Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5108735-61.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
28/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. VIGILANTE. AGENTES QUÍMICOS. RUÍDO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS
PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- No caso, restou comprovada a atividade de vigia em parte dos períodos controvertidos.
Possibilidade de enquadramento por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7
do Quadro Anexo do Decreto n. 53.831/1964), independentemente de o segurado portar arma de
fogo no exercício de sua jornada laboral.
- “Perfis Profissiográficos Previdenciários” – PPPs e laudos técnicos indicam a exposição habitual
e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância previstos nas normas
regulamentares e a agentes químicos tóxicos orgânicos, situação que se amolda aos códigos
1.1.6, 1.2.11 do anexo do Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.10 do anexo do Decreto n.
83.080/1979, 1.0.17 e 2.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise
quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Incabível o enquadramento do interstício em que não restou comprovada a exposição a agentes
nocivos, nos moldes dos decretos regulamentares.
- A parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991, desde a data do requerimento administrativo.
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado. A fixação do percentual da
verba honorária pode ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao
disposto nos §§ 3º e 11, além do inciso II do § 4º, todos do artigo 85, do CPC, nos termos da
sentença. Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual se comporá
apenas do valor das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença,
em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Remessa oficial não conhecida.
- Preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5108735-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROMILDO ONOFRE MOREIRA
Advogado do(a) APELADO: ELIAS EVANGELISTA DE SOUZA - SP250123-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5108735-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROMILDO ONOFRE MOREIRA
Advogado do(a) APELADO: ELIAS EVANGELISTA DE SOUZA - SP250123-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com
vistas à concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo
de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido, para enquadrar como atividade especial os períodos de
01/06/1982 a 23/09/1982, 15/10/1982 a 22/02/1983, 01/07/1983 a 12/05/1984, 20/06/1984 a
02/01/1990, 15/01/1991 a 07/06/1991, 26/06/1991 a 30/11/1992, 18/01/1993 a 24/05/1993,
18/05/1993 a 21/01/2000, 01/02/2001 a 12/01/2004, 15/01/2004 a 31/07/2009, 03/11/2009 a
28/03/2014, 01/06/2011 a 01/08/2012, 02/01/2014 a 22/07/2016, bem como determinar a
concessão da aposentadoria pleiteada, se preenchidos os requisitos, desde a data do
requerimento administrativo (DER). Fixados os consectários. Decisão submetida ao reexame
necessário.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual sustenta a nulidade do julgado, por
considerá-lo condicional. No mérito, impugna os enquadramentos efetuados e requer a
improcedência do pedido. Subsidiariamente, insurge-se contra o termo inicial do benefício.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5108735-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROMILDO ONOFRE MOREIRA
Advogado do(a) APELADO: ELIAS EVANGELISTA DE SOUZA - SP250123-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil (CPC), cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários
mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática
prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Ainda, não prospera a preliminar de nulidade aventada no tocante ao julgamento ser
condicional. Nesse sentido, na decisão recorrida estão presentes os requisitos previstos nos
artigos 489 e 490, do CPC.
Dessa forma, rejeito a matéria preliminar arguida pelo INSS.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ,
AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Neste caso, no tocante aos interregnos controvertidos de 01/06/1982 a 23/09/1982 e
01/07/1983 a 12/05/1984, consta Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) e laudo
técnico, os quais anotam o ofício de “vigia”, fato que permite o enquadramento por analogia à
função de “guarda”, tida por perigosa, independentemente do porte de arma de fogo, nos
termos do código 2.5.7 do anexo do Decreto n. 53.831/1964 (AREsp n. 623928/SC, 2ª Turma,
Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJU 18/3/2015).
Quantos aos períodos de 20/06/1984 a 02/01/1990, 18/05/1993 a 05/03/1997, 19/11/2003 a
12/01/2004, 15/01/2004 a 31/07/2009, 03/11/2009 a 28/03/2014 e 02/01/2014 a 22/07/2016,
consta dos PPPs e laudo técnico que a parte autora exercia suas atividades com exposição
habitual e permanente ao agente nocivo “ruído” em níveis superiores aos limites previstos nas
normas em comento.
