D.E. Publicado em 10/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038372-47.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face da sentença proferida em ação de conhecimento em que se pleiteia a concessão de pensão por morte na qualidade de companheira.
A corré Aparecida Dalva Vieira Gonçalves foi citada e apresentou contestação alegando ser cônjuge de Jorge Gonçalves (fls. 132/187).
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, deixando de condenar a autora em honorários advocatícios, ante os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Inconformada, a autora apela, pleiteando a reforma da r. sentença.
Com contrarrazões da corré e do réu, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
A pensão por morte é devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, e independe de carência (Lei 8.213/91, Art. 74 e Art. 26).
Para a concessão do benefício são requisitos a qualidade de dependente, nos termos da legislação vigente à época do óbito, bem assim a comprovação da qualidade de segurado do falecido, ou, independentemente da perda da qualidade de segurado, o preenchimento dos requisitos para concessão da aposentadoria (Lei 8.213/91, Art. 15 e Art. 102, com a redação dada pela Lei 9.528/97; Lei 10.666/03).
O óbito de Jorge Gonçalves ocorreu em 10/12/2012 (fls. 15), ao passo que o seu último contrato de trabalho cessou em 15/03/2007; voltou a verter contribuições ao RGPS no período de 01/06/2008 a 30/11/2012 na qualidade de contribuinte individual (fls. 20/21), não havendo que se falar em perda da qualidade de segurado.
Alega a autora que o instituidor da pensão mantinha dois relacionamentos, sendo casado formalmente com a corré Aparecida e mantendo concubinato consigo.
A dependência econômica do cônjuge e da companheira é presumida, consoante se infere do disposto no Art. 16, I e § 4º da Lei 8.213/91, nos termos da redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011.
Nos termos do que dispõe o Art. 1.723 combinado com o Art. 1.727, ambos do Código Civil, a união estável configura-se pela convivência pública, contínua e duradoura, existente entre homem e mulher, com objetivo de constituição de família.
A autora juntou aos autos diversas faturas de cartão de crédito e boletos emitidos pelo Banco Bradesco em nome do instituidor da pensão (fls. 33/34) e em seu nome emitidos pela Caixa Econômica Federal (fls. 35/36) com o mesmo endereço do imóvel objeto do contrato de locação de fls. 23 (Rua Pernambuco, 1866, Votuporanga/SP) para comprovar a existência do domicílio em comum no período de maio de 2010 a outubro de 2011.
Ainda para comprovar a alegada convivência pública e contínua, foram juntados aos autos, cópia de inúmeras notas fiscais em nome do falecido com o mesmo endereço da apelante (fls. 24/27), cópia de Boletim de Ocorrência relativo a acidente de trânsito, no qual se envolveu a autora (fls. 29/30) e cópia de uma notificação de multa de motoneta Honda/Biz 125 Mais, modelo 2010, cor vermelha, placa CDS 3845/SP em nome do instituidor da pensão com o endereço do imóvel no qual, residia também a autora (fls. 31/32); cópia de pedidos médicos do SUS e AME Votuporanga/SP feitos pelo instituidor da pensão com o mesmo endereço residencial da autora (fls. 44/56).
A autora sustenta a alteração do domicílio comum dos supostos conviventes para a rua Presidente Costa e Silva, 1.763 e rua Valdevir Oliveira Guena, 2.605, ambos em Votuporanga/SP no período de janeiro de 2012 até a data do óbito do instituidor da pensão conforme comprovantes de endereço emitidos por empresas de telefonia e notas fiscais em nome do falecido e da apelante (fls. 57/76).
A corré Aparecida Dalva Vieira Gonçalves, por seu turno, afirma que manteve vínculo conjugal com o instituidor da pensão por 38 anos e com ele teve 02 filhos, não tendo se separado dele, nem de direito nem de fato. Esclarece que o falecido era caminhoneiro e por isso ficava ausente por longos períodos do lar conjugal durante suas viagens.
Sustenta não estar comprovada a união estável entre a autora e o segurado falecido e para corroborar suas alegações junta aos autos cópia atualizada de sua certidão de casamento com instituidor da pensão (fls. 145); cópia do contrato de compra de imóvel, datado de 31/07/2003 (fls. 146/157); cópia de instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóvel, datado de 26/01/2010 (fls. 158/161); .
Consta dos autos cópia da impugnação à partilha de bens interposta pela autora com o objetivo de reaver uma motocicleta Honda/Biz 125 Mais, modelo 2010, cor vermelha, placa CDS 3845/SP dos bens arrolado no inventário do instituidor da pensão, sob o argumento de que teria adquirido o bem de Jorge Gonçalves (fls. 179/187).
Realizada a audiência de instrução, debates e julgamento (fls. 245/254) as testemunhas arroladas pela autora, Ivani Ravassoli da Silva e Celso José da Silva, afirmaram que o instituidor da pensão residia com a autora; já a testemunha, arrolada pela corré, Vera Maria do Amaral Silva, afirmou que ele morava com a corré; a testemunha Aparecida da Silva Gonçalves, arrolada pela corré, declarou que o segurado residia no caminhão. Por fim, a testemunha Amado Jesus Gonçalves declarou que o instituidor da pensão mantinha duas residências, uma com a autora e outra com a corré (transcrição fls. 345/365).
O conjunto probatório produzido nos autos permite concluir que o segurado estabeleceu união estável com a autora sem, contudo, romper a relação marital e familiar com a corré, sua esposa.
Com efeito, os documentos carreados aos autos pela autora e pela corré demonstram que, simultaneamente ao casamento formal com a corré, e sem que ocorresse a separação de fato, o de cujus manteve com a autora uma relação de união estável, em que configurada a convivência pública, contínua e duradoura.
Conforme já se pronunciou o Egrégio Supremo Tribunal Federal, "a superação de óbices legais ao pleno desenvolvimento das famílias construídas pelas relações afetivas interpessoais dos próprios indivíduos é corolário do sobreprincípio da dignidade humana. (...) O indivíduo jamais pode ser reduzido a mero instrumento de consecução das vontades dos governantes, por isso que o direito à busca da felicidade protege o ser humano em face de tentativas do Estado de enquadrar a sua realidade familiar em modelos pré-concebidos pela lei", em acórdão cuja ementa foi redigida nos seguintes termos:
Na mesma linha, cito precedentes jurisprudenciais que se orientam no sentido da possibilidade de concomitância entre o casamento legítimo e a existência de relação de união estável:
No âmbito desta Corte, tem-se adotado o mesmo entendimento, in verbis:
Outrossim, cabe ressaltar que o Pretório Excelso reconheceu a existência da repercussão geral da questão constitucional sobre a possibilidade de reconhecer direitos previdenciários à pessoa que, durante longo período e com aparência familiar, manteve união com pessoa casada. (RE nº 669465/SE, Relator Ministro Luiz Fux). Nestes termos:
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (11/01/2013 - fls. 19), não havendo, todavia, que se falar em pagamento de prestações em atraso, vez que o benefício foi legitimamente pago, em sua integralidade, à corré, já que a união estável somente foi reconhecida nesta oportunidade, equivalendo, assim, à habilitação tardia (Art. 76, da Lei nº 8.213/91).
Nesse sentido, confira-se:
Destarte, é de se reformar a r. sentença, devendo o réu conceder à autora, em rateio com a corré, o benefício de pensão por morte a partir de 11/01/2013, sem condenação ao pagamento das prestações vencidas, nos termos do Art. 76, da Lei nº 8.213/91.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, do CPC.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 31/07/2018 18:45:20 |