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu
mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, §3º do Estatuto
da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à
vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa
conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90),
frente à Legislação Previdenciária".
Confira-se a íntegra do v. aresto exarado no âmbito do C. STJ:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E HUMANITÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO
DA CONTROVÉRSIA. PROCESSAMENTO NOS TERMOS DO ART. 543-C DO CPC E DA
RESOLUÇÃO 08/STJ. DIREITO DO MENOR SOB GUARDA À PENSÃO POR MORTE DO
SEU MANTENEDOR. EMBORA A LEI 9.528/97 O TENHA EXCLUÍDO DO ROL DOS
DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS NATURAIS OU LEGAIS DOS SEGURADOS DO INSS.
PROIBIÇÃO DE RETROCESSO. DIRETRIZES CONSTITUCIONAIS DE ISONOMIA,
PRIORIDADE ABSOLUTA E PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE
(ART. 227 DA CF). APLICAÇÃO PRIORITÁRIA OU PREFERENCIAL DO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI 8.069/90), POR SER ESPECÍFICA, PARA ASSEGURAR
A MÁXIMA EFETIVIDADE DO PRECEITO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO. PARECER DO
MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, A TEOR DA SÚMULA 126/STJ.
RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, PORÉM DESPROVIDO.
1. A não interposição de Recurso Extraordinário somente tem a força de impedir o
conhecimento de Recurso Especial quando (e se) a matéria decidida no acórdão recorrido
apresenta dupla fundamentação, devendo a de nível constitucional referir imediata e
diretamente infringência à preceito constitucional explícito; em tema de concessão de pensão
por morte a menor sob guarda, tal infringência não se verifica, tanto que o colendo STF já
decidiu que, nestas hipóteses, a violação à Constituição Federal, nesses casos, é meramente
reflexa. A propósito, os seguintes julgados, dentre outros: ARE 804.434/PI, Rel. Min. DIAS
TOFFOLI, DJe 19.3.2015; ARE 718.191/BA, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.9.2014; RE
634.487/MG, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 1.8.2014; ARE 763.778/RS, Rel. Min. CARMEN
LÚCIA, DJe 24.10.2013; não se apresenta razoável afrontar essa orientação do STF, porquanto
se trata, neste caso, de questão claramente infraconstitucional.
2. Dessa forma, apesar da manifestação ministerial em sentido contrário, entende-se possível,
em princípio, conhecer-se do mérito do pedido recursal do INSS, afastando-se a incidência da
Súmula 126/STJ, porquanto, no presente caso, o recurso deve ser analisado e julgado, uma vez
que se trata de matéria de inquestionável relevância jurídica, capaz de produzir precedente da
mais destacada importância, apesar de não interposto o Recurso Extraordinário.
3. Quanto ao mérito, verifica-se que, nos termos do art. 227 da CF, foi imposto não só à família,
mas também à sociedade e ao Estado o dever de, solidariamente, assegurar à criança e ao
adolescente os direitos fundamentais com absoluta prioridade. Além disso, foi imposto ao
legislador ordinário a obrigação de garantir ao menor os direitos previdenciários e trabalhistas,
bem como o estímulo do Poder Público ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou
adolescente órfão ou abandonado.
4. A alteração do art. 16, § 2o. da Lei 8.213/91, pela Lei 9.528/97, ao retirar o menor sob guarda
da condição de dependente previdenciário natural ou legal do Segurado do INSS, não elimina o
substrato fático da dependência econômica do menor e representa, do ponto de vista
ideológico, um retrocesso normativo incompatível com as diretrizes constitucionais de isonomia
e de ampla e prioritária proteção à criança e ao adolescente.
5. Nesse cenário, a jurisprudência desta Corte Superior tem avançado na matéria, passando a
reconhecer ao menor sob guarda a condição de dependente do seu mantenedor, para fins
previdenciários. Precedentes: MS 20.589/DF, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, Corte Especial, DJe
2.2.2016; AgRg no AREsp. 59.461/MG, Rel. Min. OLINDO MENEZES, DJe 20.11.2015; AgRg
no REsp. 1.548.012/PE, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp.
