D.E. Publicado em 11/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher a preliminar arguida pela parte autora, anulando a sentença, e, de ofício, julgar parcialmente procedente o pedido da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | TANIA REGINA MARANGONI:10072 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18020853B4DB |
Data e Hora: | 05/12/2018 17:37:36 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0022009-77.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI:
O pedido inicial é de aposentadoria, envolvendo o cômputo de períodos de labor rural do autor, sem registro em CTPS.
A sentença julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, VI, do CPC, em razão da ausência de prévio requerimento administrativo.
Inconformado, apela o autor, afirmando, preliminarmente, ter sido incorreta a extinção do feito em razão da ausência do requerimento administrativo. No mérito sustenta, em síntese, que deve ser decretada a revelia da Autarquia, que ela deveria ter apresentado documentos, e que faz jus à averbação do tempo rural pretendido e à concessão da aposentadoria.
Regularmente processados, subiram os autos a este E. Tribunal.
É o relatório.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | TANIA REGINA MARANGONI:10072 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18020853B4DB |
Data e Hora: | 05/12/2018 17:37:30 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0022009-77.2018.4.03.9999/SP
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI:
Inicio pela análise da preliminar arguida pelo autor.
A necessidade de prévio requerimento do pleito perante o INSS, antes do ajuizamento da demanda na esfera judicial, foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, em razão de sua relevância constitucional, reconhecendo-se a repercussão geral.
O instituto da repercussão geral introduzido pela EC nº 45/2004 possibilita o efeito multiplicador da decisão proferida pela Suprema Corte em causas iguais, consolidando o entendimento firmado.
O Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, de 27/08/2014, deu parcial provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 631240 (DJe 10.11.2014), com repercussão geral reconhecida, na qual o INSS defendia a exigência do prévio requerimento do pleito na via administrativa. Por maioria de votos, o Plenário acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, entendendo que a exigência não fere a garantia constitucional de livre acesso ao Judiciário, preconizada no art. 5º, inc. XXXV, da Carta Magna.
Contudo, o pleito poderá ser formulado diretamente em juízo quando notório e reiterado o entendimento contrário da Administração à postulação do segurado, bem como nos casos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, além dos casos em que a Autarquia já contestou o feito.
O v. aresto assim dispôs, in verbis:
Na mesma esteira, o Superior Tribunal de Justiça alinhou sua jurisprudência ao entendimento sedimentado na Suprema Corte, como restou assentado no julgamento do RESP nº 1.369.834/SP (DJe 02.12.2014).
O v. aresto em questão restou assim ementado, in verbis:
Ocorre que, no caso dos autos, o INSS manifestou-se sobre o mérito (fls. 85/95), inclusive com alegações outras que não aquela atinente à ausência de prévio requerimento administrativo, de modo que, nos termos da decisão proferida pela Corte Suprema, não se faz necessário o prévio requerimento do pleito na esfera administrativa.
A anulação da sentença, portanto, é medida que se impõe, devendo ser acolhida a preliminar arguida pelo autor.
Assentado esse ponto, tem-se que o artigo 1.013, § 3º, I, do CPC possibilita a esta Corte, nos casos de extinção do processo sem resolução do mérito, dirimir de pronto a lide, desde que a mesma esteja em condição de imediato julgamento.
Passo, portanto, à análise do mérito.
O autor não esclarece precisamente na inicial a modalidade de aposentadoria pretendida. Todavia, a leitura dos autos não traz alegações de invalidez, o que implica em descartar hipótese de aposentadoria a este título. Além disso, mesmo o eventual reconhecimento de todo o período de labor rural pretendido pelo autor não permitiria a aposentadoria por tempo de contribuição, eis que seu período de efetiva contribuição previdenciária comprovado nos autos seria insuficiente para o atingimento da carência mínima para a concessão de tal benefício.
Desta maneira, a leitura atenta dos autos apenas permite a conclusão de que o benefício pretendido é a aposentadoria por idade, na modalidade híbrida, computando-se os períodos de labor rural e urbano do requerente. Passo, portanto, a apreciar o preenchimento dos requisitos para esta modalidade de aposentadoria.
A aposentadoria por idade do trabalhador urbano está prevista no art. 48 e segs., da Lei nº 8.213/91, antes disciplinada pelo art. 32 do Decreto nº 89.312, de 23.01.84. Era devida, por velhice, ao segurado que, após 60 (sessenta) contribuições mensais, completasse 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se do sexo masculino, ou 60 (sessenta), se do feminino.
