Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5043423-46.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
11/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/03/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL DE DECISÃO MONOCRÁTICA. ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO DA TURMA. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL.
PROVAS INCONTESTES. BENEFÍCIO DEVIDO. DECISÃO FUNDAMENTADA NA LEGISLAÇÃO
DE REGÊNCIA SOBRE A MATÉRIA. AGRAVO IMPROVIDO.
1.Considerando presentes os requisitos estabelecidos na Súmula/STJ n.º 568 -O relator,
monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso
quando houver entendimento dominante acerca do tema. (Súmula 568, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/03/2016, DJe 17/03/2016)-, assim como, por interpretação sistemática e
teleológica, aos artigos 1º a 12º, c.c o artigo 932, todos do Código de Processo Civil/2015,
conclui-se que no caso em análise é plenamente cabível decidir-se monocraticamente.
2.A concessão do benefício está baseada na prova colhida que tornou inconteste o direito do
autor a auferir o benefício pleiteado.
3.Recurso meramente protelatório.
4.Agravo improvido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5043423-46.2018.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO CARDOSO PIRES
Advogado do(a) APELADO: REINALDO DANIEL RIGOBELLI - SP283124-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5043423-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO CARDOSO PIRES
Advogado do(a) APELADO: REINALDO DANIEL RIGOBELLI - SP283124-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo interno contra a r. decisão monocrática deste Relator que negou provimento
ao recurso interposto pelo INSS, para manter a concessão de aposentadoria rural a João
Cardoso Pires, com consectários legais.
Alega-se, primeiramente, a impossibilidade da forma monocrática da decisão não ocorrendo
hipóteses previstas no art.932, do CPC, devendo ser submetida a decisão ao órgão colegiado.
Pondera a necessidade do esgotamento das instâncias.
No mérito, aduz não comprovado o tempo de serviço rural pleiteado pelo autor, inexistindo prova
da imediatidade anterior do labor rural em relação ao implemento de idade e requerimento
administrativo.
Requer reconsideração da decisão ou que seja submetida à apreciação do órgão colegiado.
Com contrarrazões vieram os autos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5043423-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO CARDOSO PIRES
Advogado do(a) APELADO: REINALDO DANIEL RIGOBELLI - SP283124-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O agravo não merece provimento.
Veja-se o teor da decisão recorrida que veio devidamente fundamentada nos pontos de
controvérsia trazidos no recurso.
“De início, observo que a r. sentença impugnada foi proferida na vigência do CPC/2015.
Considerando presentes os requisitos estabelecidos na Súmula/STJ n.º 568 -O relator,
monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso
quando houver entendimento dominante acerca do tema. (Súmula 568, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/03/2016, DJe 17/03/2016)-, assim como, por interpretação sistemática e
teleológica, aos artigos 1º a 12º, c.c o artigo 932, todos do Código de Processo Civil/2015,
concluo que no caso em análise é plenamente cabível decidir-se monocraticamente, mesmo
porque o julgamento monocrático atende aos princípios da celeridade processual e da
observância aos precedentes judiciais, sendo ainda passível de controle por meio de agravo
interno (artigo 1.021 do CPC/2015 ), cumprindo o princípio da colegialidade.
Feita essa breve introdução, passo à análise do caso concreto.
Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988
e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em seu
artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando este
completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei
Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de
trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos
anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido
em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal" - grifo nosso.
Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos
de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido os
requisitosetárioe deefetivo exercício de atividade ruralpelo período de carência do benefício
pretendido -conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei-, para que homens e
mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput sãoreduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei" - grifei.
Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial -
isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor de
um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período legal de
carência do benefício, "verbis":
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a
concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86,
desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período,
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes
à carência do benefício requerido".
Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial -
produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus ao
benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade
rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no
inciso VII do art. 11 desta Lei".
Conclui-se, portanto, que o benefício deaposentadoria por idade ao trabalhador ruralestá
disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação da
idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural, mesmo
que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela Lei.
Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício em
questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela
jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "verbis":
"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado,
desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes
para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua
redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o
crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor.
No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada
dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini,
v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome
daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é
possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de
documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da
família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja
eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio
rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua
necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de
pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o
exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa
descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é
suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configuranumerus
clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ
23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e
sua aceitação.
Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que
a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, tal como estabelecido no art. 143 da Lei nº 8.213/91, com redação
alterada pela Lei nº 9.063/95.
Adoto o entendimento de que há exigência de que o tempo de trabalho rural deva ser exercido no
período imediatamente anterior ao requerimento. Nesse sentido o julgado em Recurso Repetitivo
do Superior Tribunal de Justiça. REsp nº 1.354.908/SP:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.
REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991.
REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)"
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de
promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse
aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria
para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da
prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do
período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de
segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever
de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no
varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado
especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva.
Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não
constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido
exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde
campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e
coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido
no período.(TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-
92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro
de 2015, v.u).
No mesmo sentido: Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO JORDAN,
TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2104.
Do caso dos autos.
Na inicial, pondera a parte autora que é e sempre foi trabalhadora rural, exercendo sempre a
função de rurícola.
A parte autora, João Cardoso Pires, nasceu em 03/05/1955 e completou o requisito idade mínima
(60 anos) em 03/05/2015, devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por,
no mínimo, 180 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou:
Documentos pessoais;
CTPS com anotações de vínculos empregatícios rurais de 1986 a 2008 e 12/2013 a 02/2014;
Informação do sistema DATAPREV em nome do autor de concessão de auxílio-doença
acidentário de trabalhador rural em 1991;
Informativos do CNIS com as anotações da CTPS até 2016;
Documento de rescisão de contrato de trabalho na cultura de café no ano de 2000;
Indeferimento do pedido administrativo requerido em 10/05/2016.
Os documentos evidenciam o labor rural e servem como início razoável de prova material.
A contagem de atividade rural incontroversa computa 23 anos e 2 meses de contribuições, além
dos 15 anos necessários para concessão do benefício.
O recurso não merece provimento.
Primeiramente, não há falar-se em expiração de vigência em relação ao benefício após 2010.
Nesse aspecto, cumpre esclarecer que, do entendimento combinado dos artigos 2º e 3º da Lei
11.718/08, infere-se que não há estabelecimento de prazo decadencial para a hipótese de
aposentadoria rural por idade após 31.12.2010, mas tão somente o estabelecimento de regras
específicas a serem aplicadas para a comprovação de atividade rural após este prazo. Nesse
sentido, já decidiu a C. Décima Turma:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA
POR IDADE RURAL. EMPREGADOS E AUTÔNOMOS. REGRA TRANSITÓRIA. DECADÊNCIA .
AFASTAMENTO. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO.
1. Com o advento das Leis 9.032/95 e 9.063/95, as regras dos Arts. 39, I, e 143, ambos da LOPS,
tornaram-se idênticas, sendo indiferente o fundamento à concessão do benefício, durante o lapso
compreendido entre essas leis e o término do prazo previsto no Art. 143 da Lei 8.213/91. Com o
decurso do mencionado prazo de 15 anos, o benefício deve ser concedido com base no Art. 39, I,
da mesma lei.
2. As Leis 11.363/06 e 11.718/08 somente trataram de estender a vigência da regra de transição
para os empregados rurais e autônomos, porque, para esses segurados, o Art. 48 da Lei
8.213/91, ao contrário do citado Art. 39, refere-se ao cumprimento da carência, devendo a renda
mensal ser não de um salário mínimo, mas calculada de acordo com os salários-de-contribuição.
3. Ainda assim, não previu o legislador a decadência para a hipótese de pedido de aposentadoria
por idade formulado por empregados e autônomos, após 31/12/10. O que a Lei 11.718/08 trouxe
a esses segurados foi mais uma regra transitória.
4. O Ministério da Previdência Social emitiu parecer, vinculativo aos Órgãos da Administração
Pública (Parecer 39/06), pela repetição da regra do Art. 143 no Art. 39, I, da Lei 8213/91, havendo
incongruência, portanto, em o Judiciário declarar a decadência do direito de o autor pleitear a
aposentadoria por idade, quando, na seara administrativa, o pleito é admitido com base no Art.
39, I, da Lei 8213/91, nos mesmos termos em que vinha sendo reconhecido o direito com fulcro
no Art. 143 da mesma lei.
5. Apelação provida para afastar a prejudicial de mérito ( decadência ) e determinar o
prosseguimento da ação em seus ulteriores termos.
(TRF3. Décima Turma. AC 0019725-43.2011.4.03.9999. Rel. Des. Fed. Baptista Pereira. J.
