D.E. Publicado em 26/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação da parte ré, bem como ao recurso adesivo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021941-40.2012.4.03.9999/SP
VOTO-VISTA
Em Sessão realizada pela Sétima Turma desta E. Corte em 26.06.2017, o Exmo. Desembargador Federal Paulo Domingues, relator do processo, proferiu voto negando provimento à apelação de Silvana Aparecida Salvador, bem como ao recurso adesivo do INSS, no que foi acompanhado pelo Exmo. Desembargador Federal Carlos Delgado.
Pedi vista para melhor análise do feito.
Trata-se de ação revisional proposta pelo INSS na qual pleiteia o reconhecimento de falsidade documental e declaração de nulidade de sentença que concedeu renda mensal vitalícia à parte ré, com o cancelamento definitivo do pagamento e restituição dos valores pagos indevidamente.
Tutela antecipada concedida.
A sentença recorrida julgou parcialmente procedente o pedido para cassar definitivamente a renda mensal vitalícia, porém deixou de condenar a parte ré ao ressarcimento do Erário, em virtude da natureza alimentar das verbas previdenciárias.
Em sede de apelação, a parte ré aduz violação à coisa julgada, bem ainda que a percepção da renda mensal vitalícia não exigiria a comprovação de vínculo empregatício, de modo que eventual falsificação atinente aos registros laborais seria irrelevante para percepção do benefício.
O ente autárquico apresentou recurso adesivo e requereu a restituição dos valores que foram pagos indevidamente.
Versa a controvérsia acerca da possibilidade de ajuizamento de ação revisional para desconstituir coisa julgada estabelecida em demanda previdenciária cujo sucesso fora obtido a partir de documento falso.
Não se ignora o fato de a contrafação ter sido apurada após o trânsito em julgado da sentença, tampouco que tenha decorrido o biênio decadencial para a propositura da ação rescisória, interregno vigente à época do Código de Processo Civil de 1973.
A discussão acerca do tema revela duas vertentes: de um lado a coisa julgada como princípio do Estado Democrático insculpido no inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal; de outro a invocação do princípio estatuído no inciso LVI do referido artigo, que veda a utilização de provas obtidas por meios ilícitos.
Os direitos fundamentais não podem ser tidos como absolutos, sendo certo que quando em confronto com outro direito igualmente tido como fundamental um deles pode ser relativizado em face do outro.
É possível entrever dos autos que a renda mensal vitalícia foi concedida judicialmente com base em prova falsa, todavia o princípio da imutabilidade da coisa julgada não pode servir como escudo protetor para a prática de tais atos.
Afirma-se, então, em hipóteses como tais, que a imutabilidade da coisa julgada assume um caráter relativo na medida em que cede espaço, não só ao princípio do inciso LVI do artigo 5º da C.F., mas também a princípios outros como o do devido processo legal.
Não menos importante destacar a violação ao princípio da boa-fé objetiva na relação jurídica processual.
Portanto, reputo legítimo o ajuizamento da presente ação revisional.
Também não merece prosperar o argumento da parte ré no sentido de que a percepção da renda mensal vitalícia não exigiria a comprovação de vínculo empregatício, de forma que eventual falsidade documental teria sido irrelevante para percepção do benefício.
Ao contrário do alegado, nos termos do artigo 139 da Lei 8.213/1991, para fins de concessão da renda mensal vitalícia exigia-se a comprovação de atividade laboral por no mínimo 05 (cinco) anos, consecutivos ou não (inciso II), de modo que a análise do vínculo laboral falsificado foi, sim, determinante a sua concessão.
Por fim, a tese autárquica para que sejam devolvidos os valores pagos indevidamente à parte ré, tenho que na hipótese versada nos autos, além do caráter alimentar da prestação, não restou comprovado que a ré, pessoa simples, deficiente e de pouca instrução, teria concorrido para a perpetração da fraude (declaração de atividades laborais falsa).
Demais disso, como bem ponderado pelo E. Relator é fato notório a instauração de inúmeros inquéritos policiais e de ações penais em desfavor do advogado Ezio Rahal Melillo, que fora responsável pela obtenção judicial do benefício em favor da parte ré.
Ante o exposto, acompanho o E. Relator e voto por negar provimento à apelação da parte ré, bem como ao recurso adesivo do INSS.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021941-40.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação revisional proposta pelo INSS em que se objetiva o reconhecimento da falsidade documental e a declaração da nulidade da sentença proferida no Proc. nº 1.215/93, com a suspensão definitiva do pagamento do benefício de renda mensal vitalícia a SILVANA APARECIDA SALVADOR (NB 130.660.409-2).
Às fls. 133/134 foi proferida decisão, deferindo a tutela antecipada para fins de suspensão do pagamento dos valores até a prolação da sentença.
Ré citada pessoalmente, fl. 148.
A sentença julgou procedente o pedido, para cassar definitivamente a renda mensal vitalícia concedida em favor da ré nos autos nº 1.215/93, que tramitaram na 1ª Vara da Comarca de S. Manuel/SP. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, em virtude da concessão de justiça gratuita.
Apela a parte ré, alegando a inviolabilidade da coisa julgada e aduzindo que a concessão do benefício de Renda Mensal Vitalícia não exige a comprovação de vínculo empregatício, devendo ser mantida, a despeito dos desdobramentos a respeito do falso.
O INSS recorreu adesivamente, requerendo a restituição dos valores pagos indevidamente à parte ré.
Com as contrarrazões de ambas as partes, vieram os autos a este Tribunal.
Parecer do Ministério Público Federal, fls. 249/251, pelo desprovimento da apelação da parte ré, e pelo provimento do recurso adesivo do INSS.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação beneficiária e do recurso adesivo do INSS.
Inicialmente aprecio a questão atinente ao cabimento da presente ação revisional com vistas à desconstituição da coisa julgada.
O instituto da coisa julgada é matéria de direito público e deve ser conhecida de ofício pelo magistrado, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, visando assegurar a imutabilidade das decisões judiciais, de modo a garantir segurança jurídica.
A relativização da coisa julgada, já admitida no ordenamento pátrio, somente pode ser levada a cabo em casos excepcionais, por meio da ação rescisória ou ação anulatória, nas hipóteses de ocorrência dos vícios que invalidam os atos jurídicos em geral (querela nullitatis).
Há, por outro lado, uma série de outros princípios e normas que devem ser levados em conta no caso presente.
Por exemplo, a determinação constitucional do art. 5º, LVI, no sentido de que "são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos"; o princípio da boa-fé processual; a necessidade de impedir que atos fraudulentos - não apenas errados, mas oriundos de falsificação, má-fé, dolo - possam vir a ter consequências jurídicas.
Nesse contexto, em casos excepcionais como o presente, tenho por cabível o ajuizamento de ação anulatória no intuito de fazer cessar os efeitos da sentença proferida sob fundamento supostamente insubsistente, vez que obtido mediante a prática de ato ilícito.
Isso é mais verdadeiro nas situações como a ora em exame, em que as apurações levadas a efeito em sede policial, a respeito de inúmeras fraudes, são mais aprofundadas e demoradas, sendo de dificílima realização dentro do prazo exíguo da ação rescisória. Tanto é assim que o art. 975 do CPC/2015 oferece remédios mais claros para situações como esta, estendendo o prazo para a ação rescisória, por exemplo nos casos em que houve fraude, simulação ou colusão entre as partes.
Portanto, inexistindo óbice ao reexame da ilicitude da prova, que embasou a sentença que determinou a concessão do benefício previdenciário e não havendo decorrido o prazo decadencial previsto para o pedido de revisão por parte do INSS (10 anos a contar da vigência da Lei nº 9.784/99), no presente caso, entendo, de forma excepcional, possível a desconstituição da coisa julgada.
Verifica-se dos autos que SILVANA APARECIDO SALVADOR, propôs perante o Juízo de Direito da Comarca da São Manuel, ação ordinária intentando a concessão de Renda Mensal Vitalícia, a qual foi concedida mediante sentença transitada em julgado em 02.09.2002, conforme se verifica dos expedientes internos desta Corte (AC nº 97.03.008902-0).
Analisando detidamente a sentença (fls. 46/49) e o acórdão proferido em sede recursal (fls. 51/55), tem-se que os vínculos empregatícios do beneficiário não foram objeto de apreciação, passando a valer como pressupostos para concessão da renda mensal vitalícia.
Ocorre que, após a verificação da ocorrência de inúmeras fraudes na região o Grupo Especial de Trabalho - Bauru/SP, ação conjunta da AGU, MPF e Polícia Federal, procederam ao diligenciamento fiscal na cidade de São Manuel, constatando a existência de lançamentos falsos em diversas CTPS encontradas em busca e apreensão em determinado escritório de advocacia da região.
No caso de SILVANA, as supostas declarações prestadas por ex-empregador revelaram-se falsas.
Ouvido Pela Polícia Federal de Bauru (fl. 119), o suposto ex-empregador e sua esposa, Srs. PASCHOAL VITAGLIANO GRIMALDI e NILCE BIRAL GRIMALDI, afirmaram que conheciam a parte ré, por ser a filha deficiente de um ex-colega de profissão, Sr. Primo Salvador, mas que esta nunca foi sua lavadeira. Ademais, negou a autenticidade das assinaturas apostas nas declarações de atividade profissional apresentadas por SILVANA.
Assim, não resta dúvidas, quanto à inexistência do vínculo empregatício apresentado em juízo pela parte ré, o que contamina a comprovação do tempo de serviço na ação antecedente, de concessão de renda mensal vitalícia.
Ademais, não se verifica qualquer mácula no procedimento de averiguação da falsidade documental, tendo havido a atuação conjunta de vários órgãos.
Por outro lado, e diversamente do quanto alegado pela ré, a concessão do benefício de Renda Mensal Vitalícia, nos termos do art. 139, da Lei 8.213/91, exigia a comprovação de certo tempo de atividade laboral, consoante abaixo transcrito:
Assim, não procede a linha de argumentação apresentada pela ré em sua apelação, visto que a fraude perpetrada em relação ao vínculo empregatício foi determinante à concessão do benefício de RMV, nos autos nº 1.215/93.
Dessa forma, comprovada a fraude na concessão judicial do benefício, a sentença proferida no Proc. 1.215/93 deve ser anulada.
Por outro lado, não é viável a determinação de ressarcimento dos valores pagos indevidamente pelo INSS. O caso concreto demonstra tratar-se a beneficiário de pessoa muito simples, deficiente, sem qualquer conhecimento jurídico, que procurou alguém para buscar sua aposentadoria, sem ter sequer ciência de que não teria direito ao benefício, nem de que a fraude seria perpetrada, antes ou depois de sua ocorrência.
Da análise dos autos, constata-se que, embora comprovada a falsidade documental, as investigações não foram conclusivas sobre sua autoria, ainda que neste caso, como em tantos outros, tenha sido o advogado EZIO RAHAL o profissional responsável pela concessão judicial do benefício fraudulento.
Saliente-se, ademais, ser fato notório a instauração de inquérito policial e inúmeras ações penais contra o advogado EZIO RAHAL MELILLO, pela prática de diversos fatos análogos aos aqui tratados.
Ante o exposto, nego provimento à apelação de SILVANA APARECIDA SALVADOR, bem como ao recurso adesivo do INSS, mantendo integralmente a sentença recorrida.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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