D.E. Publicado em 27/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10080 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE180625583965 |
Data e Hora: | 08/11/2018 17:15:39 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005243-46.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação autárquica tirada de sentença, não submetida à remessa oficial, que, em autos de concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, julgou procedente o pedido e condenou o réu no pagamento das prestações vencidas, desde o indeferimento administrativo, discriminados os consectários e arbitrada a verba honorária à ordem de 10% sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula 111/STJ (fls. 120/121).
O INSS pugna pela reforma da sentença, ao argumento de ausência de início de prova material da atividade rurícola no período de carência. Aduz que o autor verteu contribuições na qualidade de contribuinte individual a obstar a concessão da benesse. Pede a fixação da verba honorária nos termos do art. 85, §§ 3º e 4º, do NCPC (fls. 132/142).
Ofertadas contrarrazões (fls. 158/167), subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 496, § 3º, inciso I, do NCPC, que entrou em vigor em 18 de março de 2016, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações movidas contra a União Federal e respectivas autarquias e fundações e cujo direito controvertido não exceda mil salários mínimos.
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (indeferimento administrativo em 23/03/2017, fl.18) e da prolação da sentença, (18/10/2017, fls. 120/121), bem como o valor da benesse, de um salário mínimo, verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à análise do recurso autárquico em seus exatos limites.
Pois bem, a aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. Findo o período de vigência da norma de transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses (carência da aposentadoria por idade).
Muito se debateu a respeito da comprovação da atividade rural para efeito de concessão do aludido benefício e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
(ii) são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
(iii) não se enquadra como princípio documental certidão recente da Justiça Eleitoral, preenchida de acordo com informações fornecidas pelo próprio postulante do jubilamento, assemelhando-se, portanto, à singela declaração unilateral de atividade profissional (e.g., TRF3, AC 00160584920114039999, Relator Juiz Convocado Valdeci dos Santos, Décima Turma, e-DJF3 01/07/2015; AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora Desembargadora Federal Tania Marangoni, Oitava Turma, e-DJF3 16/04/2015);
(iv) o afastamento do ofício rural, após o preenchimento de todos os requisitos exigidos à aposentadoria, não interfere em sua concessão, sendo, contudo, inaplicável aos rurícolas o estatuído no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003 (STJ, PET nº 7.476/PR, 3ª Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 13/12/2010, Rel. p/ acórdão Min. Jorge Mussi; AgRg no REsp nº 1.253.184, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06/09/2011; AgRg no REsp nº 1.242.720, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 02/02/2012; REsp nº 1.304.136, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim, j. 21/02/2013, DJe 07/03/2013), sob pena, inclusive, de se atribuir aos trabalhadores rurais regime híbrido em que se mesclariam as vantagens típicas dos campesinos e outras inerentes exclusivamente aos obreiros urbanos;
(v) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos permaneceram polêmicos por anos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o maior deles diga respeito, justamente, à necessidade de demonstração da labuta rural no período imediatamente anterior ao requerimento da benesse.
Respeitáveis posições recusavam uma resposta apriorística do que viesse a se entender pela expressão período imediatamente anterior, sob o argumento de que a solução da controvérsia passa por acurado estudo de cada caso concreto, com destaque à cronologia laboral da parte autora, a fim de definir se verdadeiramente se está diante de pessoa que dedicou sua vida profissional às lides rurais.
Sem embargo, o dissenso acabou desfechado pelo c. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia, in verbis:
No mesmo sentido:
Da análise dos entendimentos jurisprudenciais coletados, penso que a concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural há de se atrelar à comprovação do desempenho de labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, ao menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, como, de resto, textualmente deliberado por esta E. Corte em paradigma da Terceira Seção: EI 00139351020134039999, Relatora DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, e-DJF3 Judicial 1 10/06/2015.
Outra temática remanesce polêmica à atualidade, mormente na seara desta egrégia Corte, e diz com a necessidade de contemporaneidade do início de prova material amealhado a, quando menos, uma fração do período exigido pela lei para a outorga do benefício.
Muito embora reconheça postura algo hesitante deste Tribunal - que, muita vez, vem relativizando o atendimento dessa exigência, principalmente naquelas espécies em que o histórico laborativo rural da parte impressiona, permitindo divisar que na maior parte de sua jornada trabalhista a parte dedicou-se veramente aos ofícios campestres - tenho por certo que o egrégio STJ vem consagrando a imprescindibilidade de concomitância temporal - ainda que ínfima - entre a data do documento indiciário do afazer rurícola e o interstício de atividade rural necessário à concessão da benesse.