Com o Plano de Benefícios passou a exigir-se do segurado o cumprimento de carência e a idade de 65 anos para o homem e 60 para a mulher.
Segundo o inciso II do art. 24, essa carência é de 180 contribuições mensais, aplicando-se, contudo, para o segurado filiado à Previdência anteriormente a 1991, os prazos menores previstos no art. 142 do mesmo Diploma.
São, portanto, exigidos para a concessão desse benefício, o cumprimento da carência e do requisito etário.
Registre-se, por fim, que a Lei nº 10.666/03, em seu artigo 3ª, §1º, estatuiu que, na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão do benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento.
Cumpre observar a viabilidade do cômputo de períodos de trabalho rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria nos termos do art. 48, §3º e §4º, da Lei 8213/1991.
Sobre o assunto, confira-se:
A questão em debate consiste na possibilidade de se reconhecer períodos de labor rural do autor, sem registro em CTPS, para o fim de propiciar a concessão da aposentadoria por idade.
Para demonstrar a atividade rurícola alegada, o autor trouxe documentos, destacando-se os seguintes:
- documentos de identificação do autor, nascido em 22.06.1948;
- CTPS do autor, com anotações de dois vínculos empregatícios de natureza urbana, mantidos de 01.11.1981 a 01.11.1982 e a partir de 05.01.2009, sem indicação de data de saída;
- certidão de casamento do autor, contraído em 10.10.1970, sem indicação da profissão dos nubentes;
- certidão de nascimento de um filho do autor, em 28.03.1972, sem indicação da profissão dos genitores;
- declaração de sindicato de trabalhadores rurais sem homologação;
- certidão da Justiça Eleitoral emitida em 07.07.2016, indicando que no cadastro do autor consta a ocupação de agricultor;
- certidões de nascimento de dois filhos do autor, em 26.05.1974 e 30.11.1978, indicando que o requerente exercia a ocupação de lavrador;
- certidão emitida pelo IIRGD, informando que o autor, ao requerer sua carteira de identidade, em 20.06.1975, informou exercer a profissão de agricultor;
- certidão emitida pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, indicando que o pai do autor conta com inscrição estadual de produtor na condição de parceiro, com atividades iniciadas em 13.02.1978, constando cancelamento em 26.12.1985;
- notas fiscais de produtor rural em nome do pai do autor, referentes ao Sítio Fortuna, em Osvaldo Cruz , emitidas entre 1978 e 1985;
- certidão imobiliária dando conta da aquisição, pelo pai do autor, de um imóvel rural denominado Sítio Santa Terezinha, no município de Sagres, de área 14,52 hectares, em 11.10.1984 (consta, mais a frente, escritura pública de doação de tal propriedade, em 05.11.1987, ao autor e a outras pessoas de mesmo sobrenome);
- notas fiscais referentes à comercialização da produção do Sítio Santa Terezinha, emitidas a partir de 06.02.1985, até 2007.
- declarações de pessoas físicas afirmando o labor rural do autor;
- documentos escolares;
- certidão imobiliária dando conta da aquisição, por duas pessoas de sobrenome semelhante ao da mãe do autor, parentesco comprovado, de uma propriedade rural de 11,85 hectares em Osvaldo Cruz, em 10.07.1965.
Foram ouvidas duas testemunhas.
A primeira disse ter conhecido o autor em algum momento "pra cima de 1960", em Sagres. Disse que ele se mudou em algum momento para Osvaldo Cruz, depois retornou a Sagres. Afirmou que ele trabalhava na lavoura ao lado da família, mas não forneceu detalhes e afirmou saber que ele já trabalhou em outras atividades que não a lavoura.
A segunda testemunha disse ter conhecido o autor quando a família do requerente adquiriu um sítio em Sagres. Em tal sítio, toda a família trabalhava, e até hoje o autor trabalha em tal sítio. Não se recorda de que tenham contratado empregados. Segundo a testemunha, se o autor morou em Osvaldo Cruz, isso ocorreu antes da aquisição deste sítio.
A convicção de que ocorreu o efetivo exercício da atividade, com vínculo empregatício, ou em regime de economia familiar, durante determinado período, nesses casos, forma-se através do exame minucioso do conjunto probatório, que se resume nos indícios de prova escrita, em consonância com a oitiva de testemunhas.
Nesse sentido, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça.
Confira-se:
No caso dos autos, o documento mais antigo que permite qualificar o autor como lavrador é a certidão de nascimento de um filho, em 1974, seguido do requerimento de carteira de identidade, em 1975, e de certidão de nascimento de outro filho, em 1978, documentos que o qualificam como lavrador/agricultor. Posteriormente, comprovou-se a aquisição, pelo pai do autor, do Sítio Santa Terezinha, em 11.10.1984, no qual foram realizadas atividades rurais ao menos até 2007.
Embora exista comprovante de inscrição do pai do autor como produtor rural em 1978 e de aquisição de uma propriedade rural por pessoa que parece ser da família da mãe dele, em 1965, não há documentos em nome do próprio autor, antes de 1974, em 1976 e 1977 e entre 1979 e a aquisição do sítio Santa Terezinha, em 1984, que permitam o reconhecimento de que ele exerceu atividades rurais em regime de economia familiar nestes anos. Além disso, não houve corroboração, por prova testemunhal, de suas alegações a esse respeito, eis que a única testemunha que declarou conhecê-lo desde por volta de 1960 não prestou qualquer informação precisa quanto a seu labor rural. Ademais, há registro de exercício de atividades urbanas pelo autor em 1981 e 1982.
Observe-se, por oportuno, que os documentos escolares apresentados nada comprovam ou esclarecem quanto a eventual labor rural do requerente. A declaração de sindicato de trabalhadores rurais, por sua vez, não pode ser considerada prova material do alegado, diante da ausência da necessária homologação. E as declarações de pessoas físicas equivalem à prova testemunhal, com o agravante de não terem sido submetidas ao crivo do contraditório.
A partir de 11.10.1984, contudo, ficou bem caracterizado o labor rural em regime de economia familiar, no Sítio Santa Terezinha, diante da prova oral contundente a esse respeito, combinada com os documentos referentes à aquisição e doação do sítio e às notas fiscais referentes à comercialização de sua produção. O termo final do exercício de labor rural pelo autor, em regime de economia familiar, deve ser fixado em 23.03.2004, momento em que, de acordo com sua CTPS, ele passou a exercer atividades urbanas.
Em suma, é possível reconhecer que o autor exerceu atividades rurais de 01.01.1974 a 31.12.1975, de 01.01.1978 a 31.12.1978 e de 11.10.1984 a 22.03.2004.
Ressalte-se que a contagem do tempo como segurado especial iniciou-se no primeiro dia de 1974 e 1978 de acordo com o disposto no art. 64, §1º, da Orientação Interna do INSS/DIRBEN Nº 155, de 18/12/06
Não se ignora a decisão do Recurso Repetitivo analisado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aceitou, por maioria de votos, a possibilidade de reconhecer período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como prova material, baseado em prova testemunhal, para contagem de tempo de serviço para efeitos previdenciários, conforme segue:
Neste caso, porém, não é possível aplicar-se a orientação contida no referido julgado, tendo vista que as testemunhas não foram consistentes o bastante para atestar o exercício de labor rural em período anterior ao documento mais antigo.
Registre-se que o tempo de serviço rural posterior ao advento da Lei nº 8.213/91 somente poderá ser considerado para efeito de concessão dos benefícios previstos no artigo 39, inciso I, da referida Lei.
Somando-se os períodos de labor rural ora reconhecidos com os períodos incontroversos, verifica-se que o autor contava com 35 (trinta e cinco) anos, 04 (quatro) meses e 18 (dezoito) dias de trabalho por ocasião do ajuizamento da ação.
Conjugando-se a data em que foi atingida a idade de 65 anos (22.06.2013), o tempo de serviço comprovado nos autos e o art. 142 da Lei nº 8.213/91, tem-se que, por ocasião do requerimento administrativo, havia sido cumprida a carência exigida (180 meses).
O autor faz jus, portanto, ao recebimento de aposentadoria por idade híbrida, a partir da data da citação.
Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a data desta decisão, considerando que o pedido foi julgado improcedente pelo juízo "a quo".
As Autarquias Federais são isentas de custas, cabendo somente quando em reembolso.
Por essas razões, acolho a preliminar arguida pelo autor, anulando a sentença, e, nos termos do art. 1.013, § 3º, I, do CPC, julgo o pedido parcialmente procedente, para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade híbrida, desde a data da citação, bem como para fixar os consectários legais nos termos da fundamentação.
É o voto.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | TANIA REGINA MARANGONI:10072 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18020853B4DB |
Data e Hora: | 05/12/2018 17:37:33 |