D.E. Publicado em 13/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do relator, que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan e, pela conclusão, pela Desembargadora Federal Marisa Santos. Vencida a Desembargadora Federal Ana Pezarini que dava parcial provimento ao agravo interno.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009026-77.2012.4.03.6112/SP
DECLARAÇÃO DE VOTO
Cuida-se de agravo interno interposto pela parte autora em face de decisão monocrática que negou provimento à sua apelação e deu parcial provimento ao apelo do INSS. Em sede de embargos de declaração rejeitados, foi aplicada multa à parte autora.
Pretende, a agravante, em síntese, o reexame da matéria pela Turma julgadora, a fim de que se reconheça seu direito de obter aposentadoria por invalidez em vez de benefício assistencial. Subsidiariamente, pleiteia a anulação do julgado para reconhecer a inaplicabilidade da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do NCPC. Por fim, exora seja suspensa a cobrança da multa dada a concessão da justiça gratuita.
Submetido o recurso à apreciação na sessão de 02/10 p.p., após o voto do eminente Relator, Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, no sentido de negar provimento ao agravo, no que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Gilberto Santos, manifestei-me pelo parcial provimento do inconformismo autoral, seguindo-se o sobrestamento do julgamento (art. 942, caput, e § 1º do NCPC), conforme voto que passo a declarar.
Com a devida vênia do insigne Relator, dele divergi tão somente para excluir a multa aplicada ao ora agravante, em sede de julgamento dos embargos de declaração, fundada no caráter protelatório do recurso (artigo 1.026, § 2º, do NCPC).
Reputo descabida a condenação do agravante na multa de que cuida o art. 1.026, § 2º, do NCPC, tendo em vista que, muito embora os embargos de declaração não se prestem à reforma do julgado, sua interposição, por si só, não demonstra o intuito protelatório, a ensejar a imposição da aludida sanção.
Neste sentido, jurisprudência desta Corte Regional:
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo interno, para excluir a condenação em multa e, no mais, acompanho o Sr. Relator pela conclusão.
ANA PEZARINI
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009026-77.2012.4.03.6112/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora em face da decisão monocrática que lhe negou provimento à apelação e deu parcial provimento ao apelo do INSS.
Em sede de embargos de declaração rejeitados, foi aplicada multa à parte autora.
Requer, a agravante, a reforma do julgado, de modo a ser a matéria reexaminada pela Turma, a fim de obter aposentadoria por invalidez em vez de benefício assistencial. Subsidiariamente pleiteia a anulação do julgado para reconhecer a inaplicabilidade da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do NCPC. Por fim, exora seja suspensa a cobrança da multa dada a concessão da justiça gratuita.
Contraminuta não apresentada.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porque presentes os requisitos de admissibilidade, nos termos do artigo 1.021 e §§ do Novo CPC.
Tratando-se de agravo interno, calha desde logo estabelecer que, segundo entendimento firmado nesta Corte, a decisão do relator não deve ser alterada quando fundamentada e nela não se vislumbrar ilegalidade ou abuso de poder que resulte em dano irreparável ou de difícil reparação para a parte. Menciono julgados pertinentes ao tema: AgRgMS n. 2000.03.00.000520-2, Primeira Seção, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, DJU 19/6/01, RTRF 49/112; AgRgEDAC n. 2000.61.04.004029-0, Nona Turma, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, DJU 29/7/04, p. 279.
A sentença julgou procedente o pedido subsidiário, para condenar o INSS a conceder ao autor o benefício assistencial de prestação continuada, desde a data do ajuizamento da ação em 03/10/2012, antecipados os efeitos da tutela e discriminados os consectários.
Nas razões de apelo, o autor requer a autora seja a sentença reformada, para que lhe seja concedida aposentadoria por invalidez, desde a DER em 09/4/2012, majorando-se os honorários de advogado para 20% sobre a condenação.
Já, o INSS requereu a improcedência total, pois o autor não atende ao requisito da hipossuficiência. Subsidiariamente, postula a aplicação da Lei nº 11.960/2009 à apuração dos juros e correção monetária.
A decisão monocrática deste relator negou nego seguimento à apelação do autor e dou parcial provimento à do INSS, para dispor sobre os critérios de apuração dos juros e correção monetária.
Os embargos de declaração interpostos pela autora foram rejeitados, aplicada a multa pelo caráter protelatório.