Seguem arestos nesse diapasão: STJ, AR 3994 / SP, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, j. 23/09/2015, DJe 01/10/2015; STJ, AgRg no AREsp 436471 / PR, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0384226-1, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, j. 25/03/2014, DJe 15/04/2014; TRF3, APELREEX 00232553620034039999, Relator DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, NONA TURMA, e-DJF3 10/07/2015.
Esposando o mesmo raciocínio, a Súmula 34 da TNU, verbis:
A propósito, tenho que a condicionante resulta, de certo modo, enaltecida em recurso repetitivo emanado do c. STJ. Vale constatar, num primeiro lanço, o seguinte aresto, exarado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973:
Ora bem, da leitura da ementa retrotranscrita, ressai cristalino ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o período a comprovar-se: admite-se que aluda, apenas, à parcela deste. Equivale, pois, a afirmar-se que o princípio deve reportar-se ao menos a um quinhão do intervalo laborativo a ser comprovado. E, em ação de aposentadoria por idade rural, o que deve ser demonstrado é justamente o lapso dito de carência, vale dizer, a labuta campesina no período imediatamente anterior à vindicação do benefício, pois, sem isso, não há benesse a deferir-se.
Destarte, à luz dos julgados do c. STJ e da linha exegética acima, inclino-me pela simultaneidade, ainda quando diminuta, entre os documentos ofertados e o interregno laboral necessário à outorga do beneplácito.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pelo autor do requisito etário em 01/05/2015 (fl. 143), incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 180 meses.
A título de início de prova material foram colacionados, dentre outros documentos em nome do autor: contrato particular de parceria agrícola firmado em 10/04/1997 e vigência até 09/04/2000 (fls. 24/27), no qual o demandante é qualificado como agricultor.
Os demais documentos carreados, consistentes em contrato de parceria agrícola datado de 01/01/1982 (fls. 28/29), notas fiscais de produtor rural, emitidas entre 1983 e 1985 (fls. 31/34), declaração de produtor rural ao Funrural, no interregno de 1982/1985 (fls. 35/39), embora extemporâneos ao período de carência, corroboram o histórico de labor campestre declinado na inicial.
Constatams-se recolhimentos de contribuições previdenciárias em períodos intermitentes de 1980 a 1991 e como contribuinte individual de 01/03/2013 a 30/09/2017 (fl. 143), cumprindo consignar que referidos recolhimentos, por si sós, não comprovam o exercício de qualquer atividade, de modo que não afastam a condição de rurícola do autor.
Presente, portanto, vestígio de prova documental quanto ao labor campesino do proponente, nas cercanias do período de carência (05/2000 a 05/2015).
Realizada audiência em 08/10/2017 (mídia digital - fl. 169), em depoimento pessoal, o autor historiou que tem 62 anos e mora no sítio Serrinha, bairro Oliveira Barros, desde que nasceu. Quando se casou continuou trabalhando nesse sítio, no cultivo de banana e mandioca para consumo próprio e venda do excedente.
A testemunha Gercino Antônio de Lima relatou que conhece o autor há mais ou menos 45 anos, sabendo que ele é agricultor. Já viu o autor trabalhando na roça, num sítio localizado na zona rural (bairro Oliveira Barros), denominado Chácara Serrinha. O autor tem criação de galinha e plantação de banana. Sabe que os filhos do autor trabalham com ele. Acrescentou que o autor nasceu nesse sítio.
João Rodrigues disse conhecer o autor há aproximadamente 40 anos, acrescentando que moram próximos. O autor trabalha na zona rural, onde cultiva um pequeno bananal, no sítio Serrinha, bairro Oliveira Barros. O autor trabalha na roça desde pequeno e sua família trabalha junto.
Destarte, a prova oral produzida se mostra coesa e harmônica, amplificando o início de prova material, no sentido do desempenho, pelo autora, de atividade rurícola pelo interregno necessário à outorga da benesse vindicada, desde o requerimento administrativo formulado em 23/03/2017 - fl. 18 (art. 49, II, da Lei n. 8.213/1990).
Conquanto imperiosa a mantença da condenação da autarquia em honorários advocatícios, esta deve ser fixada em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11 desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula n. 111 do STJ).
Ante o exposto, nego provimento à apelação, explicitando os critérios de fixação dos honorários advocatícios.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10080 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE180625583965 |
Data e Hora: | 08/11/2018 17:15:36 |