D.E. Publicado em 21/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005313-95.2000.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida nos autos de ação de conhecimento em que se objetiva a revisão de pensão especial de ex-combatente, nos termos do Art. 2º, da Lei 4.297/63, com a percepção dos proventos em sua integralidade, inclusive gratificação de férias e adicional por tempo de serviço e todas as demais verbas que incorporem o salário do pessoal da ativa.
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor dado à causa, devidamente corrigido.
Inconformada, a autora apela, pleiteando a reforma da r. sentença, sustentando que faz jus à revisão de seu benefício, nos moldes pretendidos na inicial.
Por se considerar que a matéria é de competência da 1ª Seção desta Corte, determinou-se a redistribuição do presente feito (fls. 364).
Em decisão posterior, o e. Desembargador Federal Valdeci dos Santos determinou a restituição dos autos a este Relator, por entender que se trata de questão afeta à competência da 3ª Seção deste Tribunal (fls. 373/376).
É o relatório.
VOTO
Por primeiro, observo que o Órgão Especial desta Corte já se manifestou no sentido de que a discussão relativa à pensão de ex-combatente, com base na aplicação da Lei 4.297/63, é de competência da Terceira Seção. In verbis:
Por conseguinte, reconsidero a decisão de fls. 364, reconhecendo minha competência para análise da matéria.
Superada essa questão, passo ao exame da matéria de fundo.
A controvérsia nos autos cinge-se ao debate sobre a possibilidade de o INSS proceder à revisão dos critérios de reajuste do benefício originário da pensão por morte recebida pela parte autora; e, por consequência, reduzir o valor da renda mensal e efetuar os descontos dos valores indevidamente recebidos.
Os proventos de aposentadoria do beneficiário falecido (aposentadoria de ex-combatente) foram calculados de acordo com as vantagens estatuídas pelo Art. 2º, da Lei 4.297/63 (NB 43/7984948, DIB 30.12.1969 - fl. 40).
Assim previa o mencionado dispositivo:
Em 15.03.1970, o segurado apresentou requerimento de revisão do benefício, tendo em vista o acordo salarial promovido entre a empresa COMPANHIA LIGHT SERVIÇOS DE ELETRICIDADE S.A. e o sindicato da classe, na base de 26%, em vigor desde 01.01.1970 (fls. 51).
Posteriormente, em 11.03.1971, efetuou novo requerimento de revisão, em razão de novo acordo entre a empresa e o sindicado, na base de 21,35%, em vigor a partir de 01.01.1971 (fl. 53).
Novamente, em 20.07.1973, requereu a revisão com base no acordo em vigor a partir da janeiro de 1973, na base de 19,14% (fl. 56).
Aos 29.04.1983, pleiteou a revisão do benefício com base em decisão do Ministério da Previdência Social, que determinou o restabelecimento do adicional de periculosidade sobre as aposentadorias dos ex-combatentes, com o pagamento dos atrasados desde 1971 (fls. 58/59).
Mais tarde, em 25.10.1987, em novo pedido junto ao INPS, requereu a revisão de sua aposentadoria nos termos do Art. 2º, da Lei 4.297/63.
Na data de 23.06.1995, o INSS expediu comunicação ao segurado informando que seu benefício, a partir de julho de 1995, continuaria sendo reajustado com base nas declarações da empresa, obedecendo ao teto de 10 salários mínimos (fls. 77).
Em 02.08.1995, foi proferida decisão liminar nos autos do mandado de segurança, autuado sob o nº 95.0043701-5, determinando-se à autoridade coatora que efetuasse o pagamento da aposentadoria do beneficiário sem a limitação ao teto de 10 salários mínimos (fls. 80/81), o que restou cumprido pela Agência da Previdência Social, tendo sido depositado o pagamento das diferenças relativas ao período de 01.06.1995 a 31.07.1995 (fls. 82/83).
Aos 12.01.1999, o INSS comunicou o procedimento de revisão do benefício, por constatar suposta irregularidade decorrente do pagamento de duas parcelas indevidas, quais sejam, a parcela relativa ao adicional do tempo de serviço, "cujo pagamento, conforme declaração da Eletropaulo, foi instituído a seus funcionários apenas em janeiro de 1982, portanto não fazendo parte das parcelas recebidas quando ainda em atividade e que entraram no cálculo de sua renda mensal inicial"; e a parcela relativa à gratificação de férias, "que conforme parecer 747/96, é incompatível com a inatividade 'tendo em vista que esta gratificação está adstrita ao efetivo gozo de férias'" (fl. 178). Em seguida, após o decurso de prazo para recurso na via administrativa, a autarquia previdenciária comunicou o início dos descontos do montante apurado desde 1997, cujas parcelas não deveriam ultrapassar 30% do valor da renda mensal devida (fl. 180).
Após o óbito do segurado, sua esposa, ora apelante, obteve o benefício de pensão por morte, NB 101.495.355-0, com DIB em 13.02.2000 (fl. 23vº).
Nesse ponto, cabe salientar que o benefício de pensão por morte, submetido aos efeitos de revisão administrativa, é derivado de aposentadoria concedida sob a égide de legislação que garantia o direito ao seu reajuste na mesma proporção dos aumentos salariais concedidos ao pessoal da ativa (Lei 4.297/63), com a conservação dessa equiparação nos reajustes futuros.
Sobre o tema, é firme a jurisprudência pátria no sentido de que os benefícios previdenciários estão submetidos ao princípio tempus regit actum, devendo ser regrados pelas leis vigentes à época de sua concessão, impedindo que alterações posteriores na legislação previdenciária retroajam seus efeitos para atingir os fatos anteriormente constituídos.
No caso sob exame, a legislação em vigor na data de concessão do benefício de aposentadoria do segurado instituidor, ex-combatente, previa a vinculação do valor dos proventos aos vencimentos do pessoal da ativa, consolidando uma situação jurídica com repercussão sobre os proventos da pensão concedida à autora.
Nessa esteira, trago a lume a orientação predominante no e. Superior Tribunal de Justiça:
Todavia, é importante esclarecer que o aludido posicionamento não se aplica à questão sub judice, pois não se discute o direito ao reajustamento do benefício na forma preconizada pela legislação de regência, mas a incorporação de verbas remuneratórias posteriormente concedidas aos funcionários que continuaram a prestar serviços junto à ex-empregadora do segurado instituidor da pensão por morte.
Observe-se que a garantia prevista no Art. 2º, da Lei 4.297/63, assegurava apenas o reajuste dos proventos da aposentadoria na mesma proporção dos reajustes aplicados ao salário integral, na base dos salários atuais e futuros, de idêntico cargo, classe, função ou categoria da atividade a que pertencia o segurado, ou, na impossibilidade dessa atualização, na base dos aumentos que seu salário integral teria, se permanecesse em atividade, em consequência de todos dissídios coletivos ou acordos entre e empregados e empregadores posteriores à sua aposentadoria, o que não se amolda ao caso em tela.
O reajuste salarial pressupõe a reposição do poder aquisitivo do salário em face da inflação verificada durante certo período de tempo, com objetivo de preservar ou restabelecer o seu valor real, situação distinta da que se pretende nesta demanda. Com efeito, o que a autora busca nos autos não é a manutenção do critério de reajustamento do salário que seria devido ao de cujus, uma vez que as verbas pleiteadas - adicional por tempo de serviço e a gratificação de férias - constituem direito superveniente integrado à remuneração do pessoal da ativa, e não aumento ou reajuste salarial.
Nesse quadro, razoável a interpretação adotada pelo douto Juízo sentenciante, no sentido de que "a lei determina que somente o sistema de reajustamento é igual entre os ex-combatentes e os que estão em atividade, não havendo alcance dessa lei a toda e qualquer verba remuneratória criada em favor de trabalhadores paradigmas".
Por outro turno, não há que se falar em ofensa ao devido processo legal por cerceamento de defesa no curso do procedimento administrativo de revisão do benefício, uma vez que o segurado foi regularmente cientificado da irregularidade constatada pela autarquia previdenciária, sendo-lhe facultado prazo para apresentar recurso, somente tendo havido a alteração da renda mensal após o decurso desse prazo sem manifestação do interessado (fls. 178/180).
Cumpre observar ainda que, pelo que consta dos autos, os valores foram recebidos de boa-fé e por erro da Administração. Assim, em razão da natureza alimentar do benefício recebido, não há que se falar em restituição desses valores.
O inciso II, do Art. 115, da Lei 8.213/91, não especificou que a possibilidade de desconto dos valores indevidamente pagos ao beneficiário aplica-se mesmo quando este não concorreu para a irregularidade no pagamento, de sorte que coube à jurisprudência delimitar o alcance do comando legal, a fim de adequar sua incidência ao sistema normativo vigente.
Dessarte, restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
Confira-se:
Ainda, no julgamento do RE 587.371, o Pleno do STF ressaltou, conforme excerto do voto do Ministro Relator: "... 2) preservados, no entanto, os valores da incorporação já percebidos pelo recorrido, em respeito ao princípio da boa - fé , (...)" ( STF , RE 587371, Relator: Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 14/11/2013, acórdão eletrônico Repercussão Geral - Mérito, DJe-122 divulg 23.06.2014, public 24.06.2014).
E, mais recentemente, o mesmo colegiado, ao julgar o RE 638115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores recebidos de boa fé, conforme a ata de julgamento de 23.03.2015, abaixo transcrita:
Ademais, há que se considerar que o pronunciamento do Pretório Excelso, em relação aos servidores públicos, no sentido de que "o reconhecimento da ilegalidade da cumulação de vantagens não determina, automaticamente, a restituição ao erário dos valores recebidos, salvo se comprovada a má- fé" (MS 26085, Rel. Min. Cármen Lúcia), deve ser igualmente se estender aos beneficiários da Previdência Social, sob pena de vulneração do princípio da isonomia, insculpido no Art. 5º, da Magna Carta.
Por conseguinte, embora não se desconheça o decidido pela c. 1ª Seção do e. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1401560, julgado sob o regime dos recursos repetitivos, cabe interpretar, na hipótese do recebimento, de boa-fé, de benefício irregular, em decorrência de erro da Administração, não há como se impor ao segurado sejam os valores restituídos.
Na mesma linha de interpretação, cito os seguintes julgados:
Esclareça-se que o posicionamento ora adotado não implica em negativa de vigência ou em declaração de inconstitucionalidade do Art. 115, II, da Lei 8.213/91, consiste apenas na interpretação deste órgão judicante, a respeito das normas aplicáveis à questão de direito, com base na jurisprudência sedimentada sobre a matéria.
Assim, deve a autarquia previdenciária abster-se de efetuar novos descontos no benefício da autora. Contudo, em relação aos descontos já efetuados, não há que se falar em restituição à parte autora, uma vez que foram realizados no âmbito administrativo, no exercício do poder-dever da autarquia de apurar os atos ilegais, nos termos da Súmula 473, do STF :
Uma vez descontado pelo INSS, não se pode cogitar na hipótese de devolução de valores, compelindo a Administração a pagar algo que, efetivamente, não deve. A natureza alimentar do benefício não abarca as prestações já descontadas e que não eram devidas.
Quanto ao prequestionamento da matéria para fins recursais, não há falar-se em afronta a dispositivos legais e constitucionais, porquanto o recurso foi analisado em todos os seus aspectos.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que julgado improcedente o pedido de revisão do benefício, devem ser observadas as disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença, tão só, para determinar ao réu que se abstenha de efetuar novos descontos no benefício da autora, sem a necessidade de devolução dos valores já descontados.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
Oficie-se ao INSS.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 12/03/2019 18:24:21 |