Ademais, o labor especial não pode ser afastado em razão da metodologia utilizada para a
aferição do ruído. Os registros ambientais constantes dos formulários, expedido por engenheiro
ou médico do trabalho, indicam a metodologia usada para medição, sendo que a fidedignidade
das informações está sob a responsabilidade do empregador ou de seu representante legal.
Nesse sentido, já decidiu a 3ª Seção deste Tribunal: Ap - APELAÇÃO - 5000006-
92.2017.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado
em 21/6/2018, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/6/2018.
Em relação aos interstícios controversos de 15/10/1982 a 22/02/1983, 15/01/1991 a 07/06/1991,
26/06/1991 a 30/11/1992, 18/01/1993 a 24/05/1993, 18/05/1993 a 21/01/2000, 01/02/2001 a
12/01/2004, 15/01/2004 a 31/07/2009, 03/11/2009 a 28/03/2014, 02/01/2014 a 22/07/2016, a
parte autora também logrou comprovar, via PPP e laudos técnicos, que esteve exposta, de
forma habitual e permanente, a agentes químicos deletérios (hidrocarbonetos aromáticos e
álcalis cáusticos), fato que se amolda aos itens 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e
1.0.17 do anexo do Decreto n. 3.048/1999.
Sobre o tema, cabe destacar que os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes
químicos, em especial os hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativa
(TRF-4 - APELREEX: 50611258620114047100 RS 5061125-86.2011.404.7100, Relator:
(Auxílio Vânia) PAULO PAIM DA SILVA, Data de Julgamento: 09/07/2014, SEXTA TURMA,
Data de Publicação: D.E. 10/07/2014); (TRF-1- AC: 00435736820104013300 0043573-
68.2010.4.01.3300, Relator: JUIZ FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de
Julgamento: 14/12/2015, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de
Publicação: 22/01/2016 e-DJF1 P. 281).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Por outro lado, quanto ao interstício de 01/06/2011 a 01/08/2012, concomitante com outros
intervalos acima reconhecidos, merece guarida a irresignação da autarquia, uma vez que não
comprovada a exposição a agentes nocivos, nos moldes dos decretos regulamentares.
Inclusive, na fase de instrução, a parte autora requereu expressamente o cômputo do referido
período como tempo comum (Id. 161496163).
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial da atividade executada
apenas nos interregnos de 01/06/1982 a 23/09/1982, 15/10/1982 a 22/02/1983, 01/07/1983 a
12/05/1984, 20/06/1984 a 02/01/1990, 15/01/1991 a 07/06/1991, 26/06/1991 a 30/11/1992,
18/01/1993 a 24/05/1993, 18/05/1993 a 21/01/2000, 01/02/2001 a 12/01/2004, 15/01/2004 a
31/07/2009, 03/11/2009 a 28/03/2014 e 02/01/2014 a 22/07/2016.
Nessas circunstâncias, somados os interstícios ora reconhecidos (removidos os intervalos
concomitantes), a parte autora conta mais de 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade
especial e, desse modo, faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos
termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Do termo inicial
Sobre o termo inicial do benefício, algumas considerações devem ser feitas.
De plano, como a comprovação da atividade debatida ocorreu apenas nestes autos, por meio
de prova não submetida à prévia apreciação administrativa, penso ser adequada a fixação do
termo inicial dos efeitos financeiros na data da citação, momento em que a autarquia teve
ciência da pretensão, em sua plenitude, e a ela pôde resistir.
Quanto a esse aspecto, destaca-se o fato de o Poder Judiciário exercer suas atribuições em
substituição à Administração que deve praticar os atos que lhe são inerentes como atividade
primária.
Vale dizer: preponderantemente, apenas os atos que a Administração deveria, por lei, praticar
podem ser passíveis de controle judicial, sob o enfoque de possível lesão ou ameaça a direito.
Nessa esteira, a concessão de benefício fundada em prova produzida exclusivamente na esfera
judicial, por impedir a Administração de exercer o pleno exercício das atribuições que lhe são
inerentes, afasta a configuração de mora da autarquia e a possibilidade de fixação do termo
inicial na data do requerimento administrativo.
Afinal, a insuficiência ou inaptidão de elementos probatórios do direito invocado configura
situação que, de forma indireta, inviabiliza o exercício de atividade própria da Administração.
A propósito, esses mesmos fundamentos foram evocados pelo Ministro Roberto Barroso ao
apreciar, sob o regime da repercussão geral, o RE n. 631.240 e fixar tese sobre a necessidade
de prévio requerimento administrativo nas ações de conhecimentos de cunho previdenciário.
Confira-se o seguinte trecho do voto:
“17. Esta é a interpretação mais adequada ao princípio da separação de Poderes. Permitir que
o Judiciário conheça originariamente de pedidos cujo acolhimento, por lei, depende de
requerimento à Administração significa transformar o juiz em administrador, ou a Justiça em
guichê de atendimento do INSS, expressão que já se tornou corrente na matéria. O Judiciário
não tem, e nem deve ter, a estrutura necessária para atender às pretensões que, de ordinário,
devem ser primeiramente formuladas junto à Administração. O juiz deve estar pronto, isto sim,
para responder a alegações de lesão ou ameaça a direito. Mas, se o reconhecimento do direito
depende de requerimento, não há lesão ou ameaça possível antes da formulação do pedido
administrativo. Assim, não há necessidade de acionar o Judiciário antes desta medida....”
Não obstante o entendimento acima consignado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em
incidente de uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 14, § 4º, da Lei n. 10.259/2001,
ao tratar especificamente da matéria, deliberou pela prevalência da seguinte orientação (g. n.):
“A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não tem
o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao
benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os
requisitos para a concessão da aposentadoria”. (Pet 9.582/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 16/09/2015)
No mesmo sentido são os recentes julgados da Corte Superior: REsp 1.859.330/CE, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 31/8/2020;
AgInt no REsp 1.609.332/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado
em 19/03/2019, DJe 26/3/2019.
Dessa forma, curvo-me ao entendimento do STJ para manter o termo inicial da concessão do
benefício na data do requerimento administrativo (DER – 12/11/2015).
Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado. A fixação do percentual da
verba honorária pode ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao
disposto nos §§ 3º e 11, além do inciso II do § 4º, todos do artigo 85, do CPC, nos termos da
sentença.
Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual se comporá apenas do
valor das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença, em
consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade
alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, rejeito a matéria preliminar e, no mérito,
dou parcial provimento à apelação do INSS somente para, nos termos da fundamentação,
delimitar o reconhecimento da especialidade aos interstícios de 01/06/1982 a 23/09/1982,
15/10/1982 a 22/02/1983, 01/07/1983 a 12/05/1984, 20/06/1984 a 02/01/1990, 15/01/1991 a
07/06/1991, 26/06/1991 a 30/11/1992, 18/01/1993 a 24/05/1993, 18/05/1993 a 21/01/2000,
01/02/2001 a 12/01/2004, 15/01/2004 a 31/07/2009, 03/11/2009 a 28/03/2014 e 02/01/2014 a
22/07/2016.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. VIGILANTE. AGENTES QUÍMICOS. RUÍDO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS
PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de
jurisdição.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- No caso, restou comprovada a atividade de vigia em parte dos períodos controvertidos.
Possibilidade de enquadramento por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código
2.5.7 do Quadro Anexo do Decreto n. 53.831/1964), independentemente de o segurado portar
arma de fogo no exercício de sua jornada laboral.
- “Perfis Profissiográficos Previdenciários” – PPPs e laudos técnicos indicam a exposição
habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância previstos nas
normas regulamentares e a agentes químicos tóxicos orgânicos, situação que se amolda aos
códigos 1.1.6, 1.2.11 do anexo do Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.10 do anexo do Decreto n.
83.080/1979, 1.0.17 e 2.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999.
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise
quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI
não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Incabível o enquadramento do interstício em que não restou comprovada a exposição a
agentes nocivos, nos moldes dos decretos regulamentares.
- A parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do
artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991, desde a data do requerimento administrativo.
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado. A fixação do percentual da
verba honorária pode ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao
disposto nos §§ 3º e 11, além do inciso II do § 4º, todos do artigo 85, do CPC, nos termos da
sentença. Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual se comporá
apenas do valor das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data da
sentença, em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Remessa oficial não conhecida.
- Preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito,
dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA