D.E. Publicado em 03/10/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar, negar provimento à apelação da corré e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004473-89.2014.4.03.6120/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas em ação ajuizada por CÉLIA IANNI em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e de ANA CLÁUDIA PRAMPERO BONIFÁCIO, objetivando o rateio de benefício de pensão por morte, na condição de ex-cônjuge de Deolindo Baptista de Camargo, falecido em 20 de março de 2009.
A r. sentença proferida às fls. 386/390 julgou parcialmente procedente o pedido, deferindo a cota-parte de 10% (dez por cento) do valor do benefício em favor da postulante, acrescida dos consectários legais.
Apelação da corré ANA CLAUDIA PRAMPERO BONIFÁCIO às fls. 394/410, pela qual pugna pela reforma da sentença e improcedência do pedido, ao argumento de não ter logrado a parte autora comprovar os requisitos necessários ao deferimento do benefício, tendo em vista a ausência de dependência econômica em relação ao segurado instituidor, por se tratar de ex-cônjuge que não recebia alimentos.
Em razões recursais de fls. 413/426, a autora CÉLIA IANNI requer a anulação da sentença, em razão de cerceamento de defesa, caracterizado pelo julgamento antecipado da lide, sem que fossem trazidos aos autos esclarecimentos da instituição financeira sobre o autor dos depósitos que eram efetuados mensalmente em sua conta bancária. No mérito, aduz que, uma vez comprovada sua dependência econômica em relação ao falecido segurado, seja majorada o valor da cota-parte para 50% (cinquenta por cento) do valor do benefício. Subsidiariamente, requer a fixação do termo inicial do benefício a contar da data do requerimento administrativo, a majoração dos honorários advocatícios e a concessão da antecipação da tutela.
Contrarrazões às fls. 485/499.
Devidamente processados os recursos, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
VOTO
DA MATÉRIA PRELIMINAR
No que tange à nulidade suscitada pela parte autora, verifico ter sido requisitado pelo juízo a quo que o banco informasse sobre os depósitos que eram efetuados mensalmente em sua conta, sendo que foram trazidos aos autos o ofício de fl. 287 e a mídia digital de fl. 288, contendo os respectivos extratos bancários, porém, com a informação de não ser possível esclarecer sobre o depositante dos numerários, uma vez que, por se referirem a valores inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais), não ser obrigatória sua identificação, conforme a Circular Bacen nº 3.461/09.
Em outras palavras, ainda que fosse deferida a providência requerida pela parte autora, tal medida se revelaria inócua, ante a impossibilidade de cumprimento pelo banco, conforme esclareceu a instituição financeira à fl. 373, razão por que merece ser afastada a nulidade suscitada.
1. DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais, cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de 1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado, em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze) meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
Vale lembrar que o menor sob guarda deixou de ser considerado dependente com a edição da Medida Provisória n.º 1.523, de 11 de outubro de 1996, a qual foi convertida na Lei n.º 9.528/97.
2. DO CASO DOS AUTOS
No caso em apreço, a ação foi ajuizada em 09 de maio de 2014 e o aludido óbito, ocorrido em 20 de março de 2009, está comprovado pela respectiva Certidão de fl. 28.
Também restou superado o requisito da qualidade de segurado de Deolindo Baptista de Camargo. Conforme se depreende das informações constantes no extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV de fl. 43, o de cujus era titular de benefício previdenciário de auxílio-doença (NB 31/533.560.071-0), desde 16 de dezembro de 2008, cuja cessação decorreu de seu falecimento, em 20 de março de 2009.
Contudo, discute-se nesta demanda o direito da autora ao rateio do benefício, na condição de ex-mulher, eis que o INSS vem efetuando o pagamento exclusivamente em favor da esposa, ANA CLÁUDIA PROMPERO BONIFÁCIO, que foi citada e veio a integrar a lide em litisconsorte passivo necessário (fls. 187 e 195/204).
No que se refere à dependência econômica da autora (Célia Ianni), verifica-se da Certidão de Casamento de fl. 20 ter contraído matrimônio com Deolindo Baptista de Camargo, em 06 de agosto de 1983, contendo tal documento a averbação de que, por sentença transitada em julgado em 04.05.1998, ter sido homologado o divórcio dos cônjuges requerentes, nos autos de processo nº 311/98, os quais tramitaram pela 3ª Vara Cível da Comarca de Araraquara - SP.
Nesse particular, o artigo 76, § 2º da Lei nº 8.213/91, garante ao ex-cônjuge, igualdade de condições com os dependentes referidos no inciso I do artigo 16 desta lei, desde que receba alimentos, caso contrário a presunção legal de dependência econômica deixa de existir, sendo necessária a sua comprovação.
Das cópias dos aludidos autos (fls. 303/367), verifica-se da cláusula quinta do acordo de separação ter a autora, inicialmente, dispensado pensão alimentícia em seu favor, no entanto, pela petição de fls. 322/323 foi convencionado que o ex-marido lhe pagaria o aluguel do imóvel em que ela residia, além de sua manutenção como dependente no Instituto de Seguridade Social - Economus, o que foi homologado judicialmente à fl. 325.
A petição de fls. 330/331 reporta-se à mudança da guarda das duas filhas do casal, que passaram ao ex-marido, com a consequente dispensa da pensão alimentícia paga até então em favor das menores, conforme homologado pelo juízo, em 31 de março de 1998 (fl. 335).
