
D.E. Publicado em 18/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer do agravo retido e, no mérito, negar-lhe provimento e dar provimento apelação da parte autora para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e, com isso, julgando procedente a ação, de forma a condenar a autarquia previdenciária na implantação e pagamento dos atrasados de benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação do auxílio-doença (04/02/2008), sobre os quais incidirão juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e correção monetária apurada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, além de condenar o INSS no pagamento de honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta decisão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019155-23.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento de benefício de auxílio-doença ou de, alternativamente, concessão de aposentadoria por invalidez.
Contra decisão de fl. 40, a qual negou pedido de antecipação da tutela, a parte autora interpôs agravo de instrumento, às fls. 43/52, tendo sido deferida a antecipação dos efeitos da tutela recursal, determinando-se o imediato restabelecimento do auxílio-doença (fls. 57/59). A decisão foi confirmada por esta Egrégia Turma (fl. 123/125-verso).
Implantado o benefício, conforme ofício de fls. 79/80.
Perícia acostada às fls. 95/99. Laudo do assistente técnico do INSS às fls. 100/103.
Às fls. 106/116, a parte autora requereu nova prova técnica, a ser realizada por médico dermatologista. Reiterado o pedido às fls. 120/121.
Determinou-se a expedição de ofício à Comarca de Araraquara/SP para realização do referido exame à fl. 139. Decisão do Juízo Federal da Comarca de Araraquara/SP, à fl. 161, negando a realização da prova técnica, corroborado por decisão de fl. 164.
Agravo retido interposto pela parte autora contra decisão de fl. 169, que deu prosseguimento ao feito sem a realização de perícia por médico especialista (fls. 172/173).
Juntada de exames pela parte autora às fls. 176/185.
A r. sentença, de fls. 192/194, julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, ante a ausência de incapacidade, com a consequente cassação do benefício de auxílio-doença implantado em razão da tutela antecipada anteriormente concedida. Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Em razões recursais de fls. 197/204, a parte autora, preliminarmente, reitera as alegações deduzidas no agravo retido e pugna pela anulação da sentença, em virtude de cerceamento de defesa. No mérito, sustenta o preenchimento dos requisitos legais para a concessão dos benefícios ora vindicados.
Benefício de auxílio-doença cessado à fl. 212.
Petição da autora requerendo nova perícia médica (fls. 215/230).
Sem contrarrazões (fl. 231).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Decisão acolheu, em parte, pleito deduzido no agravo retido e reiterado nas razões do apelo, convertendo o julgamento em diligência para a realização de perícia na área de infectologia (fl. 236).
Nova perícia às fls. 251/258, com complemento de fls. 288/292.
A parte autora pugna pela realização de nova prova técnica (fls. 298/307).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, afasto a alegação de cerceamento de defesa deduzida no agravo retido e reiterada nas razões de apelo, eis que foram realizadas duas perícias judiciais nos presentes autos, fato incomum na grande maioria dos processos que versam sobre esta matéria.
Ainda que não realizada a perícia por médico infectologista, como determinado à fl. 236, entendo que o expert cumpriu integralmente as determinações exaradas pela antiga relatora do caso. Isso porque, por se tratar de processo envolvendo benefício por incapacidade, profissional especialista em medicina legal e perícia médica, é o mais apto para verificar a existência ou não de impedimento laboral.
Como bem observou o perito judicial, em complemento a laudo de fls. 288/292, "o Conselho Federal de Medicina criou a especialidade Medicina Legal e Perícia Médica, separando a área pericial da assistencial. Não há mais a habilitação em perícia médica nas várias especialidades assistenciais. É o médico-perito que tem a aptidão para analisar capacidade/incapacidade".
Ademais, os laudos periciais prestaram todas as informações necessárias à formação da convicção dos julgadores. Não é direito subjetivo da parte, a pretexto de supostos esclarecimentos, a formulação de indagações outras, ou a realização de nova prova técnica, tão só porque a conclusão médica que lhe foi desfavorável.
Superada a matéria preliminar, avanço ao meritum causae.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
In casu, resta incontroverso a qualidade de segurado da parte autora e o cumprimento da carência legal, eis que a ação visa o restabelecimento de auxílio-doença, e, por consequência, na data de sua interrupção, a autora estava em gozo de benefício, enquadrando-se na hipótese do já mencionado art. 15, I, da Lei 8.213/91.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame pericial de fls. 95/99, diagnosticou a parte autora como portadora "do vírus da imunodeficiência humana adquirida (HIV) - CID - B24".
Atestou o expert que a demandante não se apresenta incapacitada para o trabalho no momento.
Conforme mencionado alhures, convertido o julgamento em diligência, foi realizada nova prova técnica, às fls. 251/258, com complemento de fls. 288/292, que também se manifestou pela ausência de impedimento laboral.
Saliento, no entanto, que a análise da incapacidade para o labor, no caso da imunodeficiência adquirida, deve se dar à luz das ocupações funcionais habituais do seu portador, do seu grau de escolaridade, do potencial exibido para recolocação profissional e reabilitação e, por fim, do ambiente profissional de convivência, eis que muitos dos portadores do vírus HIV, ainda que assintomáticos, não têm oportunidades de trabalho e são marginalizados pela sociedade, sofrendo com os constrangimentos, preconceitos e estigmas que giram em torno da doença; apresentam debilidades físicas e psicológicas; e, em razão do coquetel que são submetidos, passam por diversos efeitos colaterais, com náuseas e fadigas que dificultam o exercício de atividade laboral.
Pois bem, no caso em apreço, verifico que a parte autora sempre desempenhou atividades braçais (auxiliar de serviços gerais, ajudante geral e trabalhador rural - CTPS de fls. 38/39 e CNIS anexo) e, provavelmente, vive em um ambiente social hostil a referida patologia, no qual a AIDS é estigmatizada, sobretudo, em razão do desconhecimento acerca de sua forma de transmissão, decorrente da própria condição socioeconômica das pessoas que fazem parte do seu convívio. Além do mais, os últimos 2 (dois) vínculos exibidos pela autora dão conta de que exercia a função de colhedora de frutas, circunstância, ao meu sentir, que a expõe aos riscos de lesões e que, diante disso, certamente, dificulta futuras contratações.
Destaco, do segundo laudo pericial, o seguinte trecho: "Maio 2014. Ao perito do INSS. Paciente Sra. Maria Elisabete de Oliveira com 49 anos é portadora de doença crônica e incurável causada por um retrovírus. Em tratamento há mais ou menos 8 anos, usando Biovir 12/12h + Efavirenz ?, com última carga viral negativo CD4 591, referindo 'ilegível', poliqueixas e incapacidade laborativa. Solicito avaliação do perito (Dr. Ricardo A. Santos, CRM 118.814)" (fls. 254/255).
O CNIS da autora, que ora faço juntar aos autos, revela que o trabalho para prover a subsistência sempre integrou o seu cotidiano e o afastamento profissional coincide com o diagnóstico "anti-HIV positivo", com as três pneumonias contraídas e com as lesões ulceradas.
Colaciono decisão desta Egrégia Turma nesse sentido:
Dessa forma, ao meu sentir, pelo diagnóstico apresentado, a falta de qualificação profissional, as últimas atividades remuneradas exercidas, o histórico laborativo indicativo da busca do autossustento por meio de sua força de trabalho e o ambiente profissional de convívio, tenho por presente a incapacidade absoluta e definitiva para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Acerca do termo inicial do benefício, o entendimento consolidado do E. STJ é de que, "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida" (Súmula 576).
Nessa senda, em razão de pedido de prorrogação de auxílio-doença e sua posterior negativa (fl. 23), fixo a data do início (DIB) da aposentadoria por invalidez quando da cessação do benefício anterior.
Quanto aos consectários legais, os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso também deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Relativamente à verba patronal, inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ), que ora determino.
Ante o exposto, conheço do agravo retido e, no mérito, nego-lhe provimento e dou provimento à apelação da parte autora para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e, com isso, julgando procedente a ação, de forma a condenar a autarquia previdenciária na implantação e pagamento dos atrasados de benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação do auxílio-doença (04/02/2008), sobre os quais incidirão juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e correção monetária apurada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, além de condenar o INSS no pagamento de honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ).
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 05/07/2017 19:20:30 |