Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2006209 / SP
0006730-52.2013.4.03.6143
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRECEDENTES
JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA) E STF
(REPERCUSSÃO GERAL). CARACTERIZADO O INTERESSE DE AGIR PELA PRETENSÃO
RESISTIDA. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. TEMPO INSUFICIENTE PARA CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE
PROVIDA.
1 - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido
nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio
requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda
previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art.
5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o
Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção
de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do
INSS em desfavor da pretensão do segurado.
2 - Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça revisitou sua jurisprudência de modo a
perfilhar o posicionamento adotado pela Suprema Corte, o que se deu quando do julgamento do
RESP nº 1.369.834/SP, resolvido nos termos do artigo 543-C do CPC/73.
3 - No caso em exame, trata-se de pedido concessivo de benefício, não sendo, portanto, a
hipótese de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Da mesma forma, o pleito não se enquadra nos casos em que notória ou reiterada a resistência
autárquica.
4 - Entretanto, verifica-se que o INSS apresentou contestação de mérito, caracterizando o
interesse em agir pela resistência à pretensão. Assim, passo à análise do mérito.
5 - Pretende o autor a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
mediante o reconhecimento de labor exercido sob condições especiais.
6 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
7 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
9 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
10 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
11 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
12 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
13 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
14 - Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum,
independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da
conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
15 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do
Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
16 - Pretende o autor o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 01/06/1974
a 10/01/1977, de 01/08/1977 a 19/11/1980, de 01/05/1981 a 24/09/1981, de 01/07/1982 a
30/11/1982, de 02/04/1984 a 02/07/1985, de 03/11/1987 a 31/01/1990, de 01/05/1990 a
31/08/1995, de 01/03/1996 a 01/03/1999, de 01/03/2000 a 22/03/2003 e de 01/02/2006 até a
data do ajuizamento da ação (08/06/2011), com a concessão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição.
17 - Conforme CTPS e Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs: no período 01/06/1974 a
10/01/1977, laborado na empresa Redevel Recuperadora de Veículos Ltda, o autor exerceu o
cargo de "ajudante" - CTPS de fl. 24; no período de 01/08/1977 a 19/11/1980, laborado na
empresa Mario Apparecido Cortez, o autor exerceu o cargo de "funileiro" - CTPS de fl. 24; nos
períodos de 01/05/1981 a 24/09/1981, de 01/07/1982 a 30/11/1982 e de 02/04/1984 a
02/07/1985, laborados na empresa Auto Funilaria Nogueira S/C Ltda, o autor exerceu o caro de
"funileiro"- CTPS de fls. 25 e 26; no período de 03/11/1987 a 31/01/1990, laborado na empresa
Amaral e Alves Cia Ltda ME, o autor exerceu o caro de "funileiro"- CTPS de fl. 26; no período
de 01/05/1990 a 31/08/1995, o autor exerceu a atividade de "funileiro autônomo" - Declaração
Cadastral da Prefeitura Municipal de Limeira de fl. 49; nos período de 01/03/1996 a 01/03/1999
e de 01/03/2000 a 22/03/2003, laborados na empresa Vecol Veículos Cordeirópolis Ltda, o
autor exerceu o cargo de "funileiro de autos" - CTPS de fl. 27 e PPPs de fls. 138/138-verso e
139/139-verso; e de 01/02/2006 a 17/04/2009 (data da emissão do PPP), laborado para Laércio
Paulo dos Santos EPP, o autor exerceu o cargo de "funileiro", exposto a ruído de 89,6 dB(A) no
período de 01/02/2006 a 24/07/2006; a ruído de 92,01 dB(A), no período de 25/07/2006 a
24/07/2007; a ruído de 84,41 dB(A), a calor de 22,6 IBUTG, a fumos de solda, ferro, manganês,
cobre, cromo e chumbo, com uso de EPI eficaz, de 25/07/2007 a 24/07/2008; e a ruído de 88,54
dB(A), de 25/07/2008 a 17/04/2009 - PPP de fls. 140/142.
18 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos período de 01/02/2006
a 24/07/2007 e de 25/07/2008 a 17/04/2009.
19 - No tocante aos períodos de 01/06/1974 a 10/01/1977, de 01/08/1977 a 19/11/1980, de
01/05/1981 a 24/09/1981, de 01/07/1982 a 30/11/1982, de 02/04/1984 a 02/07/1985, de
03/11/1987 a 31/01/1990, de 01/05/1990 a 31/08/1995, o autor apresentou apenas CTPS e
declaração cadastral, impossibilitando o reconhecimento da especialidade, eis que a atividade
não pode ser considerada especial por mero enquadramento profissional, em razão de
ausência de previsão no rol do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79.
20 - Os períodos de 01/03/1996 a 01/03/1999 e de 01/03/2000 a 22/03/2003 também não
podem ser reconhecidos como exercidos sob condições especiais, pois o PPP apresentado não
menciona a exposição a agentes agressivos.
21 - Inviável também o reconhecimento da especialidade do labor no período de 25/07/2007 a
24/07/2008, eis que o autor esteve exposto a ruído inferior a 85 dB(A) exigidos à época, e, em
relação aos agentes químicos, fez uso de EPI eficaz.
22 - Cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da
Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação
acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de
atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da
atividade desempenhada.
23 - Portanto, a partir de 15/12/1998, nos períodos em que está comprovada a utilização de
equipamentos individuais de proteção eficazes, fica afastada a insalubridade.
24 - Ressalte-se que impossível também o reconhecimento do período de 25/07/2007 a
24/07/2008 pelo agente agressivo calor, pois pelo PPP apresentado, não há como se aferir qual
era o seu regime próprio de intermitência, assim como o local específico de trabalho.
25 - Portanto, não há como se afirmar com segurança que a atividade tenha sido realizada sob
condições tidas por insalubres.
26 - Por fim, impossível o reconhecimento do labor exercido sob condições especiais no
período de 18/04/2009 a 08/06/2011, pois não há nos autos prova de sua especialidade.
27 - Com o advento da emenda constitucional 20/98, extinguiu-se a aposentadoria proporcional
para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998),
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
28 - Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de
forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema
por ocasião da alteração legislativa em comento.
29 - Desta forma, conforme tabela anexa, após converter os períodos especiais em tempo
comum, aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e somá-los aos demais períodos comuns já
reconhecidos administrativamente pelo INSS (fls. 124/125) e anotados em CTPS (fls. 23/47);
verifica-se que a parte autora, na data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998), contava com 18
anos, 3 meses e 8 dias de tempo total de atividade; insuficiente para a concessão do benefício
de aposentadoria.
30 - Computando-se períodos posteriores, observa-se que, na data do ajuizamento da ação
(08/06/2011 - fl. 01), o autor contava com 27 anos, 9 meses e 13 dias de tempo total de
atividade; assim, não havia cumprido nem o "pedágio" e nem o requisito etário necessários para
fazer jus ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
31 - Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Sem condenação das partes nas custas
e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas se
encontra isento.
32 - Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do autor, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 01/02/2006 a
24/07/2007 e de 25/07/2008 a 17/04/2009; deixando de condenar quaisquer das partes nas
custas e despesas processuais e, ante a sucumbência recíproca (art. 21, CPC/73), dando a
verba honorária por compensada entre os litigantes, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.