Feito o introito, passo à análise do mérito.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Hipossuficiência ou miserabilidade
O critério da miserabilidade do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação. Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza - entendida como a de falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial -, a fim de se concluir por devida a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.
Logo, a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição de miserabilidade por outros meios de prova, conforme precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 435.871, 5ª Turma Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764, STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
O próprio Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado taxativo (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
A decisão concluiu que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos que, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidenciam um quadro de notória hipossuficiência econômica.
Essa insuficiência da regra decorre não só das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.
A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais voltados a famílias carentes, considera pobres aqueles com renda mensal per capita de até meio salário-mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/97 - regulamentada pelos Decretos n. 2.609/98 e 2.728/99; as Portarias n. 458 e 879, de 3/12/2001, da Secretaria da Assistência Social; o Decreto n. 4.102/2002; a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).
Ressalte-se que o critério do meio salário mínimo foi estabelecido para outros benefícios diversos do amparo social. Assim, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 como absoluto e único para a aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.
Vale dizer, não se pode tomar como "taxativo" o critério do artigo 20, § 3º, da LOAS, mesmo porque toda regra jurídica deve pautar-se na realidade fática. Entendo pessoalmente que, em todos os casos, outras circunstâncias devem ser levadas em conta, mormente se o patrimônio do requerente também se subsume à noção de hipossuficiência, devendo ser apurado se vive em casa própria, com ou sem ar condicionado, se possui veículo, telefones celulares, auxílio permanente de parentes ou terceiros etc.
Sendo assim, pode-se estabelecer alguns parâmetros norteadores da análise individual de cada caso, como por exemplo:
a) todos os que recebem renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo são miseráveis;
b) nem todos que percebem renda familiar per capita superior a ¼ e inferior a ½ salário mínimo são miseráveis;
c) nem todos que percebem renda familiar per capita superior a ½ salário mínimo deixam de ser miseráveis;
d) todos que perceberem renda mensal familiar superior a um salário mínimo (artigo 7º, IV, da Constituição Federal) não são miseráveis.
Para se apurar se a renda per capita do requerente atinge, ou não, o âmbito da hipossuficiência, faz-se mister abordar o conceito de família.
O artigo 20 da Lei n. 8.742/93 estabelecia, ainda, para efeitos da concessão do benefício, os conceitos de família (conjunto de pessoas do art. 16 da Lei n. 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto - § 1º), de pessoa portadora de deficiência (aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho - § 2º) e de família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa (aquela com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - § 3º).
A Lei n. 12.435, vigente desde 7/7/2011, alterou os §§ 1º e 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93, estabelecendo que a família, para fins de concessão do benefício assistencial, deve ser aquela composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Idosos e pessoas com deficiência
Na hipótese de postulante idoso, a idade mínima de 70 (setenta) anos foi reduzida para 67 (sessenta e sete) anos pela Lei n. 9.720/98, a partir de 1º de janeiro de 1998, e, mais recentemente, para 65 (sessenta e cinco) anos, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03).
No que se refere ao conceito de pessoa portadora de deficiência - previsto no § 2º da Lei n. 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 13.146/2015 -, passou a ser considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no artigo 4º do Decreto n. 3.298/99 (regulamentar da Lei n. 7.853/89, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo; portanto, constatado que os males sofridos pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício.
Menciona-se também o conceito apresentado pela ONU, elaborado por meio da Resolução n.° XXX/3.447, que conforma a Declaração, em 09/12/1975, in verbis:"1. O termo 'pessoa deficiente' refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais".
Esse conceito dá maior ênfase à necessidade, inclusive da vida individual, ao passo que o conceito proposto por Luiz Alberto David Araujo prioriza a questão da integração social, como se verá.
Nair Lemos Gonçalves apresentou os principais requisitos para sua definição: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional, considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito, n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).
Luiz Alberto David Araujo, por sua vez, compilou muitos significados da palavra deficiente, extraídos dos dicionários de Língua Portuguesa. Observa ele que, geralmente, os dicionários trazem a idéia de que a pessoa deficiente sofre de falta, de carência ou de falha.
Esse autor critica essas noções porque a idéia de deficiência não se apresenta tão simples, à medida que as noções de falta, de carência ou de falha não abrangem todas as situações de deficiência, como, por exemplo, o caso dos superdotados, ou de um portador do vírus HIV que consiga levar a vida normal, sem manifestação da doença, ou ainda de um trabalhador intelectual que tenha um dedo amputado.