04.10.2011. DJE 13.10.2011, p. 2079).
Por sua vez, de acordo com o estabelecido no art. 3º da Lei 11.718/08, a partir de 01.01.2011 há
necessidade de recolhimento das contribuições previdenciárias, uma vez que o período de 15
anos a que se refere o artigo 143 da Lei nº 8.213/91 exauriu-se em 31.12.2010, conforme
disposto no artigo 2º da Lei nº 11.718/08, que assim dispõe:
"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de
julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Da leitura do artigo acima, depreende-se que a prorrogação do prazo mencionado diz respeito
somente aos empregados, não se referindo aos segurados especiais que desenvolvam sua
atividade em regime de economia familiar. Neste aspecto, também já decidiu a 10ª Turma,
conforme julgado acima transcrito, ao discorrer acerca da exclusão dos segurados especiais no
que diz respeito às novas regras trazidas pela Lei nº 11.718/08, verbis:
As Leis 11.363/06 e 11.718/08 somente trataram de estender a vigência da regra de transição
para os empregados rurais e autônomos, porque, para esses segurados, o artigo 48 da Lei
8.213/91, ao contrário do citado artigo 39, refere-se ao cumprimento da carência, devendo a
renda mensal ser não de um salário mínimo, mas calculada de acordo com os salários-de-
contribuição. (item 2 da ementa)
E do referido acórdão, peço vênia para transcrever trecho de seu voto, que muito bem elucida a
questão, nos seguintes termos:
A exclusão (dos segurados especiais que trabalham em regime de economia familiar) foi
intencional. Intencional porque, diante do regramento contido no Art.39, I, da Lei 8213/91,
desnecessário qualquer outro dispositivo garantindo a aposentadoria por idade ao produtor em
regime de economia familiar, no valor de um salário-mínimo, sem o cumprimento da carência, ou
seja, sem a demonstração do recolhimento das contribuições obrigatórias
(...)
Vale acrescentar que o Ministério da Previdência Social emitiu parecer, vinculativo aos Órgãos da
Administração Pública (Parecer 39/06), pela repetição da regra do Art. 143 no Art. 39, I, da Lei
8213/91, havendo incongruência, portanto, em o Judiciário declarar a decadência do direito de o
autor pleitear a aposentadoria por idade, quando, na seara administrativa, o pleito é admitido com
base no Art. 39, I, da Lei 8213/91, nos mesmos termos em que vinha sendo reconhecido o direito
com fulcro no Art. 143 da mesma lei.
Afasto, pois, a premissa aduzida no recurso pela autarquia.
Da análise da prova, vejo demonstrado que a parte autora trabalhou em propriedade rural com
predominância em estabelecimentos agrícolas, a evidenciar o efetivo exercício de atividade rural
nos diversos períodos anotados nos documentos, CTPS e CNIS.
É o que se extrai também da documentação trazida que demonstra o labor rural inclusive
anteriormente ao ano de quando completou a idade necessária à obtenção da aposentadoria no
ano de 2015 e 2016 (data do requerimento administrativo e do implemento de idade necessária à
aposentadoria), estando presente a qualidade de segurado.
As provas são suficientes, interpretada a atividade rurícola também pela prova testemunhal que
demonstra a atividade rural, como comprovação de cumprimento do prazo de carência, uma vez
que pelo requisito de comprovação de imediatidade do trabalho rural anteriormente ao
implemento de idade estabelece-se a necessidade de comprovação do labor rural do período de
15 anos até 2015 ou 2016, o que está demonstrado nos autos especificados os locais nos quais o
autor trabalhou.
As testemunhas ouvidas em juízo prestaram depoimentos suficientes à comprovação necessária
dos requisitos para a aposentadoria, diante do trabalho efetivo como rurícola em período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício pelo período de carência (art.143 da Lei nº
8.213/91) e disseram que a autora trabalhou no meio rural.
Assim, a parte autora comprovou que o trabalho rural foi predominante ao longo de sua vida
profissional.
Dessa forma, preenchidos os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por idade
pleiteado, devendo ser mantida a concessão da aposentadoria.”.
(...)
Nesse passo, a decisão não é passível de retificação, uma vez que analisada a prova
devidamente, à luz da legislação de regência que a fundamentou.
Também no que diz com a forma monocrática de decidir, as razões estão expostas no preâmbulo
da decisão, o que vem sendo o entendimento do órgão colegiado desta C. Turma.
Desse modo, evidencia-se o caráter meramente procrastinatório do recurso, diante da análise
integral dos pontos controvertidos, a afastar o provimento do presente agravo.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL DE DECISÃO MONOCRÁTICA. ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO DA TURMA. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL.
PROVAS INCONTESTES. BENEFÍCIO DEVIDO. DECISÃO FUNDAMENTADA NA LEGISLAÇÃO
DE REGÊNCIA SOBRE A MATÉRIA. AGRAVO IMPROVIDO.
1.Considerando presentes os requisitos estabelecidos na Súmula/STJ n.º 568 -O relator,
monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso
quando houver entendimento dominante acerca do tema. (Súmula 568, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/03/2016, DJe 17/03/2016)-, assim como, por interpretação sistemática e
teleológica, aos artigos 1º a 12º, c.c o artigo 932, todos do Código de Processo Civil/2015,
conclui-se que no caso em análise é plenamente cabível decidir-se monocraticamente.
2.A concessão do benefício está baseada na prova colhida que tornou inconteste o direito do
autor a auferir o benefício pleiteado.
3.Recurso meramente protelatório.
4.Agravo improvido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao agravo, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA