D.E. Publicado em 26/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, ora tida por interposta, para afastar o reconhecimento da especialidade dos períodos de 18/05/81 a 05/10/81, de 24/05/82 a 18/12/82, de 28/04/83 a 26/12/83, de 03/02/84 a 08/12/88, e entre 01/03/96 e 20/04/99, bem como reformar a r. sentença de origem, para indeferir o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço do autor. Demais disso, em decorrência da sucumbência recíproca, cada parte arcará com os honorários de seus respectivos patronos, mantida, no mais, a r. sentença de 1º grau. Por fim, nega-se provimento à apelação adesiva do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021197-16.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo réu e pelo autor (adesivamente), nos autos da ação previdenciária, pelo rito ordinário, ajuizada por PASCHOAL CROTTE FILHO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum.
A r. sentença de fls. 64/66 julgou procedente o pedido, para reconhecer como especiais os períodos de 14/04/75 a 17/12/76, 02/05/77 a 30/06/79, 10/12/79 a 15/04/80, 18/05/81 a 05/10/81, 24/05/82 a 18/12/82, 28/04/83 a 26/12/83, 03/02/84 a 08/12/88, 16/05/89 a 15/01/94 e de 01/03/96 a 20/04/99, concedendo, ao final, a aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data da citação, acrescidas as parcelas vencidas de correção monetária e juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação, observada a Súmula 111 do C. STJ.
Em razões recursais de fls. 69/76, o INSS pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não comprovou a especialidade do labor questionada na inicial.
Em apelação adesiva, às fls. 90/93, pugna a parte autora pela fixação da DIB na data do ajuizamento do feito.
Contrarrazões da parte autora às fls. 78/89. Transcorrido in albis o prazo do INSS para contra-arrazoar (fl. 95).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 23/11/2009, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a implantar, em favor da parte autora, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data da citação da Autarquia.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais.
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
Quanto aos períodos laborados, respectivamente, nas empresas "Curtume São Manuel Ltda." (de 14/04/75 a 17/12/76, 02/05/77 a 30/06/79, 10/12/79 a 15/04/80 e de 16/05/89 a 15/01/94) e "Curtume Sul Paulista Ltda.", de 01/03/96 a 20/04/99, o autor coligiu aos autos os formulários DSS-8030 de fls. 15/16 e 20/21.
Pois bem.
O reconhecimento da especialidade com base na exposição aos fatores de risco não se mostra possível, na medida em que os únicos agentes agressivos mencionados (ruído, calor, poeira, ambientes molhados e com produtos químicos) vieram desacompanhados de maiores especificações, como, por exemplo, a intensidade sonora ou de calor aos quais o autor estava exposto, bem como se de forma habitual e permanente.
Remanesce, tão-somente, a possibilidade de enquadramento da especialidade pela categoria profissional, limitado a 28 de abril de 1995. E, nesse particular, verifico que se mostra possível mencionado reconhecimento, consoante previsão contida no item 2.5.7 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 ("preparação de couros - caleadores de couros, curtidores de couro, trabalhadores em tanagem de couros"), na medida em que as funções desempenhadas pelo autor (manuseio de couros bovinos) são consideradas como "trabalhador do curtimento de couros e peles.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais, os períodos de 14/04/75 a 17/12/76, 02/05/77 a 30/06/79, 10/12/79 a 15/04/80 e de 16/05/89 a 15/01/94, pelo enquadramento da categoria profissional, merecendo reforma a r. sentença, nesse particular.
No tocante aos demais períodos controvertidos, alegados como especiais em função do agente insalubre "ruído", de se verificar que os únicos documentos a demonstrarem tal condição (PPP's) restam inconclusivos, visto que, a despeito de atestarem a exposição do autor a tal fator físico, não fazem menção à sua intensidade, de modo a não ser possível, portanto, concluir que o barulho ao qual era o autor submetido fosse, de fato, superior ao limite legal permitido à época da prestação do trabalho em referência (fls. 17/19). Demais disso, o PPP de fl. 19 é apócrifo, não possuindo qualquer efeito jurídico.
No que tange ao intervalo compreendido entre 18/05/81 e 05/10/81, não houve qualquer prova a demonstrar a insalubridade, não sendo possível, portanto, seu reconhecimento como especial. Nem mesmo por enquadramento da atividade profissional.
Não havendo mais provas, além das supraelencadas, acerca da especialidade nos autos, imperioso o afastamento, in casu, quanto aos interregnos laborativos de 18/05/81 a 05/10/81, 24/05/82 a 18/12/82, 28/04/83 a 26/12/83, 03/02/84 a 08/12/88 e entre 01/03/96 e 20/04/99, devendo a r. sentença a quo, portanto, ser, quanto a tal, reformada.
Conforme planilha anexa, somando-se a atividade especial ora reconhecida aos períodos comuns incontroversos, verifica-se que, até a data da citação (26/03/2009), o autor possuía apenas 29 anos, 02 meses e 03 dias de tempo de contribuição/serviço, de modo a não ter direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço, nem mesmo na modalidade proporcional.
Desta feita, diante da sucumbência recíproca, cada parte arcará com os honorários de seus respectivos patronos.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, ora tida por interposta, para afastar o reconhecimento da especialidade dos períodos de 18/05/81 a 05/10/81, de 24/05/82 a 18/12/82, de 28/04/83 a 26/12/83, de 03/02/84 a 08/12/88, e entre 01/03/96 e 20/04/99, bem como reformar a r. sentença de origem, para indeferir o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço do autor. Demais disso, em decorrência da sucumbência recíproca, cada parte arcará com os honorários de seus respectivos patronos, mantida, no mais, a r. sentença de 1º grau. Por fim, nego provimento à apelação adesiva do autor.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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