Por ser a noção de falta, carência ou falha insuficiente à caracterização da deficiência, Luiz Alberto David Araujo propõe um norte mais seguro para se identificar a pessoa protegida, cujo fator determinante do enquadramento, ou não, no conceito de pessoa portadora de deficiência, seja o meio social:
"O indivíduo portador de deficiência, quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve apresentar dificuldades para seu relacionamento social. O que define a pessoa portadora de deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a sua integração social é o que definirá quem é ou não portador de deficiência". (A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: Ministério da Justiça, 1997, p. 18-22). |
E quanto mais complexo o meio social, maior rigor se exigirá da pessoa portadora de deficiência para sua adaptação social. De outra parte, na vida em comunidades mais simples, como nos meios agrícolas, a pessoa portadora de deficiência poderá integrar-se com mais facilidade.
Desse modo, o conceito de Luiz Alberto David Araujo é adequado e de acordo com a norma constitucional, motivo pelo qual é possível seu acolhimento para a caracterização desse grupo de pessoas protegidas nas várias situações reguladas na Constituição Federal, nos arts. 7o, XXXI, 23, II, 24, XIV, 37, VIII, 203, V e 208, III.
Mas é preciso delimitar a proteção constitucional apenas àquelas pessoas que realmente dela necessitam, porquanto existem graus de deficiência que apresentam menores dificuldades de adaptação à pessoa. E tal verificação somente poderá ser feita diante de um caso concreto.
Luiz Alberto David Araujo salienta que os casos-limite podem, desde logo, ser excluídos, como o exemplo do bibliotecário que perde um dedo ou do operário que perde um artelho; em ambos os casos, ambos continuam integrados socialmente. Ou ainda pequenas manifestações de retardo mental (deficiência mental leve) podem passar despercebidas em comunidades simples, pois tal pessoa poderá "não encontrar problemas de adaptação a sua realidade social (escola, trabalho, família)", de maneira que não se pode afirmar que tal pessoa deverá receber proteção, "tal como aquele que sofre restrições sérias em seu meio social" (obra citada, páginas 42/43).
"A questão, assim, não se resolve sob o ângulo da deficiência, mas, sim sob o prisma da integração social. Há pessoas portadoras de deficiência que não encontram qualquer problema de adaptação no meio social. Dentro de uma comunidade de doentes, isolados por qualquer motivo, a pessoa portadora de deficiência não encontra qualquer outro problema de integração, pois todos têm o mesmo tipo de dificuldade" (obra citada, p. 43). |
Enfim, a constatação da existência de graus de deficiência é de fundamental importância para identificar aqueles que receberão a proteção social prevista no art. 203, V, da Constituição Federal.
Feitas essas considerações, torna-se possível inferir que não será qualquer pessoa portadora de deficiência que se subsumirá no molde jurídico protetor da Assistência Social.
Noutro passo, o conceito de pessoa portadora de deficiência, para fins do benefício de amparo social, foi tipificado no artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, que em sua redação original assim dispunha:
"§ 2º - Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho." |
Como se vê, pressupunha-se que o deficiente era aquele que: a) tinha necessidade de trabalhar, mas não podia, por conta da deficiência; b) estava também incapacitado para a vida independente. Ou seja, o benefício era devido a quem deveria trabalhar, mas não poderia e, além disso, não tinha capacidade para uma vida independente sem a ajuda de terceiros.
Lícito é concluir que, tais quais os benefícios previdenciários, o benefício de amparo social, enquanto em vigor a redação original do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, era substitutivo do salário. Isto é, era reservado aos que tinham a possibilidade jurídica de trabalhar, mas não tinham a possibilidade física ou mental para tanto.
Mas a redação original do artigo 20, § 2º, da LOAS foi alterada pelo Congresso Nacional, exatamente porque sua dicção gerava um sem número de controvérsias interpretativas na jurisprudência.
A Lei n º 12.435/2011 deu nova redação ao § 2º do artigo 20 da LOAS, que esculpe o perfil da pessoa com deficiência para fins assistenciais, da seguinte forma:
"§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se: (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) |
I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas; |
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos." |
Com a novel legislação, o benefício continuou sendo destinado àqueles deficientes que: a) tinha necessidade de trabalhar, mas não podia, por conta de limitações físicas ou mentais; b) estava também incapacitado para a vida independente.