A parte autora acostou à exordial cópias dos extratos de sua conta bancária, pertinentes ao período ininterrupto de janeiro de 2000 a março de 2009, nos quais se verificam os depósitos mensais do importe de R$ 300,00 (trezentos reais), as quais atribuem ao ex-marido, como pagamento de pensão.
A autenticidade desses extratos verifica-se da mídia digital de fl. 288, encaminhada pela instituição financeira, os quais coincidem com aqueles apresentados pela postulante, contendo o depósito mensal de numerário, geralmente no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), desde dezembro de 1999 até o mês em que o segurado veio a óbito (março de 2009).
Testemunhas ouvidas nos autos (mídia digital de fls. 247 e 270) confirmaram que, mesmo após a separação e o divórcio, Deolindo Baptista de Camargo continuou auxiliando financeiramente a ex-mulher.
A esse respeito, destaco o depoimento de Luiz Henrique de Camargo, irmão do de cujus, que admitiu que o de cujus nunca ocultou que ajudava mensalmente a ex-mulher, sem especificar as quantias. A testemunha acrescentou que, mesmo após ter obtido a guarda das filhas, Deolindo continuou ajudando financeiramente Célia Ianni e pagando o aluguel do imóvel em que ela residia.
A depoente Ana Lúcia Daminhani, ouvida como informante, disse ser cunhada do de cujus e esclareceu que, quando Deolindo vinha visitá-los, ele sempre relatava que, mesmo após a separação e o divórcio, continuou prestando auxílio financeiro a Célia Ianni, uma vez que, depois que as filhas do casal nasceram ela tinha parado de exercer atividade laborativa remunerada para se dedicar exclusivamente à família.
Ouvido como informante, Luiz Jorge Perez Júnior, testemunha arrolada pela corré, disse que Deolindo pagou pensão alimentícia às filhas até 1999, quando elas deixaram a genitora para ir morar com ele. Asseverou que a autora não dependia economicamente do ex-marido, já que ela veio a conviver com outro homem, conhecido por "Chiquinho".
A testemunha Ana Carolina Baptista Camargo, arrolada pela Autarquia Previdenciária, em seu depoimento de fl. 270, colhido em mídia audiovisual, em audiência realizada em 04 de agosto de 2015, afirmou que seu genitor continuou ajudando financeiramente sua mãe, em razão de ela não exercer atividade laborativa remunerada. Esclareceu que Deolindo depositava mensalmente dinheiro na conta bancária da genitora, o que se prorrogou até a data do falecimento.
À vista do exposto, tenho que a parte autora recebia pensão alimentícia extraoficial e mensal, logrando comprovar nos autos a persistência da dependência econômica, mesmo após a separação do casal.
Com efeito, os extratos bancários apresentados pela parte autora contêm informações acerca de depósitos efetuados mensalmente e de forma ininterrupta em sua conta, o que se prorrogou por mais de dez anos, cessando apenas com o óbito do segurado. Tais documentos foram corroborados pelos depoimentos das testemunhas, no sentido de que, mesmo após a separação e o divórcio, Deolindo continuou ministrando recursos financeiros para prover o sustento do ex-cônjuge.
Entendo que o ex-cônjuge, ainda que por ocasião de separação judicial ou de fato tenha dispensado alimentos, faz jus à pensão por morte, desde que comprove sua dependência econômica, o que se verifica na espécie sub examine.
Nesse sentido, trago à colação as ementas dos seguintes julgados proferidos por esta Egrégia Corte:
No mesmo sentido, já decidiu o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, confira-se:
Em face de todo o explanado, a parte autora faz jus ao recebimento do benefício de pensão por morte, em rateio, em razão do falecimento de Deolindo Baptista de Camargo.
Fixo o valor de sua cota-parte em 50% (cinquenta por cento) do valor da pensão atualmente auferido pela corré.
Conforme preconizado pelo artigo 77, caput da Lei nº 8.213/91, havendo mais de um pensionista, a pensão será rateada entre todos em parte iguais.
3. CONSECTÁRIOS
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício de pensão por morte, segundo o art. 74 da Lei nº 8.213/91, com a nova redação dada pela Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997, será o da data do óbito, caso requerido até trinta dias após a sua ocorrência, ou na data em que for pleiteado, se transcorrido este prazo.
Na hipótese dos autos, tendo sido requerido o benefício após o lapso temporal de trinta dias (fl. 55), o dies a quo deve ser a data do requerimento administrativo (03/08/2012), pois foi o momento em que a Autarquia Previdenciária tomou conhecimento do direito da parte autora e se recusou a concedê-lo.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art. 497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os documentos da parte autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento desta decisão, para a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias, fazendo constar que se trata de rateio de pensão por morte, deferida a CÉLIA IANNI, com data de início do benefício - (DIB: 03/08/2012), em valor a ser calculado pelo INSS.
4. DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar, dou provimento à apelação da parte autora, a fim de reformar a sentença recorrida e julgar parcialmente procedente o pedido, deferindo-lhe o rateio da pensão por morte, no percentual de cinquenta por cento do valor do benefício, e nego provimento à apelação da corré, na forma da fundamentação. Concedo a tutela específica.
É o voto.
GILBERTO JORDAN
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 19/09/2017 13:56:29 |