Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
6090446-34.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
01/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/10/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AFASTAMENTO DO ÓBICE DA COISA JULGADA. PREVIDENCIÁRIO.
MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE
RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO.
LIMITES DO PEDIDO RECURSAL.
- Reconhecido o agravamento do estado de saúde da autora, houve alteração no estado de fato,
razão pela qual não há que se falar na ocorrência de coisa julgada ou mesmo de litigância de má-
fé.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses) -
é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com as
condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora atestadas,
ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada pela lei a
realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para que se avalie
a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei n.º 8.213/91.
- Reconhecimento da procedência do pedido de concessão de auxílio-doença.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº6090446-34.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS TAVARES
Advogado do(a) APELADO: CONRADO SILVEIRA ADACHI - SP414532-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº6090446-34.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS TAVARES
Advogado do(a) APELADO: CONRADO SILVEIRA ADACHI - SP414532-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio-doença previdenciário,
a partir do requerimento administrativo (8/3/2018).
O juízo a quo julgou procedente o pedido para conceder ao autor o benefício de auxílio-doença, a
partir do requerimento administrativo, deferindo a antecipação dos efeitos da tutela. Determinou o
pagamento das parcelas vencidas acrescidas de correção monetária e juros de mora “na forma
prevista no manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal”.
Submeteu a sentença ao reexame necessário.
Apela, o INSS, suscitando, preliminarmente, o reconhecimento da existência de coisa julgada
com o feito de registro n.º 0028305-85.2016.4.03.9999 e, no mérito, a integral reforma da
sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão pretendida.
Se vencido, pleiteia a modificação dos índices de correção monetária e juros de mora.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº6090446-34.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS TAVARES
Advogado do(a) APELADO: CONRADO SILVEIRA ADACHI - SP414532-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
No tocante ao reconhecimento da coisa julgada, anote-se que a autora ajuizou demanda no ano
de 2011, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença
previdenciário (n.º 0028305-85.2016.4.03.9999).
À época, conforme constou da sentença de procedência, acessada por meio do sistema de
consultas processuais do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o perito atestou que “a
parte autora é portadora de moléstia que causa incapacidade total e permanente para suas
funções habituais”.
Em 3/10/2016, esta Corte reformou a sentença, registrando que “O laudo atesta que a parte
autora apresenta esquizofrenia e depressão. Conclui pela existência de incapacidade total e
permanente para o trabalho. Informa não ser possível definir a data de início da incapacidade,
mas que a autora afirmou não trabalhar há aproximadamente vinte anos” e que “é possível
concluir que a incapacidade já existia antes mesmo da sua refiliação junto à Previdência Social e,
ainda, não restou demonstrado que o quadro apresentado progrediu ou agravou-se, após seu
reingresso no RGPS, o que afasta a concessão dos benefícios pleiteados, nos termos dos artigos
42, § 2º, e 59, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91”.
Em 27/7/2018, ajuizou a presente demanda, argumentando terem sido alteradas suas condições
laborativas.
Nos termos do art. 505 do Código de Processo Civil, tratando-se de relação jurídica continuativa,
caso sobrevenha modificação no estado de fato ou de direito, a parte pode pedir revisão do
disposto na sentença.
De acordo com o laudo médico pericial atual, a autora é portadora de osteoartrose e hérnia de
disco lombar, das quais resulta sua incapacidade parcial e permanente para o exercício de
atividades laborativas, não reunindo condições de exercer atividades que requeiram esforços
físicos moderados ou pesados. Quanto ao termo de início da incapacidade laborativa registrou
que “De acordo com a anamnese, exame físico e a análise dos documentos médicos e exames
apresentados e os contidos nos autos é possível que a incapacidade laboral para as atividades
que requeiram esforços físicos acentuados e/ou moderados seja desde agosto de 2018” (Id.
98868002).
In casu, com as modificações no estado de saúde da autora, demonstrado pelos exames periciais
acima referidos, houve nítida alteração no estado de fato, razão pela qual não há que se falar na
ocorrência de coisa julgada.
Rejeito, portanto, a preliminar em questão.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes
da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na
existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento
da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva
para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do
requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de
recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida
profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma,
DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos
arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da
Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a
contribuir decorreu da incapacidade laborativa.
Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível a existência de, pelo menos,
seis meses de recolhimento, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos
termos do art. 27-A da Lei de Benefícios.
Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma
lei, a saber:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social
depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
DO CASO DOS AUTOS (INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE COM REPERCUSSÃO
NEGATIVA SOBRE AS ATIVIDADES HABITUAIS QUE NÃO OBSTA A REABILITAÇÃO)
Para comprovar o preenchimento do requisito afeto à qualidade de segurado, a autora acostou
CPTS da qual se infere o registro de vínculo de trabalho, no cargo de “serviços gerais”, no
período de 2/1/2013 a 30/10/2013 (Id. 98868016).
Extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), por sua vez, demonstra que, além
do vínculo acima referido, a autora recolheu contribuições previdenciárias nos períodos de 3/1992
a 10/1994, na condição de contribuinte individual (empregado doméstico), e de 12/2008 a 4/2009,
9/2010 a 11/2011, 12/2011 a 11/2012, 1/2013 a 12/2015 e de 11/2016 a 12/2018 (Id. 98868013)
Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando
demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, inciso II,
da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 27/7/2018.
Demonstrou, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de 12 contribuições
previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91).
No concernente à incapacidade, a perícia médica, como visto, atestou que a autora é portadora
de osteoartrose e hérnia de disco lombar, das quais resulta sua incapacidade parcial e
permanente para o exercício de atividades laborativas, não reunindo condições de exercer
atividades que requeiram esforços físicos moderados ou pesados. Quanto ao termo de início da
incapacidade laborativa registrou que “De acordo com a anamnese, exame físico e a análise dos
documentos médicos e exames apresentados e os contidos nos autos é possível que a
incapacidade laboral para as atividades que requeiram esforços físicos acentuados e/ou
moderados seja desde agosto de 2018” (Id. 98868002).
Anote-se, que, embora o INSS argumente a preexistência da incapacidade laborativa da autora,
perícias médicas administrativas realizadas pelo próprio ente autárquico, em 4/2/2011, 1.º/3/2011
e 12/3/2018, revelaram a inexistência de incapacidade para o trabalho (Id. 98868013, p. 14-16).
Não obstante a incapacidade se restrinja às atividades que demandem esforço físico,
considerando a idade da autora (61 anos), as limitações que as patologias lhe impõem são
grandes e restringem, em muito, a possibilidade de colocação no mercado de trabalho, diante das
profissões que sempre exerceu.
Contudo, tendo em vista os limites da matéria devolvida à apreciação desta Corte pelo recurso
exclusivo do INSS, mantenho o benefício de auxílio-doença concedido pelo juízo a quo.
O benefício deve ser mantido indefinidamente, até que identificada melhora nas condições
clínicas ora atestadas, ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível,
facultada pela lei a realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado,
para que se avalie a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da
Lei nº 8.213/91.
A correção monetária das parcelas vencidas se dará nos termos da normatização de regência
(Lei n.º 6.899/1981 e legislação superveniente), bem como do Manual de Orientação de
Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro
Luiz Fux.
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação, pois o Supremo Tribunal
Federal, ao apreciar embargos declaratórios no recurso extraordinário em questão, decidiu pela
não modulação dos efeitos.
Os juros moratórios são devidos à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, a contar da citação,
nos termos dos arts. 1.062 do Código Civil de 1916 e 240 do Código de Processo Civil. A partir da
vigência do novo Código Civil (Lei n.º 10.406/2002), deverão ser computados nos termos do art.
406 desse diploma, em 1% (um por cento) ao mês, neste caso até 30/6/2009. A partir de 1.º de
julho de 2009, incidirão, uma única vez, até a conta final que servir de base para a expedição do
precatório, para fins de atualização monetária e de juros, os índices oficiais de remuneração
básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97,
com a redação dada pela Lei n.º 11.960/2009 (Repercussão Geral no RE n.º 870.947),
observada, quanto ao termo final da incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n.º
579.431, de 19/4/2017, Rel. Ministro Marco Aurélio.
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e dou parcial provimento à apelação para fixar os critérios
de correção monetária e juros de mora nos termos da fundamentação, supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AFASTAMENTO DO ÓBICE DA COISA JULGADA. PREVIDENCIÁRIO.
MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE
RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO.
LIMITES DO PEDIDO RECURSAL.
- Reconhecido o agravamento do estado de saúde da autora, houve alteração no estado de fato,
razão pela qual não há que se falar na ocorrência de coisa julgada ou mesmo de litigância de má-
fé.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses) -
é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com as
condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora atestadas,
ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada pela lei a
realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para que se avalie
a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei n.º 8.213/91.
- Reconhecimento da procedência do pedido de concessão de auxílio-doença. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e dar parcial provimento à apelação, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA