D.E. Publicado em 29/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor no período de 19/11/2003 a 31/12/2009, determinando à Autarquia que proceda à respectiva averbação, para fixar a sucumbência recíproca, nos termos do disposto no art. 21 do CPC/73, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau, e, por fim, para revogar a tutela concedida, autorizando a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela parte autora a título de tutela antecipada, nestes próprios autos, após regular liquidação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001460-57.2010.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por CLAUDEMIR APARECIDO ZANI, em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria especial, prevista no artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
Concedida a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 64/68).
A r. sentença de fls. 101/103-verso julgou improcedente o pedido, e condenou a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no valor de R$300,00, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita. Revogada a antecipação de tutela.
Em razões recursais de fls. 109/115, a parte autora pleiteia a reforma da r. sentença, ao argumento de que o fornecimento de equipamento de proteção individual não afasta o caráter especial da atividade, uma vez que "não há a comprovação do efetivo uso". Aduz ainda que, no caso do agente agressivo ruído, "ainda que tivesse ocorrido o uso, o EPI não descaracteriza a nocividade". Pugna pela total procedência da ação, com a concessão da aposentadoria especial.
Devidamente processado o recurso, sem o oferecimento das contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão do benefício de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do labor no período compreendido entre 24/04/1984 e 15/01/2010.
Compulsando os autos, verifica-se que a autarquia previdenciária reconheceu a especialidade do labor desempenhado no período de 24/04/1984 a 05/03/1997 ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" às fls. 48/49), motivo pelo qual referido lapso deve ser tido como incontroverso.
Quanto ao período controvertido, compreendido entre 06/03/1997 e 15/01/2010, o autor instruiu a presente demanda com o Laudo Técnico Pericial de fl. 43 e com o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP constante de fls. 44/45 e 59/60, os quais informam que, no exercício da função de "construtor de pneus", junto à empresa "Goodyear do Brasil - Produtos de Borracha Ltda", esteve exposto ao agente agressivo ruído nas seguintes intensidades e períodos:
1) 86,1 dB (A), de 06/03/1997 a 31/12/2002;
2) 86,8 dB(A), de 01/01/2003 a 31/12/2004;
3) 86,9 dB(A), de 01/01/2005 a 31/12/2005;
4) 87,1 dB(A), de 01/01/2006 a 31/12/2006;
5) 86,5 dB(A), de 01/01/2007 a 31/12/2007;
6) 88,4 dB(A), de 01/01/2008 a 31/12/2008;
7) 86,2 dB(A), de 01/01/2009 a 31/12/2009.
Com efeito, a aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo que no período compreendido entre 19/11/2003 e 31/12/2009 (termo final dos registros ambientais constantes do PPP de fls. 59/60), merece ser acolhido o pedido do autor de reconhecimento da especialidade do labor, eis que desempenhado com sujeição a nível de pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente à época da prestação dos serviços, conforme quadro de limite de tolerância constante da fundamentação supra. Por outro lado, impossível o cômputo de tempo especial para o período compreendido entre 06/03/1997 e 18/11/2003, uma vez que não se enquadra nas exigências legais acima delineadas.
Somando-se a atividade especial ora reconhecida, verifica-se que o autor alcançou 18 anos, 11 meses e 25 dias de serviço especial (vide planilha em anexo), tempo nitidamente insuficiente para a concessão da aposentadoria pleiteada na inicial, restando improcedente a demanda quanto a este ponto específico.
Por sua vez, merece acolhida, em parte, o pedido do autor no sentido de que a autarquia previdenciária seja compelida a reconhecer e averbar, como tempo especial de labor, o período de 19/11/2003 a 31/12/2009.
Informações extraídas do Sistema Único de Benefícios/DATAPREV, anexas a este voto, noticiam a implantação da aposentadoria especial, concedida nesta demanda por meio de tutela antecipada (NB 1.458.153.603). Assim, a situação dos autos adequa-se àquela apreciada no recurso representativo de controvérsia - REsp autuado sob o nº 1.401.560/MT.
O precedente restou assim ementado, verbis:
Revogo os efeitos da tutela antecipada e aplico, portanto, o entendimento consagrado pelo C. STJ no mencionado recurso repetitivo representativo de controvérsia e reconheço a repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora por força de tutela de urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.
Ante a sucumbência recíproca, deixo de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas por ser o autor beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, tão somente para reconhecer a especialidade do labor no período de 19/11/2003 a 31/12/2009, determinando à Autarquia que proceda à respectiva averbação, e para fixar a sucumbência recíproca, nos termos do disposto no art. 21 do CPC/73, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau. Revogo a tutela concedida e autorizo a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela parte autora a título de tutela antecipada, nestes próprios autos, após regular liquidação.
Comunique-se o INSS.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 20/09/2017 16:24:06 |