D.E. Publicado em 20/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, no que tange ao pedido de reconhecimento do labor rural, julgar, de ofício, extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil/1973 e artigo 485, IV, do Código de Processo Civil/2015, e, no que sobeja, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 08/02/2018 18:47:38 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027523-60.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARIA FRANCISCA DA CONCEIÇÃO SILVA em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de labor rural, bem como de trabalho exercido em condições especiais.
A r. sentença de fls. 63/65 julgou improcedente o pedido inicial, e condenou a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 69/73, a autora pugna pela reforma da r. sentença, ao fundamento de que teria preenchido todos os requisitos para a obtenção do benefício vindicado, sendo dispensável a observância de uma idade mínima, tal como consignando no decisum. Aduz que, "excetuando o período trabalhado na lavoura, os demais foram exercidos em condições especiais e independem de laudo, para conversão em tempo comum, pois estão abrangidos pelos decretos 53.831/64; 83.080/79 e 3.048/99, em razão da profissão exercida".
Devidamente processado o recurso, sem o oferecimento das contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural, no período de 01/01/1974 a 30/03/1979. Além disso, pretende ver reconhecida a especialidade do trabalho desempenhado nos períodos de 06/04/1979 a 18/12/1986, 01/05/1989 a 21/11/1989, 01/02/1990 a 16/08/1997, 19/08/1997 a 03/11/1997, 04/11/1997 a 06/04/1998 e 07/04/1998 a 16/12/1998.
Passo ao exame do labor rural.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso concreto.
Para a comprovação do labor rural, a autora apresentou apenas:
a) Declaração de Exercício de Atividade Rural, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itapetininga/SP, na qual se verifica que o período de atividade rural pretendido não restou homologado pelo INSS, "em virtude da não aceitação dos documentos anexados à declaração" (fls. 19 e 21);
b) Certidão do Registro de Imóveis, na qual o genitor da autora figura como adquirente de imóvel rural, sendo qualificado à época como lavrador, com anotação do registro em 05/01/1960 (fls. 15/15-verso);
c) Declaração emitida pelo Sindicato Rural de Itapetininga, em 02/02/2001, atestando que o pai da autora foi associado, "na condição de lavrador, desde 15/04/1975 até 20/12/1979" (fl. 16) e declaração firmada pela própria autora, em 23/02/2001, a atestar o labor campesino (fl. 18).
Em relação a tais documentos, cumpre por ora notar que nenhum deles constitui hábil início de prova material de labor rurícola, visto que: a) a Declaração de Exercício de Atividade Rural não atende os ditames da lei de regência, que exige a homologação do INSS para fins de comprovação do labor campesino (Lei nº 8.213/91, art. 106, III); b) o registro imobiliário, em nome de terceiros, por sua vez, nada prova quanto ao exercício de labor rural por parte da requerente, além de ser inábil por extemporaneidade; outrossim, a extensão de efeitos em decorrência de documento de familiar próximo (no caso, genitor) parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, nos termos do artigo 11, inciso VII, da Lei n. 8.213/91, não sendo este o caso dos autos, em que a autora relata que trabalhou como diarista na propriedade do Sr. João Luiz dos Santos (fl. 59); c) ambas as declarações de atividade rural constituem meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório.
Demais disso, nenhuma outra prova material foi acostada aos autos, pretendendo a autora que os depoimentos testemunhais supram a comprovação de supostos cinco anos de exercício de labor rural, o que não se afigura legítimo.
Desta forma, diante da ausência de prova documental idônea que comprove que a autora laborou no campo, impossível seu reconhecimento.
Em razão do entendimento fixado pela Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n.º 1.352.721/SP, na forma do artigo 543-C do CPC/1973, e diante da ausência de conteúdo probatório eficaz, deverá, ainda que contrariamente ao entendimento deste Relator, o feito ser extinto, nesse ponto específico, sem resolução de mérito, por carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, de sorte a possibilitar à parte autora o ajuizamento de novo pedido, administrativo ou judicial, caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Passo a analisar o período de atividade especial suscitado pela requerente.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Do caso concreto.
Para comprovar que suas atividades, nos períodos apontados na inicial, foram exercidas em condições prejudiciais à saúde e à integridade física, a autora coligiu aos autos tão somente a sua CTPS (fls. 22/26), na qual foram inseridas as seguintes informações:
a) no período de 06/04/1979 a 18/12/1986, a autora exerceu a função de "servente" junto à "Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Itapetininga";
b) no período de 01/05/1989 a 21/11/1989, a autora exerceu a função de "atendente" na Prefeitura Municipal de Guarei;
c) no período de 01/02/1990 a 16/08/1997, a autora exerceu a função de "recepcionista" junto à "Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Itapetininga";
d) no período de 19/08/1997 a 03/11/1997, a autora exerceu a função de "auxiliar de farmácia" junto à empresa "J. B. Cirúrgica Comercial Ltda";
e) no período de 04/11/1997 a 06/04/1998, a autora exerceu a função de "auxiliar de farmácia" junto à empresa "HOSP - SERV Produtos Hospitalares Ltda";
f) a partir de 07/04/1998, a autora passou a exercer a função de "auxiliar de farmácia" junto à "Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Itapetininga".
Pretende a autora o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos acima explicitados, invocando para tanto o disposto nos Decretos nºs 53.831/64 (códigos 1.3.2 e 2.1.3); 83.080/79 (códigos 1.3.4 e 2.1.3) e 3.048/99 (código 3.0.1 do anexo IV). Todavia, ao contrário do que alega em seu apelo, não se afigura possível o reconhecimento "em razão da profissão exercida", haja vista a ausência de previsão específica nos Decretos que regem a matéria (veja-se que os itens mencionados pela autora dizem respeito às profissões ligadas à medicina, odontologia e enfermagem, ao passo que a demandante exerceu as funções de servente, atendente, recepcionista e auxiliar de farmácia).
Por outro lado, se o intuito era demonstrar o exercício de atividade especial em razão da exposição aos mesmos agentes agressivos a que se encontram submetidos os profissionais que desempenham suas funções em ambientes hospitalares (com exposição a materiais infecto-contagiantes, portanto), então deveria a parte autora ter apresentado a documentação pertinente (formulário emitido pela empregadora, laudo técnico e/ou Perfil Profissiográfico Previdenciário), de modo a viabilizar eventual enquadramento legal.
Em outras palavras, o pedido da autora, nesse particular, não encontra respaldo legal, uma vez que não é possível presumir a existência de agentes nocivos em seu quotidiano laboral por meio das informações inseridas em Carteira de Trabalho (pois as profissões declinadas não se subsomem aos anexos dos Decretos anteriormente indicados), sendo indispensável a apresentação, repise-se, dos documentos que comprovem efetivamente a insalubridade do ambiente de trabalho.
De rigor, portanto, a manutenção da sentença de improcedência, no particular.
Ante o exposto, no que tange ao pedido de reconhecimento do labor rural, julgo, de ofício, extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil/1973 e artigo 485, IV, do Código de Processo Civil/2015, e, no que sobeja, nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 08/02/2018 18:47:35 |