1.550.168/SE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 22.10.2015; REsp.
1.339.645/MT, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 4.5.2015.
6. Não se deve perder de vista o sentido finalístico do Direito Previdenciário e Social, cuja
teleologia se traduz no esforço de integração dos excluídos nos benefícios da civilização e da
cidadania, de forma a proteger as pessoas necessitadas e hipossuficientes, que se encontram
em situações sociais adversas; se assim não for, a promessa constitucional de proteção a tais
pessoas se esvai em palavras sonoras que não chegam a produzir qualquer alteração no
panorama jurídico.
7. Deve-se proteger, com absoluta prioridade, os destinatários da pensão por morte de
Segurado do INSS, no momento do infortúnio decorrente do seu falecimento, justamente
quando se vêem desamparados, expostos a riscos que fazem periclitar a sua vida, a sua saúde,
a sua alimentação, a sua educação, o seu lazer, a sua profissionalização, a sua cultura, a sua
dignidade, o seu respeito individual, a sua liberdade e a sua convivência familiar e comunitária,
combatendo-se, com pertinácia, qualquer forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão (art. 227, caput da Carta Magna).
8. Considerando que os direitos fundamentais devem ter, na máxima medida possível, eficácia
direta e imediata, impõe-se priorizar a solução ao caso concreto de forma que se dê a maior
concretude ao direito. In casu, diante da Lei Geral da Previdência Social que apenas se tornou
silente ao tratar do menor sob guarda e diante de norma específica que lhe estende a pensão
por morte (Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 33, § 3o.), cumpre
reconhecer a eficácia protetiva desta última lei, inclusive por estar em perfeita consonância com
os preceitos constitucionais e a sua interpretação inclusiva.
9. Em consequência, fixa-se a seguinte tese, nos termos do art. 543-C do CPC/1973: O
MENOR SOB GUARDA TEM DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR
MORTE DO SEU MANTENEDOR, COMPROVADA A SUA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA,
NOS TERMOS DO ART. 33, § 3o. DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE,
AINDA QUE O ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO SEJA POSTERIOR À VIGÊNCIA DA
MEDIDA PROVISÓRIA 1.523/96, REEDITADA E CONVERTIDA NA LEI 9.528/97. FUNDA-SE
ESSA CONCLUSÃO NA QUALIDADE DE LEI ESPECIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE (8.069/90), FRENTE À LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
10. Recurso Especial do INSS desprovido".
(STJ, Primeira Seção, REsp 1.411.258 - RS, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe
21/02/2018).
Depreende-se do referido julgado que não basta que o menor esteja sob a guarda do segurado,
sendo indispensável a comprovação da dependência econômica e, no caso em apreço, diante
do acervo probatório, tenho que esta restou configurada.
Em face de todo o explanado, a postulante faz jus ao benefício de pensão por morte.
Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas auferidas
em decorrência da antecipação da tutela.
CONSECTÁRIOS
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício de pensão por morte, segundo o art. 74 da Lei nº 8.213/91, com a
nova redação vigente ao tempo do óbito, seria o da data do óbito, caso requerido até trinta dias
após a sua ocorrência, ou na data em que fosse pleiteado, se transcorrido este prazo.
Na situação retratada na presente demanda, em que o óbito ocorreu em 15 de outubro de 2013,
o requerimento administrativo da pensão foi formulado em 19 de junho de 2015 (id. 196157210
– p. 41/43). Na ocasião, a autora, nascida em 31 de dezembro de 2003, contava com 11 anos
de idade.
O direito à pensão por morte, que nasce para o absolutamente incapaz com o óbito do
segurado do qual dependia economicamente, não se extingue diante da inércia de seus
representantes legais. O lapso temporal transcorrido entre a data do evento morte e a da
formulação do pedido, não pode ser considerado em desfavor daquele que se encontra
impossibilitado de exercer pessoalmente atos da vida civil.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado, proferido pelo Colendo Superior Tribunal de
Justiça:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. ABSOLUTAMENTE
INCAPAZ. INTERDITADO. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL DO
BENEFÍCIO: DATA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO. SENTENÇA DE INTERDIÇÃO:
EFEITOS
DECLARATÓRIOS. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A pessoa absolutamente incapaz para os atos da vida civil, submetida à curatela, tem direito
ao benefício de pensão por morte desde o óbito do Segurado, ainda que não postulado
administrativamente no prazo de trinta dias, uma vez que não se sujeita aos prazos
prescricionais.
2. É firme o entendimento desta Corte de que a suspensão do prazo de prescrição para tais
indivíduos ocorre no momento em que se manifesta
a sua incapacidade, sendo a sentença de interdição, para esse fim específico, meramente
declaratória.
3. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.
(STJ, Primeira Turma, REsp 1429309/SC, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe
08/08/2018)”.
Desta forma, deve ser mantido o termo inicial na data do falecimento da segurada (15/10/2013),
sem a incidência de prescrição.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
PREQUESTIONAMENTO
Cumpre salientar, diante de todo o explanado, que a r. sentença monocrática não ofendeu
qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento suscitado pelo Instituto
Autárquico.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS. Os honorários advocatícios deverão ser
fixados por ocasião da liquidação do julgado, na forma da fundamentação. Mantenho a tutela
concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2013, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. QUALIDADE DE SEGURADO. A DE CUJUS ERA
TITULAR DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA
COMPROVADA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO
ADOLESCENTE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. PRESCRIÇÃO. NÃO
INCIDÊNCIA.
- O óbito de Sônia Maria Wagner, ocorrido em 15 de outubro de 2013, está comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurado da de cujus, uma vez que ela
era titular do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/6028885707),
desde 03 de junho de 2013, cuja cessação decorreu de seu falecimento.
- Do acervo probatório, depreende-se ser a postulante filha de Nivia Maria dos Santos, que veio
a óbito em 01 de janeiro de 2009, conforme demonstrado pela respectiva certidão.
- A segurada falecida (Sônia Maria Wagner), logo após o falecimento da genitora da menor,
ajuizou a ação nº 18/2009, a qual tramitou pela Vara Distrital de Jandira – SP, requerendo sua
guarda.
- A r. sentença proferida nos aludidos autos, em 18 de março de 2009, julgou procedente o
pedido e conferiu a guarda da autora à segurada Sônia Maria Wagner.
- Do laudo de estudo social realizado na referida demanda, verifica-se que o deferimento da
guarda havia sido respaldado em parecer favorável da assistente social.
- O Ministério Público Estadual atuou na aludida demanda e também emitiu parecer favorável
ao deferimento da guarda.
- Com efeito, também instruem os presentes autos cópias dos ajustes anuais do Imposto de
Renda, declarados à Receita Federal, atinentes aos exercícios fiscais de 2006 a 2013, dos
quais se verifica que a segurada relacionava o nome da autora no campo destinado à descrição
dos dependentes econômicos.
- Comprovada a dependência econômica em relação à guardiã, o menor faz jus ao benefício de
pensão por morte, uma vez que os direitos fundamentais da criança e do adolescente têm seu
campo de incidência amparado pelo status de prioridade absoluta, requerendo, assim, uma
hermenêutica própria comprometida com as regras protetivas estabelecidas na Constituição
Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedente do Colendo Superior Tribunal
de Justiça (REsp 1.411.258/RS).
- Assinale-se, ademais, que, de acordo com o julgamento do REsp 1.411.258/RS, Relator
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, sob a sistemática de recurso repetitivo, referente ao TEMA
732, publicado no Diário da Justiça Eletrônico do dia 21/02/2018, restou firmada a seguinte tese
de que : "O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do
seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, §3º do
Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior
à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se
essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente
(8.069/90), frente à Legislação Previdenciária".
- Termo inicial mantido na data do falecimento da segurada (15/10/2013), ante a não incidência
de prescrição contra o menor absolutamente incapaz. Precedente.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, mantendo a concessão do
benefício previdenciário de pensão por morte, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA