D.E. Publicado em 10/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000531-13.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por ELENA MOREIRA DOS SANTOS CORREA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício de pensão por morte, em decorrência do falecimento de João Batista Correa, ocorrido em 16 de março de 2013.
A r. sentença proferida às fls. 246/253 julgou improcedente o pedido, com a aplicação de multa em desfavor da autora, ao fundamento de haver incidido em litigância de má-fé.
Em razões recursais de fls. 258/270, pugna a parte autora, preliminarmente, pela nulidade da sentença, em razão de cerceamento de defesa, caracterizado pelo julgamento antecipado da lide, sem propiciar-lhe a produção de prova testemunhal. Requer a procedência do pedido inicial e, alternativamente, que seja afastada a condenação por litigância de má-fé.
Contrarrazões às fls. 275/276.
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
VOTO
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA
Do compulsar dos autos, denota-se que a oitiva de testemunhas era dispensável ao deslinde da causa. Conforme restou demonstrado nos autos de processo nº 400.01.2009.004404-0, os quais tramitaram pela 3ª Vara da Comarca de Olímpia - SP, João Batista Correa não mais exercia a atividade de trabalhador rural. Revelam as cópias da sentença proferida naqueles autos (fls. 160/164) ter-lhe sido deferido judicialmente o benefício de prestação continuada, na forma do art. 20 da Lei nº 8.742/93, a partir de 21.12.2009.
A tese do exercício do labor campesino ao tempo do óbito suscitada nestes autos se encontra em franca contradição à invalidez subsequente à perda da qualidade de segurado sedimentada na referida demanda. No laudo pericial trazido àqueles autos foi reconhecido que João Batista Correa foi acometido por transtorno mental com psicose, quando não mais ostentava a qualidade de segurado.
A produção de prova testemunhal para a comprovação do labor rural em tempo pretérito também se revelava despicienda ao deslinde da causa, já que João Batista Correa, ao falecer, contava com 54 anos de idade e, à evidência, não preenchia a idade mínima necessária ao deferimento da aposentadoria por idade do trabalhador rural (60 anos).
Resta, assim, afastada a preliminar de cerceamento de defesa.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais, cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de 1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado, em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze) meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
Vale lembrar que o menor sob guarda deixou de ser considerado dependente com a edição da Medida Provisória n.º 1.523, de 11 de outubro de 1996, a qual foi convertida na Lei n.º 9.528/97.
DO CASO DOS AUTOS
No caso sub examine, a ação foi ajuizada em 16 de dezembro de 2016 e o aludido óbito, ocorrido em 16 de março de 2013, está comprovado pela respectiva Certidão de fl. 16.
O vínculo marital entre a autora e o instituidor foi comprovado pela Certidão de Casamento de fl. 15, sendo desnecessária a comprovação da dependência econômica, por ser presumida, conforme preconizado pelo artigo 16, I e § 4º da Lei de Benefícios.
No que se refere à qualidade de segurado do falecido, depreende-se do extrato do CNIS de fl. 18 que seu último vínculo empregatício dera-se entre 27 de junho de 1994 e 15 de agosto de 1994. Na sequência, verteu contribuições como contribuinte individual, entre 01 de fevereiro de 2000 e 31 de julho de 2000. Entre a data da última contribuição e o falecimento, transcorreram mais de 15 (quinze) anos e 07 (sete) meses, o que, à evidência, acarretou a perda da qualidade de segurado.
Ademais, o extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV carreado pela Autarquia Previdenciária à fl. 195 revela que João Batista Correa era titular de benefício assistencial (NB 87/5475436092), desde 21 de dezembro de 2009, cuja cessação decorreu de seu falecimento.
Por se tratar de benefício de caráter assistencial, personalíssimo e intransferível, extingue-se com a morte do titular, não gerando, por consequência, o direito à pensão por morte a eventuais dependentes.
Nesse sentido, já decidiu esta Egrégia Corte, confira-se:
É certo que o art. 102 da Lei n.º 8.213/91, em sua redação atual, conferida pela Lei n.º 9.528/97, dispõe que a pensão por morte poderá ser concedida aos dependentes, ainda que o segurado tivesse perdido essa qualidade, desde que atendidos todos os requisitos para se aposentar, segundo a legislação em vigor, como se vê in verbis:
Também neste sentido, preceitua a Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, ao prescrever em seus arts. 48, § 1º e 143 que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais é devido ao segurado que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida.
A lei deu tratamento diferenciado ao rurícola dispensando-o do período de carência, que é o número mínimo de contribuições mensais necessárias para a concessão do benefício, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural, nos termos da tabela progressiva, de caráter transitório, prevista no art. 142 da Lei Previdenciária, que varia de acordo com o ano de implementação das condições legais.
Na espécie sub examine, depreende-se da Certidão de Casamento juntada por cópia à fl. 15 que João Batista Correa nascera em 03 de agosto de 1958, e, por ocasião do falecimento, contava com 54 anos de idade, ou seja, não preenchia a idade mínima à aposentadoria por idade de trabalhador rural.
Frise-se que nada veio a demonstrar nos autos que, no momento do falecimento, o de cujus fizesse jus a qualquer outra espécie de aposentadoria, porquanto não há prova de incapacidade laborativa advinda enquanto ainda ostentava a qualidade de segurado, afastando o reconhecimento de aposentadoria por invalidez.
A esse respeito, verifico que os prontuários médicos e hospitalares de fls. 19/134 não fazem referência à incapacidade laborativa enquanto ele ainda ostentava a qualidade de segurado, cabendo destacar o laudo de fl. 49, emitido pela Santa Casa de Misericórdia de Cajobi - SP, em 25 de junho de 2002, no qual consta: "transparência normal dos campos pleuro-pulmonares; cúpulas diafragmáticas livres; área cardíaca dentro dos limites da normalidade".
Além disso, não foi comprovado o período mínimo de trabalho exigido em Lei para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, ainda que na modalidade proporcional.
Nesse contexto, torna-se inviável o acolhimento do pedido inicial, sendo de rigor a manutenção do decreto de improcedência do pleito.
DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
A r. sentença a quo condenou a autora em litigância de má-fé, em virtude de ter fundamentado seu pedido na alegação de que o de cujus exercia o labor campesino, mesmo havendo nos autos cópia de sentença transitada em julgado, pela qual lhe houvera sido concedido benefício assistencial.
A litigância de má fé está prevista no CPC/2015, na seção que trata da responsabilidade das partes por dano processual, ao preconizar no artigo 79 que responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como autor, réu ou interveniente.
Conforme o artigo 80 do referido diploma legal, considera-se litigante de má-fé aquele que:
Sobre o citado instituto processual, diz Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery:
A litigância de má-fé consiste no descumprimento do dever de probidade para com as demais partes do processo. Não há indicativos de que isso tenha ocorrido nos presente autos.
A autora exerceu regularmente o direito de postular e de recorrer, apresentando os argumentos que sustentam sua tese, sem incorrer em quaisquer dos incisos do artigo 80 do CPC de 2015.
Conquanto o de cujus fosse titular de benefício assistencial e já houvesse perdido a qualidade de segurado, havia a possibilidade de concessão da pensão por morte, caso, por ocasião do falecimento, ele já houvesse preenchido os requisitos para o deferimento de qualquer benefício previdenciário, nos termos do artigo 102, § 2º da Lei de Benefícios, conforme a tese sustentada pela parte autora na exordial.
No entanto, no curso da demanda, restou afastada esta possibilidade, com a demonstração de que, além de ser titular de benefício assistencial, o de cujus não preenchia os requisitos que propiciasse a concessão de qualquer espécie de benefício previdenciário, sendo de rigor a exclusão da condenação pela litigância de má-fé.
DISPOSITIVO
É o voto.
GILBERTO JORDAN
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 22/03/2018 18:00:06 |