Todavia, o legislador, não satisfeito, novamente alterou a redação do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, e o conceito de pessoa com deficiência foi uma vez mais alterado, pela Lei nº 12.470/2011, passando a ter a seguinte dicção:
"§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." |
Nota-se que, com o advento desta novel lei, dispensou-se a menção à incapacidade para o trabalho ou à incapacidade para a vida independente, como requisito à concessão do benefício assistencial.
Destarte, tal circunstância (a entrada em vigor de nova lei) deve ser levada em conta neste julgamento, ex vi o artigo 462 do CPC/73 e 493 do NCPC.
Finalmente, a Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis:
"§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." |
Reafirma-se, assim, que o foco, doravante, para fins de identificação da pessoa com deficiência, passa a ser a existência de impedimentos de longo prazo, apenas e tão somente, tornando-se despicienda a referência à necessidade de trabalho.
Subsidiariedade da assistência social
Resta consignar que a Assistência Social, tal como regulada na Constituição Federal e na Lei nº 8.742/93, tem caráter subsidiário em relação às demais técnicas de proteção social (previdência social, previdência privada, caridade, família, poupança etc), dada a gratuidade de suas prestações.
Com efeito, levando-se em conta o alto custo do pretendido "Estado de bem-estar social", forjado no Brasil pela Constituição Federal de 1988 quando a grande maioria dos países europeus já haviam reconhecido sua inviabilidade financeira, lícito é inferir que só deve ser prestada em casos de real necessidade, dentro das estritas regras do direito material, sob pena de comprometer a mesma proteção social não apenas das futuras gerações, mas também da atual.
De fato, o benefício previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal tem o valor de 1 (um) salário mínimo, ou seja, a mesma quantia paga a milhões de brasileiros que se aposentaram no Regime Geral de Previdência Social mediante o pagamento de contribuições, durante vários anos.
De modo que a assistência social deve ser fornecida com critério, pois do contrário se gerarão privilégios e desigualdades, em oposição à própria natureza dos direitos sociais que é a de propiciar igualdade, isonomia de condições a todos.
Diga-se de passagem que a concessão indiscriminada do benefício assistencial geraria não apenas injustiça aos contribuintes da previdência social, mas incentivo para que estes parem de contribuir, ou mesmo não se filiem ou não contribuam, o que constitui situação anômala e gravíssima do ponto de vista atuarial.
No mais, não deve o Estado substituir a sociedade em situações onde esta consegue, ela própria, mediante esforço, resolver suas pendências, sob pena de se construir uma sociedade de freeloaders, cada vez mais dependente das prestações do Estado e incapaz de construir um futuro social e economicamente viável para si própria.
Nesse diapasão, a proteção social baseada na solidariedade legal não tem como finalidade cobrir contingências encontradas somente na letra da lei (dever-ser) e não no mundo dos fatos (ser). Cabe, em casos que tais, à sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência aos próximos.
Pertinente, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário Wagner Balera, quando pondera a respeito da dimensão do princípio da subsidiariedade: "O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos e dos indigentes exigindo que sejam, por todos respeitados os direitos dos pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã - o Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir, nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'Rerum Novarum', a 'Quadragésimo Anno', pontos 79-80)." (Centenárias Situações e Novidade da 'Rerum Novarum', p. 545).
Por fim, quanto a esse tópico, lícito é inferir que quem está coberto pela previdência social está, em regra, fora da abrangência da assistência social. Nesse sentido, prelecionou Celso Bastos, in verbis: "A assistência Social tem como propósito satisfazer as necessidades de pessoas que não podem gozar dos benefícios previdenciários, mas o faz de uma maneira comedida, para não incentivar seus assistidos à ociosidade. Concluímos, portanto, que os beneficiários da previdência social estão automaticamente excluídos da assistência social. O benefício da assistência social, frise-se, não pode ser cumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o de assistência médica" (Celso Bastos e Ives Gandra Martins, in Comentários à Constituição do Brasil, 8o Vol., Saraiva, 2000, p. 429).
Caso concreto
O INSS impugnou em sua apelação a questão da miserabilidade, alegando que a renda familiar per capita é de ½ (meio) salário mínimo, superior à prevista no artigo 20, § 3º, da LOAS.
Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social revela que o autor reside com a mãe, que recebe aposentadoria de um salário mínimo. A mãe é idosa, então com oitenta anos de idade (f. 90).
No caso deve ser seguida a orientação do RE n. 580963 (repercussão geral - vide supra), de modo que o critério legal não é "taxativo".
Assim, segundo o mesmo precedente, aplica-se a regra do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso, pois o irmão do autor tem mais de sessenta anos de idade.
A renda da mãe deve ser desconsiderada, portanto, fazendo com que seja satisfeito o requisito da miserabilidade.
Em decorrência, forçoso e concluir pelo preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada, previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93 e regulamentado pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
O benefício é devido no valor de um salário mínimo, nos termos do artigo 20 da Lei n. 8.742/93 e deve ser revisto a cada 2 (dois) anos, consoante artigo 21 da mesma lei.
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO
Noutro passo, discute-se o atendimento das exigências à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da Lei n. 8.213/91, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença, benefício pago se a incapacidade for temporária, é disciplinado pelo art. 59 da Lei n. 8.213/91, e a aposentadoria por invalidez tem seus requisitos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91.
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho.
São exigidos à concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
O primeiro laudo médico realizado atestou que o autor, nascido em 13/01/1956, ingere bebidas alcoólicas desde 2005, sofre de alcoolismo crônico e sofreu AVC em 05/01/2013, tornando-se inválido desde tal data (f. 53/60).
Já, o segundo laudo pericial atestou que o autor está incapaz total e definitivamente, desde o ano de 2009, em razão do alcoolismo.
Há, porém, várias questões, éticas e jurídicas, a serem levadas em linha de conta no presente feito.
Segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), o alcoolismo crônico ("transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência" - F10.2) é "o conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de abstinência física".
Tal síndrome de dependência "pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (por exemplo, o fumo ou o álcool), a uma categoria de substâncias psicoativas (por exemplo, substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente diferentes."
Por isso a jurisprudência tem autorizado a concessão dos chamados benefícios por incapacidade, para que o segurado possa se tratar, uma vez que sendo a abstinência da bebida uma das etapas a ser seguida no tratamento.
Por um lado, resta evidente que alcoolismo e dependência de drogas podem ser tachadas de doenças, mas por outro são fruto de atos volitivos conscientes dos segurados, envolvendo pleito de proteção social que se afasta, sobremaneira, da própria noção de previdência social, um sistema de proteção social destinado a cobertura de eventos ou contingências incertas.
Embora o alcoolismo cause dependência física e psicológica do álcool, reconhecido pela medicina como uma patologia incapacitante, de natureza crônica e progressiva, difícil de ser controlada, a determinação do indivíduo em submeter-se a tratamento para livrar-se do vício é de fundamental importância.
De qualquer maneira, o autor perdera a qualidade de segurado anos antes do requerimento administrativo, realizado em 14/4/2012.
De fato, seu último vínculo deu-se entre 01/5/2006 e 10/4/2007.
Entretanto, observada a DER, tenho que a parte autora não manteve sua qualidade de segurada, por ter sido superado o "período de graça" previsto no art. 15 da Lei n. 8.213/91.
Ressalte-se; a prorrogação do período de graça para 24 meses somente seria possível se demonstrado o recolhimento de 120 contribuições mensais sem interrupção, o que não ocorreu no caso em tela.
Operou-se, portanto, a caducidade dos direitos inerentes à qualidade de segurado da parte autora, nos termos do disposto no art. 102 da Lei n. 8.213/91.
Nesse diapasão:
PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - AUXÍLIO DOENÇA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA - OCORRÊNCIA - DOENÇA PRÉ-EXISTENTE I. Para concessão de aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a incapacidade total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos, ressalvando-se a incapacidade, que deve ser total e temporária. II. Considerando que as patologias diagnosticadas são de caráter crônico e degenerativo, restou evidenciado que, ao ingressar ao Regime Geral da Previdência Social, na qualidade de contribuinte facultativo, no período de 01/07/2003 a 06/2004, a autora já estava incapacitada. III. Considerando a data da incapacidade fixada nos autos (meados de 08/2008), e a última contribuição vertida pela autora (09/06/2004 - 06/2004), teria sido consumada a perda da qualidade de segurada, conforme disposto no art. 15, II, e §4°, da Lei 8.213/91, uma vez que também não houve o recolhimento das quatro contribuições necessárias, após tal perda, nos termos do art. 24, par. único, da LBPS. IV. Agravo legal improvido (AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1056095 Processo: 0039855-64.2005.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:03/10/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/10/2011 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS). |
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL (ART.557, § 1º, DO CPC).. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO INDEVIDO. AGRAVADA MANTIDA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. 1. O agravo previsto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil tem o propósito de submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator, bem como a legalidade da decisão monocrática proferida, não se prestando à rediscussão de matéria já decidida. 2. Inexistente qualquer ilegalidade ou abuso de poder na decisão questionada que justifique a sua reforma. 3. Os elementos de prova coligidos nos autos não permitem afirmar que a agravante deixou de laborar e contribuir para previdência em razão de doença ou lesão, aspecto que importa em perda da condição de segurado, sendo indevido o benefício pleiteado. 4. Agravo legal desprovido (APELREE - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1045936 Processo: 2005.03.99.031572-8 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento: 28/03/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:01/04/2011 PÁGINA: 1329 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA). |
Nos termos do artigo 15, II, e §§, da Lei nº 8.213/91, perdeu a qualidade de segurado em 16/6/2008.
Inaplicável à espécie o § 1º do mencionado artigo, pois as provas dos autos não conduzem à certeza de que a parte autora deixou de trabalhar em virtude da doença apontada.
A toda evidência, não há prova bastante no sentido de que invalidez do autor tenha se dado no período de graça. E aqui subscrevo, in totum, as conclusões da primeira perícia, que concluiu que a DII deve ser fixada na data do AVC em 05/01/2013.
Ademais, também não há comprovação da situação de desemprego (relativo ao último vínculo), seja perante órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social, seja por qualquer outro meio, sendo incabível a prorrogação da qualidade de segurado por mais 12 meses, nos moldes do artigo 15, § 2°, da Lei n. 8.213/91.
Aliás, a primeira internação psiquiátrica, segundo a prova constante dos autos, deu-se em setembro de 2009, mais de 2 (dois) anos a contar da data do último vínculo. Logo, foi a partir de 09/2009 que o perito do segundo laudo fixou a DII (vide, nesse sentido, a justificativa contida no quesito "2" à f. 118).
A oitiva das testemunhas arroladas não apresenta suporte probatório para fins de constatação de invalidez, apenas servindo para trazer à tona o deplorável comportamento do autor sob o efeito do álcool (f. 175/177).
Sendo assim, ainda que se pudesse acolher o pleito de extensão do "período de graça" para 2 (dois) anos, por conta de suposto desemprego, a pretensão do autor não poderia ser aceita porque, quando da DII, já havia ocorrido a perda da qualidade de segurado, repita-se, porque a primeira internação (único fato objetivo indiciário de invalidez) deu-se em 09/2009.
Aliás, a simples cessação de contrato de trabalho não comprova a situação de desemprego. Nesse diapasão, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADO. PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA. MERA AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO NA CTPS. INSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS DA SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. 1. A ausência de registros na CTPS, só por si, não é suficiente para comprovar a situação de desemprego da parte autora, admitindo-se, no entanto, que tal demonstração possa ser efetivada por outros meios de prova que não o registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social, como a testemunhal. Precedentes: Pet 7.115/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 6/4/2010; AgRg no Ag 1.182.277/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJe 6/12/2010. 2. No caso concreto, no que diz respeito à demonstração da qualidade de segurado do autor, a Corte de origem, ao se louvar, unicamente, na ausência de anotação na CTPS e ter como prorrogado o período de graça, destoou da mencionada jurisprudência. 3. Recurso especial do INSS parcialmente provido, para afastar a possibilidade de reconhecimento da condição de segurado pela mera ausência de registros na CTPS, determinando o retorno dos autos à origem para que oportunize ao autor a produção de provas e, então, julgue a causa como entender de direito (REsp 1338295 / RS, RECURSO ESPECIAL 2012/0101719-0, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, Data do Julgamento 25/11/2014, Data da Publicação/Fonte, DJe 01/12/2014). |
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. QUESTÃO ATRELADA AO REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O Tribunal a quo, com base nos elementos contidos nos autos, concluiu que no momento do óbito não foi comprovado a qualidade de segurado do ora agravante, razão pela qual inviável a concessão do benefício pretendido. 3. A alteração das premissas fáticas contidas no acórdão a quo encontra óbice na Súmula 7/STJ. Precedentes. 4. Ademais, o STJ já se manifestou no sentido de que a simples ausência de registro na CTPS não tem o condão de, por si só, comprovar a situação de desemprego, devendo ser cumulada com outros elementos probatórios. 5. Agravo regimental não provido (AgRg no AREsp 801828 / PE, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL, 2015/0265251-1, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento, 24/11/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 02/12/2015). |
E muito menos pode ser justificado, para comprovar o desemprego, o fato de o autor ter se tornado alcoólatra. A uma, porque o desemprego só existe para quem busca emprego e não encontra, não para quem abre mão do trabalho para satisfazer o vício. A duas, porque, a despeito de alcoolista, o autor só se tornou inválido posteriormente ao período de graça, como exaustivamente analisado acima.
Lícito é reconhecer, como operador do direito, que não se pode simplesmente considerar o alcoolista crônico um impotente perante sua doença, sob pena de se afastar de antemão uma noção ínsita à idéia de civilização: as pessoas são responsáveis por seus atos. E seu ato, consciente, de não mais trabalhar implicará a perda da filiação.
Também é razoável ponderar que o sistema de previdência social, custeado sofridamente não só pelos segurados, mas por toda a população, não tem por essência pagar valores a quem não cuida da própria saúde, ou a quem faz a opção de consumir substâncias qualificadas como drogas, lícitas ou ilícitas.
Nem mesmo socorre o autor o jargão que se tornou lugar comum nas lides previdenciárias, tanto quanto o apelo genérico à dignidade da pessoa humana, denominado "in dubio pro misero", princípio que simplesmente não está acolhido no direito substancial e no processual.
Com relação a tal "princípio", hodiernamente denominado "solução pro misero", consigno que não deve ser usado em previdência social, porquanto "o uso indiscriminado deste princípio afeta a base de sustentação do sistema, afetando sua fonte de custeio ou de receita, com prejuízos incalculáveis para os segurados, pois o que se proporciona a mais a um, é exatamente o que se tira dos outros" (Rui Alvim, Interpretação e Aplicação da Legislação Previdenciária, in Revista de Direito do Trabalho n° 34).
Ademais, "A previdência em si já é um instrumento social, por isso não vinga o pretexto de aplicar a lei com vista no interesse social. Este raciocínio é falso. O interesse social maior é que o seguro funcione bem, conferindo as prestações a que se obrigou. Se lhe é transmitida uma carga acima do previsto, compromete-se a sua liquidez financeira: ponto nevrálgico da eficiência de qualquer seguro. O prius que se outorga sairá do próprio conjunto de segurados, em virtude da pulverização do risco entre eles. Nesta circunstância o seguro se torna custoso e socialmente desinteressante, indo refletir no preço dos bens produzidos, influindo de maneira maléfica sobre os demais contribuintes, os quais têm de suportar o que se outorga alargando as obrigações do órgão segurador em favor de pretensões lamuriosas" (Elcir Castello Branco, Segurança Social e Seguro Social, 1º volume, Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda, 1975, São Paulo, páginas 127/128).
Deve ser mantida, assim, a r. sentença no tocante à concessão do benefício assistencial a contar do ajuizamento da ação, tendo em vista a ausência de remessa oficial e de recurso do INSS nesse ponto.
Quanto à multa aplicada aos embargos de declaração, deve ser mantida, ante o caráter infringente da pretensão recursal, com intuito evidentemente protelatório, na forma do artigo 1.026, § 2º, do NCPC.
O julgado afastou, fundamentadamente, certas conclusões de uma das perícias, acolhendo as conclusões da outra, mas a parte autora, não se conformando, interpôs recurso descabido com intuito puramente infringente, fora das hipóteses legais.
Infelizmente verifica-se em todos os tribunais do país manifesto abuso na interposição de recursos, inclusive nos embargos de declaração, amiúde em detrimento do interesse do próprio cliente, que se vê privado, por ainda mais tempo, do acesso aos atrasados a que faz jus.
No caso, os embargos de declaração foram interpostos como se se tratasse de recurso infringente, visando ao simples reexame da causa, gerador de prolongamento desnecessário do procedimento, colaborando para o congestionamento de feitos na Justiça, por isso devendo ser mantida a multa cominada.
Quanto à justiça gratuita, a toda evidência não possui o condão de afastar a multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do NCPC.
Diante do exposto, nego provimento ao agravo.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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