D.E. Publicado em 10/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004388-27.2009.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por MARCOS GARCIA, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de trabalho exercido em condições especiais.
A r. sentença de fls. 271/279 julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade do labor no período de 07/10/1980 28/04/1995, convertendo-o de especial em comum, e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (22/10/2004 - fl. 140). Condenou o réu ao pagamento dos atrasados, observada a prescrição quinquenal, com correção monetária calculada na forma do Provimento COGE 64/2005. Juros de mora, devidos desde a citação, à razão de 1% ao mês. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação, na forma da Súmula nº 111 do STJ. Concedida a tutela antecipada. Sentença submetida ao reexame necessário.
Em razões recursais de fls. 285/291, o INSS postula, inicialmente, o a suspensão da decisão que concedeu a tutela antecipada. Pede a reforma da sentença, ao fundamento de não ter sido comprovada a atividade especial alegada na inicial. Aduz, ainda, a impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum para períodos anteriores a dezembro de 1980. Sustenta a necessidade de que seja aplicado ao caso o fator de conversão 1,20. Por fim, requer a modificação dos critérios de incidência dos juros de mora e da correção monetária.
Contrarrazões da parte autora às fls. 294/298.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento da especialidade do trabalho desempenhado no período de 07/10/1980 a 26/02/1999.
Inicialmente, insta salientar que nesta fase processual a análise do pedido de suspensão da antecipação da tutela será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelos recursos de apelação e pela remessa necessária.
Passo a analisar o período de atividade especial suscitado pelo requerente.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
Diante da ausência de recurso do autor, a insurgência está limitada ao período de 07/10/1980 a 28/04/1995.
De acordo com o PPP de fls. 41/43, o autor, no período de 07/10/1980 a 30/04/1997, estava exposto a "vapores de acetona, acetato de etila, benzeno, butanol, diclorometano, dioxano, clorofórmio, n-Hexano, éter etílico, etanol, metanol, piridina, tolueno, iodo, acido acético, acido clorídrico, acido fosfórico, ácido sulfúrico, amoni,a anisaldeido, diazometano", ao desempenhar as funções de "assessor de pesquisas Jr.", "pesquisador químico", "pesquisador químico Sr.", pesquisador e consultor assistente, junto à empresa "Rhodia Poliamida e Especialidade Ltda.".
A documentação apresentada evidencia a exposição a tóxicos orgânicos no período descrito, assim possível de reconhecimento do caráter especial pelo enquadramento, nos itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto 83.080/79 (código 1.2.10). Demais disso, de se frisar que não há, nos autos, qualquer prova de que o uso de EPI, in casu, tenha neutralizado a insalubridade.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrado com especial o período de 07/10/1980 a 28/04/1995.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
Conforme planilha de fl. 265, procedendo ao cômputo do labor especial reconhecido nesta demanda acrescido dos períodos constantes do "resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição", verifica-se que, na data de 22/10/2004, o autor alcançou 33 anos, 10 meses e 09 dias de serviço, o que lhe assegura, a partir de então, o direito à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, uma vez cumpridos os requisitos referentes ao "pedágio" e idade mínima.
O termo inicial do benefício deve ser estabelecido na data do requerimento administrativo (22/10/2004 - fl. 35). Registro, por oportuno que, indeferido o benefício, o autor manejou recurso administrativo (fls. 36/37) e intentou ação anteriormente junto ao Juizado Especial Federal em 2008, tendo sido proposta a presente demanda em 07 de abril de 2009.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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