D.E. Publicado em 01/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000718-89.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações de sentença pela qual foi julgado parcialmente procedente o pedido formulado em ação de concessão de aposentadoria especial para condenar o réu a averbar o tempo de atividade especial correspondente ao período de 28.01.1985 a 05.03.1997. Pela sucumbência, tendo em vista que o requerido decaiu de parte mínima do pedido, o requerente foi condenado a pagar custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), observada a gratuidade judiciária.
Em suas razões de apelo, o autor sustenta o enquadramento do período de 06.03.1997 a 31.12.2003 como laborado em condições insalubres, devido ao agente agressivo ruído, bem como o período de 01.01.2004 a 22.07.2010, devido ao agente agressivo hidrocarbonetos aromáticos. Requer a fixação dos honorários advocatícios em 15% do valor da condenação, respeitadas as Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4. Requer, ainda, que a correção monetária seja aplicada nos termos da Lei nº 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, e que os juros de mora obedeçam ao disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação que lhe deu a Lei nº 11.960/09. Por fim, requer seja fixado como parâmetro para o cálculo do Imposto de Renda retido na fonte o valor de cada parcela mensal a que faria jus o beneficiário (não o montante integral).
Por sua vez o INSS, alega, em síntese, que não restou comprovado o caráter especial da atividade exercida pelo autor. Subsidiariamente, suscita o prequestionamento da matéria ventilada nos autos.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000718-89.2016.4.03.9999/SP
VOTO
Busca o autor, nascido em 12.08.1959, o reconhecimento do exercício de atividade especial no período de 06.03.1997 a 22.07.2010, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria especial.
De início, cumpre distinguir a aposentadoria especial prevista no art. 57, "caput", da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de serviço, prevista no art. 52 da Lei nº 8.213/91, porquanto a aposentadoria especial pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, e, cumprido esse requisito o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da E.C. nº 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, assim como não se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de serviço há tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade especial sofre a conversão em atividade comum aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da E.C. nº 20/98.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto n. 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei n. 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei n. 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória n. 1.523/96 (reeditada até a MP n. 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP n. 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei n. 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto n. 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n. 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do C.P.C., Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Assim, devem ser mantidos os termos da sentença que reconheceu a especialidade do período de 28.01.1985 a 05.03.1997, em que o autor laborou na empresa Cestari Industrial e Comercial S/A, exposto a ruído de 85 decibéis, conforme PPP de fls. 15/16, por se tratar de agente nocivo previsto nos códigos 1.1.6 do Decreto 53.831/1964.
De igual forma também deve ser tido como especial o período de 06.03.1997 a 22.07.2010, em o autor laborou exposto a hidrocarbonetos aromáticos, conforme descrito nos PPP's de fls. 15/19, extremamente prejudiciais à saúde, encontrando previsão no código 1.2.11 do Decreto 53.831/1964 e 1.2.10 do Decreto 83.080/1979 (Anexo I).
Cumpre esclarecer que, em que pese a omissão do PPP de fls. 15/16 quanto à exposição a agentes químicos, verifica-se que o autor sempre exerceu a mesma atividade que consistia em preparar e ajustar máquina; ajustar dispositivos e ferramentas, usinar peças de metais ferroso e não ferrosos, documentar atividades, trabalhar seguindo normas de segurança, higiene e qualidade, sendo possível concluir que também esteve exposto aos mesmos agentes nocivos (hidrocarbonetos aromáticos), indicados no PPP de fls. 17/19.
Nos termos do § 2º do art.68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação ao Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
Sendo assim, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em praticamente todo o intervalo reconhecido que por si só justifica o reconhecimento de atividade especial, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
A referida discussão também é despicienda em relação à exposição a outros agentes (químicos, biológicos, etc), pois podemos dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Assim, computados os períodos de atividade especial ora reconhecidos, o autor atinge 25 anos, 06 meses e 03 dias de tempo de serviço exercido exclusivamente sob condições especiais, conforme planilha anexa, parte integrante do presente voto.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, havendo requerimento administrativo (08.08.2011 - fl. 32), o termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data de tal requerimento.
Não há falar-se em prescrição, tendo em vista que o requerimento administrativo foi realizado em 08.08.2011, após o ajuizamento da ação que se deu em 07.06.2011.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados pela lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, em conformidade com o entendimento adotado por esta 10ª Turma.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), devendo reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Importante consignar que o autor é beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 170.005.304-0) desde 11.01.2016, conforme CNIS, ora anexado.
Diante do exposto, dou provimento à apelação da parte autora para julgar parcialmente procedente o pedido, a fim de considerar especial a atividade exercida nos períodos de 06.03.1997 a 22.07.2010, totalizando 25 anos, 6 meses e 03 dias de tempo de serviço até 08.08.2011, data do requerimento administrativo. Em consequência, condeno o réu a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo (08.08.2011), com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99. Nego provimento à apelação do réu.
As prestações vencidas serão resolvidas em liquidação de sentença, compensando-se os valores recebidos a título de aposentadoria por tempo de contribuição concedida administrativamente.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, encaminhando-se os documentos da parte autora VICENTE DE FÁTIMA FREITAS, a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis para que seja implantado o benefício de APOSENTADORIA ESPECIAL, DIB em 08.08.2011, com Renda Mensal Inicial a ser calculada pelo INSS, cessando simultaneamente o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 170.005.304-0), a teor do disposto no "caput" do artigo 497 do CPC.
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 23/08/2016 17:08:51 |